
| D.E. Publicado em 22/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000273-08.2010.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação rescisória ajuizada por Ruth da Silva Delphino em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com fundamento no artigo 485, incisos V, VII e IX, do Código de Processo Civil de 1973 - violação a literal disposição de lei, documento novo e erro de fato, visando a desconstituição de acórdão da 8ª Turma desta Corte, prolatado na ação nº 2007.03.99.020578-6 (origem 702/2006), que tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Monte Alto/SP.
O v. acórdão rescindendo, reproduzido às fls. 107/113, deu provimento à apelação do INSS e julgou improcedente o pedido inicial do benefício de aposentadoria por idade rural. Referido acórdão foi assim ementado:
Alega a parte autora que a decisão em questão deve ser rescindida, uma vez que aos autos da ação subjacente foi carreado início de prova material suficiente à comprovação de sua condição de rurícola que, aliada à prova testemunhal ali produzida, demonstra o efetivo exercício de atividade rural no período necessário à concessão da aposentadoria por idade rural. Assim, ao julgar improcedente o pedido de concessão do benefício em questão, o acórdão rescindendo incorreu em erro de fato, bem como em violação a literal dispositivo de lei. Alega, ainda, que posteriormente ao trânsito em julgado da decisão em questão, foram obtidos documentos novos que demonstram que ela fazia jus ao recebimento do benefício de aposentadoria rural por idade. A inicial veio acompanhada de documentos (fls. 38/116).
Regularmente citada (fl. 125), a autarquia-ré apresentou contestação (fls. 127/143), alegando, preliminarmente, carência de ação, uma vez que estaria a parte autora utilizando-se da ação rescisória como sucedâneo de recurso. No mérito, pugna pela improcedência do pedido.
Réplica às fls. 179/192.
Instadas, as partes apresentaram alegações finais (fls. 210/219 e 221/226).
O Ministério Público Federal ofertou parecer às fls. 228/233, opinando pela improcedência do pedido em juízo rescindendo.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada em 08/01/2010, ou seja, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.
Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18/03/2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Quanto à matéria preliminar, arguida em contestação, observo que tal questão confunde-se com o mérito da demanda e com ele será analisado.
Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 495 do CPC/1973, considerando a certidão de trânsito em julgado (fl. 115).
A presente ação rescisória tem por base a alegação de ocorrência de violação a literal disposição de lei, documento novo e erro de fato, nos termos do artigo 485, incisos V, VII e IX, do Código de Processo Civil de 1973.
Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese de rescisão com fundamento em violação de lei, hipótese descrita no inciso V, do art. 485, do CPC/1973, é certo que o julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.
Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:
"Art. 485: 20. 'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416. no mesmo sentido: RT 634/93." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 44ª edição, 2012, p. 600).
No presente caso, é patente que a parte autora, ao postular a rescisão do julgado, na verdade busca a reapreciação da prova produzida na demanda subjacente.
Com efeito, verifica-se que o julgado rescindendo apreciou todos os elementos probatórios produzidos no feito subjacente e concluiu não restar comprovada a condição de trabalhadora rural, entendendo não ser possível a concessão do benefício pleiteado.
Oportuno, ainda, lembrar que a ação rescisória não se presta ao debate acerca da justiça ou injustiça da orientação perfilhada pelo julgado rescindendo, conforme a remansosa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
O mesmo se aplica à pretensão de mero reexame de teses já devidamente debatidas no feito subjacente, devendo o pedido rescindente referir-se a ofensa à própria literalidade da disposição que se tem por malferida.
Aqui, portanto, a violação a disposição de lei não restou configurada, resultando a insurgência da autora de mero inconformismo com o teor do julgado rescindendo, que lhe foi desfavorável, insuficiente para justificar o desfazimento da coisa julgada, a teor do que estatui o artigo 485, inciso V, CPC/73, que exige, para tanto, ofensa à própria literalidade da norma, hipótese ausente, in casu.
Também não é possível falar na ocorrência de erro de fato, uma vez que o julgado rescindendo não considerou como inexistente um fato efetivamente ocorrido ou admitiu um fato inexistente, pois houve a resolução da questão expressamente como posta nos autos.
A rescisória não se presta ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos recursos. Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador, o que não ocorreu no presente feito, sendo certo que o acórdão que se pretende rescindir considerou todos os elementos probatórios carreados aos autos. A propósito, segue recente julgado dessa 3ª Seção:
De outra parte, cumpre observar que o documento novo, previsto no Codex Processual, limita-se àquele que, apesar de existente no curso da ação originária, era ignorado pela parte, ou que, sem culpa do interessado, não pode ser utilizado no momento processual adequado, por motivo de força maior. Outrossim, deve o documento referir-se a fatos que tenham sido alegados no processo original, e ser capaz de, por si só, garantir um pronunciamento favorável.
Preconiza o artigo 485, inciso VII, da CPC/73, in verbis:
Deste modo, reputa-se documento novo, de molde a ensejar a propositura da ação rescisória, aquele que preexistia ao tempo do julgado rescindendo, cuja existência a parte autora ignorava ou, por razão justificável, não pôde fazer uso durante o curso da ação subjacente.
É de se salientar que, em relação aos rurícolas, a jurisprudência flexibilizou a exigência de demonstração de que o autor da rescisória ignorava a existência dos documentos novos, ou de que deles não pode fazer uso no momento oportuno, considerando adequada a solução pro misero àqueles que, em situação bastante desigual à de outros trabalhadores, não possuem noções mínimas de seus direitos fundamentais, conforme numerosos precedentes nesse sentido, oriundos desta Corte e do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido:
A improcedência do pedido, em julgado de relatoria da Des. Fed. Therezinha Cazerta, fundamentou-se nos seguintes termos:
Da transcrição acima, verifica-se que o pedido foi julgado improcedente em razão da ausência de início razoável de prova material do alegado serviço rural, uma vez que a condição de trabalhador rural do marido foi descaracterizada pela atividade urbana por ele desempenhada posteriormente, por longo período.
Nestes autos, a parte autora apresentou como documentos novos cópia de certificado de isenção do serviço militar, em nome do marido (fl. 38), expedido em 29/08/1963, sem constar qualificação, apenas registro anotado a lápis "Faz Barreiro Z Rural Monte Alto"; cópia de escritura de imóvel rural (24/09/1962) e de recibo de contribuição sindical rural (24/09/1962), em nome do sogro (fls. 40/45), documentos inservíveis para o fim almejado, uma vez que se referem a período anterior ao início do exercício de trabalho urbano do cônjuge.
Ocorre que apresentou, também, cópia de certidão de nascimento do filho (expedida em 09/02/1968), na qual não só o marido, mas ela própria foi qualificada como lavradeira (fl. 39).
Conforme já mencionado, é considerado documento novo aquele já existente à época da propositura da ação rescindenda e, em razão do princípio "pro misero" aplicado em favor dos rurícolas, este documento em nome próprio, juntado à fl. 39, poderia ser considerado documento novo.
Todavia, é preponderante que o documento novo seja de tal ordem capaz, por si só, de alterar o resultado do julgado rescindendo, assegurando pronunciamento judicial favorável à parte autora.
A jurisprudência já tem se pronunciado nessa linha de raciocínio, conforme precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: REsp 906740/MT, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, j. 06/09/2007, DJ 11/10/2007, p. 314; AgRg no Ag 569546/RS, Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/08/2004, DJ 11/10/2004, p. 318.
E também a doutrina, no tocante ao disposto no novel artigo 966 do CPC/2015 mantém tal entendimento: "Para o cabimento da ação rescisória, a prova nova deve ter a aptidão de, por si só, assegurar um resultado positivo ao autor da ação rescisória, porque de nada vale a desconstituição da decisão se a prova nova não tiver força suficiente de convencimento para que uma eventual nova decisão a ser proferida seja em sentido contrário ao julgamento rescindido (STJ, AR 3.444/PB, 3ª Seção, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 08.08.2007, DJ 27.08.2007), ainda que disso não resulte uma decisão totalmente favorável ao autor da ação rescisória, bastando que melhore sua situação anterior." (Neves, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil; Editora Jus Podium; 2016; p. 1574)
No presente caso, a questão que se põe é se a parte autora teria cumprido os requisitos para concessão da aposentadoria por idade rural.
Ainda que as testemunhas atestem que a parte autora tenha laborado no meio rural, declaram também que seu marido é lavrador, o que torna os depoimentos contraditórios com as demais provas aos autos. Conforme consulta ao CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, o cônjuge da autora possui um vínculo de 01/09/1978 a 31/08/1993 em nome de "José Prisco Bianco", com vínculo de natureza 'urbana' e recolhimentos como facultativo de 01/11/1993 a 31/01/1995 e 01/05/1995 a 30/09/1999, tendo aposentado por idade na qualidade de comerciário, contribuinte individual, com DIB em 01/12/2009. Não há nos autos qualquer documento que comprove o seu retorno à lida rural, bem como que comprove a manutenção da parte autora nessa condição durante o período necessário à concessão do benefício.
Assim, completado o requisito etário em 2001, o documento de 1968 refere-se a período remoto, a ser corroborado apenas por uma prova testemunhal genérica e contraditória. Tal entendimento, inclusive, alinha-se com a tese estabelecida pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 1.354.908/SP (tema 642), submetido ao procedimento dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, em que se firmou: "o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade."
Assim, referido documento não serviria para fins de rescisão da coisa julgada, pois não tem robustez o suficiente para mudar a orientação então adotada. Nesse sentido:
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido formulado nesta ação rescisória, nos termos da fundamentação acima.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Novo Código de Processo Civil/2015, observando-se a suspensão de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 14/08/2018 14:47:16 |
