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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005027-93.2020.4.03.6130 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: GERSON ROSSI Advogados do(a) APELADO: JOSE ALVES DE BRITO FILHO - SP133798-A, TATIANE STEVANATO DA PAZ - SP435224-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OO EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária que objetiva o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/183.402.040-6 (DIB 14/11/17), cessada após auditoria administrativa, que entendeu pela não comprovação do exercício da atividade remunerada, tratando-se de contribuinte individual. A r. sentença, proferida em 22/03/2024, julgou procedente o pedido para condenar o INSS a reconhecer os períodos comuns de 04/2003 a 09/2007 e de 11/2007 a 12/2016 e restabelecer a aposentadoria por tempo de contribuição ao autor desde a data de cancelamento em abril de 2018. Os valores em atraso serão corrigidos monetariamente e acrescidos de mora, nos termos da Manual de Cálculos da Justiça Federal, sendo que os juros deverão incidir de forma englobada em relação as prestações anteriores à citação e, após, deverão ser calculadas mês a mês, de forma decrescente, compensando-se os valores já recebidos. Honorários advocatícios fixados a favor do autor nos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§3º e 4º, inciso II e §5º do CPC, aplicando-se a Súm. 111/STJ. Deferida a antecipação da tutela. Sentença não submetida ao reexame necessário. Inconformado, o INSS interpôs apelação, alegando, em síntese, a possibilidade de revisão do ato administrativo e a necessidade de comprovação da atividade econômica remunerada, na hipótese de recolhimento extemporâneo pelo contribuinte individual. Pugna pela reforma da sentença com a improcedência do pedido. Sem contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta E. Corte. É o relatório.
V O T OO EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: De início, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Passo ao exame. Os princípios básicos da administração pública estão previstos na Constituição Federal (art. 37) e a eles somam-se outros constantes da Carta Magna, de forma implícita ou explícita, mas sempre de indispensável aplicação. A Constituição de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98, estabelece alguns princípios a que se submete a administração pública, tais como os princípios da legalidade, da supremacia do interesse público, da impessoalidade, da presunção de legitimidade, da moralidade administrativa, da publicidade, da motivação. Dentre estes, a observância aos princípios da eficiência, do devido processo legal e da publicidade dos atos é dever que se impõe a todo agente público ao realizar suas atribuições com presteza e rendimento funcional. A inobservância destes princípios remete ao exercício do controle dos atos da Administração, seja pela aplicação do princípio da autotutela com a revisão dos seus próprios atos, revogando-os quando inconvenientes ou anulando-os quando ilegais, seja pela via judicial. Ademais, o Ministério da Previdência Social e o INSS mantêm um programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes, previsto no art. 11 da Lei n° 10.666/03 e regulamentado pelo artigo 179, §1° do Decreto n° 3.048/99. No entanto, nada obsta que o segurado leva ao Poder Judiciário eventual inconformidade. Assim, constata-se dos autos que o INSS em procedimento administrativo de revisão, houve por bem cessar o benefício do autor, em razão da não comprovação da atividade nos períodos de 04/2003 a 09/2007 e de 11/2007 a 12/2016, em que houve recolhimentos como contribuinte individual. A controvérsia que se estabelece versa sobre a comprovação da atividade remunerada, a fim de corroborar as contribuições vertidas extemporaneamente pelo contribuinte individual. De início, considerando que o benefício foi concedido em 14/11/17, aplicável a legislação anterior a EC n. 103/2019, de modo que, consoante previsto no art. 11, V, Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.876/99, incluem-se na categoria de contribuinte individual, “a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não” e aquele que “presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego” (alíneas g e h). Os recolhimentos previdenciários, no caso de contribuinte individual, são efetuados por sua própria iniciativa, nos termos do art. 79, IV, da Lei nº 3.807/60; art. 139, II, do Decreto nº 89.312/84 e art. 30, II, da Lei nº 8.212/91. A partir de 01/04/2003, por disposição expressa da Lei 10.666/2003, se o contribuinte individual prestar serviço à empresa tomadora de serviços, “fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia” (art. 4º). A mesma regra é aplicável tratando-se de cooperativas de trabalho em relação aos associados cooperados contribuintes individuais (art. 4º, §1º). Prevê o art. 5º da Lei 10.666/2003 que nas hipóteses do art. 4º, compete ao contribuinte individual complementar a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem inferiores ao salário mínimo. Cabe igualmente a complementação da contribuição se o contribuinte individual optou pelo recolhimento da contribuição em patamar inferior a 20% (art. 21, §2º, I e II, “a”, Lei 8.212/91) e pretender computar o período como tempo de contribuição para fins de obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição (art. 21, §3º, Lei 8.212/91 e art. 55, §4º, Lei 8.213/91) ou da contagem recíproca do tempo. Assim, se mantidos os recolhimentos abaixo do valor mínimo (salário mínimo), sem complementação, estes não poderão ser considerados para fins de carência, tampouco de tempo de contribuição (art. 195, parágrafo 4º, da Constituição Federal, do art. 29, inciso I, da Emenda Constitucional nº 103/2019 e do art. 19-E do Decreto nº 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto nº 10.410/2020). Comprovado o recolhimento regular das contribuições relativas aos períodos que deseja ver computados, o contribuinte individual faz jus ao cômputo dos períodos como tempo de contribuição e ao aproveitamento do tempo, com vistas à percepção da aposentadoria. Neste sentido: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5014159-10.2023.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 11/09/2024, DJEN DATA: 17/09/2024; APELAÇÃO CÍVEL - 5000204-19.2023.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 28/08/2024, DJEN DATA: 03/09/2024. Descumprido o prazo de recolhimento da contribuição do contribuinte individual, é possível a regularização (I) nos cinco anos posteriores às competências devidas, mediante o recolhimento com atraso, acrescido de multa de mora e juros moratórios (art. 35 c/c art. 45-A, §3º, Lei 8.212/91) e (II) após esse quinquênio, mediante indenização das contribuições na forma prevista no art. 45-A, Lei 8.212/91. Ademais, o art. 216, §12, do Decreto 3.048/99 condiciona o reconhecimento da filiação ao “efetivo recolhimento das contribuições relativas ao período em que for comprovado o exercício da atividade remunerada”. Dessa forma, além do recolhimento das contribuições, há clara exigência de comprovação do efetivo exercício de atividade remunerada, tratando-se de períodos anteriores à inscrição. No caso dos autos, além do pagamento das contribuições, entendo que restou devidamente comprovado o exercício da atividade remunerada, tendo em vista que o autor apresentou seu comprovante de inscrição perante a Ordem do Advogados do Brasil – Seccional São Paulo, além disso juntou extrato de consulta dos processos em que atuou desde 1995 até 2020. O autor acostou ainda comprovantes de pagamento/pro labore conforme se verifica dos ID 293716813 p. 32 e ss e ID 293716818 p. 1 a 67, não se detectando as irregularidades apontadas na revisão administrativa. Dessa forma, faz jus a parte autora ao restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição desde a data da cessação indevida do benefício, devendo ser mantida a r. sentença. As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial. Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2% (dois por cento). Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS. É como voto.E M E N T APREVIDENCIÁRIO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. CESSAÇÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE REMUNERADA. INSCRIÇÃO EM CONSELHO PROFISSIONAL. COMPROVANTES DE PAGAMENTO DE PRO LABORE. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. 1. A controvérsia que se estabelece versa sobre a comprovação da atividade remunerada, a fim de corroborar as contribuições vertidas extemporaneamente pelo contribuinte individual. 2. Consoante previsto no art. 11, V, Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.876/99, incluem-se na categoria de contribuinte individual, “a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não” e aquele que “presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego” (alíneas g e h). 3. Os recolhimentos previdenciários, no caso de contribuinte individual, são efetuados por sua própria iniciativa, nos termos do art. 79, IV, da Lei nº 3.807/60; art. 139, II, do Decreto nº 89.312/84 e art. 30, II, da Lei nº 8.212/91. 4. O art. 216, §12, do Decreto 3.048/99 condiciona o reconhecimento da filiação ao “efetivo recolhimento das contribuições relativas ao período em que for comprovado o exercício da atividade remunerada”. 5. No caso dos autos, além do pagamento das contribuições, restou comprovado o exercício da atividade remunerada, tendo em vista que o autor apresentou sua inscrição em conselho profissional (OAB/SP), juntamente extrato de consulta dos processos em que atuou desde 1995 até 2020, além dos comprovantes de pagamento/pro labore, não se detectando as irregularidades apontadas na revisão administrativa. 6. Mantida a r. sentença, de rigor o restabelecimento do benefício. 7. As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial. 8. Sucumbência recursal do INSS. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARCELO VIEIRA
Relator |
