
| D.E. Publicado em 01/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária e DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0009312-07.2010.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelações interpostas tanto pela parte autora (fls. 301/307) como pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (fls. 309/329) em face da r. sentença (fls. 291/298), submetida ao reexame necessário, que julgou parcialmente procedente pedido para reconhecer a especialidade do labor desempenhado entre 26/09/1983 e 08/12/1998, bem como para assentar o exercício de atividade rural levada a efeito entre 01/01/1970 e 31/12/1970 e entre 01/01/1974 e 31/01/1975, determinando que a autarquia conceda aposentadoria por tempo de serviço à parte autora, desde a data do requerimento formulado na esfera administrativa, devendo arcar com as parcelas em atraso acrescidas de juros e de correção monetária, fixando verba honorária em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) - a antecipação dos efeitos da tutela foi mantida.
Pugna a parte autora pela majoração dos honorários advocatícios. Por sua vez, requer o ente autárquico, preliminarmente, a cassação da tutela antecipada e, no mérito, aduz que a parte autora não teria comprovado nem o labor especial nem o labor rural - subsidiariamente, questiona os critérios de juros.
Subiram os autos com contrarrazões.
Instada a se manifestar sobre a ocorrência de decadência (fls. 344), a parte autora quedou-se inerte (fls. 347).
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de demanda na qual a parte autora pugna pelo restabelecimento de sua aposentadoria (deferida em 08/02/2000 retroativamente a 28/06/1999 - fls. 37, 76, 109 e 111/113), que teria sido cessada por ato ilegal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em janeiro/2010 (fls. 185), uma vez que demonstrou, quando do requerimento administrativo, o preenchimento de todos os requisitos necessários à concessão da prestação. Sustenta que a autarquia previdenciária, ao arrepio da legislação de regência, teria suspenso o pagamento mensal em decorrência da não comprovação do exercício de atividade sob condições especiais (período de 26/09/1983 a 08/12/1998) e do exercício de atividade campesina (período de 01/01/1971 a 31/12/1973), condutas que não se sustentam ante o conjunto probatório carreado tanto no procedimento administrativo de concessão como nesta demanda. Ademais, requer neste feito a revisão do ato concessório do benefício com o objetivo de que fosse reconhecido o desempenhado de atividade rural entre 01/01/1970 e 31/12/1970 e entre 01/01/1974 e 28/02/1975.
Uma vez delimitada a demanda, cumpre salientar que a alegação referente à necessidade da revogação da tutela antecipada não merece prosperar. Com efeito, na hipótese de ação que tenha por escopo obrigação de fazer, se procedente o pleito, é cabível a outorga de tutela específica que assegure o resultado concreto equiparável ao adimplemento (arts. 461, do Código de Processo Civil de 1973, e 497, do Código de Processo Civil). De outro ângulo, para a eficiente prestação da tutela jurisdicional, a aplicação dos dispositivos legais em tela independe de requerimento, diante de situações urgentes. Não há máculas, portanto, na antecipação de tutela concedida pela r. sentença.
DO REEXAME NECESSÁRIO
O Código de Processo Civil afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I), cabendo considerar que a legislação processual civil tem aplicação imediata (art. 1.046).
Todavia, cumpre salientar que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.144.079/SP (representativo da controvérsia), apreciando a incidência das causas de exclusão da remessa oficial vindas por força da Lei nº 10.352/01 em face de sentenças proferidas anteriormente a tal diploma normativo, fixou entendimento no sentido de que a adoção do princípio tempus regit actum impõe o respeito aos atos praticados sob o pálio da lei revogada, bem como aos efeitos desses atos, impossibilitando a retroação da lei nova, razão pela qual a lei em vigor à data da sentença é a que regula os recursos cabíveis contra o ato decisório e, portanto, a sua submissão ao duplo grau obrigatório de jurisdição - nesse sentido:
Assim, tendo como base o entendimento acima exposto e prestigiando a força vinculante dos precedentes emanados como representativo da controvérsia, entendo deva ser submetido o provimento judicial guerreado ao reexame necessário (ainda que a condenação seja certamente inferior a 1.000 - mil - salários mínimos), tendo como base a legislação vigente ao tempo em que proferida a r. sentença, bem como o entendimento contido na Súmula 490, do C. Superior Tribunal de Justiça: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas".
DA DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO DO BENEFÍCIO
Uma das pretensões formuladas pela parte autora nesta demanda consiste na revisão do ato de concessão de sua aposentadoria mediante o reconhecimento do desempenho de atividade rural entre 01/01/1970 e 31/12/1970 e entre 01/01/1974 e 28/02/1975. Entretanto, no caso dos autos, entendo deva ser reconhecida a ocorrência de decadência em relação a tal pedido.
Com efeito, a instituição do prazo decadencial para o ato de revisão de concessão de benefício apareceu com a 9ª reedição da Medida Provisória nº 1.523 (de 27 de junho de 1997), a seguir convertida na Lei nº 9.528 (de 10 de dezembro de 1997). Posteriormente, a Lei nº 9.711 (de 20 de novembro de 1998) deu nova redação ao caput do art. 103 da Lei nº 8.213/91, reduzindo o prazo decadencial inaugural de 10 (dez) anos para 05 (cinco) anos (resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.663-14, de 24 de setembro de 1998). Com a edição da Medida Provisória nº 138, de 19 de novembro de 2003 (convertida na Lei nº 10.839/04), esse prazo acabou sendo majorado mais uma vez para 10 (dez) anos. A Lei nº 9.528/97 deu a seguinte redação ao art. 103, da Lei nº 8.213/91:
Especificamente, no caso dos autos, deve ser reconhecida a ocorrência de prazo decadencial, pois a aposentadoria a ser revisada foi deferida em 08/02/2000 (fls. 109), de forma retroativa a 28/06/1999 (data de entrada do requerimento administrativo - fls. 37, 76 e 111/113) ao passo que esta ação foi ajuizada somente em 30/07/2010 (fls. 02), ou seja, após o transcurso de mais de 10 (dez) anos contados do deferimento da prestação (evento ocorrido em 08/02/2000 - fls. 109), motivo pelo qual prejudicado o pleito de reconhecimento do desempenho de atividade rural entre 01/01/1970 e 31/12/1970 e entre 01/01/1974 e 28/02/1975.
DA POSSIBILIDADE DE O ENTE AUTÁRQUICO REVER OS ATOS ADMINISTRATIVOS DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO - APLICAÇÃO DA SÚMULA 473/STF - RESPEITO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
Indo adiante, com relação ao pedido de restabelecimento do benefício previdenciário cassado, cumpre salientar a possibilidade de a administração pública rever seus atos a fim de apurar e de coibir a prática de condutas ilegais, das quais não há que se falar em direito adquirido, desde que respeitado o princípio constitucional do devido processo legal (consubstanciado em manifestações que assegurem a ampla defesa e o contraditório), sempre assegurada a apreciação judicial da contenda - nesse sentido, é o entendimento do C. Supremo Tribunal Federal, conforme é possível ser aferido de sua Súmula 473 e de sua jurisprudência:
Nesse contexto, importante ser destacado que o processo de revisão levado a efeito pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS respeitou os ditames do devido processo legal previsto no Texto Constitucional (com seus corolários da ampla defesa e do contraditório), tendo em vista que foi assegurada à parte autora a possibilidade de apresentação de defesa e de recurso da decisão originária que determinou a suspensão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço. Nota-se, compulsando os autos, que, em 02/12/2009, a autarquia previdenciária emitiu carta à parte autora elencando as irregularidades encontradas em sua aposentadoria, possibilitando a apresentação de defesa escrita no prazo de 10 (dez) dias (fls. 164), faculdade desempenhada pela parte autora (fls. 165/166). Posteriormente, há nos autos nova missiva emitida pelo ente público, agora em 19/01/2010, refutando os argumentos apresentados em sede de defesa, oportunidade em que comunicou à parte autora a suspensão de seu benefício e permitiu a apresentação de recurso no prazo de 30 (trinta) dias (fls. 187). Saliente-se, por oportuno, que a parte autora protocolizou recurso conforme lhe garante a legislação aplicável ao processo administrativo federal (fls. 188/191).
Por todo o exposto, verifica-se que não há vícios processuais a ensejar a anulação do procedimento de revisão / suspensão executado pela autarquia previdenciária (que culminou na cessação da aposentadoria por tempo de serviço da parte autora), de modo que se mostra possível adentrar a análise efetiva das teses de mérito que ensejaram a suspensão do benefício.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
DO TEMPO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
O tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum independente da época trabalhada (art. 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99). Desta forma, não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/80, seja em períodos posteriores à Lei nº 9.711/98, sendo certo que o art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, foi elevado à posição de Lei Complementar pelo art. 15, da Emenda Constitucional nº 20/98, de modo que somente por Lei Complementar poderá ser alterado.
Importante ser consignado que, na conversão do tempo especial em comum, aplica-se a legislação vigente à época da prestação laboral; na ausência desta e na potencial agressão à saúde do trabalhador, deve ser dado o mesmo tratamento para aquele que hoje tem direito à concessão da aposentadoria (STF, RE 392.559/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 07.02.06).
Cumpre salientar que a conversão do tempo de trabalho em atividades especiais era concedida com base na categoria profissional classificada de acordo com os anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, sendo que, a partir da Lei nº 9.032/95, faz-se necessário comprovar o exercício da atividade prejudicial à saúde por meios de formulários ou de laudos. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo (portanto, não exaustivo), motivo pelo qual a ausência do enquadramento da atividade tida por especial não é óbice à concessão de aposentadoria especial, consoante o entendimento da Súmula 198, do extinto TFR: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
Portanto, o reconhecimento de outras atividades insalubres, penosas e perigosas é admissível, caso exercidas sob ditas condições especiais; porém, tais especialidades não se presumem (como ocorre com aquelas categorias arroladas na legislação pertinente).
A partir de 10 de dezembro de 1997, com a edição da Lei nº 9.528, passou-se a ser necessária a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade insalubre, documento este que deve demonstrar efetiva exposição do segurado ao agente nocivo, mediante formulário estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base em laudo técnico do ambiente de trabalho, expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, com exceção de ruído (que sempre exigiu a apresentação de referido laudo para caracterizá-lo como agente agressor). Registro, por oportuno, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico em comento, sendo, assim, documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Destaque-se que a extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data de elaboração de tais documentos (tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho somente melhoram com a evolução tecnológica).
Saliente-se que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 têm aplicação simultânea até 05 de março de 1997, de modo que, verificada divergência entre tais diplomas, deve prevalecer a regra mais benéfica (como, por exemplo, ocorre na constatação de insalubridade em razão de ruído com intensidade igual ou superior a 80 dB, que atrai a incidência do Decreto nº 53.831/64).
Especificamente com relação ao agente agressivo ruído, importante ser dito que até 05 de março de 1997 entendia-se insalubre a atividade desempenhada exposta a 80 dB ou mais. Posteriormente, o Decreto nº 2.172/97 revogou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, passando a considerar insalubre o labor desempenhado com nível de ruído superior a 90 dB. Mais tarde, em 18 de novembro de 2003, o Decreto nº 4.882/03 reduziu tal patamar para 85 dB. Ressalte-se que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.398.260/PR (representativo da controvérsia - Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe de 05/12/2014), firmou entendimento no sentido da impossibilidade de retroação do limite de 85 dB para alcançar fatos praticados sob a égide do Decreto nº 2.172/97.
O E. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo em RE nº 664.335/RS (com repercussão geral da questão constitucional reconhecida), pacificou o entendimento de que, havendo prova da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI (vale dizer, efetiva capacidade de neutralizar a nocividade do labor), não há que se falar em respaldo constitucional à concessão de aposentadoria especial. Todavia, em caso de dúvida em relação à neutralização da nocividade, assentou que a Administração e o Poder Judiciário devem seguir a premissa do reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial, pois o uso do EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submeteu - destaque-se que se enfatizou, em tal julgamento, que a mera informação da empresa sobre a eficácia do EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço para fins de aposentadoria. Ainda em indicado precedente, analisando a questão sob a ótica do agente agressivo ruído, o Supremo estabeleceu que não se pode garantir a eficácia real do EPI em eliminar os efeitos agressivos ao trabalhador, destacando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, não abrangendo apenas perdas auditivas, pelo que é impassível de controle, seja pelas empresas, seja pelos trabalhadores.
Por fim, no tocante à alegada necessidade de prévia fonte de custeio, em se tratando de empregado, sua filiação ao sistema previdenciário é obrigatória, bem como o recolhimento das contribuições respectivas, cabendo ao empregador vertê-las, nos termos do art. 30, I, da Lei nº 8.212/91. Dentro desse contexto, o trabalhador não pode ser penalizado se tais recolhimentos não foram efetuados corretamente, porquanto a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
DO TEMPO EXERCIDO EM ATIVIDADE RURAL
O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991 é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições correspondentes, todavia, não se prestando para fins de carência (art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91).
A comprovação de tal tempo, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91, deve ser levada a efeito por meio de início de prova material, não sendo admitida, porém, prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou de caso fortuito, a teor da Súm. 149/STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário". Por outro lado, havendo início de prova material, corroborada pelas testemunhas colhidas em juízo, é possível o reconhecimento de tempo anterior ao documento mais remoto (desde que o labor seja confirmado pela prova oral), de acordo com o que restou assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, representativo da controvérsia.
Importante ser dito que o reconhecimento de labor na faina rural não demanda prova do recolhimento das respectivas contribuições sociais, conforme jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
Cabe destacar, ainda, que o fato da prova evidenciar trabalho do menor em nada o prejudica na contagem desse tempo. Na verdade, de todo razoável o cômputo de tal período, pois a autorização constitucional condicionada ao vínculo empregatício (art. 165, X, da Emenda Constitucional nº 1/69) se justificava no intuito de proteção do menor, o que está implícito no dever de educar dos pais nas famílias em que predomina a economia de subsistência. De igual modo, se a atual Constituição veda o trabalho aos menores de 14 (catorze) anos, o faz certamente em benefício deles; logo, em tais condições, descabe prejudicá-los deixando de computar o período de atividade rurícola desde a idade de doze (12) anos. Sobre o tema, o C. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico que o exercício da atividade rural do menor deve ser reconhecido para fins previdenciários, já que as normas proibitivas do trabalho são editadas para protegê-lo - nesse sentido:
Por fim, quanto ao tempo de serviço rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91, na qualidade de pequeno produtor rural em regime de economia familiar, observa-se a regra do art. 39, de referido diploma:
Desta forma, em relação ao reconhecimento de trabalho rural posterior a novembro de 1991, faz-se necessária a prova do recolhimento das contribuições previdenciárias relativas ao período (art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99).
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
Da atividade especial: Pugna a parte autora pelo reconhecimento da especialidade do labor desempenhado entre 26/09/1983 e 08/12/1998. Com efeito, compulsando os autos, verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 54, bem como do laudo de fls. 55, analisados em cotejo com as informações prestadas às fls. 19, que a parte autora laborava submetida ao agente agressivo ruído em intensidade de 91 dB, limite este superior ao tolerado pela legislação de regência aplicável à época, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento da especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
Do labor rural: Pugna a parte autora pelo reconhecimento de atividade levada a efeito na faina rural no interregno de 01/01/1971 a 31/12/1973, originariamente tido como incontroverso pelo ente autárquico quando do deferimento da aposentadoria debatida neste feito (fls. 79 e 104), posteriormente homologado apenas em relação ao ano de 1973 quando do procedimento de revisão administrativa (fls. 182). Com efeito, reconheço, como início de prova material, a declaração emitida pelo sindicato (fls. 57), devidamente homologada para os anos de 1971 a 1973, e a certidão de casamento (fls. 58), de 1973, ambas a indicar a profissão da parte autora como sendo a de lavrador. Tal início de prova é corroborado pelos testemunhos colhidos em juízo (fls. 287/289), que foram coesos e unânimes em sustentar o labor rural em todo o período controvertido. Destaque-se a possibilidade de se reconhecer a faina rural antes da data do documento mais remoto por força do que restou decidido pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP (representativo da controvérsia). Nesse contexto, reconheço como efetivamente laborado no campo o lapso de 01/01/1971 a 31/12/1973.
DO CASO CONCRETO
Somados os períodos incontroversos (fls. 104) com aqueles ora reconhecidos (seja de tempo especial, seja de tempo rural), perfazia a parte autora, ao tempo do requerimento administrativo (28/06/1999 - fls. 37, 76, 109 e 111/113), 32 anos, 06 meses e 20 dias de tempo de serviço (antes do advento da Emenda Constitucional nº 20/98), conforme planilha que ora se determina a juntada, suficiente para conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, na forma proporcional, motivo pelo qual se mostra indevida a suspensão levada a efeito no âmbito administrativo.
Nesse diapasão, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS deve ser condenado a restabelecer a aposentadoria descrita nos autos, desde a data de sua indevida cessação (janeiro/2010 - fls. 185), devendo, ainda, arcar com as parcelas acumuladas e não adimplidas desde a data da entrada do requerimento na esfera administrativa (28/06/1999 - fls. 37, 76, 109 e 111/113) até o momento em que houve o deferimento da prestação (08/02/2000 - fls. 109). Afastada a ocorrência de prescrição quinquenal uma vez que não transcorreram mais de 05 (cinco) anos entre a data de cessação da prestação (janeiro/2010 - fls. 185) e o momento de propositura desta ação (30/07/2010 - fls. 02).
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei n.º 9.289, de 04.07.1996, do art. 24-A da Lei n.º 9.028, de 12.04.1995, com a redação dada pelo art. 3º da Medida Provisória n.º 2.180- 35 /2001, e do art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620, de 05.01.1993.
Sucumbente, deve o INSS arcar com os honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento), calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, consoante os arts. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, e 85, § 3º, I, do Código de Processo Civil, observada a Súm. 111/STJ.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária (para reconhecer a ocorrência de decadência do pleito revisional e para aclarar os critérios de juros e de correção monetária) e por DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora (para majorar a verba honorária), nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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