Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0008494-85.2016.4.03.6105
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/01/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/01/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR
RURAL. RECONHECIMENTO. TERMO INICIAL. DER. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL
AFASTADA.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural pleiteado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º,
e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- A autarquia deverá proceder a revisão da RMI para computar o acréscimo resultante do
reconhecimento do período de atividade rural, considerando o novo tempo de contribuição em
16/12/98, em 28/11/99 e na data do pedido administrativo, implantando o que for de maior valor.
- Os efeitos financeiros da revisão têm como termo inicial a data do requerimento na via
administrativa. Não há que se falar em prescrição quinquenal.
- Apelação autoral parcialmente provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0008494-85.2016.4.03.6105
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOAO MANTOANI FILHO
Advogado do(a) APELANTE: SINVAL MIRANDA DUTRA JUNIOR - SP159517-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008494-85.2016.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOAO MANTOANI FILHO
Advogado do(a) APELANTE: SINVAL MIRANDA DUTRA JUNIOR - SP159517-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: Trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento e conversão de
atividade especial, com vistas à revisão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença, integralizada por embargos de declaração, julgou parcialmente procedente o
pedido para: (i) reconhecer o labor rural desempenhadono interstício de 18/10/1972 a 30/3/1979;
(ii) conceder ao autor a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
pleiteada, a partir da data do requerimento na via administrativa (14/12/2009 - DER), respeitada a
prescrição quinquenal; (iii) fixar os critérios de incidência dos juros e da correção monetária; (iv)
determinar a sucumbência recíproca.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual: (i) pleiteia o reconhecimento
do trabalho rural desempenhado do período de 18/10/1970 a 17/10/1972; (ii) sustenta a não
aplicação da prescrição quinquenal, sob a alegação de que o último ato ocorrido no procedimento
administrativo se deu em 2013; (iii) requer seja observado o princípio do benefício mais vantajoso,
sob o argumento de que em 16/12/1998 já havia preenchido os requisitos exigidos para a
concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, o que possibilitaria o aumento da RMI.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta egrégia corte.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008494-85.2016.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOAO MANTOANI FILHO
Advogado do(a) APELANTE: SINVAL MIRANDA DUTRA JUNIOR - SP159517-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: Conheço da apelação, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Assim, passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
In casu, a controvérsia cinge-se ao reconhecimento da atividade desempenhada junto às lides
campesinas no interstício de 18/10/1970 (quando a parte autora completou 12 anos de idade) a
17/10/1972.
Para comprovar o alegado labor rural foram juntados aos autos os seguintes documentos: (i)
Certidão de casamento dos pais do autor, em que a profissão de seu pai consta como “lavrador”
(1949); (ii) Registros escolares (1977/1/979); (iii) Certidões de nascimento dos irmãos do autor,
nas quais a profissão de seu pai consta como “lavrador”(1956/1969); (iv) Certidão de dispensa de
incorporação (1976); (v) Declaração, emitida pela Secretaria da Educação e Cultura de Alto
Piquiri/PR, em que a profissão de seu genitor consta como “lavrador” (1977).
Conforme se depreende da r. sentença, os testemunhos colhidos sob o crivo do contraditório
corroboraram o mourejo asseverado, sobretudo ao afirmarem o labor desempenhado desde tenra
idade.
A respeito do labor desde criança, entende-se na jurisprudência ser possível o reconhecimento de
tempo de serviço em períodos anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o
trabalhador rural tenha iniciado suas atividades antes dos 14 anos.
Nesse sentido, como não há elementos seguros que apontem o início da atividade, pessoalmente
entendo ser razoável sua fixação na idade de 16 (dezesseis) anos.
Isso porque o próprio Código Civil de 1916, então vigente, em seu artigo 384, VII, autorizava a
realização de serviços pelos filhos menores, desde que adequados a sua idade e condição, sem
que isso configurasse relação de emprego para fins trabalhistas ou previdenciários.
Eis o conteúdo de tal norma:
"Art. 384. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
(...)
V. Representa-los, até aos dezeseis annos, nos actos da vida civil, e assisti-los, após essa idade,
nos actos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento. (Redação dada pelo Decreto do
Poder Legislativo nº 3.725, de 1919).
(...)
VII. Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição."
A mim me parece, dessarte, que as atividades realizadas no campo, ao lado dos pais, pelo menor
de 16 (dezesseis) anos, não poderiam ser computadas para fins previdenciários, ou mesmo
trabalhistas, porquanto não atendidos os requisitos do artigo 3º, caput, da CLT, in verbis:
"Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não
eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário."
Por outro lado, se o menor de 16 (dezesseis) anos realizar atividades rurais para reais
empregadores - isto é, sem assistência dos pais -, nesse caso se deve, juridicamente, reconhecer
a relação de emprego para todos os fins de direito.
Não obstante, o entendimento desta Egrégia Nona Turma é no sentido de que, não havendo
elementos seguros que apontem o início da atividade, deve ser computado o tempo de serviço
desde os 12 (doze) anos de idade.
Tal se dá porque, conquanto histórica a vedação constitucional do trabalho infantil, na década
1960 a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que nossos constituintes
viam, àquela época, como realidade incontestável, que o menor efetivamente desempenhava
atividade no campo ao lado dos pais.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados
Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14
anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser
reconhecida para fins previdenciários." (DJ 25.09.2003).
Joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o labor rural desenvolvido no intervalo de
18/10/1970 (quando a parte autora completou 12 anos de idade) a 17/10/1972,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/91).
Por conseguinte, a autarquia deverá proceder a revisão da RMI do benefício em contenda, para
computar o acréscimo resultante do reconhecimento do supracitado período de atividade rural,
considerado o novo tempo de contribuição em 16/12/98, em 28/11/99 e na data do pedido
administrativo, implantando o que for de maior valor.
Os efeitos financeiros da revisão têm como termo inicial a data do requerimento na via
administrativa (14/12/2009 DER), momento em que a parte autora já possuía o direito ao
recebimento do acréscimo.
Tendo em vista que o requerimento administrativo tramitou até o ano de 2012 - com decisão final
proferida pela Terceira Câmara de Julgamento do Conselho de Recursos da Previdência Social
(Id. 47566547 - fl. 67/69) - e o ajuizamento da presente ação se deu em 2/5/2016, não há que se
falar em prescrição quinquenal.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, cumpre asseverar não ter havido
contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, nos termos da
fundamentação: (i) reconhecer a atividade rural desempenhada no lapso de 18/10/1970 a
17/10/1972, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e
contagem recíproca; (ii) determinar a revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, desde a data do pedido na via administrativa (14/12/2009 DER), considerado o novo
tempo de contribuição em 16/12/98, em 28/11/99 e na data do pedido administrativo, implantando
o que for de maior valor; (iii) afastar a prescrição quinquenal.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR
RURAL. RECONHECIMENTO. TERMO INICIAL. DER. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL
AFASTADA.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural pleiteado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º,
e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- A autarquia deverá proceder a revisão da RMI para computar o acréscimo resultante do
reconhecimento do período de atividade rural, considerando o novo tempo de contribuição em
16/12/98, em 28/11/99 e na data do pedido administrativo, implantando o que for de maior valor.
- Os efeitos financeiros da revisão têm como termo inicial a data do requerimento na via
administrativa. Não há que se falar em prescrição quinquenal.
- Apelação autoral parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
