
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0012824-83.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON ALVES TEODORO - SP333185-N
APELADO: AIAS RAQUEL CHUKS
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0012824-83.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON ALVES TEODORO - SP333185-N
APELADO: AIAS RAQUEL CHUKS
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação do INSS e recurso adesivo da parte autora, interpostos em face da r. sentença, submetida ao reexame necessário, que julgou procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer a especialidade do labor realizado no período de 09/02/1988 a 28/02/2013 e para condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria especial, desde o requerimento administrativo.
A r. sentença foi proferida aos 17 de julho de 2014, condenou o INSS ao pagamento da verba honorária, arbitrada em 15% do valor da condenação, nos termos da Súmula 111 do C. STJ, e fixou critérios de juros de mora e correção monetária. Foi deferida a antecipação de tutela (fls. 133/135 e fl. 141).
Por força de embargos de declaração opostos pelo INSS, foi retificada a parte dispositiva da decisão, para excluir o reconhecimento da especialidade em relação aos intervalos nos quais a autora esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário (fl.161).
Em suas razões recursais, sustenta o INSS, ser indevido o reconhecimento da especialidade no interregno declinado na r. sentença. Pugna pela reforma e total improcedência do pedido.
Por sua vez, a parte autora, em razões de recurso adesivo, pugna para a reforma da r. sentença para que os intervalos nos quais esteve em gozo de auxílio-doença, de 1º/10/2003 a 16/10/2003 e de 17/05/2011 a 03/07/2011, não sejam desconsiderados do cômputo como labor nocivo, bem como, na hipótese de reforma da r. sentença, seja deferida a aposentadoria especial, com termo inicial na data em que implementados os requisitos.
Ofertadas contrarrazões pela parte autora, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0012824-83.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON ALVES TEODORO - SP333185-N
APELADO: AIAS RAQUEL CHUKS
Advogado do(a) APELADO: MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA - SP322504-N
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V O T O
Inicialmente, afigura-se correta a submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, apesar de a sentença ter sido prolatada após a alteração do art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973 pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, não há, no caso em análise, valor certo a ser considerado, devendo ser observado o disposto na Súmula nº 490 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Passo ao exame do mérito.
A aposentadoria especial - modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição com tempo mínimo reduzido - é devida ao segurado que tiver trabalhado, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, conforme disposição legal, a teor do preceituado no art. 57 da Lei nº 8.213/91 e no art. 201, § 1º, da Constituição Federal.
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo art. 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu art. 142.
Registre-se, por oportuno, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial , é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao art. 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial.
A caracterização e comprovação da atividade especial, de acordo com o art. 70, § 1º, do Decreto n.º 3.048/1999, "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço", como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado em sede de recurso repetitivo, no julgamento do REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011, e do REsp 1310034/PR, citado acima.
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da atividade especial, bastava o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim, vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante comprovação nos autos. Nesse sentido, a súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
A partir de referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o art. 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito: STJ, AgRg no AREsp 547559/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, j. 23/09/2014, DJe 06/10/2014.
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou seu preposto - SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP -, ou outros elementos de prova, independentemente da existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º 2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao art. 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir, além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Ademais, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo, em seu art. 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
À luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, o PPP deve apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e identificação dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP - perfil profissiográfico previdenciário como substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhe-se o seguinte precedente: STJ, AgRg no REsp 1340380/CE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 23/09/2014, DJe 06/10/2014.
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º 664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial ". Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial".
Especificamente em relação ao agente agressivo ruído, estabeleceu-se que, na hipótese de a exposição ter se dado acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do EPI, "não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque não há como garantir, mesmo com o uso adequado do equipamento, a efetiva eliminação dos efeitos nocivos causados por esse agente ao organismo do trabalhador, os quais não se restringem apenas à perda auditiva.
Outrossim, como consignado no referido julgado, não há que se cogitar em concessão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, haja vista os termos dos §§ 6º e 7º do art. 57 da Lei n.º 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.732/98:
"Art. 57. [...]
§ 6º O benefício previsto neste art. será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput.
[...]."
Ademais, sendo responsabilidade exclusiva do empregador o desconto devido a esse título, a sua ausência ou recolhimento incorreto não obsta o reconhecimento da especialidade verificada, pois não pode o obreiro ser prejudicado pela conduta de seu patrão.
NÍVEIS DE RUÍDO - LIMITES LEGAIS
No tocante ao agente agressivo ruído, tem-se que os níveis legais de pressão sonora, tidos como insalubres, são os seguintes: acima de 80 dB, até 05/03/1997, na vigência do Decreto n.º 53.831/64, superior a 90 dB, de 06/03/1997 a 18/11/2003,conforme Decreto n.º 2.172/97 e acima de 85 dB, a contar de 19/11/2003, quando foi publicado o Decreto n.º 4.882/2003, o qual não se aplica retroativamente, consoante assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC/1973 (REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 05/12/2014).
A par disso, esta Turma Julgadora tem se posicionado no sentido da admissão da especialidade quando detectada a presença desse agente nocivo em patamares exatos (80, 90 e 85 decibéis):
AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXPOSIÇÃO A RUÍDO DE 85 DECIBÉIS. DECRETO 4.882/2003. MANTIDO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. ENTENDIMENTO DA NONA TURMA. ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER INEXISTENTES.
I. No agravo legal, a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte, vícios inexistentes na decisão.
II. Os documentos juntados aos autos - PPP e laudo técnico - indicam, para o período de 19.11.2003 a 18.04.2012, exposição a ruído de 85 decibéis (fls. 68/75).
III. O Decreto 4.882, de 18.11.2003, ao alterar o limite vigente de 90 para 85 decibéis, faz menção, em seu artigo 2º, a "exposição a Níveis de Exposição Normalizados (NEN) superiores a 85 dB(A)".
IV. A exposição a exatos 85 dB de 19.11.2003 a 18.04.2012 não configuraria condição especial de trabalho. Ressalvado o posicionamento pessoal da Relatora, acompanha-se o entendimento desta Turma no sentido de reconhecer como especiais as atividades exercidas sob níveis de ruído de 80 dB, 85 dB ou 90 dB (no limite).
V. Agravo legal improvido.
(TRF 3ª Região, Apelação Cível 0005050-55.2013.4.03.6103, Nona Turma, Rel. Desembargadora Federal Marisa Santos, julgado em 15/08/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/08/2016, destaquei)
Em igual teor, segue precedente de minha relatoria: ApReeNec n.º 0013503-95.2010.4.03.6183, Nona Turma, julgado em 07/03/2018, v.u., e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018.
DO CASO CONCRETO
Postas as balizas, passa-se ao exame
do caso concreto.
Verifica-se, inicialmente, que o INSS procedeu ao enquadramento na via administrativa, como atividade especial, dos períodos de
09/02/1988 a 31/05/1990 e de 1º/06/1990 a 03/12/1998
(fl.45). Trata-se, portanto, de períodos incontroversos.Passo à análise do período de labor nocivo, reconhecido na r. sentença, face às provas colacionadas aos autos:
- de 04/12/1998 a 28/02/2013
Empregador(a): Nestle Brasil LTDA
Atividade(s): auxiliar geral e operadora de máquinas no setor ESTAMPARIA -
Prova(s): formulário de fl.09 e 34, PPP de fls. 13/14- com data de emissão 28/02/2013 e laudo técnico da empresa, com emissão na data de 07/12/2001 (fls. 58/109).
Agente nocivo:
- de 04/12/1998 a 07/12/2001 (data de emissão do laudo da empresa)- ruído de 91,dB; - vide fls. 99/100 do laudo – setor estamparia;
- de 1º/01/2004 a 28/02/2003 (PPP) – ruído superior a 85 dB; agentes químicos
- Conclusão: Possível o enquadramento, pela exposição ao agente nocivo ruído, nos termos do código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 para o intervalo de 04/12/1998 a 07/12/2001 1º/01/2004 a 28/02/2013.
Não se mostra possível o enquadramento do intervalo compreendido entre
08/12/2001 até 31/12/2003
, uma vez que apresentado apenas o formulário de fls. 10 e 34, e não colacionado aos autos o laudo técnico pericial, firmado por Médico ou Engenheiro do trabalho, atestando a exposição da requerente ao agente nocivo ruído.Por fim, quanto à data de emissão do PPP/laudo, como termo final para o reconhecimento da atividade especial, veja-se: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0016346-21.2016.4.03.9999/SP - TRF3 - Nona Turma - Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos - v.u. - Data do julgamento: 15/08/2016.
Atente-se à regularidade formal dos documentos apresentados, inexistindo necessidade de contemporaneidade do formulário ou laudo ao período de exercício da atividade insalubre, à falta de previsão legal nesse sentido e de comprovação de significativa alteração no ambiente laboral.
Frise-se, ainda, que o simples fato de a empresa informar a utilização do EPI pelo trabalhador não elide a configuração do trabalho insalubre, havendo a necessidade da comprovação de sua eficácia, o que não ocorreu no caso vertente.
Destarte, apresenta-se possível o reconhecimento do labor nocivo para os intervalos de
04/12/1998 a 07/12/2001
e de1º/01/2004 a 28/02/2013,
devendo o INSS proceder à respectiva averbação.Com relação aos intervalos nos quais a parte autora esteve em gozo de benefício de auxílio-doença, considero que, com relação ao período de 1º/10/2003 a 16/10/2003, merece ser mantido como período comum, uma vez que não reconhecido o labor nocivo nesse intervalo, face a não comprovação da nocividade, por ausência de laudo técnico, na forma acima fundamentada.
Para o intervalo de
17/05/2011 a 03/07/2011
, compreendido dentro da lacuna do labor nocivo ora reconhecido, o mesmo deve ser computado como especial, nos termos do restou decido no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia de nº REsp 1759098/RS, (Tema nº 998)- acórdão publicado no DJe de 01/08/2019, oportunidade em que fixou-se a tese de que “o segurado em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.”Por oportuno, colaciono inteiro teor do julgado, em questão:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do Segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o Segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o Segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
3. A justificativa para tal distinção era o fato de que, nos períodos de afastamento em razão de benefício não acidentário, não estaria o Segurado exposto a qualquer agente nocivo, o que impossibilitaria a contagem de tal período como tempo de serviço especial.
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o Segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao Segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reinvindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032/1995 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213/1991 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição deque trata o art. 22, II da Lei 8.212/1991, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo Segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
7. Note-se que o custeio do tempo de contribuição especial se dá por intermédio de fonte que não é diretamente relacionada à natureza dada ao benefício por incapacidade concedido ao Segurado, mas sim quanto ao grau preponderante de risco existente no local de trabalho deste, o que importa concluir que, estando ou não afastado por benefício movido por acidente do trabalho, o Segurado exposto a condições nocivas à sua saúde promove a ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária destinada ao custeio do benefício de aposentadoria especial.
8. Tais ponderações, permitem concluir que o Decreto 4.882/2003 extrapolou o limite do poder regulamentar administrativo, restringindo ilegalmente a proteção exclusiva dada pela Previdência Social ao trabalhador sujeito a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física.
9. Impõe-se reconhecer que o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento.
(REsp 1759098/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019)”(g.n.)
Somado os períodos insalubres reconhecidos neste feito, de
04/12/1998 a 07/12/2001
e de1º/01/2004 a 28/02/2013,
aqueles reconhecidos especiais na via administrativa (fl.45 dos autos), soma a requerente, até a data do requerimento administrativoem 14/02/2013 (fl.10),
tempo de labor especial de22 anos, 11 meses e 13 dias.
Cuida-se de tempo insuficiente para concessão da aposentadoria especial, cuja exigência pressupõe comprovação de 25 anos, como se verifica da planilha abaixo reproduzida:“
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM
- Data de nascimento
- Sexo
- DER
- Período 1 - 09/02/1988 a 31/05/1990 - 2 anos, 3 meses e 22 dias - 28 carências - Tempo comum - enquadramento administrativo - fl. 45
- Período 2 - 01/06/1990 a 03/12/1998 - 8 anos, 6 meses e 3 dias - 103 carências - Tempo comum - enquadramento administrativo fl. 45
- Período 3 - 04/12/1998 a 07/12/2001 - 3 anos, 0 meses e 4 dias - 36 carências - Tempo comum – Nestle
- Período 4 - 01/01/2004 a 14/02/2013 - 9 anos, 1 meses e 14 dias - 110 carências - Tempo comum – Nestle
* Não há períodos concomitantes.
- Soma até 14/02/2013 (DER): 22 anos, 11 meses, 13 dias, 277 carências
* Para visualizar esta planilha acesse https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/CJKQ7-JNJFT-6X
Por todo o exposto, de rigor a reforma da r. sentença para afastar a condenação do INSS à concessão da aposentadoria especial, mantendo-se o reconhecimento do labor nocivo nos intervalos de
04/12/1998 a 07/12/2001
e de1º/01/2004 a 28/02/2013,
com a condenação da Autarquia Previdenciária à respectiva averbação.Com relação ao pleito formulado pela parte autora, em sede de recurso adesivo, para que deferida a concessão da aposentadoria especial a partir da data em que implementados todos os requisitos, não se mostra possível o seu acolhimento, uma vez que os autos se encontram desprovidos de prova do labor especial para a data posterior a 28/02/2013, data de emissão do PPP colacionado à fls. 13/14 dos autos.
Observada a sucumbência recíproca em relação a verba honorária, uma vez se tratar de r. sentença prolatada na vigência do Diploma Processual Civil de 1973.
Ante o exposto,
DOU PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA e À APELAÇÃO DO INSS
para limitar o reconhecimento da especialidade aos intervalos de04/12/1998 a 07/12/2001
e de1º/01/2004 a 28/02/2013,
condenando o INSS à respectiva averbação.PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA AUTORA
para que intervalo de17/05/2011 a 03/07/2011,
seja computado como especial, nos termos da fundamentação acima.É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. CABIMENTO. REVISÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS.
- Inexistindo, in casu, valor certo a ser considerado, é cabível a remessa oficial, em consonância com a Súmula nº 490 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
- O conjunto probatório dos autos revela o exercício de atividade especial pela exposição da demandante ao agente nocivo ruído, nos intervalos indicados, de forma habitual e permanente, devendo ser reconhecida a especialidade.
- Por fim, quanto à data de emissão do PPP/laudo, como termo final para o reconhecimento da atividade especial, veja-se: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0016346-21.2016.4.03.9999/SP - TRF3 - Nona Turma - Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos - v.u. - Data do julgamento: 15/08/2016.
- Reconhecido como especial o intervalo no qual a autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, nos termos do que restou decido no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia de nº REsp 1759098/RS, (Tema nº 998)- acórdão publicado no DJe de 01/08/2019, oportunidade em que fixou-se a tese de que “o segurado em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.”
- Tendo a parte autora laborado por tempo inferior a 25 anos sob condições especiais, não há direito à percepção de aposentadoria especial, o que torna de rigor a reforma da r. sentença.
- Parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS e parcial provimento ao recurso adesivo da parte autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à remessa necessária, parcial provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
