
| D.E. Publicado em 09/02/2018 |
EMENTA
| PREVIDENCIÁRIO.REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.LABOR RURAL.ATUALIZAÇÃO DA DÍVIDA. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e de parte da apelação, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, conhecer de parte da apelação e dar-lhe parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007702-55.2007.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS
A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, o reconhecimento de períodos laborados em atividade rural e a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Foi proferida r. sentença com antecipação dos efeitos da tutela. Houve recurso do INSS e a decisão foi anulada por esta Relatoria, determinando-se o retorno dos autos à Vara de origem.
Após a regularização do feito, proferiu-se nova sentença de procedência do pedido para reconhecer o trabalho rural em regime de economia familiar no período de 01/01/1.962 a 10/07/1.978, com a concessão da benesse perseguida a partir da data do requerimento administrativo.
Condenação do Instituto no pagamento dos atrasados, atualizados monetariamente nos termos do Manual de Orientações de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observada a compensação de valores anteriormente pagos.
Custas ex lege e verba honorária arbitrada em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da r. sentença.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Inconformado, o INSS interpôs recurso de apelação. Preliminarmente, aduz a impossibilidade do recebimento do benefício judicial e das respectivas parcelas em atraso, por ser a parte autora beneficiária da aposentadoria por idade, concedida administrativamente. No mérito, defende a reforma total do julgado, sob argumento da ausência de comprovação do tempo de labor rural pretendido pela parte e da falta de cumprimentos dos requisitos para a concessão da aposentadoria "por idade". Subsidiariamente, alega a ocorrência da prescrição, insurge-se contra a data do termo inicial do benefício e contra os critérios de atualização da dívida
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007702-55.2007.4.03.6103/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS
Da remessa oficial.
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
...
§ 4o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM) , e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu transito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal ) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
Natureza Jurídica Da Remessa Oficial
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o princípio inquisitório (e não o princípio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
Direito Intertemporal
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
"A remessa necessária não é recurso, mas condição de eficácia da sentença. Sendo figura processual distinta da do recurso, a ela não se aplicavam as regras do direito intertemporal processual vigente para os eles: a) cabimento do recurso rege-se pela lei vigente à época da prolação da decisão; b) o procedimento do recurso rege-se pela lei vigente à época em que foi efetivamente interposto o recurso - Nery. Recursos, n. 37, pp. 492/500. Assim, a L 10352/01, que modificou as causas em que devem ser obrigatoriamente submetidas ao reexame do tribunal, após a sua entrada em vigor, teve aplicação imediata aos processos em curso. Consequentemente, havendo processo pendente no tribunal, enviado mediante a remessa necessária do regime antigo, o tribunal não poderá conhecer da remessa se a causa do envio não mais existe no rol do CPC 475. É o caso por exemplo, da sentença que anulou o casamento, que era submetida antigamente ao reexame necessário (ex- CPC 475 I), circunstância que foi abolida pela nova redação do CPC 475, dada pela L 10352/01. Logo, se os autos estão no tribunal apenas para o reexame de sentença que anulou o casamento, o tribunal não pode conhecer da remessa." Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pág. 744.
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
Inicialmente verifico que o INSS em seu recurso, insurge-se contra benefício diverso -aposentadoria por idade- do objeto do pedido: aposentadoria por tempo de contribuição.
Desta forma, não conheço, em parte, das razões dissociadas.
Sobre a preliminar aventada, no sentido de que houve concessão administrativa posterior de benefício, cabe apenas dizer que é direito do segurado fazer opção pelo benefício mais vantajoso o que significa dizer que não pode haver concomitância no recebimento das aposentadorias.
Tal fato não caracteriza a perda do objeto da presente ação, bem como a "extinção da execução das prestações vencidas do benefício concedido judicialmente".
Neste sentido, excerto de decisão do Col. STJ, REsp 1269091, Relator o Ministro JORGE MUSSI, data da publicação em 08/11/2011, verbis:
"(...)Veja-se o seguinte trecho do acórdão recorrido, em que é rejeitada expressamente a alegação de fato superveniente:
'No caso, não se verifica o vício de omissão ou qualquer outro que pudesse ensejar o acolhimento dos presentes embargos de declaração, tendo em vista que não teria como o acórdão embargado ter se pronunciado sobre um fato que não havia sido ainda noticiado nos autos.
De qualquer maneira, a impossibilidade de acumulação de duas aposentadorias por parte do autor/embargado, em vista da posterior concessão do benefício em sede administrativa, não implica falta de interesse de agir no presente feito, porquanto caso este venha a lograr êxito ao final dessa demanda, poderá, obviamente, optar pelo benefício mais vantajoso, opção da qual decorrerá ou não o direito de receber diferenças, observando-se, em sendo o caso, a devida compensação entre os valores recebidos e devidos'. (...)Diante do exposto, com espeque no caput do art. 557 do Código de Processo Civil, nega-se seguimento ao recurso especial." (g.n.)
Também:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - ERRO DE PREMISSA FÁTICA RECONHECIDO - JULGAMENTO APARTADO DOS ELEMENTOS DOS AUTOS - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA VIA JUDICIAL E POSTERIORMENTE NA VIA ADMINISTRATIVA - OPÇÃO DO SEGURADO PELA MAIS BENÉFICA - CABIMENTO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS - AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO - RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. Nos termos do art. 535 do CPC, são cabíveis os embargos de declaração para a modificação do julgado que se apresentar omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente na decisão.
2. No caso dos autos, há evidente erro material quanto à questão tratada nos autos.
3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis podendo seus titulares deles renunciar. Dispensada a devolução dos valores recebidos pela aposentadoria a ser preterida.
4. A jurisprudência desta Corte é firme quanto à possibilidade de opção ao benefício previdenciário mais vantajoso, sendo legítima a execução dos valores devidos compreendidos entre o reconhecimento judicial do direito e a concessão administrativa do benefício.
5. Embargos de declaração acolhidos para sanar o erro de premissa fática e prover o agravo regimental, negando provimento ao recurso especial." (STJ, EDcl no AgRg no REsp nº 1.170.430-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª Turma, v.u., DJUe 17/06/2014) (g.n.).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE VALORES DECORRENTES DE BENEFÍCIO RECONHECIDO EM JUÍZO, NA EXISTÊNCIA DE DEFERIMENTO DE BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO RECONHECIDO PELO INSS. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 794 E 795 DO CPC. JURISPRUDÊNCIA FIRME DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Ao segurado é dado optar pelo benefício previdenciário mais vantajoso.
2. O direito previdenciário é direito patrimonial disponível.
3. O segurado pode renunciar ao benefício previdenciário, para obter um mais vantajoso.
4. Não há necessidade de o segurado devolver valores do benefício renunciado.
5. Reconhecido o direito de opção pelo benefício mais vantajoso concedido administrativamente, no curso da ação judicial em que se reconheceu benefício menos vantajoso, sendo desnecessária a devolução de valores decorrentes do benefício renunciado, afigura-se legítimo o direito de execução dos valores compreendidos entre o termo inicial fixado em juízo para concessão do benefício e a data de entrada do requerimento administrativo. Precedentes.
6. Recurso conhecido e não provido."
Superadas estas questões, examino apenas a decisão que reconheceu o período de labor rural.
Do reconhecimento do labor rural
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz respeito à valoração das provas comumente apresentadas:
- declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95;
- declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte;
- não alcança os fins pretendidos a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente;
- a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido se trouxer a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor;
- a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades;
- têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248;
- a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais;
- na atividade desempenhada em regime de economia familiar toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar; ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar;
- de qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos;
- ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro; para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família;
- o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação;
- a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento anterior;
- a circunstância, ainda, do artigo 3º da Lei nº 10.666/03 mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola, pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de se invocar o brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus;
- a equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II;
- no que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação; no caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar , é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural -pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio);
- por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Em regra, toda a documentação comprobatória da atividade, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
O caso concreto
A parte autora juntou documentos dos quais reputo como válidos:
- certidões de casamento, nascimento, inscrição do título eleitoral, dos anos de 1971 a 1.978 atestando sua condição de lavrador.
- certidão de aquisição de imóvel rural do pai do autor, do ano de 1.945.
Pertinente dizer que é sedimentado o entendimento de que documentos apresentados para comprovação de tempo rural não precisam referir-se a todo o interregno que se pretende comprovar, constituindo em início de prova material e não prova plena, podendo, assim, ser complementado por depoimentos testemunhais. Confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO INTEGRAL, MEDIANTE A JUNÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL COM O URBANO. ATIVIDADE RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Para efeito de reconhecimento do tempo de serviço urbano ou rural, não há exigência legal de que o documento apresentado abranja todo o período que se quer ver com prova do, devendo o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, desde que prova testemunhal amplie-lhe a eficácia probatória.
2. Agravo regimental desprovido.
A convicção de que ocorreu o efetivo exercício da atividade, durante determinado período, nesses casos, forma-se através do exame minucioso do conjunto probatório, que se resume nos indícios de prova escrita, em consonância com a oitiva das testemunhas. É preciso que se estabeleça um entrelaçamento entre os elementos extraídos de ambos os meios probatórios: o material e o testemunhal.
Nesse sentido, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça.
Confira-se:
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. VALORAÇÃO DE PROVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EXISTÊNCIA. CARÊNCIA.
1. "1. A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no artigo 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo 55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
2. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados, devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função exercida pelo trabalhador." (REsp 280.402/SP, da minha Relatoria, in DJ 10/9/2001).
3. (...)
4. "Não há exigência legal de que o início de prova material se refira, precisamente, ao período de carência do art. 143 da referida lei, visto que serve apenas para corroborar a prova testemunhal." (EDclREsp 321.703/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, in DJ 8/4/2002).
5. Recurso improvido.
(STJ - Superior Tribunal de Justiça; REsp 628995; Processo: 200400220600; 6ª T. j. 24/08/2004; DJ 13/12/2004, pg 470; Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO).
Finalmente, impende sublinhar que, para a conclusão sobre ter ou não direito à aposentadoria, mister se faz a constatação, por meio da prova testemunhal, se efetivamente a parte autora trabalhou no campo e a duração do referido labor, corroborando, assim, o início de prova material apresentado, o que ocorreu nos autos.
O depoimento pessoal da parte autora e a oitiva das testemunhas realizada no procedimento de justificação administrativa mostraram-se harmônicos e reveladores da atividade rural da parte autora, considerando-se o início de prova material apresentado.
Diante do conjunto fático probatório, mantenho o reconhecimento a da atividade rural no período delimitado pela r. sentença.
Todavia, cabe lembrar que os períodos de labor rural sem registro na CTPS, anteriores ao advento da Lei 8.213/91, podem ser computados, independentemente do recolhimento das contribuições correspondentes, exceto para fins de carência e contagem recíproca.
Mantenho o a data do termo inicial do benefício, ocasião em que o INSS teve ciência da pretensão e a ela resistiu.
Inocorrente a prescrição, considerando-se que a ação foi proposta no mesmo ano em que foi realizado o pedido administrativo (2.007).
Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947, sobressaindo o seguinte corolário em relação aos débitos de natureza não tributária:
"....quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina." (Plenário, j. 20/09/17. Pres. Min. Carmen Lúcia)
Diante do exposto, NÃO CONHEÇO DA REMESSA OFICIAL, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR, NÃO CONHEÇO DE PARTE DA APELAÇÃO E, NA PARTE CONHECIDA, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, apenas para explicitar os critérios de atualização da dívida.
É o voto.
Desembargador Federal
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