D.E. Publicado em 10/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, conhecer das apelações das partes para dar parcial provimento ao recurso do autor e negar provimento ao apelo do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004957-15.2015.4.03.6106/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de atividade especial, bem como o recálculo dos salários-de-contribuição adotados no período básico de cálculo, para fins de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença acolheu em parte o pedido, à luz do NCPC, apenas para incluir a competência dez./2003 no PBC do benefício do autor, relativa à retirada do pro labore e que deixou de compor o salário-de-contribuição; ademais, fixou os consectários e a sucumbência integral a cargo do autor, sem justiça gratuita.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformado, o autor apelou, exorando a reforma para enquadramento dos lapsos especiais afastados pelo julgado e recomposição do PBC com base na remuneração do pro labore de 2003 a 2005.
Também inconformada, a autarquia apresentou apelação defendendo a decadência do direito de revisão da prestação previdenciária.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos apelos manejados pelas partes, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Contudo, não conheço da remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na vigência do NCPC, cujo artigo 496, §3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
Em relação à decadência, dispõe o artigo 103 da Lei n. 8.213/91:
O prazo decadencial para que o segurado possa requerer a revisão ou a alteração de sua RMI foi introduzido no direito positivo em 27/6/1997, data da entrada em vigor da Medida Provisória nº 1.523-9/1997.
Tal medida provisória criou a decadência do direito de requerer a revisão do ato de concessão do benefício previdenciário, inicialmente com prazo de 10 (dez) anos, passando a 5 (cinco) anos em 20/11/1998, e voltando a ser de 10 (dez) anos em 20/11/2003.
Até tempos atrás, muitos entendiam que a Medida Provisória nº 1.523-9 não poderia ser aplicada aos benefícios concedidos anteriormente à sua vigência, com base em decisões proferidas no Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, melhor analisando a situação, compreendeu-se que não aplicar a regra da decadência aos benefícios concedidos anteriormente a 1997 seria eternizar as demandas de revisão, violando, de plano, a segurança jurídica.
Evidentemente, outrossim, que se não podem prejudicar os segurados anteriores por norma posterior, acabando repentinamente com a possibilidade de revisão.
Assim, harmonizando o direito em questão de modo a assegurar a isonomia entre os segurados, pode-se entender que, para os benefícios com DIB anterior a 27/6/1997, data da nona edição da Medida Provisória nº 1.523-9, o prazo de decadência também deve iniciar-se a partir da vigência da nova norma, uma vez que com sua publicação, passou a ser de conhecimento de todos.
Neste sentido, decidiu recentemente a Turma Nacional de Uniformização do JEF:
Trago, ainda, precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
No mesmo sentido, o Plenário do C. STF, no julgamento o RE n. 626.489, sob regime de repercussão geral, dirimiu definitivamente a questão ao considerar constitucional a aplicação da MP n. 1.523-9 aos benefícios anteriores a 28 de junho de 1997, pois, além dos imperativos de justiça e segurança jurídica, o regime geral de previdência seria um sistema de seguro, no modelo de repartição simples, a significar a necessidade de diluição de todas as despesas entre os segurados, com base na solidariedade.
Ademais, o entendimento consolidado pelo Supremo no julgamento do RE n. 630.501 quanto à preservação do direito adquirido, sempre que preenchidos os requisitos para gozo de determinado benefício, ressalvou expressamente a observância dos institutos da decadência e da prescrição.
A propósito, transcrevo o trecho do v. acordão (g. n.):
Na espécie, considerando a DIB do benefício do autor, 1/11/2005, o efetivo pagamento da primeira prestação, dezembro de 2005, e o aforamento da causa em 9/9/2015, entendo não ter se esvaído a potestade revisional pelo decurso do prazo decadencial, lembrando ser o ajuizamento o marco regulatório, não a citação, como entende o réu.
Afasto, portanto, a prejudicial de decadência.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era viável até a entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual passo a adotar, tanto no âmbito desta Corte quanto no C. STJ, assentou-se no sentido de permitir o enquadramento apenas pela categoria tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, 2ªT, julgado em 6/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
O autor reivindica o enquadramento dos lapsos de 21/3/1966 a 29/8/1966 (aprendiz de sapateiro), de 2/6/1969 a 1/10/1973 (auxiliar de torno), de 1/12/1973 a 28/3/1977 (torneiro soldador), de 20/12/1977 a 27/4/1980 (torneiro mecânico) e de 28/4/1980 a 15/5/1990 (torneiro mecânico).
Em relação à ocupação de torneiro, coligiu formulário padrão, respaldado em CTPS, consignando o desenvolvimento das funções em estabelecimento industrial, fato que permite o reconhecimento, em razão da atividade, até 28/4/1995, nos códigos 2.5.1 e 2.5.3 do anexo do Decreto n. 83.080/79, bem como nos termos da Circular n. 15 do INSS, de 8/9/1994, a qual determina o enquadramento das funções de ferramenteiro, torneiro mecânico, fresador e retificador de ferramentas, no âmbito de indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do anexo II do Decreto n. 83.080/79.
Nesse sentido, destaco os seguintes arestos (g. n.):
Já no que tange à ocupação de aprendiz de sapateiro, a despeito de ostentar certa carga insalubre, em razão da exposição a agentes nocivos inerentes à profissão, como "cola de sapateiro" (hidrocarboneto tóxico), não encontra previsão nos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979.
Por não constar na lista de ocupações dos regulamentos, não se podendo presumir a manipulação com os hidrocarbonetos aromáticos, cabia ao autor a devida comprovação, mediante formulários e laudos descritivos da potencialidade nociva das atribuições, situação não apurada nestes autos.
Portanto, insta reconhecer a contagem diferenciada apenas em relação aos intervalos de 2/6/1969 a 1/10/1973, de 1/12/1973 a 28/3/1977, de 20/12/1977 a 27/4/1980 e de 28/4/1980 a 15/5/1990.
Recolhimentos sobre pró-labore
Assim dispõe o artigo 201, §5º, I e II, do Decreto n. 3.048/99 acerca da contribuição da empresa em relação aos sócios contribuintes individuais:
É o que se extrai também do escólio dos doutrinadores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari (Manual de Direito Previdenciário, 20ª ed., p. 190, Forense): "... de acordo com o § 5º do art. 201 do Regulamento da Previdência Social, para efeito de incidência de contribuição patronal sobre os valores pagos ou creditados a sócios, serão considerados não apenas os valores pagos em decorrência do trabalho (pro labore), mas também os valores totais pagos ou creditados aos sócios, ainda que a título de antecipação de lucro da pessoa jurídica, quando não houver discriminação entre a remuneração decorrente do trabalho e a proveniente do capital social ou tratar-se de adiantamento de resultado ainda não apurado por meio de demonstração de resultado do exercício".
Na situação em tela, a par da discussão sobre o alcance, ou não, do teto de algumas contribuições na memória que serviu de cálculo para a aposentadoria do autor (f. 74), as guias GPSs acostadas às fs. 68/73 revelam o efetivo recolhimento sobre as retiradas do pró-labore do segurado durante as competências abril, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro de 2004, janeiro, fevereiro e julho de 2005, sendo factível sua incorporação aos salários-de-contribuição utilizados na composição da RMI, respeitado o limite legal disposto no §4º do art. 29 e art. 33 da Lei 8.213/91.
Por outro giro, o autor não logrou comprovar as contribuições vertidas sobre sua remuneração no tocante às competências janeiro, fevereiro, maio, de julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2003, descabendo a revisão vindicada.
Nesse sentido:
Destarte, cumpre incluir os recolhimentos, sobre o pró-labore, realizados nas competências abril, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro de 2004, janeiro, fevereiro e julho de 2005, aos salários-de-contribuição utilizados na composição da RMI do autor, respeitado o limite legal disposto no §4º do art. 29 e art. 33 da Lei 8.213/91.
Dos consectários
Quanto à correção monetária, deve ser adotada nos termos da Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (cf. Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente, observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, sendo vedada a compensação pela novel legislação, deverá ser observada a proporcionalidade à vista do vencimento e da derrota de cada parte, conforme critérios do artigo 85, caput e §14, do NCPC.
Assim, condeno o INSS a pagar honorários ao advogado da parte contrária, que arbitro em 7% (sete por cento) sobre o valor da condenação, a incidir sobre as prestações vencidas até a data da sentença, e condeno a parte autora a pagar honorários de advogado ao INSS, fixados em 3% (três por cento) sobre a mesma base de cálculo.
Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial e conheço das apelações das partes; dou parcial provimento ao apelo do autor para, nos termos da fundamentação desta decisão: (i) determinar o enquadramento dos períodos de tempo especial de 2/6/1969 a 1/10/1973, de 1/12/1973 a 28/3/1977, de 20/12/1977 a 27/4/1980 e de 28/4/1980 a 15/5/1990; (ii) incorporar aos salários-de-contribuição, utilizados na composição da RMI, os recolhimentos sobre o pró-labore relativos às competências abril, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro de 2004, janeiro, fevereiro e julho de 2005, respeitado o limite legal disposto no §4º do art. 29 e art. 33 da Lei 8.213/91; (iii) discriminar, por consequência, a forma de aplicação dos consectários. Nego provimento ao apelo do INSS. Mantida, de resto, a r. sentença recorrida.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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