
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001131-54.2010.4.03.6106
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUMERCINDO ALVES GARCIA
Advogado do(a) APELADO: OSWALDO SERON - SP71127-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001131-54.2010.4.03.6106
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUMERCINDO ALVES GARCIA
Advogado do(a) APELADO: OSWALDO SERON - SP71127-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de ação previdenciária ajuizada aos 19 de fevereiro de 2010 objetivando o reconhecimento de períodos de labor rural sem registro em CTPS, bem como a condenação do INSS ao pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença, não submetida ao reexame necessário, foi proferida em 13 de fevereiro de 2013 e julgou procedente o pedido para condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, com termo inicial na data do requerimento administrativo (19/11/2009- DER-fl. 15). Arbitrada a verba honorária em 10% do valor da condenação (fls. 62/63).
Apela o INSS. Em suas razões recursais, sustenta em preliminar, a ocorrência de julgamento extra petita, uma vez que o pedido formulado pelo autor na inicial foi para a declaração do tempo de labor rural sem registro e para a condenação da Autarquia à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Pugna pela respectiva anulação. No mérito, sustenta a improcedência do pedido para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, uma vez que não cumprida a carência legal.
Apresentadas as contrarrazões da parte autora, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001131-54.2010.4.03.6106
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUMERCINDO ALVES GARCIA
Advogado do(a) APELADO: OSWALDO SERON - SP71127-N
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V O T O
DA REMESSA OFICIAL
Afigura-se incorreta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, apesar de a sentença ter sido prolatada após a alteração do art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973 pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, não há, no caso em análise, valor certo a ser considerado, devendo ser observado o disposto na Súmula nº 490 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
PRELIMINAR- SENTENÇA EXTRA PETITA
Inicialmente, verifica-se, pela leitura da petição inicial, que a parte autora, formulou, expressamente, pedido para o reconhecimento do labor campesino sem registro, desde a data em que completou 12 (doze anos), bem como para a condenação do INSS à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
No entanto, a r. sentença recorrida, concedeu tutela jurisdicional diversa da pretendida, consistente na concessão de aposentadoria por idade rural, com termo inicial a partir de 19/11/2009 (DER-fl.25). Assim, resta caracterizada a ocorrência de julgamento "extra petita", sendo de rigor a sua anulação, a teor do disposto no artigo 460 do CPC/1973, atualmente, artigo 492 do Código de Processo Civil.
Ademais, percebe-se que o feito se encontra em condições de imediato julgamento, razão pela qual passo à análise do mérito, com fulcro no artigo 1.013, § 3º, inciso II, da lei processual.
Passo à análise do mérito.
Pois bem, conforme dispõem os arts. 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, a aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, é devida, na forma proporcional ou integral, respectivamente, ao segurado que tenha completado 25 anos de serviço (se mulher) e 30 anos (se homem), ou 30 anos de serviço (se mulher) e 35 anos (se homem).
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo art. 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu art. 142.
Contudo, após a Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998, respeitado o direito adquirido à aposentadoria com base nos critérios anteriores até então vigentes, aos que já haviam atendido os requisitos para sua obtenção (art. 3º da citada Emenda), não há mais que se falar em aposentadoria proporcional.
Excepcionalmente, poderá se aposentar, ainda, com proventos proporcionais, o segurado filiado ao regime geral da previdência social até a data de sua publicação (DOU de 16/12/1998) que preencher as seguintes regras de transição: idade mínima de 53 anos, se homem, e 48 anos, se mulher, e um período adicional de contribuição equivalente a 40% do tempo que, àquela data (16/12/1998), faltaria para atingir o limite de 25 ou 30 anos de tempo de contribuição (art. 9º, § 1º, da EC n.º 20/98).
No caso da aposentadoria integral, descabe a exigência de idade mínima ou "pedágio", consoante exegese da regra permanente, menos gravosa, inserta no art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, como já admitiu o próprio INSS administrativamente.
Registre-se, por oportuno, que, para efeito de concessão desse benefício, poderá ser considerado o tempo de serviço especial prestado em qualquer época, o qual será convertido em tempo de atividade comum, à luz do disposto no art. 70, § 2º, do atual Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/1999): "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste art., aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período".
Inexiste, pois, limitação à conversão em comento quanto ao período laborado, seja ele anterior à Lei n.º 6.887/1980 ou posterior a 1998, havendo o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, inclusive, firmado a compreensão de que se mantém "a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991". Ficou assentado, ademais, que o enquadramento da atividade especial rege-se pela lei vigente ao tempo do labor, mas "a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento", ou seja, no momento em que foram implementados os requisitos para a concessão da aposentadoria, como é o caso da regra que define o fator de conversão a ser utilizado (REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011).
Em sintonia com o aresto supracitado, a mesma Corte, ao analisar outro recurso submetido à sistemática do art. 543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao art. 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial (REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).
DA COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE LABORATIVA SEM REGISTRO PROFISSIONAL
Para efeito de concessão do benefício em tela, a comprovação do tempo de serviço, agora, tempo de contribuição (art. 4º da EC 20/98), sem regular registro em carteira profissional, deverá ser feita com base em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91).
No tocante à atividade rural, muito se debateu a respeito da aplicação do dispositivo supramencionado e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (STJ, REsp 1321493/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2012, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC/1973);
(ii) os documentos em nome de terceiros, como pais, cônjuge e filhos, servem como início de prova escrita para fins de comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, onde dificilmente todos os membros da família terão documentos em seu nome, posto que concentrados, na maioria das vezes, na figura do chefe da família (STJ, EREsp 1171565/SP, Relator Ministro Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 05/3/2015; AgRg no REsp 1073582/SP, Relator Ministro OG Fernandes, Sexta Turma, DJe 02/03/2009; REsp 447655, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJ 29/11/2004).
(iii) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos permaneceram polêmicos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o maior deles diga respeito, justamente, à desnecessidade de contemporaneidade do início de prova material amealhado a todo período que se pretende ver reconhecido.
A propósito, vale transcrever, num primeiro lanço, o último aresto citado, exarado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL . RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1348633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014)
Esposando o mesmo raciocínio, a Súmula 577 do c. STJ, verbis:
"É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório".
Ora bem, da leitura dos textos retrotranscritos, ressai cristalino ser dispensável que o princípio de prova documental refira-se a todo o período a comprovar-se: admite-se que aluda, apenas, à parcela deste. Equivale, pois, a afirmar-se que o princípio deve reportar-se ao menos a um quinhão do intervalo laborativo a ser comprovado.
Destarte, à luz dos julgados do c. STJ e da linha exegética acima, inclino-me pela simultaneidade, ainda quando diminuta, entre os documentos ofertados e o interregno laboral alegado.
Postas as balizas, passa-se ao exame do
caso concreto
.Pugna o autor, nascido aos 16/06/1947 pelo reconhecimento do labor rural, sem registro, sob a alegação de que exerceu as lides rurais, desde a idade de 12 anos, em regime de economia familiar, nas seguintes propriedades:
- a partir dos 12 anos de idade até o ano de 1974 – em regime de economia familiar no município de Adolfo/SP;
- de 1975 a 1979, na lavoura de café e cereais, como “meeiro”, na propriedade “Fazenda Nossa Senhora Aparecida”, município de Novo Horizonte/SP;
- de 1980 a 1992, na propriedade de Adelino Carareto, “Sítio São João, no município de Bady Bassiti/SP, nas lavouras de café, cereais e manga, como “meeiro”, possuindo registro em CTPS no intervalo entre 1985 a 1989;
- de 1992 a 1996 – empresa Beta Indústria e Comércio LTDA, na qualidade de ajudante geral, com registro em CTPS;
- de 1996 a 1999, na propriedade de Flavio Bascovitti, como “meeiro” em lavoura de hortaliças;
- de 2000 até o ajuizamento da ação, na propriedade de Benedita de Andrade Candeira, como “caseiro”, com registro em CTPS, sendo que entre 2001 a 2002, na mesma chácara, trabalhou na lavoura de hortaliças, como parceiro agrícola.
- Do período de labor rural:
A fim de comprovar o trabalho rural sem registro foram apresentados pelo autor os seguintes documentos:
- certidão de casamento celebrado em 1974, documento no qual o autor está qualificado como lavrador (fl.10);
- cópia de sua CTPS (fls. 12/13), com a anotação dos seguintes vínculos laborais:
a) de 1º/10/1985 a 30/09/1989 – Adelino Carareto, trabalhador rural;
b) de 1º/09/1992 a 10/04/1996- Beta Indústria e Comércio LTDA, ajudante geral;
c) de 1º/06/2000 a 30/11/2000 – Benedita de Andrade Candeira, “caseiro”;
d) 1º/08/2002 até o ajuizamento da ação em 19/02/2010, para Matheus Miguel de Andrade Candeira.
Consoante remansosa jurisprudência, verifica-se a existência de indício documental de exercício de labor rural. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. VALIDADE DOS DOCUMENTOS DE REGISTROS CIVIS. COMPLEMENTAÇÃO COM ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA QUE ALCANÇA OS PERÍODOS ANTERIOR E POSTERIOR À DATA DO DOCUMENTO. PEDIDO DE SUSPENSÃO DO FEITO. REPETITIVO COM TESE DIVERSA.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural por idade, deve ser demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses idêntico à carência.
2. São aceitos, como início de prova material, documentos de registros civis que apontem o efetivo exercício de labor no meio rural , tais como certidões de casamento, de nascimento de filhos e de óbito, desde complementada com robusta e idônea prova testemunhal.
3. No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, esta Corte, examinando a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
4. São distintas as questões discutidas no recurso representativo da controvérsia apontado pelo INSS ( REsp 1.354.980/SP) e no presente feito. Neste recurso discute-se a necessidade de o início de prova material ser contemporâneo ao período imediatamente anterior ao requerimento administrativo para fins de concessão de aposentadoria a trabalhador rural. Já no recurso especial apontado pelo INSS a questão decidida não se refere especificamente à contemporaneidade dos documentos apresentados.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ, AgRg no AREsp 329682/PR, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe 29/10/2015 - grifo nosso).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VOTO-VISTA DO MIN. MAURO CAMPBELL MARQUES. ALINHAMENTO COM A POSIÇÃO DO NOBRE COLEGA. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL RECONHECIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS E CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO.
1. A controvérsia gira em torno do preenchimento dos requisitos para a concessão de pensão por morte à autora.
2. A jurisprudência do STJ se mostra firme no sentido de que o reconhecimento de tempo de serviço rurícola exige que a prova testemunhal corrobore um início razoável de prova material, sendo certo que o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo.
3. Segundo a orientação do STJ, as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao sindicato dos Trabalhadores Rurais, ficha de inscrição em sindicato rural , contratos de parceria agrícola, podem servir como início da prova material nos casos em que a profissão de rurícola estiver expressamente mencionada desde que amparados por convincente prova testemunhal. Precedentes: AgRg no AREsp 577.360/MS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/6/2016, e AR 4.507/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 24/8/2015.
4. O acórdão recorrido concluiu desconsiderar as provas materiais, afastando a decisão do juízo sentenciante que presidiu a instrução do feito, que bem valorou as provas ao ter estabelecido contato direto com as partes, encontrando-se em melhores condições de aferir a condição de trabalhador rural afirmada pelo autor e testemunhas ouvidas.
5. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim valoração do conjunto probatório existente. Precedentes: AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 11/4/2014, e AgRg no AREsp 652.962/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 3/9/2015. 6. Recurso especial provido.
(STJ, RESP 201700058760, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE 30/06/2017)
Assim, admitida a presença de princípio de prova documental no lapso reclamado, bem como em suas cercanias, incumbe verificar se este é corroborado - e amplificado - pelos depoimentos testemunhais.
Dos depoimentos testemunhais coletados em audiência realizada em 08/11/2010 verifica-se que os depoentes Zacarias Gonçalves e João Bueno de Godoy Filho afirmaram conhecer o autor e ter conhecimento de que ele exerceu as lides rurais.
A testemunha João Bueno de Godoy Filho afirmou conhecer o autor há aproximadamente quarenta anos, quando residiram na “Fazenda Nossa Senhora Aparecida”, de Antonio Graciano. Esclareceu que ali residiu até 1975, e que o autor ali chegou um pouco antes e trabalhou até o ano de 1978, na lavoura de café. Após, ele se mudou para o “Sítio São João” em Bady Bassiti/SP, onde trabalhou para Adelino Carareto, por uns 12 anos, até ir para a atividade urbana. Após, retornou para o trabalho com hortaliças para “Bascoviti”, e por fim, para “Dona Bernadete”, emprego no qual permanece (fl.59).
A testemunha Zacarias Gonçalves afirmou conhecer o autor desde o ano de 1984, quando residiam na propriedade rural de “Pedro Biasi”, em Bady Bassiti/SP, e que o autor foi trabalhar na propriedade vizinha de Adelino Carareto, na lide rural, até ir trabalhar na empresa “Beta”, com concreto. Posteriormente retornou à lide rural, para trabalhar com horta, e por fim como caseiro em uma chácara (fl. 60).
Destarte, restou comprovado nos autos o desempenho de atividade rural, sem registro, no período de
1º/01/1974 até 30/09/1985
e de1º/10/1989 até 25/07/1991
, dia imediatamente anterior ao vínculo laboral em atividade urbana, na empresa Beta Indústria e Comércio LTDA, conforme anotado em sua CTPS (fl. 13), observando-se que para o intervalo entre 1º/10/1985 a 30/09/1989, o demandante possui anotação em CTPS, como trabalhador rural (fl.13).Saliente-se, que para o período entre 1996 até 1999, no qual o autor alega ter trabalhado para o empregador Flavio Bascovitti, em lavoura de hortaliças, em que pese afirmado pelas testemunhas, não foi apresentado início de prova material em relação à essa atividade.
Importante consignar, por pertinente, que o tempo de serviço prestado por segurado trabalhador rural, anterior à vigência da Lei n.º 8.213/91, deverá ser computado independentemente do recolhimento das respectivas contribuições, exceto para efeito de carência (art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91).
Somados os períodos rural reconhecidos nestes autos, aos vínculos laborais anotados em CTPS (fls. 12/13 e cadastrados no CNIS, verifica-se que, afastados os lapsos concomitantes, possui o autor, até a data do requerimento administrativo em 19/11/2009 (DER), o tempo de 28 anos, 11 meses e 28 dias, o que é insuficiente à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que na modalidade proporcional, conforme verifica-se da planilha abaixo colacionada:
“ CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM
- Data de nascimento
- Sexo
- DER 01/01/1974 30/09/1985
- Período 2 - 01/10/1985 30/09/1989
- Período 3 - 01/10/1989 25/07/1991
- Período 4 - 01/09/1992 14/04/1996
- Período 5 - 01/06/2000 30/11/2000
- Período 6 - 01/08/2002 19/11/2009
* Não há períodos concomitantes.
- Soma até 16/12/1998 (EC 20/98)
- Soma até 28/11/1999 (Lei 9.876/99)
- Soma até 19/11/2009 (DER)
- Pedágio (EC 20/98)
* Para visualizar esta planilha acesse https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/426TQ-FPZYJ-XQ
- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição
Nessas condições, em
16/12/1998
, a parte autoranão
tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpria o tempo mínimo de serviço de 30 anos, nem a carência mínima de 102 contribuições.Em
28/11/1999
, a parte autoranão
tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição de 30 anos , o pedágio de 3 anos, 6 meses e 8 dias , a carência de 108 contribuições e nem a idade mínima de 53 anos.Por fim, em
19/11/2009
(DER), a parte autoranão
tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição de 30 anos e nem o pedágio de 3 anos, 6 meses e 8 dias.Outrossim, ainda que somado o tempo de contribuição até a data do ajuizamento da ação, em 19/02/2010, o demandante não alcançaria o tempo necessário ao cumprimento do pedágio legal para o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional.
Destarte, face às considerações acima, impõe-se a parcial procedência do pedido do autor, apenas para declarar o exercício da atividade rural sem registro, nos períodos de
1º/01/1974 até 30/09/1985
e de1º/10/1989 até 25/07/1991
, com a condenação do INSS a proceder a respectiva averbação.Face a sucumbência mínima do INSS, condeno a parte autora em honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do NCPC, que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, acolho a preliminar arguida pelo INSS, quanto a ocorrência de julgamento " extra petita " para anular a r. sentença e, com fulcro no artigo 1.013, § 3º, inciso II, do NCPC, julgo parcialmente procedente o pedido para reconhecer o labor campesino sem registro de
1º/01/1974 até 30/09/1985
e de1º/10/1989 até 25/07/1991
, condenando o INSS à respectiva averbação. Prejudicada a apelação do INSS.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SÚMULA 490 DO C. STJ. CABIMENTO. PRELIMINAR – JULGAMENTO EXTRA PETITA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL SEM REGISTRO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. AVERBAÇÃO.
- Inexistindo, in casu, valor certo a ser considerado, é cabível a remessa oficial, em consonância com a Súmula nº 490 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
3. Em verificado a ocorrência de julgamento "extra petita", impõe-se a nulidade da r. sentença.
- Demonstrado, pelo conjunto probatório dos autos, o labor rural sem registro, eis que comprovado nos autos por meio de início de prova material, corroborado por prova testemunhal harmônica e idônea, nos períodos declinados.
- Ausentes os requisitos legais, indevida a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
- Preliminar acolhida. Sentença anulada. Parcial procedência do pedido do autor, nos termos do art. 1.013, §3º, II do CPC. Prejudicada a apelação do INSS.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu acolher a preliminar de julgamento 'extra petita' e, nos termos do art. 1.013, §3º, II do CPC, julgar parcialmente procedente o pedido para reconhecer o labor campesino sem registro de 1º/01/1974 até 30/09/1985 e de 1º/10/1989 até 25/07/1991, condenando o INSS à respectiva averbação, prejudicada a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
