
| D.E. Publicado em 10/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial e NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0008263-24.2012.4.03.6000/MS
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (fls. 454/458) em face da r. sentença (fls. 442/448), submetida ao reexame necessário, que julgou procedente pedido para determinar que a autarquia restabeleça a aposentadoria titularizada pela parte autora com a utilização do interregno de 20/11/1981 a 11/12/1990, desde a indevida cessação, devendo arcar com as parcelas em atraso acrescidas de juros e de correção monetária, fixando verba honorária em 10% do valor da condenação (nos termos da Súm. 111/STJ) e impondo o ressarcimento de custas processuais - houve a antecipação dos efeitos da tutela.
Sustenta o ente previdenciário a legalidade da cessação da aposentadoria sob o argumento de que o período litigioso foi usado para que a parte autora pudesse se aposentar junto a Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, sendo vedado o emprego concomitante do mesmo período de labor junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
Subiram os autos com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de demanda na qual a parte autora pugna pelo restabelecimento de sua aposentadoria especial (deferida em 23/03/2009 - fls. 30 e 237), que teria sido cessada por ato ilegal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em 01/07/2012 (fls. 117/118, 379/380, 387, 394/395 e 422), uma vez que demonstrou, quando do requerimento administrativo, o preenchimento de todos os requisitos necessários à concessão da prestação. Sustenta que a autarquia previdenciária, ao arrepio da legislação de regência, teria suspenso o pagamento mensal em decorrência da utilização do interregno de 20/11/1981 a 11/12/1990 para fins de obtenção de aposentadoria junto a Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, sendo vedado pelo sistema o uso concomitante do mesmo período de labor junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
DO REEXAME NECESSÁRIO
O Código de Processo Civil afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I), cabendo considerar que a legislação processual civil tem aplicação imediata (art. 1.046).
Todavia, cumpre salientar que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.144.079/SP (representativo da controvérsia), apreciando a incidência das causas de exclusão da remessa oficial vindas por força da Lei nº 10.352/01 em face de sentenças proferidas anteriormente a tal diploma normativo, fixou entendimento no sentido de que a adoção do princípio tempus regit actum impõe o respeito aos atos praticados sob o pálio da lei revogada, bem como aos efeitos desses atos, impossibilitando a retroação da lei nova, razão pela qual a lei em vigor à data da sentença é a que regula os recursos cabíveis contra o ato decisório e, portanto, a sua submissão ao duplo grau obrigatório de jurisdição - nesse sentido:
Assim, tendo como base o entendimento acima exposto e prestigiando a força vinculante dos precedentes emanados como representativo da controvérsia, entendo deva ser submetido o provimento judicial guerreado ao reexame necessário (ainda que a condenação seja certamente inferior a 1.000 - mil - salários mínimos), tendo como base a legislação vigente ao tempo em que proferida a r. sentença, bem como o entendimento contido na Súmula 490, do C. Superior Tribunal de Justiça: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas".
DA POSSIBILIDADE DE O ENTE AUTÁRQUICO REVER OS ATOS ADMINISTRATIVOS DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO - APLICAÇÃO DA SÚMULA 473/STF - RESPEITO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
Inicialmente, cumpre salientar a possibilidade de a administração pública rever seus atos a fim de apurar e de coibir a prática de condutas ilegais, das quais não há que se falar em direito adquirido, desde que respeitado o princípio constitucional do devido processo legal (consubstanciado em manifestações que assegurem a ampla defesa e o contraditório), sempre assegurada a apreciação judicial da contenda - nesse sentido, é o entendimento do C. Supremo Tribunal Federal, conforme é possível ser aferido de sua Súmula 473 e de sua jurisprudência:
Nesse contexto, importante ser destacado que o processo de revisão levado a efeito pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS respeitou os ditames do devido processo legal previsto no Texto Constitucional (com seus corolários da ampla defesa e do contraditório), tendo em vista que foi assegurada à parte autora a possibilidade de apresentação de defesa e de recurso da decisão originária que determinou a suspensão do benefício de aposentadoria especial.
Nota-se, compulsando os autos, que o ente previdenciário encaminhou carta à parte autora em 30/03/2012 relatando as irregularidades encontradas quando da concessão da prestação e deferindo prazo de 10 (dez) dias para a apresentação de defesa escrita (fls. 84/85, 113/114, 345/346 e 375/376), faculdade esta utilizada pela parte autora (defesa às fls. 87/96 e 348/357). Procedeu-se ao seu julgamento em 22/05/2012 (fls. 115/116 e 377/378), tendo o resultado sido comunicado à parte autora por meio de missiva enviada em 28/05/2012, na qual constava a suspensão da benesse e a possibilidade de interposição de recurso no prazo de 30 (trinta) dias (fls. 119/120 e 381/382). A parte autora apresentou complementação de sua defesa em 10/08/2012 (fls. 388/390), também refutada administrativamente (fls. 427/428).
Por todo o exposto, verifica-se que não há vícios processuais a ensejar a anulação do procedimento de revisão / suspensão executado pela autarquia previdenciária (que culminou na cessação da aposentadoria especial da parte autora), de modo que se mostra possível adentrar a análise efetiva da tese de mérito veiculada nesta demanda.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO E DA APOSENTADORIA ESPECIAL
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
Já a aposentadoria especial (art. 57, caput, da Lei nº 8.213/91) difere da aposentadoria por tempo de serviço, porquanto pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, cabendo, ainda, considerar que sua renda mensal inicial será equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, não estando submetida à inovação legislativa promovida pela Emenda Constitucional nº 20/1998 (assim, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91). Diferentemente, na aposentadoria por tempo de serviço, há tanto o exercício de atividade comum como o exercício de atividade especial (convertida em tempo comum, aumentando, assim, o tempo de serviço do trabalhador) e, conforme a data em que o segurado preencher os requisitos, deverá cumprir as regras da Emenda Constitucional nº 20/1998.
DO CASO CONCRETO E DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
A controvérsia debatida nesta demanda guarda relação em perquirir se o interregno de 20/11/1981 a 11/12/1990 foi utilizado para deferimento de aposentadoria exclusivamente junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS ou se para concessão de benesse perante Regime Próprio de Previdência Social - RPPS. Argumenta o ente público que ele teria sido empregado junto a Regime Próprio, o que obstaria sua inclusão para fins de deferimento de aposentadoria perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, motivo pelo qual teria sido glosado e, portanto, cassada a aposentadoria especial titularizada pela parte autora, com o que esta não concorda.
Com efeito, analisando as provas carreadas aos autos, reputo que o lapso em litígio deve ser empregado junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS de modo que a parte autora tem direito ao restabelecimento de sua aposentadoria especial. Isso porque, de acordo com os ofícios de fls. 494/495, apura-se que a parte autora manteve 02 (duas) relações de trabalho concomitantes: uma junto à Associação Beneficente de Campo Grande - Santa Casa - Mantenedora do Hospital de Caridade (com admissão em 01/09/1980 e desligamento em 02/01/2017, vertendo contribuições ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS - fls. 494) e outra junto à Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (com contratação a partir de 20/11/1981, passando ao Regime Estatutário a partir de 12/12/1990, tendo inicialmente vertido exações ao Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social - IAPAS, atualmente Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, e, posteriormente, ao Regime Próprio de Previdência Social - fls. 495).
Dentro desse contexto, não há qualquer problema no emprego do período controverso (ressalte-se: de 20/11/1981 a 11/12/1990) para fins de concessão da aposentadoria especial mantida pela autarquia previdenciária tendo em vista que a parte autora possuía 02 (dois) vínculos empregatícios distintos naquele intervalo temporal (vertendo, assim, exações previdenciárias em decorrência de cada empregador): um perante a Associação Beneficente de Campo Grande - Santa Casa - Mantenedora do Hospital de Caridade e outro junto a Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, donde se concluiu que o interregno em comento não foi empregado para fins de aposentação em Regime Próprio na justa medida em que o tempo de trabalho exercido ao empregador Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul foi levado em consideração para tal desiderato.
Não prosperam argumentos no sentido de que originariamente as contribuições repassadas ao erário por força do contrato de trabalho junto a Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul teriam sido feitas ao Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social - IAPAS, atualmente Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, de modo que já teria havido seu uso quando da aposentação em Regime Próprio em razão do expediente da contagem recíproca. Na verdade, havia concomitância de recolhimentos, motivo pelo qual lícito o uso de um deles para postulação de aposentadoria perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (refiro-me ao vínculo mantido junto a Associação Beneficente de Campo Grande - Santa Casa - Mantenedora do Hospital de Caridade) e outro para requerimento de inatividade em Regime Próprio de Previdência Social - RPPS (faço menção ao contrato de trabalho perante a Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).
Por tais fundamentos, a parte autora tem direito ao restabelecimento de sua aposentadoria especial mantida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em razão da averbação do interregno de 20/11/1981 a 11/12/1990 (decorrente de contrato de trabalho levado a efeito perante a Associação Beneficente de Campo Grande - Santa Casa - Mantenedora do Hospital de Caridade) junto ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS. Destaque-se que tal restabelecimento deve retroagir à data da indevida cessação da prestação (01/07/2012 - fls. 117/118, 379/380, 387, 394/395 e 422), não havendo que se falar na ocorrência de prescrição quinquenal na justa medida em que não transcorreram mais de 05 (cinco) anos entre tal marco (01/07/2012 - fls. 117/118, 379/380, 387, 394/395 e 422) e o momento de ajuizamento desta demanda (08/08/2012 - fls. 02).
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei n.º 9.289, de 04.07.1996, do art. 24-A da Lei n.º 9.028, de 12.04.1995, com a redação dada pelo art. 3º da Medida Provisória n.º 2.180- 35 /2001, e do art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620, de 05.01.1993. Todavia, a teor do paragrafo único do art. 4º da Lei nº 9.289/96, deve o ente público reembolsar as despesas judiciais adiantadas pela parte vencedora. Consigne-se, a propósito, ser este o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria:
Sucumbente, deve o INSS arcar com os honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento), calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, consoante os arts. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, e 85, § 3º, I, do Código de Processo Civil, observada a Súm. 111/STJ.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial (apenas para aclarar os critérios de juros e de correção monetária) e por NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 27/06/2017 15:57:48 |
