D.E. Publicado em 27/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à rescisória e, em juízo rescisório, julgar extinto o feito sem resolução de mérito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0008698-48.2015.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de Maria Sebastiana Alves de Morais, com fundamento no artigo 485, incisos V e VII, do Código de Processo Civil/73 - violação a literal disposição de lei e documento novo, visando à desconstituição da decisão monocrática terminativa desta Corte, reproduzida às fls. 139/142, que deu parcial provimento à apelação da autarquia apenas para alterar o termo inicial do benefício, reduzir o percentual da verba honorária e modificar os critérios do cômputo dos juros e da correção monetária, mantendo a procedência do pedido inicial de concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
Alega o INSS que, quando do cumprimento do acórdão rescindendo, foram obtidos documentos novos, que demonstram que o marido da ré era trabalhador urbano, inclusive aposentou-se pelo RGPS nessa qualidade. Afirma que, à época do processo de conhecimento, por problemas técnicos, a pesquisa feita no CNIS e no PLENUS da ré e de seu marido resultou "CPF não localizado" e "não existe benefício com este nome e data de nascimento", o que impossibilitou a apresentação dos documentos ora juntados. Assim, argumenta que estaria desconfigurado o trabalho rural no período equivalente à carência e, ao manter a concessão do benefício à ré, o julgado em questão viola expressamente o disposto nos artigos 55, § 3º e 143, da Lei nº 8.213/91. Requer a suspensão da execução do julgado e a rescisão do acórdão, pois não faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural. A inicial veio acompanhada de documentos (fls. 12/159).
O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (fls. 161/162).
Regularmente citada (fl. 166, verso), ré não apresentou contestação, sendo declarada sua revelia (fl. 170).
Apenas o INSS apresentou alegações finais, reiterando as teses até então sustentadas (fl. 171).
O Ministério Público Federal, em seu parecer (fl. 172), opina pelo processamento sem a sua intervenção.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada em 23/04/2015, ou seja, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 - CPC/1973.
Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18/03/2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 495 do CPC/1973, considerando a certidão de fl. 144.
A despeito de não haver sido formulado pedido expresso nestes autos, defiro à ré os benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 4º, caput e § 1º, da Lei nº 1.060/50, tendo em vista a presunção legal de pobreza, afirmada na inicial da ação subjacente (fl. 48).
Observo ainda que, em que pese a parte ré não haver contestado o presente feito, é assente não se aplicar, em sede de ação rescisória, como efeito da revelia, a presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial. Nesse sentido:
A presente ação rescisória tem por base a alegação de violação a literal disposição de lei e obtenção de documento novo, nos termos do art. 485, incisos V e VII, do CPC/1973.
Quanto ao pedido de rescisão sob o fundamento do Art. 485, VII, do CPC, cumpre observar que o documento novo, previsto no Codex Processual, limita-se àquele que, apesar de existente no curso da ação originária, era ignorado pela parte, ou que, sem culpa do interessado, não pode ser utilizado no momento processual adequado, por motivo de força maior. Outrossim, deve o documento referir-se a fatos que tenham sido alegados no processo original, e ser capaz de, por si só, garantir um pronunciamento favorável.
Preconiza o artigo 485, inciso VII, da Lei Adjetiva Civil, in verbis:
Deste modo, reputa-se documento novo, de molde a ensejar a propositura da ação rescisória, aquele que preexistia ao tempo do julgado rescindendo, cuja existência a parte autora ignorava ou, por razão justificável, não pôde fazer uso durante o curso da ação subjacente.
Além disso, é preponderante que o documento novo seja de tal ordem capaz, por si só, de alterar o resultado do julgado rescindendo, assegurando pronunciamento judicial favorável à parte autora.
A jurisprudência já tem se pronunciado nessa linha de raciocínio, conforme precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: REsp 906740/MT, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, j. 06/09/2007, DJ 11/10/2007, p. 314; AgRg no Ag 569546/RS, Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/08/2004, DJ 11/10/2004, p. 318.
Verifica-se, entretanto, que o teor do documento era de conhecimento da parte autora quando do trâmite da ação subjacente, a qual, todavia, deixou de instruí-la com o referido documento. Nessas situações, não é cabível que se faça uso de documento para subsidiar alegação feita em ação precedente, sob o fundamento de documento novo.
No caso dos autos, a autarquia acosta, como documentos novos, informações do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, tela do PLENUS e processo administrativo de concessão de benefício previdenciário todos em nome do marido da ré, que revelam vínculos de caráter urbano, a partir de 1976 (fl. 16/35), bem como concessão de aposentadoria por tempo de contribuição urbano em nome de seu marido (fl. 14), a partir de novembro/1995.
Não há como alegar o desconhecimento pelo INSS, por ocasião da demanda originária, dos elementos de prova constantes do CNIS e do PLENUS, sistemas de dados pertencentes à própria autarquia, de acesso precípuo de seus agentes, restando manifesta a desídia do instituto, que deixou de lançar mão de elementos imprescindíveis à sua defesa, sem demonstração de qualquer impossibilidade de apresentá-los oportunamente.
Observo que a Ação Rescisória não é recurso com prazo dilatado. Não pode suprir falhas probatórias de ações anteriormente intentadas e deve ser utilizada com parcimônia, atendendo-se ao princípio de que cabe às partes provar os fatos constitutivos do seu direito, sob pena de ofensa ao princípio do devido processo legal.
Todavia, no tocante a alegação de violação a literal disposição de lei, entendo que o pedido do INSS merece procedência.
Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese de rescisão em questão, é certo que o julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.
Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:
No caso vertente, observo que a questão do sistema de provas para a comprovação do labor rural, embora tenha recebido interpretação jurisprudencial controvertida quando da edição da Lei nº 8.213/91, restou pacificada com a edição da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, com o seguinte teor:
Considerando que a sentença rescindenda foi prolatada quando, há muito, a questão já havia sido pacificada, não há falar, na hipótese, em aplicação da Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal.
No caso dos autos, o benefício de aposentadoria por idade rural foi concedido a ré tendo em vista o início de prova material consistente na sua certidão de casamento (fl. 51), celebrado em 21/07/1962, onde seu marido foi qualificado como lavrador. Ocorre que o exame dos autos revela que o cônjuge passou a exercer atividade urbana, a partir de 1976, como empregado em empresa de cerâmica onde permaneceu até 1996, tendo, inclusive, se aposentado como industriário.
A admissão de documento em nome do marido ou companheiro, extensível à mulher, dá-se em consideração ao exercício da atividade que se presume ser comum ao casal. Se o marido deixou a lida rural, não se pode afirmar que a mulher, ora ré, continuou exercendo atividade rural nesse regime. Por outro lado, se a ré passou a exercer a atividade rural independente, há necessidade de que traga para os autos início de prova material dessa condição após o início da atividade urbana de seu marido, o que não é o caso dos autos.
Nesse sentido, convém citar o REsp 1.304.479/SP, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, cuja questão submetida a julgamento foi a repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91, tendo sido firmada a seguinte tese: "Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana" (Tema Repetitivo nº 533. STJ. REsp 1.304.479/SP. Relator Min. Herman Benjamin. Data de afetação 21/03/2012. Julgado em 10/10/2012. Acórdão publicado em 19/12/2012. Trânsito em julgado em 05/03/2013).
Portanto, não existindo outro documento que indique o exercício de atividade rural em período mais recente, posterior ao trabalho urbano do cônjuge ou contemporâneo ao período de carência, a sentença rescindenda incidiu em violação literal ao disposto no artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91.
Caracterizada a hipótese legal do inciso V do artigo 485 do Código de Processo Civil, rescinde-se o julgado questionado.
Realizado o juízo rescindente, passo ao juízo rescisório.
A ré postulou a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, previsto no artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, o qual exige, para a sua concessão, a comprovação do exercício de trabalho rural, ainda que descontinuamente, mas no período imediatamente anterior ao ajuizamento da demanda, em número de meses idêntico à carência desse benefício, dispensando-se a comprovação do efetivo recolhimento das contribuições mensais nesse período.
Em se tratando de trabalhadora rural, a aposentadoria por idade é devida aos 55 (cinquenta e cinco) anos (artigo 48, § 1º, da Lei n.º 8.213/91), tendo a ré completado essa idade em 13/02/2000.
Como já salientado, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei 8.213/91 e do entendimento jurisprudencial consubstanciado na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, para a comprovação do trabalho rural é necessária a apresentação ao menos de início de prova material, corroborável por prova testemunhal. Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
Entretanto, no caso em exame, não restou demonstrado que a ré tenha exercido atividade rural pelo período mencionado.
É certo que a ora ré apresentou cópia de sua certidão de casamento, a qual revela a qualificação de seu marido, em 1962, como lavrador. Todavia, mesmo se entendendo extensível à esposa a qualificação de trabalhador rural constante de documento de seu marido, também se constata dos autos que este, a partir de 1976, passou a exercer atividade de natureza urbana. Tal fato afasta a condição de trabalhadora rural da ora ré.
Além disso, a prova testemunhal mostrou-se frágil e inconsistente (fls. 106/114). Com efeito, as testemunhas, ouvidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, limitaram-se a afirmar que a ré exerceu a atividade rural, entretanto, não souberam precisar os períodos efetivos de trabalho, oferecendo testemunhos vagos e insuficientes para confirmar todo o período de atividade rural até a data do implemento do requisito etário (25/11/1995). Ademais, a prova testemunhal, isoladamente, não se presta à declaração de existência de tempo de serviço rural (Súmula 149, STJ).
Não comprovado o exercício pela ré de atividade rurícola no período equivalente à carência, impossível a concessão da aposentadoria rural por idade prevista no artigo 143 da Lei n.º 8.213/91. Todavia, adotando recente posicionamento do STJ em matéria repetitiva, a precariedade da prova da atividade rural não implica na improcedência do pedido e, sim, na extinção do feito, sem resolução do mérito. Colaciono a tese firmada:
Condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (um mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.
Diante do exposto, julgo procedente o pedido formulado na presente demanda rescisória para desconstituir a decisão monocrática proferida nos autos do Processo nº 0037733-97.97.2013.4.03.9999, e, em juízo rescisório, extinguir o feito, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 267, IV, do Código de Processo Civil/1973.
Oficie-se ao Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Mogi Guaçu/SP, comunicando o inteiro teor deste julgado.
Dê-se ciência ao Ministério Público Federal.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
Data e Hora: | 19/02/2018 17:20:13 |