
| D.E. Publicado em 03/04/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial e DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | FAUSTO MARTIN DE SANCTIS:66 |
| Nº de Série do Certificado: | 62312D6500C7A72E |
| Data e Hora: | 21/03/2017 11:47:22 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006155-98.2012.4.03.6104/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (fls. 330/335) em face da r. sentença (fls. 308/311), submetida ao reexame necessário, que julgou procedente pedido pra determinar que o ente público se abstenha de cobrar da parte autora os valores recebidos por ela em razão do benefício cessado, bem como implante nova aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data de ajuizamento desta ação, devendo arcar com as parcelas em atraso acrescidas de juros e de correção monetária, fixando verba honorária em 10% do valor da condenação (nos termos da Súm. 111/STJ) - os efeitos da tutela deferidos no início desta demanda foram confirmados pelo r. provimento judicial (para o fim de suspender cobrança do importe indevidamente recebido pela parte autora), tendo seu âmbito sido ampliado para também determinar a imediata concessão de nova aposentadoria.
Sustenta a autarquia previdenciária que a parte autora deve ser condenada a ressarcir o erário em relação à importância que recebeu decorrente do benefício cassado na justa medida em que obtido mediante fraude.
Subiram os autos com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de demanda na qual a parte autora pugnava pelo restabelecimento de sua aposentadoria originária, formulando pleito subsidiário de não devolução dos valores que tinha recebido entre a data de implantação da prestação e o momento de sua cessação, bem como de deferimento de novo benefício previdenciário (aposentadoria por tempo de contribuição ou aposentadoria por idade) em razão do preenchimento dos requisitos legais para tanto.
Conforme se infere do r. provimento judicial guerreado, restou indeferida a hipótese de restabelecimento da aposentadoria originária, cabendo considerar que foi exarado comando sentencial determinando que a autarquia previdenciária se abstenha de cobrar os valores pagos à parte autora entre a data de início do benefício e sua suspensão - ademais, deferiu-se nova aposentadoria por tempo de contribuição à parte autora a partir do ajuizamento deste feito.
Em razão da não interposição de recurso de apelação pela parte autora, encontra-se preclusa a análise relativa ao restabelecimento de seu benefício primitivo, tendo sido devolvido a esse E. Tribunal Regional, seja por força da remessa oficial, seja por meio do apelo manejado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, questão afeta à necessidade (ou não) de devolução das parcelas percebidas pela parte autora enquanto vigente a aposentadoria suspensa e a aferição do efetivo preenchimento dos requisitos necessários para fruição de novo benefício previdenciário (no caso, novel aposentadoria por tempo de contribuição), temas que passam a ser analisados a partir desse momento.
DO REEXAME NECESSÁRIO
O Código de Processo Civil afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I), cabendo considerar que a legislação processual civil tem aplicação imediata (art. 1.046).
Todavia, cumpre salientar que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.144.079/SP (representativo da controvérsia), apreciando a incidência das causas de exclusão da remessa oficial vindas por força da Lei nº 10.352/01 em face de sentenças proferidas anteriormente a tal diploma normativo, fixou entendimento no sentido de que a adoção do princípio tempus regit actum impõe o respeito aos atos praticados sob o pálio da lei revogada, bem como aos efeitos desses atos, impossibilitando a retroação da lei nova, razão pela qual a lei em vigor à data da sentença é a que regula os recursos cabíveis contra o ato decisório e, portanto, a sua submissão ao duplo grau obrigatório de jurisdição - nesse sentido:
Assim, tendo como base o entendimento acima exposto e prestigiando a força vinculante dos precedentes emanados como representativo da controvérsia, entendo deva ser submetido o provimento judicial guerreado ao reexame necessário (ainda que a condenação seja certamente inferior a 1.000 - mil - salários mínimos), tendo como base a legislação vigente ao tempo em que proferida a r. sentença, bem como o entendimento contido na Súmula 490, do C. Superior Tribunal de Justiça: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas".
DA NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE
Com relação à existência (ou não) de obrigação de devolver os valores recebidos decorrentes de benefício cassado, há entendimento jurisprudencial que reza que somente não haveria de ser determinada a devolução da importância quando efetivamente constatado erro administrativo, situação que denotaria a presença de boa-fé do segurado, cumprindo salientar, inclusive, a existência de Recursos Especiais representativos da controvérsia nos quais o tema encontra-se em debate (com a determinação de suspensão na origem de feitos cuja temática encontra-se a devolução de valores recebidos de boa-fé pelo segurado em decorrência de erro administrativo, de má aplicação da norma ou de interpretação equivocada da lei) - a respeito, vide o Ofício nº 0035/16, encaminhado pelo Gabinete da Vice-Presidência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região a esse Desembargador Federal.
Todavia, analisando detidamente os autos, verifica-se que a situação nele retratada não se enquadra na suspensão a que foi feita referência anteriormente (Ofício nº 0035/16, encaminhado pelo Gabinete da Vice-Presidência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região) na justa medida em que os elementos probatórios coligidos demonstram em sentido contrário à existência de erro administrativo, de má aplicação da norma ou de interpretação equivocada da lei (casos em que a boa-fé do segurado está implícita), mas sim a hipótese de fraude perpetrada em prejuízo do erário (patrimônio do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS).
Diz-se isso tendo em vista que os fatos debatidos nos autos guardam relação à ausência de comprovação de recolhimento previdenciário para o período de fevereiro/1970 a janeiro/1975, que foi indevidamente incluído em apuração final de tempo de serviço amealhado pela parte autora a possibilitar o deferimento de aposentadoria por tempo de contribuição com início fixado em 23/10/2000.
Com efeito, ao longo do procedimento administrativo de apuração de fraude (no qual foram respeitados os ditames do devido processo legal com seus corolários da ampla defesa e do contraditório com a possibilidade de apresentação de diversas defesas administrativas - fls. 79/80, 105, 108/113, 126/127 e 143/145 - e de recursos - fls. 149/150 e 185/190), constatou-se a existência de expediente levado a efeito de forma reiterada por ex-servidora da autarquia (inclusive com desdobramentos na esfera criminal) em diversos processos de concessão de benefício previdenciário (inclusive o da parte autora), conforme é possível ser aferido do relatório final acostado às fls. 224 destes autos:
Especificamente no caso dos autos, a fraude consistiu na inclusão de período fictício de tempo de labor (por meio do lançamento de contribuições previdenciárias inexistentes) para o interregno de fevereiro/1970 a janeiro/1975 a possibilitar o preenchimento dos requisitos exigidos pela legislação de regência para a concessão da prestação - ademais, houve aumento dos salários de contribuição do lapso de julho/1994 a setembro/2000 com o objetivo de majorar o valor final da aposentadoria (a respeito, vide os documentos de fls. 55/56 e 79). Sem prejuízo do exposto, o benefício em tela foi formatado em um único dia, vale dizer, protocolizado, analisado, processado e deferido em uma única oportunidade sem qualquer solicitação de complementação de documentação (fls. 224).
Dentro desse contexto, afastada cabalmente a boa-fé da parte autora tendo em vista a impossibilidade de se aceitar argumentos no sentido de erro administrativo quando da concessão da prestação ou de má aplicação da lei. Ademais, saliente-se que a tese defensiva apresentada administrativamente sempre consistia em argumentos desprovidos de qualquer elemento probatório no sentido de que os documentos requeridos (atinente ao interregno de fevereiro/1970 a janeiro/1975 - guias de contribuição pagas) estavam em poder da autarquia previdenciária e teriam sido extraviados (fls. 68, 80 e 144/145) - destaque-se, por oportuno, que em nenhum momento a parte autora colacionou termo de retenção de documentos emitido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (praxe em situações em que a autarquia previdenciária fica de posse de CTPS's, de guias de contribuições previdenciárias ou de outros elementos titularizados por aquele que está postulando a concessão de um benefício).
Assim, cotejando todos os aspectos anteriormente descritos, reputo pela existência de fraude na concessão do benefício originário da parte autora motivo pelo qual imperioso que os valores recebidos indevida e ilegalmente pela parte autora devam ser devolvidos ao erário (valor histórico - para 18/04/2012 - R$ 301.284,78 - trezentos e um mil, duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e oito centavos - fls. 217/221), cabendo considerar até mesmo a possibilidade de abatimento de eventual prestação atualmente percebida pela parte autora, usando-se, para tanto, o limite de 30% (trinta por cento) de parcela consignável da prestação mensal auferida ou de abatimento de crédito que a parte autora seja titular em face da autarquia previdenciária (como, por exemplo, decorrente da concessão de nova prestação previdenciária). Nesse diapasão, determino seja oficiado o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS acerca da cassação da tutela antecipada outrora deferida e confirmada pelo r. provimento judicial de fls. 308/311.
DA CONCESSÃO DE NOVO BENEFÍCIO - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
DO CASO CONCRETO - ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DE NOVA APOSENTADORIA
Somados os períodos incontroversos (fls. 100) com lapso posterior ao termo inicial do benefício cassado (CNIS - fls. 317), apura-se que a parte autora perfaz 34 anos, 11 meses e 16 dias de tempo de serviço, conforme planilha que ora se determina a juntada, suficiente para conceder novo benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, na forma integral, a partir da citação do ente autárquico neste demanda (cabendo considerar que a legislação de regência não traz disposição apta a amparar o deferimento desde o ajuizamento da ação - art. 54 c.c art. 49, ambos da Lei nº 8.213/91). Afastada a ocorrência de prescrição quinquenal uma vez que não são devidas parcelas anteriores à propositura deste processo.
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei n.º 9.289, de 04.07.1996, do art. 24-A da Lei n.º 9.028, de 12.04.1995, com a redação dada pelo art. 3º da Medida Provisória n.º 2.180- 35 /2001, e do art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620, de 05.01.1993.
Reconhecida a ocorrência de sucumbência recíproca, uma vez que cada litigante foi vencedor e vencido, nos termos do art. 21, do Código de Processo Civil de 1973, e do art. 86, do Código de Processo Civil. Mantida a tutela antecipada outrora deferida atinente à concessão de novo benefício previdenciário.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial e por DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária (para determinar que a parte autora seja condenada a ressarcir o erário acerca daquilo que recebeu indevidamente a título de aposentadoria cassada administrativamente, para fixar a concessão da nova aposentadoria a partir da citação do ente público nesta demanda, para aclarar os critérios de juros e de correção monetária e para estabelecer a ocorrência de sucumbência recíproca), nos termos anteriormente expendidos. Determino seja oficiado o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS acerca do conteúdo deste voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | FAUSTO MARTIN DE SANCTIS:66 |
| Nº de Série do Certificado: | 62312D6500C7A72E |
| Data e Hora: | 21/03/2017 11:47:25 |
