
| D.E. Publicado em 14/09/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, reconhecer de ofício erro material e, em novo julgamento, dar parcial provimento ao agravo legal da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028433-19.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de ação previdenciária com vistas à revisão da renda mensal inicial de benefício previdenciário com a inclusão de período de labor nocivo entre 19/08/1980 a 18/03/1997, com conversão em comum.
A sentença reconheceu a decadência do direito à revisão da renda mensal inicial do benefício do autor.
Apelou o demandante requerendo a reforma da sentença e a análise do pedido inicial sob o argumento de que não operada a decadência do direito à revisão pretendida.
Em julgamento monocrático de fls. 121/122, nos termos do artigo 557 do CPC, negou-se seguimento à apelação.
Agravou a parte autora e em sessão realizada em 17/02/2014, a C. Nona Turma desta Corte, por unanimidade, negou provimento ao recurso, restando mantida integralmente a decisão monocrática.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 136/138).
O autor interpôs recurso especial.
Em razão do decidido no RE n. 626.489/SE-STF e RESP nº1.309.529/PR e RESP nº 1.326.114/SC vieram-me os autos em obediência à disposição do artigo 543-C do Código de Processo Civil (fls. 159/160).
É o relatório.
VOTO
Trata-se de demanda previdenciária em que se pleiteia o recálculo da renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por tempo de serviço concedido em 19/03/1997, com vistas à inclusão do período de 18/08/1980 a 18/03/1997 como labor especial.
Após a interposição de recurso especial retornaram-me os autos para o reexame disposto no artigo 543-C do Código de Processo Civil.
No caso vertente, às fls. 136/138, negou-se provimento ao agravo interposto pelo autor contra a decisão monocrática que negou seguimento à sua apelação mantendo integralmente a sentença que reconheceu a decadência do direito à revisão requerida.
Assim, tendo em vista o advento do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça, incide a norma prevista no artigo 543 -C, §7º, inciso II e §8º, do Código de Processo Civil, com redação dada pela Lei n. 11.672/08:
Por força do juízo de retratação, com fundamento no art. 543-C, em reanálise dos documentos coligidos aos autos, constato que assiste razão à parte autora, uma vez que o acórdão recorrido incidiu em evidente erro material.
A concessão administrativa do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição foi deferida ao autor em 19/03/1997 (fl.09), sendo que em 23/05/1997 foi protocolizado recurso administrativo pleiteando a revisão administrativa (fl.39).
Os documentos colacionados às fls. 40 e 48 dos autos demonstram que o recurso administrativo protocolizado sob o nº 35383.001687/97-51, na data de 03/10/2007 ainda não havia sido definitivamente julgado.
A presente ação foi ajuizada em 09/10/2008, na pendência do julgamento do recurso administrativo, razão pela qual não há que se falar em decadência do direito do autor a obter a revisão desejada, situação essa que demonstra evidente erro material no v. acórdão recorrido (fls. 136/138), o qual passo à retificação.
DO PERÍODO DE 18/08/1980 A 18/03/1997
Sobre a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais, o art. 70, §1º do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048, de 06.05.99), com a redação dada pelo Decreto nº 4.827, de 03.09.03, dispõe que "[a] caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço", enquanto o §2º, por sua vez, explica que "[a]s regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período".
Da leitura desses parágrafos depreende-se que a caracterização e a comprovação do tempo de atividade especial devem levar em consideração a legislação vigente à época em que exercida tal atividade e que não há limitação ao reconhecimento do tempo de atividade especial. Com efeito, quanto a este último tópico, o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005, dispõe que é vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar. Assim, não poderia haver a limitação temporal ao reconhecimento do exercício de atividade especial.
Ademais, incontestável o direito à conversão do tempo de trabalho especial, independentemente de o segurado possuir ou não direito adquirido, em qualquer período.
Ressalte-se que, antes da edição da Lei 9.032/95 era suficiente que a atividade desenvolvida estivesse enquadrada como especial em ato do Poder Executivo (Anexo do Decreto nº 53.831/64 e Anexos I e II do Decreto nº 83.080/79, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611/92).
Posteriormente, a Lei 9.032, de 29.04.95, deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91, com alteração dos seus §§ 3º e 4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, o que se deve comprovar através de formulário próprio (STJ - AgRg no AREsp 295495/AL, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, Dje 15.04.13).
A exigência de laudo técnico das condições ambientais de trabalho para a caracterização de atividade penosa, insalubre ou perigosa, somente passou a existir com a entrada em vigor da Lei nº 9.528, de 10.12.97, salvo quanto aos agentes agressivos ruído, calor e poeira, para os quais o laudo sempre foi necessário.
Assim, o segurado possui direito de ter reconhecido, com base na categoria profissional ou pela exposição, comprovada através de SB 40, a qualquer dos agentes nocivos descritos nos Anexos dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, o labor especial por ele desenvolvido até 29.04.95 - advento da Lei 9.032/95 (excetuados, como anteriormente asseverado, os agentes ruído, calor e poeira).
Para período posterior a 29.04.95 deverá ser apresentado formulário DSS 8030 (antigo SB 40), sem imposição de que tal documento se baseie em laudo pericial, por gozar da presunção de que as condições de trabalho descritas o foram em condições nocivas (com exceção, não olvidemos, dos agressores ruído, calor e poeira).
A partir de 10.12.97, data da entrada em vigor da Lei 9.528/97, torna-se necessária a apresentação de laudo técnico.
Por fim, cumpre trazer a lume a figura do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), criada pela Lei nº 9.528/97, com vistas a revelar as características de cada vínculo empregatício do segurado e facilitar o futuro reconhecimento de atividades insalubres.
Desde que identificado, em tal documento, o engenheiro ou médico responsável pelas condições de trabalho, é possível a sua utilização como substituto do laudo pericial, em qualquer época. Neste sentido, precedentes deste Egrégio Tribunal: 10ª Turma, AC nº 2006.61.09.006640-9, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, j. 07.12.10, DJF3 15.12.2010, p. 613; 10ª Turma, AC nº 2008.03.99.033957-6, Rel. Juíza Convocada Giselle França, j. 05.08.08, DJF3 20.08.08.
Quanto à utilização do equipamento de proteção individual - EPI, o STF já se manifestou, em sede de repercussão geral, no seguinte sentido:
Extrai-se do inteiro teor do referido julgamento que o C. STF, ao pacificar a questão acerca do uso do EPI para fins de caracterização ou não da natureza especial da atividade, assentou um norte interpretativo a respeito desse tema constitucional, no sentido de que a natureza especial decorre da relação entre o agente agressivo e o trabalhador, de forma que quando houver comprovação do efetivo uso de EPI pelo trabalhador, bem como, de que ele é capaz de neutralizar todos os efeitos prejudiciais à sua saúde, constitucionalmente não se justifica considerar o trabalho como especial.
Restou evidenciado no julgamento, de forma a nortear a Administração e o Judiciário, que divergências ou dúvidas sobre a eliminação dos prejuízos ou riscos à saúde ou à integridade física pelo uso do Equipamento de Proteção Individual não obstariam o reconhecimento do direito do segurado ao reconhecimento das condições especiais de labor, vez que a utilização do EPI pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.
Extrai-se, ainda mais, que o C. STF, embora assentando este critério interpretativo geral, resolveu não se manifestar sobre toda a multiplicidade de agentes agressivos que podem dar ensejo ao tempo de serviço especial, por depender de múltiplos e complexos aspectos técnicos, tendo decidido naqueles autos especificamente apenas com relação ao agente agressivo ruído (para assentar que o uso de EPI não afasta a especialidade porque não neutraliza os efeitos prejudiciais sobre o trabalhador), conforme se extrai do inteiro teor do acórdão, no voto do eminente Ministro Roberto Barroso (p. 63), in verbis:
A despeito disso, como exposto, o C. STF estabeleceu o critério interpretativo geral, com fundamento constitucional, e o fez em sede de repercussão geral, por isso devendo ser seguido em todos os julgamentos acerca do tema, por todas as instâncias judiciais inferiores.
Conclui-se da orientação trazida, em sede de repercussão geral, no julgamento do ARE 664335 do C. STF que, apenas a comprovação da neutralização pelo efetivo uso do EPI do agente nocivo ao que o segurado estava exposto pode afastar o reconhecimento do labor exercido em condições especiais, sendo que eventuais dúvidas na documentação apresentada devem ser interpretadas em favor do segurado/trabalhador.
Deste modo, adotando tal entendimento, esclareço que nos casos de exposição ao agente nocivo ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) ou do Laudo Técnico Pericial, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria.
Para todos os demais agentes nocivos, conforme orientação da Suprema Corte, se comprovado o efetivo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), bem como, a capacidade de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
Para tanto, é imprescindível que o segurado traga aos autos a documentação hábil, descrita na legislação específica, ou seja, em síntese: que tenha sido elaborada por pessoa habilitada; que descreva o agente agressivo a que esteve exposto e sob quais condições; que contenha descrição do tipo de equipamento utilizado; que demonstre a intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador; bem como que certifique o efetivo uso do EPI pelo empregado.
Assim, se o PPP ou o laudo técnico apresentado atestam que o trabalhador exerceu atividade exposto a agentes nocivos capaz de caracterizar a sua natureza especial, tais documentos devem, subsequentemente, também trazer informações sobre a real utilização do EPI pelo empregado e se o uso do equipamento, estabelecido nos termos da NR-06, se deu de forma a neutralizar o agente nocivo.
Desta feita, a declaração do empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário de que o uso de EPI é eficaz, por si só, não é suficiente para descaracterizar a atividade especial. Independentemente da eficácia do equipamento, devem ser levados em consideração outros fatores e condições relevantes a fim de comprovar a neutralização da nocividade ao trabalhador.
Observe-se que se o segurado se desincumbe regularmente de seu ônus de apresentar a documentação comprobatória do exercício de atividade exposta a fatores de risco, nos termos do que é exigido pela legislação específica, eventual dúvida decorrente da falta de informação precisa, nesta documentação, acerca do uso efetivo do EPI ou da capacidade de neutralização dos riscos advindos do agente agressivo para o trabalhador, hão de ser interpretadas em favor deste, portanto, não descaracterizando a natureza especial da atividade desenvolvida.
AGENTE AGRESSIVO RUÍDO
Quanto ao agente ruído, a jurisprudência é tranquila no sentido de que, na vigência do Decreto nº 53.831, de 25.03.64 e até o advento do Decreto nº 2.172/97, somente podia ser entendida como especial a atividade sujeita a nível de ruído superior a 80 dB; a partir de 05.03.97, somente a função com exposição a ruído superior a 90 dB e desde a edição do Decreto nº 4.882, de 18.11.03 a atividade submetida a ruído superior a 85 dB.
Esse entendimento está consolidado na Súmula nº 32 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais:
Ademais, nesse sentido, o seguinte julgado:
CASO CONCRETO
Pretende a parte autora o reconhecimento da nocividade em relação ao período de 18/08/1980 a 18/03/1997 em que laborou na empresa Daimlercrysler do Brasil LTDA, com exposição a ruído superior a 80 dB.
Apresentados os perfis profissiográficos previdenciários- ppp's emitidos pela empresa em 29/03/2007 e 02/07/2007, por força de carta de exigência da Autarquia emitida em 06/05/2007 (fl.40).
No caso, é possível o enquadramento como especial do período de 18/08/1980 a 18/03/1997, com conversão em comum, nos termos do código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79 (ruído), devendo a Autarquia Previdenciária proceder a revisão do benefício.
Considero que o termo inicial da revisão deve ser fixado a partir da data de citação (15/04/2009-fl.71), uma vez que os documentos que justificam o reconhecimento do labor nocivo foram emitidos somente em 2007 e, portanto, não integraram o processo administrativo que ensejou a concessão em 19/03/1997.
JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA
Visando à futura execução do julgado, observo que sobre as prestações vencidas incidirá correção monetária, nos termos da Lei nº 6.899, de 08.4.1981 (Súmula nº 148 do Superior Tribunal de Justiça), e legislação superveniente, a partir de cada vencimento (Súmula nº 8 do Tribunal Regional Federal da Terceira Região). Sobre esses valores incidirão juros de mora à taxa de 0,5% (meio por cento) ao mês, a partir da citação, por força do art. 1.062 do Código Civil anterior e art. 219 do Código de Processo Civil. A partir do novo Código Civil, serão devidos no percentual de 1% (um por cento) ao mês, nos termos do art. 406 deste último diploma, e do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. Após a Lei 11.960, de 29.06.2009, deve ser utilizada a taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, conforme seu art. 5º, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97. (STJ - SEXTA TURMA, REsp 1099134/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, julgado em 08/11/2011, DJe 21/11/2011). Cumpre observar que os critérios acima delineados devem ser consoantes com o decidido pelo STF nas ADIs 4.357 e 4.425, com efeitos já modulados em 25.03.2015.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, entendida esta como a somatória das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, cujo enunciado foi modificado pela Terceira Seção em 27/09/2006 para que constasse expressamente que, nas ações previdenciárias, os honorários advocatícios não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
A autarquia está isenta de custas e despesas processuais, exceto as eventualmente dispendidas pela parte autora.
Diante do exposto, em juízo de retratação, nos termos do art. 543-C do CPC, CORRIJO, DE OFÍCIO, ERRO MATERIAL e em novo julgamento, recebo os embargos de declaração do autor como agravo e lhe dou parcial provimento para reconhecer o labor especial de 18/08/1980 a 18/03/1997 e para condenar o INSS ao recálculo do seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da citação.
É o voto.
SOUZA RIBEIRO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 02/09/2015 20:17:35 |
