
| D.E. Publicado em 23/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do reexame necessário, reconhecer a caracterização de julgamento ultra petita, limitando a sentença recorrida aos limites do pedido, afastar as preliminares apresentadas e dar parcial provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002769-52.2012.4.03.6139/SP
RELATÓRIO
Mario Francisco dos Santos ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando o reconhecimento de atividade rural no período de 02/1973 a 01/1989, sua somatória com o tempo de trabalho na atividade urbana e a consequente concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição integral.
A sentença, fls. 69/74, julgou procedente o pedido, extinguindo o processo com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, reconhecendo a atividade rural da parte autora no período de 31/12/1973 a 02/02/1989, para condenar o INSS à implantação e pagamento da aposentadoria por tempo de contribuição integral em favor da parte autora, nos termos do artigo 52 da Lei 8.213/91, incluindo-se gratificação natalina, com início na data da citação (10/04/2013 - fl. 19), calculado pelo coeficiente correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício (art. 53, II), a ser apurado nos termos do artigo 29 da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99. Determinou que as prestações vencidas entre a data de início do benefício e a data de sua implantação deverão ser corrigidas monetariamente na forma prevista no novo Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução 267/2013 do Conselho da Justiça Federal, sendo acrescidas de juros, nos termos dos artigos 406 do CCB e 161, 1º, do CTN, a contar da citação (STJ, Súmula 204), em vista de que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn 4.357/DF, Relator Ministro Ayres Brito, declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 5º da Lei 11.960 /2009, que modificou a redação do art. 1º-F da Lei 9.494/1997. Condenou o Instituto Nacional do Seguro Social ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em percentual sobre o valor da condenação, a ser definido após a liquidação, nos termos do artigo 85, 4º, II do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça, em sua redação atual. Sem condenação nas custas, em face de o réu ser isento do seu pagamento. Foi determinado o reexame necessário.
Em sua apelação, fls. 77/92, o INSS alega:
- preliminarmente, a ausência de requerimento administrativo para o recebimento do benefício, o que caracteriza a ausência de interesse processual, bem como a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precedeu o ajuizamento da ação, nos termos do artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91;
- que a atividade rural poderá ser reconhecida a partir dos 14 anos de idade;
- a inexistência de comprovação do tempo de serviço rural da parte autora, diante da ausência de início de prova material e a impossibilidade de prova exclusivamente testemunhal;
- a necessidade de indenização para o cômputo do tempo de atividade rural;
- que não foram preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição;
- que os honorários não devem ser fixados em percentual superior a 10% das parcelas vencidas, observada a Súmula 111 do STJ;
- a aplicação dos juros e correção monetária nos termos da Lei nº 11.960/2009.
Com contrarrazões da parte autora.
É o relatório.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002769-52.2012.4.03.6139/SP
VOTO
DO CONHECIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO
O novo Código de Processo Civil elevou o valor de alçada para a remessa "ex officio", de 60 (sessenta) salários mínimos, para 1.000 (mil) salários-mínimos, "in verbis":
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2º Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público"
Considerando que o reexame necessário não se trata de recurso, mas de simples condição de eficácia da sentença, as regras processuais de direito intertemporal a ele não se aplicam, de sorte que a norma supracitada, estabelecendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1000 (um mil) salários mínimos, tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, ainda que para cá remetidos na vigência do revogado CPC.
Nesse sentido, a lição de Nelson Nery Jr.:
"A remessa necessária não é recurso, mas condição de eficácia da sentença. Sendo figura processual distinta da do recurso, a ela não se aplicavam as regras do direito intertemporal processual vigente para os eles: a) cabimento do recurso rege-se pela lei vigente à época da prolação da decisão; b) o procedimento do recurso rege-se pela lei vigente à época em que foi efetivamente interposto o recurso - Nery. Recursos, n. 37, pp. 492/500. Assim, a L 10352/01, que modificou as causas em que devem ser obrigatoriamente submetidas ao reexame do tribunal, após a sua entrada em vigor, teve aplicação imediata aos processos em curso. Consequentemente, havendo processo pendente no tribunal, enviado mediante a remessa necessária do regime antigo, o tribunal não poderá conhecer da remessa se a causa do envio não mais existe no rol do CPC 475. É o caso por exemplo, da sentença que anulou o casamento, que era submetida antigamente ao reexame necessário (ex- CPC 475 I), circunstância que foi abolida pela nova redação do CPC 475, dada pela L 10352/01. Logo, se os autos estão no tribunal apenas para o reexame de sentença que anulou o casamento, o tribunal não pode conhecer da remessa ." Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pág 744.
Dessa forma, tendo em vista que o valor de alçada no presente feito não supera 1.000 (um mil) salários mínimos, não conheço do reexame necessário.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO OU DE CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado do Regime Geral de Previdência Social é assegurada pelo art. 201, § 7º, I, da Constituição Federal, nos seguintes termos:
"§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;"
A redação atual do dispositivo foi fixada pela Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998. Até então, o texto constitucional falava na concessão de aposentadoria "por tempo de serviço", e possibilitava sua concessão também na forma proporcional, ao segurado do sexo masculino que contasse com 30 anos de tempo de serviço ou à segurada do sexo feminino que contasse com 25 anos de tempo de serviço, sem exigência de idade mínima.
A regra de transição do art. 9º da EC 20/98 garante aos segurados filiados ao regime geral de previdência social antes da sua publicação o direito à obtenção do benefício proporcional se atendidos os requisitos ali fixados.
Nesse sentido, a Lei de Benefícios da Previdência Social prevê que a concessão da aposentadoria por tempo de serviço está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei 8.213/91, "verbis":
"Artigo 52. A aposentadoria por tempo de serviço, cumprida a carência exigida nesta Lei, será devida ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos, se do sexo masculino."
"Artigo 53. A aposentadoria por tempo de serviço, observado o disposto na Seção III deste Capítulo, especialmente no artigo 33, consistirá numa renda mensal de:
I - para mulher: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 25 (vinte e cinco) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço:
II - para homem: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício aos 35 (trinta e cinco) anos de serviço."
DA APOSENTADORIA INTEGRAL
Concede-se a aposentadoria integral (i) pelas regras anteriores à EC nº 20/98 se comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, ou 30 (trinta) anos, se mulher, antes da vigência da Emenda, ou (ii) pelas regras permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se preenchido o requisito temporal após a mencionada alteração constitucional (Lei nº 8.213/91, art. 53, I e II).
Com efeito, forçoso ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do § 7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição de 35 anos, para homem e 30 anos, para mulher à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, § 7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Nesse sentido, aliás, o próprio INSS reconheceu não serem exigíveis, para a aposentação na sua forma integral, quer a idade mínima, quer o cumprimento do tempo adicional de 20%, aos segurados já inscritos na Previdência Social em 16/12/1998. É o que se comprova dos termos postos pelo art. 109, I, da Instrução Normativa INSS/DC nº 118, de 14.04.2005:
"Art. 109. Os segurados inscritos no RGPS até o dia 16 de dezembro de 1998, inclusive os oriundos de outro Regime de Previdência Social, desde que cumprida a carência exigida, atentando-se para o contido no § 2º, do art. 38 desta IN, terão direito à aposentadoria por tempo de contribuição nas seguintes situações:
I - aposentadoria por tempo de contribuição, conforme o caso, com renda mensal no valor de cem por cento do salário-de-benefício, desde que cumpridos:
a) 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem;
b) 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher".
DA CARÊNCIA EM RELAÇÃO À APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Além dos requisitos explicitados acima, o período de carência é também requisito legal para obtenção do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, dispondo o artigo 25 da Lei 8.213/91, "in verbis":
"Artigo 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
[...] II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições mensais.".
Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, aplica-se a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que se relaciona um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II, de acordo com o ano de implemento dos demais requisitos (tempo de serviço ou idade).
DA COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO
O art. 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social.
De acordo com o art. 29-A do mesmo dispositivo legal, o meio ordinário de prova do tempo de contribuição são as informações constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS sobre os vínculos e as remunerações do segurado.
Caso o segurado entenda estarem incorretas ou incompletas as informações constantes do CNIS, cabe-lhe o ônus de comprovar as suas alegações. Para tanto, nos termos do §3º do art. 55 da Lei 8.213/91, deve apresentar início de prova material, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal.
DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL E SUA COMPROVAÇÃO PARA FINS DE CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Para fins de concessão da presente modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição, é necessário que o segurado comprove períodos de atividade rural, os quais deverão ser somados aos períodos urbanos comprovados.
Preliminarmente, é necessário esclarecer que após a edição da lei nº 8.213/91, o segurado deve comprovar os efetivos recolhimentos previdenciários.
Ademais, é importante destacar os critérios de valoração das provas, já sedimentados pela jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, "in verbis":
"[...] Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95."
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
DA CARÊNCIA EM RELAÇÃO AO PERÍODO RURAL
Finalmente, consigno também que eventuais períodos rurais reconhecidos sem contribuições anteriores à 24/07/1991 não são computados como período de carência, nos termos do artigo 55, §2º da Lei nº 8.213/91, "in verbis":
"§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento."
Portanto, para efeito de carência, serão computados tão somente os períodos rurais posteriores ao advento da Lei nº 8.213/91.
DO CASO DOS AUTOS
Inicialmente, não merece prosperar a preliminar quanto à exigibilidade de prévio requerimento do benefício para a caracterização do interesse processual da recorrida.
Em 03.09.2014, o Supremo Tribunal Federal decidiu, ao julgar o Recurso Extraordinário 631.240 que a exigência de prévio requerimento administrativo não viola o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.
Naquele julgamento, ficou decidido o seguinte quanto às ações ajuizadas anteriormente a 03.09.2014:
"6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais."
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 18/10/2012 e houve contestação de mérito, restando configurado, pois, o interesse de agir da parte autora.
A seguir, passo à análise do recurso do INSS.
DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL
Tendo em vista que a presente ação foi ajuizada em 18/10/2012, não há que se falar na ocorrência de prescrição quinquenal prevista no art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, uma vez que o termo inicial do benefício foi determinado a partir da data da citação (10/04/2013 - fl. 19).
DO PERÍODO RURAL
No caso em questão, há de se considerar inicialmente que permanecem controversos os períodos rurais entre 31/12/1973 a 02/02/1989.
O recorrente juntou os seguintes documentos aptos para a caracterização de início de prova material:
- sua certidão de casamento, realizado em 28/07/1979, qualificando-o como lavrador (fl. 10);
- certificado de dispensa de incorporação ao serviço militar, emitido em 10/04/1973, qualificando-o como lavrador (fl. 11).
A audiência para a oitiva das testemunhas ocorreu em 09/10/2014. As testemunhas ouvidas em juízo afirmaram que a parte autora exerceu atividade rural desde criança até começar a trabalhar com registro na CTPS. A testemunha Nelson Rodrigues de Oliveira disse que conhece o autor desde criança, afirmando que ele trabalhou de criança até 1989 na lavoura. Disse que o recorrido para os senhores Enoque, Darci Prestes dos Santos e Valdemar Prestes dos Santos e também para outras pessoas cujos nomes não se recorda. Afirma que o autor trabalhava na lavoura de feijão, milho, tomate e arroz. Asseverou, ainda, ter trabalhado na roça com o autor. Disse que o autor parou de trabalhar na lavoura com quase 30 anos. Em seu depoimento, Dorico Werneque do Amaral relatou conhecer o autor desde a infância. Afirmou que o autor trabalhava somente como boia-fria, na região de Palmitalzinho, nas plantações de feijão, milho, arroz e tomate. Asseverou, ainda, que o autor deixou de trabalhar na lavoura por volta de seus 30 anos.
Destaque-se que o reconhecimento de atividade rural deve ser feito a partir dos 12 (doze) anos de idade, conforme reiterada jurisprudência do STJ.
Como a r. sentença fixou o termo inicial do benefício em 31/12/1973 e não houve recurso da parte autora para a sua alteração para 02/1973 - como requerido na inicial -, o mesmo ficará mantido a fim de evitar a caracterização de reformatio in pejus.
O termo final do benefício deverá ser fixado em 31/01/1989 - como pedido na inicial -, e não em 02/02/1989, como constou da r. sentença, implicando em julgamento ultra petita, devendo, pois, a sentença ser reduzida aos limites do pedido.
Destarte, os depoimentos corroboram a prova documental apresentada aos autos quanto à atividade rural da autora, possibilitando a conclusão pelo efetivo exercício de atividade rural no seguinte período: 31/12/1973 a 31/01/1989.
DO PERÍODO COM REGISTRO NA CTPS
Observo que o autor trouxe aos autos cópias de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (fls. 12/13), documentos dos quais constam anotações dos períodos em que a parte autora trabalhou com registro profissional.
Observe-se que tais anotações constituem prova do exercício de atividade urbana comum pelo autor, na condição de empregada, ainda que tais vínculos não constem do seu Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS. Isto porque a CTPS goza de presunção relativa de veracidade, a qual somente poderia ser afastada por indícios fundamentados de fraude ou irregularidades no documento.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO E TRABALHISTA. CARTEIRA PROFISSIONAL. ANOTAÇÕES FEITAS POR ORDEM JUDICIAL. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE.ENUNCIADO N.º 12 DO TST E SÚMULA N.º 225 DO STF.
1. As anotações feita na Carteira de Trabalho e Previdência Social gozam de presunção juris tantum, consoante preconiza o Enunciado n.º 12 do Tribunal Superior do Trabalho e da Súmula n.º 225 do Supremo Tribunal Federal.
2. O fato de o empregador ter descumprido a sua obrigação de proceder ao registro do empregado no prazo devido, tendo o feito tão-somente extemporaneamente e por força de ordem judicial, não tem o condão de afastar a veracidade da inscrição. Para ocorrência dessa hipótese, seria imperioso a demonstração de que houve conluio entre as partes no processo trabalhista, no intuito de forjar a existência da relação de emprego.
3. Não há falar em prejuízo para a autarquia, uma vez que, a teor do art. 114, § 3º, da Constituição Federal, a própria Justiça do Trabalho executa ex officio as contribuições previdenciárias relativas ao período reconhecido na sentença por ela prolatada.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido." (REsp 498.305/RN, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 02/09/2003, DJ 06/10/2003, p. 307)
No mesmo sentido, a Súmula 225 do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que o valor probatório da CTPS não é absoluto, podendo ser elidido por provas contrárias:
"Não é absoluto o valor probatório das anotações da carteira profissional".
E, também, a jurisprudência desta Oitava Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. IDADE. CARÊNCIA.
[...]
III- Impende salientar que a Carteira de Trabalho e Previdência Social constitui prova plena do tempo de serviço referente aos vínculos empregatícios ali registrados, porquanto gozam de presunção iuris tantum de veracidade, elidida somente por suspeitas objetivas e fundadas acerca das anotações nela exaradas.
IV- O fato de alguns períodos não constarem do Cadastro de Informações Sociais - CNIS não pode impedir o reconhecimento do trabalho prestado pelo segurado como tempo de serviço para fins previdenciários, especialmente quando o lapso vem regularmente registrado em sua CTPS e o INSS não demonstrou que o registro se deu mediante fraude.
V- No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, cumpre ressaltar que tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado pela inércia alheia."
[...]
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2286671 - 0043018-32.2017.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA, julgado em 05/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/03/2018 )
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. VALIDADE DE ANOTAÇÕES EM CTPS. TRABALHO RURAL COM ANOTAÇÕES EM CTPS. CORREÇÃO MONETÁRIA.
[...]
- É pacífico na doutrina e jurisprudência que as anotações na CTPS possuem presunção iuris tantum, o que significa admitir prova em contrário.
- Na Justiça Trabalhista, o Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho fixou entendimento que as anotações feitas na CTPS são relativas, podendo, portanto, ser invalidadas por qualquer outra espécie de prova admitida no ordenamento jurídico (perícia, prova testemunhal, etc.). Além da Súmula nº 225 do STF sedimentando a matéria.
- As anotações na CTPS do requerente não apresentam irregularidades que justifiquem sua não aceitação pela Autarquia.
[...]"
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2286794 - 0043137-90.2017.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, julgado em 05/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/03/2018 )
No caso dos autos, as anotações na CTPS do autor não apresentam irregularidades nem o INSS apresentou qualquer argumento apto a afastar sua presunção de veracidade. Dessa forma, o período em análise deve ser computado no cálculo do tempo de contribuição do autor.
DO DIREITO AO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Tempo de serviço: reconhecida a atividade rural no período entre 31/12/1973 a 31/01/1989, somado ao período urbano, totaliza a parte autora mais de 35 anos de tempo de contribuição até a data do ajuizamento da ação (vide tabelas de tempo de atividade e CNIS anexos).
Carência: Observo que a parte autora também cumpriu o período de carência, nos termos do artigo 25, II, da Lei nº 8.213/91, porquanto comprovou ter vertido mais de 180 contribuições à Seguridade Social.
Quanto ao termo inicial do benefício, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que este deve ser a data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a data da citação:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA. TERMO INICIAL.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, na ausência de prévio requerimento administrativo, o benefício de aposentadoria por tempo de serviço é devido a contar da citação da autarquia previdenciária. Precedentes.
2. Agravo interno desprovido".
(AgInt no AREsp 916.250/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/09/2017, DJe 11/12/2017)
O termo inicial do benefício será a data da citação, haja vista inexistir prévio requerimento administrativo.
Com relação à correção monetária, cabe pontuar que o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, foi declarado inconstitucional por arrastamento pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nos 4.357 e 4.425, mas apenas em relação à incidência da TR no período compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo pagamento.
Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação, que se realiza após a conclusão da fase de conhecimento.
Vislumbrando a necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E. Corte de Justiça, a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região (Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005) é expressa ao determinar que, no tocante aos consectários da condenação, devem ser observados os critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
A respeito do tema, insta considerar que, no dia 20/09/2017, no julgamento do RE nº 870.947, com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da utilização da TR, também para a atualização da condenação.
No mesmo julgamento, em relação aos juros de mora incidentes sobre débitos de natureza não tributária, como é o caso da disputa com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em causa, o STF manteve a aplicação do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/2009.
"In casu", como se trata da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que a matéria não está pacificada, há de se concluir que devem ser aplicados os índices previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado, em respeito ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005 (AC 00056853020144036126, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016), observado o entendimento firmado pelo STF no RE 870.947.
Condeno o INSS no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a data da prolação da sentença, que julgou procedente o pedido, nos termos do enunciado da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
O STJ entende que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal (art. 8º, da Lei nº 8.620/1993). Contudo, a Colenda 5ª Turma desta Corte tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do artigo 14, § 4º, da Lei 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.
Na hipótese, a parte autora é beneficiária da justiça gratuita, não sendo devido, desse modo, o reembolso das custas processuais pelo INSS.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, NÃO CONHEÇO DA REMESSA OFICIAL, RECONHEÇO O JULGAMENTO ULTRA PETITA, adequando-se a decisão aos limites do pedido para fixar o termo final do labor campesino em 31/01/1989. AFASTO AS PRELIMINARES de ausência de prévio requerimento administrativo e de prescrição quinquenal, e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS, para reconhecer a atividade rural no período de 31/12/1973 a 31/01/1989, salvo para fins de carência, fixar os honorários em 10% sobre o valor da condenação até a data da sentença, observada a Súmula nº 111 do STJ, bem como os critérios de aplicação dos juros e correção monetária, nos termos da fundamentação supra.
Concedo a tutela antecipada para determinar a imediata implantação do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Expeça-se o competente ofício ao INSS, com urgência, para que implante o benefício no prazo de 30 dias, sob pena de desobediência.
É o voto.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
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