D.E. Publicado em 22/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001983-33.2005.4.03.6307/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (fls. 539/543) em face da r. sentença (fls. 502/533), submetida ao reexame necessário, que julgou parcialmente procedente pedido para reconhecer o labor rural desempenhado entre 15/03/1969 e 11/09/1972 e o labor especial nos períodos de 10/03/1973 a 16/10/1974, de 01/04/1975 a 30/08/1975, de 01/06/1985 a 31/07/1986 e de 01/08/1986 a 10/11/1997, determinando que a autarquia expeça certidão de tempo de contribuição, fixando verba honorária em R$ 500,00 (quinhentos reais). Sustenta o ente autárquico que a parte autora não faz jus ao reconhecimento da especialidade nos lapsos em que exerceu a profissão de frentista (de 01/04/1975 a 30/08/1975, de 01/06/1985 a 31/07/1986 e de 01/08/1986 a 10/11/1997).
Subiram os autos com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Cumpre, inicialmente, delimitar o que foi devolvido a este E. Tribunal por meio tanto da remessa oficial como do recurso de apelação manejado pelo ente autárquico. Com efeito, originariamente, tratava-se de demanda na qual a parte autora postulava o deferimento de aposentadoria por tempo de serviço / contribuição mediante o reconhecimento de labor desempenhado na faina rural e em condições especiais. Sobreveio a r. sentença, que apenas assentou o trabalho campesino e em condições especiais nos interregnos que elenca, determinado que a autarquia expedisse certidão de tempo de contribuição, submetendo o decidido à remessa oficial. Sem prejuízo do recurso de ofício, apelou o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, argumentando que a parte autora não tem direito ao reconhecimento da especialidade nos períodos em que exerceu a profissão de frentista.
Nesse contexto, a matéria trazida ao conhecimento desta E. Corte guarda relação tanto com o reconhecimento de labor nas lides campestres como com o desempenho de atividades especiais nos lapsos asseverados pela r. decisão guerreada, não havendo que ser apreciada questão afeta ao deferimento de aposentadoria (uma vez que não há apelação interposta pela parte autora).
DO TEMPO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
O tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum independente da época trabalhada (art. 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99). Desta forma, não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/80, seja em períodos posteriores à Lei nº 9.711/98, sendo certo que o art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, foi elevado à posição de Lei Complementar pelo art. 15, da Emenda Constitucional nº 20/98, de modo que somente por Lei Complementar poderá ser alterado.
Importante ser consignado que, na conversão do tempo especial em comum, aplica-se a legislação vigente à época da prestação laboral; na ausência desta e na potencial agressão à saúde do trabalhador, deve ser dado o mesmo tratamento para aquele que hoje tem direito à concessão da aposentadoria (STF, RE 392.559/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 07.02.06).
Cumpre salientar que a conversão do tempo de trabalho em atividades especiais era concedida com base na categoria profissional classificada de acordo com os anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, sendo que, a partir da Lei nº 9.032/95, faz-se necessário comprovar o exercício da atividade prejudicial à saúde por meios de formulários ou de laudos. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo (portanto, não exaustivo), motivo pelo qual a ausência do enquadramento da atividade tida por especial não é óbice à concessão de aposentadoria especial, consoante o entendimento da Súmula 198, do extinto TFR: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
Portanto, o reconhecimento de outras atividades insalubres, penosas e perigosas é admissível, caso exercidas sob ditas condições especiais; porém, tais especialidades não se presumem (como ocorre com aquelas categorias arroladas na legislação pertinente).
A partir de 10 de dezembro de 1997, com a edição da Lei nº 9.528, passou-se a ser necessária a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade insalubre, documento este que deve demonstrar efetiva exposição do segurado ao agente nocivo, mediante formulário estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base em laudo técnico do ambiente de trabalho, expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, com exceção de ruído (que sempre exigiu a apresentação de referido laudo para caracterizá-lo como agente agressor). Registro, por oportuno, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico em comento, sendo, assim, documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Destaque-se que a extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data de elaboração de tais documentos (tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho somente melhoram com a evolução tecnológica).
Saliente-se que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 têm aplicação simultânea até 05 de março de 1997, de modo que, verificada divergência entre tais diplomas, deve prevalecer a regra mais benéfica (como, por exemplo, ocorre na constatação de insalubridade em razão de ruído com intensidade igual ou superior a 80 dB, que atrai a incidência do Decreto nº 53.831/64).
Especificamente com relação ao agente agressivo ruído, importante ser dito que até 05 de março de 1997 entendia-se insalubre a atividade desempenhada exposta a 80 dB ou mais. Posteriormente, o Decreto nº 2.172/97 revogou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, passando a considerar insalubre o labor desempenhado com nível de ruído superior a 90 dB. Mais tarde, em 18 de novembro de 2003, o Decreto nº 4.882/03 reduziu tal patamar para 85 dB. Ressalte-se que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.398.260/PR (representativo da controvérsia - Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe de 05/12/2014), firmou entendimento no sentido da impossibilidade de retroação do limite de 85 dB para alcançar fatos praticados sob a égide do Decreto nº 2.172/97.
O E. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo em RE nº 664.335/RS (com repercussão geral da questão constitucional reconhecida), pacificou o entendimento de que, havendo prova da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI (vale dizer, efetiva capacidade de neutralizar a nocividade do labor), não há que se falar em respaldo constitucional à concessão de aposentadoria especial. Todavia, em caso de dúvida em relação à neutralização da nocividade, assentou que a Administração e o Poder Judiciário devem seguir a premissa do reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial, pois o uso do EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submeteu - destaque-se que se enfatizou, em tal julgamento, que a mera informação da empresa sobre a eficácia do EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço para fins de aposentadoria. Ainda em indicado precedente, analisando a questão sob a ótica do agente agressivo ruído, o Supremo estabeleceu que não se pode garantir a eficácia real do EPI em eliminar os efeitos agressivos ao trabalhador, destacando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, não abrangendo apenas perdas auditivas, pelo que é impassível de controle, seja pelas empresas, seja pelos trabalhadores.
Por fim, no tocante à alegada necessidade de prévia fonte de custeio, em se tratando de empregado, sua filiação ao sistema previdenciário é obrigatória, bem como o recolhimento das contribuições respectivas, cabendo ao empregador vertê-las, nos termos do art. 30, I, da Lei nº 8.212/91. Dentro desse contexto, o trabalhador não pode ser penalizado se tais recolhimentos não foram efetuados corretamente, porquanto a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
DO TEMPO EXERCIDO EM ATIVIDADE RURAL
O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991 é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições correspondentes, todavia, não se prestando para fins de carência (art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91).
A comprovação de tal tempo, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91, deve ser levada a efeito por meio de início de prova material, não sendo admitida, porém, prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou de caso fortuito, a teor da Súm. 149/STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário". Por outro lado, havendo início de prova material, corroborada pelas testemunhas colhidas em juízo, é possível o reconhecimento de tempo anterior ao documento mais remoto (desde que o labor seja confirmado pela prova oral), de acordo com o que restou assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, representativo da controvérsia.
Importante ser dito que o reconhecimento de labor na faina rural não demanda prova do recolhimento das respectivas contribuições sociais, conforme jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
Cabe destacar, ainda, que o fato da prova evidenciar trabalho do menor em nada o prejudica na contagem desse tempo. Na verdade, de todo razoável o cômputo de tal período, pois a autorização constitucional condicionada ao vínculo empregatício (art. 165, X, da Emenda Constitucional nº 1/69) se justificava no intuito de proteção do menor, o que está implícito no dever de educar dos pais nas famílias em que predomina a economia de subsistência. De igual modo, se a atual Constituição veda o trabalho aos menores de 14 (catorze) anos, o faz certamente em benefício deles; logo, em tais condições, descabe prejudicá-los deixando de computar o período de atividade rurícola desde a idade de doze (12) anos. Sobre o tema, o C. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico que o exercício da atividade rural do menor deve ser reconhecido para fins previdenciários, já que as normas proibitivas do trabalho são editadas para protegê-lo - nesse sentido:
Por fim, quanto ao tempo de serviço rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91, na qualidade de pequeno produtor rural em regime de economia familiar, observa-se a regra do art. 39, de referido diploma:
Desta forma, em relação ao reconhecimento de trabalho rural posterior a novembro de 1991, faz-se necessária a prova do recolhimento das contribuições previdenciárias relativas ao período (art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99).
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
Da atividade especial: Pugna a parte autora pelo reconhecimento como especial do labor exercido entre 10/03/1973 e 16/10/1974, entre 01/04/1975 e 30/08/1975, entre 01/06/1985 e 31/07/1986 e entre 01/08/1986 e 10/11/1997. Cumpre analisar cada interregno separadamente:
- Período de 10/03/1973 a 16/10/1974: Verifica-se, de acordo com a CTPS de fls. 20 e 250, bem como do formulário de fls. 65 e 158, que a parte autora trabalhava como vigia noturno (inclusive portando arma de fogo), atividade que permite o reconhecimento da especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum), na justa medida que o labor em tela se enquadra, por analogia, no item 2.5.7 do anexo ao Decreto 53.831/64, diante da existência de periculosidade inerente às atividades de guarda, policial, bombeiros e investigadores. Ademais, não há que se falar da necessidade de comprovação do porte de arma de fogo (ainda que tal ocorra neste feito), tendo em vista que a atividade de vigilante patrimonial é perigosa, deixando o trabalhador exposto ao risco de morte. Cumpre ressaltar, igualmente, que alterações no art. 193, da CLT, consignam a atividade de vigilante como perigosa, sem a exigência de demonstração do uso de arma de fogo. Por fim, a exposição ao risco de acidentes não se dá de forma intermitente, pois a periculosidade da função (com risco de morte) está presente durante toda a jornada de trabalho, inerente à profissão (sendo desnecessária a apresentação de formulários ou laudos específicos para a sua comprovação) - nesse sentido:
- Período de 01/04/1975 a 30/08/1975: Verifica-se, de acordo com a CTPS de fls. 20 e 251, bem como do formulário de fls. 66 e 159, que a parte autora exercia a função de frentista, atividade passível de ser enquadrada no item 1.2.11, do Decreto nº 53.831/64, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento da especialidade do labor (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 01/06/1985 a 31/07/1986: Verifica-se, de acordo com a CTPS de fls. 21 e 252, bem como do formulário de fls. 53/54, 67, 146/147 e 160, que a parte autora exercia a função de frentista, atividade passível de ser enquadrada no item 1.2.11, do Decreto nº 53.831/64, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento da especialidade do labor (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 01/08/1986 a 10/11/1997: Verifica-se, de acordo com a CTPS de fls. 21 e 252, bem como do formulário de fls. 55/56, 68, 148/149, 161 e 176, que a parte autora exercia a função de frentista, bem como que estava exposta aos agentes gasolina, óleo, álcool, diesel, metanol, monóxido de carbono e intempéries climáticas (além do risco de explosão). Entendo possível o reconhecimento da especialidade vindicada apenas como decorrência da profissão de frentista (atividade passível de ser enquadrada no item 1.2.11, do Decreto nº 53.831/64), somente até o advento da Lei nº 9.032/95 (momento a partir do qual a legislação passou a exigir a efetiva exposição a agente agressivo como forma de se reconhecer a especialidade do labor). Destaco que as informações constantes dos formulários indicados anteriormente referente aos agentes agressivos não permitem o reconhecimento almejado na justa medida que se mostram genéricas, não servindo como demonstração da efetiva submissão a agentes agressivos. Desta forma, faz jus a parte autora ao reconhecimento da especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum) de 01/08/1986 a 28/04/1995.
Do labor rural: Pugna a parte autora pelo reconhecimento de atividade levada a efeito na faina rural no interregno de 15/03/1969 a 11/09/1972. Com efeito, compulsando os autos, verifica-se que a autarquia previdenciária reconheceu administrativamente tal interregno (fls. 471), motivo pelo qual o período de labor rural em tela mostra-se incontroverso.
Por todo o exposto, merece reforma a r. sentença apenas para afastar a especialidade do labor no lapso de 29/04/1995 a 10/11/1997, devendo ser mantida quanto aos demais aspectos.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária (apenas para afastar a especialidade do labor no lapso de 29/04/1995 a 10/11/1997), nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 08/08/2016 18:26:06 |