
| D.E. Publicado em 03/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, tida por ocorrida, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10078 |
| Nº de Série do Certificado: | 112317020459EA07 |
| Data e Hora: | 25/04/2018 14:56:29 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006719-09.2005.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, desde a data do protocolo do primeiro processo judicial (Autos n° 0076168-94.2004.403.6301, JEF Cível de São Paulo, protocolo em 14.01.2004), mediante o reconhecimento do labor rural em regime de economia familiar (20.01.1971 a 20.12.1976), bem como de período trabalhado em atividades especiais (27.01.1977 a 31.03.1978, 01.04.1978 a 31.07.1978, 01.08.1978 a 20.05.1982, 03.09.1982 a 19.07.1983, 11.08.1983 a 15.04.1986, 16.04.1986 a 04.08.1989, 21.09.1989 a 08.11.1990, 19.03.1991 a 28.05.1991, 05.08.1991 a 04.05.1993, 05.05.1993 a 31.05.1993, 01.06.1993 a 08.02.1995 e de 08.02.1995 a 18.11.2003), sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer como trabalhados em atividades especiais os períodos relativos às empresas: Companhia Brasileira de Alumínio (01.04.1978 a 31.07.1978, 01.08.1978 a 20.05.1982, 11.08.1983 a 15.04.1986 e de 16.04.1986 a 04.08.1989), CBPO - Companhia Brasileira de Projetos e Obras (21.09.1989 a 08.11.1990) e Newton Indústria e Comércio Ltda. (08.02.1995 a 28.04.1995). Deixou de fixar condenação em custas processuais diante da isenção de que gozam as partes. Fixou serem indevidos honorários advocatícios, ante a sucumbência recíproca.
Foi determinada ao INSS, em sede de antecipação de tutela, a averbação dos períodos de tempo especial reconhecidos em sentença.
Dispensada a remessa necessária, nos termos do §2º do artigo 475 do Código de Processo Civil/73.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando que o autor não comprovou o exercício de atividade especial, pois: o Decreto n° 53.831/64 e o Decreto n° 83.080/79 não contemplam as funções por ele exercidas (frentista, montador, maçariqueiro); o formulário não quantifica os agentes agressivos aos quais estaria exposto de forma permanente. Subsidiariamente, pretende a fixação de honorários advocatícios em percentual inferior a 10%. Requer a reforma da r. sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. Subsidiariamente, postula a modificação dos honorários advocatícios.
Apela a parte autora. Alega que comprovou o tempo rural (20.01.1971 a 20.12.1976) e o exercício de atividade especial também nos períodos trabalhados nas empresas FEM (19.03.1991 a 28.05.1991), OMTEK (05.08.1991 a 04.05.1993), OMETTO (05.05.1993 a 31.05.1993 e 01.06.1993 a 08.02.1995) e NEWTON (08.02.1995 a 18.11.2003). Requer a reforma da r. sentença para que sejam julgados procedentes os pedidos formulados na petição inicial.
Contrarrazões pelo autor, requerendo a manutenção da sentença.
Vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Remessa Necessária
Tendo em vista que a sentença, proferida anteriormente à Lei nº 13.105/2015, tem cunho declaratório e, no caso concreto, é impossível aferir ou definir o valor econômico dela decorrente, entendo inaplicável ao caso o disposto no §2º do art. 475 do Código de Processo Civil de 1973, que dispensa a remessa necessária na hipótese de a condenação, ou o direito controvertido, ser de valor certo e não exceder 60 (sessenta) salários mínimos (cf. STJ, Corte Especial, EResp 600596, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 04/11/2009, v.u., DJE 23/11/2009).
Admissibilidade
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de 1988, todavia, prevalece a idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, ante a remessa necessária e o teor das apelações das partes, verifica-se que a controvérsia alcança a especialidade das atividades trabalhadas nos períodos de 01.04.1978 a 31.07.1978, 01.08.1978 a 20.05.1982, 11.08.1983 a 15.04.1986, 16.04.1986 a 04.08.1989, 21.09.1989 a 08.11.1990, 08.02.1995 a 28.04.1995, 19.03.1991 a 28.05.1991 (FEM), 05.08.1991 a 04.05.1993 (OMTEK), 05.05.1993 a 31.05.1993 (OMETTO), 01.06.1993 a 08.02.1995 (OMETTO) e 08.02.1995 a 18.11.2003 (NEWTON), bem como o tempo rural no período de 20.01.1971 a 20.12.1976, além do direito ao benefício previdenciário.
Atividade rural
O autor, nascido em 05.01.1957, trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural:
- Certificado de Alistamento Militar emitido em 15.06.1976, no qual consta a qualificação do autor como agricultor e sua residência no Sítio Cachoeirinha, Município de Custódia/PE (fl. 24).
Com relação à declaração do proprietário do imóvel rural (pai do autor), onde o autor teria atuado, e à declaração de terceiro, ambas confirmando o trabalho rural do autor no sítio de seu pai no período de 20.01.1971 a 20.12.1976, pondero que estas não possuem valor probante, visto que não foram produzidas contemporaneamente ao período que se deseja provar, sendo datada do ano de 1997 (fls. 29/30). A mesma conclusão se aplica às declarações de terceiros que afirmam haver adquirido algodão, milho, feijão e outros itens do pai do autor, no período de 20.01.1971 a 20.12.1976, de vez que estão datadas do ano de 1998 (fls. 39/40).
A declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Custódia/SP (fl. 21) também não configura início de prova material, pois em desacordo com o disposto no artigo 106, III, da Lei nº 8.213/91, que em sua redação original exigia, para sua validade, homologação pelo Ministério Público e, após a alteração legislativa em 2008, passou a exigir homologação do INSS.
O Certificado de Dispensa de Incorporação emitido em 30.04.1977, no qual consta a qualificação do autor como agricultor é posterior ao período rural que se deseja provar (fl. 23).
Os demais documentos foram produzidos anos após o período rural que se deseja provar, a saber: certificado de cadastro no INCRA em nome do pai do autor dos exercícios de 1979 e 1980 (fls. 35/36); declaração para cadastro de imóvel rural em nome do pai do autor relativo ao ano de 1988 (fls. 32/33); imposto territorial rural em nome do pai do autor dos anos de 1991 e 1996 (fl. 38).
O Imposto territorial rural em nome do pai do autor do ano de 1971 (fls. 34) e a Escritura de Compra e Venda de Imóvel Rural lavrada em 11.12.1973, na qual o pai do autor consta como comprador do imóvel e está qualificado como agricultor, embora, a princípio, sirvam de início de prova material, não foram corroborados por prova testemunhal (fls. 26/27).
Registre-se que, intimado a especificar provas, o autor deixou de pleitear a produção de prova testemunhal.
Nesse contexto, o conjunto probatório revela-se apto a comprovar o desempenho da atividade rural apenas no período de 01.01.1976 a 20.12.1976, exceto para efeito de carência.
Atividade especial
Os períodos de 01.04.1978 a 31.07.1978 (informativo de fl. 44; setor casa de máquinas), 01.08.1978 a 20.05.1982 (informativo de fl. 46; setor casa de máquinas), 11.08.1983 a 15.04.1986 (informativo de fl. 50; setor de barragem) e 16.04.1986 a 31.01.1987 (informativo de fl. 52; setor de túnel/comportas), em que o autor trabalhou na Companhia Brasileira de Alumínio, na função de frentista (A, B e C), operando marteletes pneumáticos e perfuratrizes em serviço de escavações de rochas, e o período de 01.02.1987 a 04.08.1989 (informativo de fl. 52; setor de túnel/comportas), em que o autor trabalhou na mesma empresa, exercendo a função de montador, auxiliando os serviços supra e na montagem/reparo de equipamentos na comporta, devem ser reconhecidos como trabalhados em condições especiais, em razão do enquadramento legal (por agente nocivo e por categoria profissional), nos códigos 1.1.5 do Decreto nº 53.831/64, bem como itens 1.1.4 e 2.5.3 do Decreto nº 83.080/79.
O período de 21.09.1989 a 08.11.1990 (94 a 105 dB; informativo de fl. 54 e laudo técnico individual de fl. 55), em que o autor trabalhou na Companhia Brasileira de Projetos e Obras - CBPO, na função de "montador I" em canteiro de obras do "Metrô Paulista", deve ser considerado como trabalhado em condições especiais, porquanto restou comprovada a exposição a ruído acima do limite permitido, de forma habitual e permanente, enquadrando-se no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79.
De sua vez, o período de 08.02.1995 a 18.11.2003 (PPP de fls. 63/66, emitido em 10.03.2004), em que o autor trabalhou na empresa Newton Ind. Com. Ltda., exercendo a função de maçariqueiro (unindo e cortando peças de ligas metálicas; usando processos de soldagem e corte, tais como eletrodo revestido, tig, mig, mag, oxigás, arco submerso, brasagem, plasma; preparando equipamentos, acessórios, consumíveis de soldagem e corte, e peças a serem soldadas; cortando chapas metálicas a fogo com utilizando de maçarico a base de oxigênio e peruano), deve ser considerado como trabalhado em condições especiais somente no interregno de 08.02.1995 a 28.04.1995, em razão do enquadramento legal na categoria profissional prevista no código 2.5.3 do Decreto nº 83.080/79.
No tocante aos interregnos remanescentes, não devem ser considerados como trabalhado em condições especiais, pois de: a) 05.1997 a 04.1998 (87 dB), 08.1999 a 07.2000 (87 dB), 08.2000 a 07.2001 (87 dB), a exposição a ruído ocorreu em níveis que estão abaixo do limite legal vigente à época (90dB); b) 07.2001 a 06.2002 (85,5dB; 23,5 IBUTG; óxido de nitrogênio em 0,10 mg/m³ com uso de EPI eficaz) e 11.2002 a 18.11.2003 (86,3 dB; 23,5 IBUTG; asfixiante simples com uso de EPI eficaz), exposição ao ruído e calor ocorreu em níveis que estão abaixo dos limites legais vigentes à época (90dB; até 30/26,7/25 IBUTG em atividade leve/moderada/pesada), e a exposição a agentes químicos ocorreu com uso de EPI eficaz, o que afasta a caracterização da especialidade a partir de 11/12/98 (Lei n° 9.732/98); c) 29.04.1995 a 30.04.1997, 05.1998 a 07.1999 e 07.2002 a 10.2002, o PPP não contempla qualquer atesto de exposição a agentes nocivos, de forma habitual e permanente.
O período 19.03.1991 a 28.05.1991 (informativo de fl. 56), em que o autor trabalhou na empresa FEM Fábrica de Estrutura Metálicas S/A, na função de montador em obra externa, atuando na preparação e montagem de estruturas metálicas do Edifício do FAD-III da Cia Brasileira de Alumínio (CBA), exposto a elevação/altura, não deve ser considerado como trabalhado em condições especiais, porquanto é inviável o enquadramento legal por categoria profissional e o informativo não contempla qualquer atesto de exposição a agentes nocivos, de forma habitual e permanente.
O período de 05.08.1991 a 04.05.1993 (88 dB e 92 dB; informativos de fls. 57/58, ajudante de fabricação de RNA), em que o autor trabalhou na empresa Omtek Ind. Com Ltda., e os períodos de 05.05.1993 a 31.05.1993 (102,5 dB, 106,9 dB, 102,9 dB; 88 dB; informativos de fls. 59/60; ajudante de fabricação no prédio das moendas) e 01.06.1993 a 08.02.1995 (102,5 dB, 106,9 dB, 102,9 dB; informativos de fls. 61/62; operador de turbinas no prédio das moendas), em que o autor trabalhou na Cia Ind. e Agrícola Ometto (fabricação de açúcar/álcool), devem ser considerados como trabalhados em condições especiais, pois restou comprovada a exposição a ruído acima do limite permitido, de forma habitual e permanente, enquadrando-se no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79.
Frise-se que o enquadramento legal por categoria profissional é possível até 28/04/95 (Lei n° 9.032/95) e que, após tal data, deve ser comprovada a exposição a agentes nocivos, de forma habitual e permanente. Ademais, no caso do agente ruído, o uso de EPI, ainda que eficaz, não afasta a caracterização das condições especiais.
Desta forma, considerando o tempo de serviço especial e rural reconhecido nos autos, bem como o tempo urbano comum reconhecido pelo INSS (extrato do CNIS em anexo), verifica-se que à época de ajuizamento da ação a parte autora não havia preenchido o tempo necessário à concessão da aposentadoria proporcional/integral por tempo de serviço (nem mesmo pelas regras de transição da EC n° 20/98 - não cumprido o requisito etário) e da aposentadoria integral por tempo de contribuição, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
Assim, reconheço o tempo rural no período de 01.01.1976 a 20.12.1976, exceto para efeito de carência, bem como o tempo especial nos períodos de 01.04.1978 a 31.07.1978, 01.08.1978 a 20.05.1982, 11.08.1983 a 15.04.1986, 16.04.1986 a 31.01.1987, 01.02.1987 a 04.08.1989, 21.09.1989 a 08.11.1990, 08.02.1995 a 28.04.1995 (reconhecidos em sentença) e, ainda, nos períodos de 05.08.1991 a 04.05.1993, 05.05.1993 a 31.05.1993 e 01.06.1993 a 08.02.1995.
No mais, em sede de remessa necessária, mantenho a sentença nos termos em que proferida.
Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária, tida por ocorrida, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação do autor para reconhecer o tempo rural no período de 01/01/76 a 20/12/76, exceto para efeito de carência, e o tempo especial de 05.08.1991 a 04.05.1993, 05.05.1993 a 31.05.1993 e 01.06.1993 a 08.02.1995, mantendo, no mais, a sentença.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10078 |
| Nº de Série do Certificado: | 112317020459EA07 |
| Data e Hora: | 25/04/2018 14:56:26 |
