Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0002448-42.2020.4.03.6331
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
12/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 19/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APTC. REVISÃO. RECONHECIMENTO DE PERÍODOS ESPECIAIS.
SOLDADOR. CTPS. RECONHECIMENTO. CONSTRUÇÃO EDIFÍCIOS E BARRAGENS.
RECONHECIMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. AGENTES QUÍMICOS GENÉRICOS.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Para a comprovação da atividade especial com base na categoria profissional até o advento da
Lei n. 9.032/95 pode ser feita exclusivamente pela anotação da função na CTPS.
2. Servente e montador industrial em construção civil pesada, atividade especial prevista no item
2.3.3 do Anexo II do Decreto n. 53.831/64 (edifícios, barragens, pontes e ou torres).
3. O Tema 174/TNU determina que é necessário, para o período laborado após 18/11/2003, que
haja a indicação de aferição do ruído através das metodologias constantes da NHO-01 ou da NR-
15.
4. A exposição ocasional a agentes nocivos afasta o reconhecimento da atividade como especial.
5. Recurso a que se dá parcial provimento.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002448-42.2020.4.03.6331
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: MANOEL LOURENCO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002448-42.2020.4.03.6331
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: MANOEL LOURENCO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte Autora (21) da sentença que julgou
improcedente o pedido de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição mediante o
reconhecimento de tempo laborado em condições especiais.
O pedido versa sobre a averbação dos seguintes períodos de atividade especial 30/10/1986 a
15/09/1987, 18/05/1988 a 29/11/1988, 08/12/1988 a 10/04/1989, 23/04/1989 a 02/05/1990,
03/06/1991 a 03/07/1991, 05/03/1992 a 11/11/1992, 06/03/1997 a 21/01/2002 e 01/04/2009 a
05/08/2015.
Razões do Autor repisando os termos da inicial alegando que a CTPS, formulários e PPP
anexados demonstram a exposição a agentes nocivos de modo habitual e permanente.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002448-42.2020.4.03.6331
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: MANOEL LOURENCO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: RAYNER DA SILVA FERREIRA - SP201981-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando o artigo 1.013 do Código de Processo Civil, o recurso devolve a instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
Da caracterização do exercício da Atividade Especial.
Quanto aos critérios legais para o enquadramento, como especiais, das atividades sujeitas ao
Regime Geral de Previdência Social - RGPS, os arts. 58 e 152 da Lei n.º 8.213/91, em sua
redação original, estabeleceram que a relação das atividades consideradas especiais, isto é,
das “atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física”, seria objeto de lei
específica e que, até o advento dessa lei, permaneceriam aplicáveis as relações de atividades
especiais que já vigoravam antes do advento da nova legislação previdenciária.
Assim, por força dos referidos dispositivos legais, continuaram a vigorar as relações de
atividades especiais constantes dos quadros anexos aos Decretos n.º 53.831/64 e 83.080/79,
conforme expressamente reconhecido pelos sucessivos regulamentos da Lei n.º 8.213/91 (cf.
art. 295 do Decreto n.º 357/91, art. 292 do Decreto n.º 611/92 e art. 70, parágrafo único, do
Decreto n.º 3.048/99, em sua redação original).
O fundamento para considerar especial uma determinada atividade, nos termos dos Decretos
n.º 53.831/64 e 83.080/79, era sempre o seu potencial de lesar a saúde ou a integridade física
do trabalhador em razão da periculosidade, penosidade ou insalubridade a ela inerente. Os
referidos decretos classificaram as atividades perigosas, penosas e insalubres por categoria
profissional e em função do agente nocivo a que o segurado estaria exposto. Portanto, uma
atividade poderia ser considerada especial pelo simples fato de pertencer o trabalhador a uma
determinada categoria profissional ou em razão de estar ele exposto a um agente nocivo
específico.
Tais formas de enquadramento encontravam respaldo não apenas no art. 58, como também no
art. 57 da Lei n.º 8.213/91, segundo o qual o segurado do RGPS faria jus à aposentadoria
especial quando comprovasse período mínimo de trabalho prejudicial à saúde ou à atividade
física “conforme a atividade profissional”. A Lei n.º 9.032/95 alterou a redação desse dispositivo
legal, dele excluindo a expressão “conforme a atividade profissional”, mas manteve em vigor os
arts. 58 e 152 da Lei n.º 8.213/91.
A prova da exposição a tais condições foi disciplinada por sucessivas instruções normativas
baixadas pelo INSS, a última das quais é a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010. Tais
regras tradicionalmente exigiram, relativamente ao período em que vigorava a redação original
dos arts. 57 e 58 da Lei n.º 8.213/91, a comprovação do exercício da atividade especial por
meio de formulário próprio (SB-40/DSS-8030), o qual, somente no caso de exposição aos
agentes nocivos ruído e calor, deveriam ser acompanhados de laudo pericial atestando os
níveis de exposição.
Com o advento da Medida Provisória n.º 1.523/96, sucessivamente reeditada até sua ulterior
conversão na Lei n.º 9.528/97, foi alterada a redação do art. 58 e revogado o art. 152 da Lei n.º
8.213/91, introduzindo-se duas importantes modificações quanto à qualificação das atividades
especiais: (i) no lugar da “relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à
integridade física” passaria a haver uma “relação dos agentes nocivos químicos, físicos e
biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física”, e (ii) essa
relação não precisaria mais ser objeto de lei específica, atribuindo-se ao Poder Executivo a
incumbência de elaborá-la.
Servindo-se de sua nova atribuição legal, o Poder Executivo baixou o Decreto n.º 2.172/97, que
trouxe em seu Anexo IV a relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos a que
refere a nova redação do art. 58 da Lei n.º 8.213/91 e revogou, como consequência, as
relações de atividades profissionais que constavam dos quadros anexos aos Decretos n.º
53.831/64 e 83.080/79. Posteriormente, o Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 foi substituído pelo
Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, que permanece ainda em vigor.
Referida norma, mediante a introdução de quatro parágrafos ao art. 58 da Lei n.º 8.213/91,
finalmente estabeleceu regras quanto à prova do exercício da atividade especial. Passou então
a ser exigida por lei a apresentação de formulário próprio e, ainda, a elaboração, para todo e
qualquer agente nocivo (e não apenas para o caso de ruído), de laudo técnico de condições
ambientais do trabalho expedido por profissional habilitado (médico do trabalho ou engenheiro
de segurança do trabalho).
Em relação ao enquadramento por atividade profissional, na alteração materializada pela Lei
9.032/95, editada em 28/04/1995, deixou-se de reconhecer o caráter especial da atividade
prestada com fulcro tão somente no enquadramento da profissão na categoria respectiva,
sendo mister a efetiva exposição do segurado a condições nocivas que tragam consequências
maléficas à sua saúde, conforme dispuser a lei.
Posteriormente, com a edição da MP nº 1.523-9/97, reeditada até a MP nº 1.596-14/97,
convertida na Lei 9.528, que modificou o texto, manteve-se o teor da última alteração (parágrafo
anterior), com exceção da espécie normativa a regular os tipos de atividades considerados
especiais, que passou a ser disciplinado por regulamento.
Da análise da evolução legislativa ora exposta, vê-se que a partir de 28/04/1995, não há como
se considerar como tempo especial o tempo de serviço comum, com base apenas na categoria
profissional do segurado.
Desta forma, para períodos até 28.04.1995, é possível o enquadramento por categoria
profissional, sendo que os trabalhadores não integrantes das categorias profissionais poderiam
comprovar o exercício de atividade especial tão somente mediante apresentação de formulários
(SB-40, DISES-BE 5235, DSS-8030 e DIRBEN 8030) expedidos pelo empregador, à exceção
do ruído e calor, que necessitam de laudo técnico; de 29.04.1995 até 05.03.1997, passou-se a
exigir a exposição aos agentes nocivos, não mais podendo haver enquadramento com base em
categoria profissional, exigindo-se a apresentação de formulários emitidos pelo empregador
(SB-40, DISES-BE 5235, DSS-8030 e DIRBEN 8030), exceto para ruído e calor, que
necessitam de apresentação de laudo técnico; e a partir de 06.03.1997, quando passou a ser
necessária comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos mediante
formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base
em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou
engenheiro de segurança do trabalho, em qualquer hipótese.
Contudo, a presença do agente nocivo nas condições de trabalho, por si só, não caracteriza a
atividade como especial para fins previdenciários. Além da sua presença é imprescindível que a
exposição tenha ocorrido de modo habitual e permanente e que não tenha sido utilizado
Equipamentos de Proteção Coletiva ou Individual eficazes.
Da necessidade de habitualidade e permanência da exposição aos agentes nocivos.
A Lei 9.032/95, acrescentou o § 3º do art. 57 à Lei 8.213/91, dizendo da necessidade de
habitualidade, permanência e não intermitência da exposição aos agentes nocivos. Como
leciona Fernando Vieira Marcelo, Aposentadoria Especial, 2ª Edição, 2013, Ed.JHMIZUNO, “se
as atividades cuja exposição à nocividade forem alternadas em atividade especial e atividade
comum passam a não ser mais atividade insalubre no âmbito previdenciário”.
A propósito, confira-se o seguinte julgado do E. TRF da 3a Região:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO PREVISTO NO § 1º DO ART.557 DO
C.P.C.. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL NÃO
COMPROVADA. I - Restou consignado na decisão agravada que a jurisprudência vem
adotando o entendimento no sentido de que pode, em tese, ser considerada especial a
atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em
razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a
caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-
8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica. II - O adicional de
insalubridade/periculosidade não serve, por si só, para contagem de tempo de forma
diferenciada para fins previdenciários, que exige exposição habitual e permanente a agentes
nocivos prejudiciais à saúde ou o exercício de atividade tida por perigosa ou risco inerente a
processo produtivo/industrial, situação esta não configurada no caso em análise. III - Agravo da
parte autora improvido (art.557, § 1º, do C.P.C.).” (AC 00127146720084036183, Décima Turma,
rel. Desembargador Federal Sérgio Nascimento, e-DJF3 Judicial 1 19/02/2014).
Do uso eficaz de Equipamentos de Proteção Coletivo e Individual.
No que se refere ao uso de tecnologias de proteção aptas a atenuar os efeitos do agente
nocivo, a MP n.º 1.523/96 passou a exigir que constassem do laudo técnico informações
relativas ao uso de equipamentos de proteção coletiva (EPCs).
Em relação aos Equipamentos de Proteção Individual, tal regulamentação somente pode ser
aplicada ao período trabalhado após a entrada em vigor da Lei 9.732/98, em 14/12/1998, que
estabeleceu a exigência de informações acerca da eficácia dos equipamentos no laudo pericial
que embasa o PPP.
Neste sentido, trago o seguinte julgado do E. TRF da 3a Região:
“APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE
ESPECIAL ANTERIOR A 5/3/1997 COM BASE EM PPP - POSSIBILIDADE - UTILIZAÇÃO DE
EPI EFICAZ - AUSENTES OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA
POR TEMPO DE SERVIÇO. I. A existência de Equipamento de Proteção Individual - EPI, desde
que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade, poderá excluir o enquadramento da
atividade especial somente a partir da vigência da Lei n. 9.732, em 14/12/1998, quando foi
inserida na legislação previdenciária a exigência de que essa informação constasse do
respectivo laudo técnico. II. O PPP, desde que devidamente preenchido e constando o
responsável legalmente habilitado para a aferição dos fatores de risco, é possível a sua
utilização como substituto do laudo pericial. No mesmo sentido: AC nº 2006.61.09.006640-9,
Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, 10ª Turma, j. 07.12.2010, DJF3 15.12.2010, p. 613; AC nº
2008.03.99.033957-6, Rel. Juíza Convocada Giselle França, 10ª Turma, j. 05.08.2008, DJF3
20.08.2008. III. Conjunto probatório suficiente para enquadramento de parte do lapso requerido.
IV. Ausentes os requisitos da aposentadoria por tempo de serviço. V. Agravo legal do autor
provido.” (AC 00088654620124036119, Nona Turma, rel. Juiz Federal Convocado Leonardo
Safi, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/11/2013)
Quanto ao uso desses equipamentos, revejo posicionamento anterior, sobretudo com respaldo
no julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 664.335/SC pelo E. STF, em
04/12/2014, para adotar o entendimento de que a eficácia do EPI exclui a nocividade do agente,
impossibilitando a consideração do período como especial.
Entretanto, a eficácia do EPI exclui a nocividade do agente – exceto para o ruído,
impossibilitando a consideração do período como especial.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC em 04/12/2014, fixou duas
teses distintas, que servem para o reconhecimento de tempo de serviço sob condições
prejudiciais à saúde ou a integridade física, que servem à concessão de aposentadoria especial
(aos 25 anos de atividade) ou para a conversão do tempo especial para tempo comum, a ser
utilizada na concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A primeira tese faz referência ao uso de EPI (equipamento de proteção individual) sugerindo
que se comprovadamente houve o uso eficaz do EPI não poderá ser reconhecido o direito ao
reconhecimento do tempo de atividade especial.
Diz o STF: “O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a
agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.”
A outra tese, também relativa ao uso do EPI, é mais especifica, uma vez que se relaciona a
exposição ao agente físico ruído.
Entendeu o Tribunal que a despeito do uso de EPI de forma eficaz, caso o nível de exposição
ao agente físico ruído esteja acima do nível de tolerância previsto na legislação pertinente, “na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido
da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria”
Em relação ao uso do EPC (Equipamento de Proteção Coletivo) deve ser dispensado o mesmo
tratamento, pois se trata, inclusive, de proteção mais ampla do trabalhador, pois divididos em (i)
métodos de proteção usados por uma coletividade, ex. máscara de solda e cintos de segurança
para trabalhadores na construção civil, e (ii) medidas gerais que visam melhorar o ambiente de
trabalho como um todo, ex. ventilação dos locais de trabalho que resultem na eliminação do
calor em nível agressivo visam eliminar a nocividade do ambiente de trabalho o que se mostra
mais eficaz do que o próprio uso do EPI que afasta o agente agressivo somente do trabalhador
enquanto o estiver usando.
Colaciono, por oportuno, a decisão do E. STF:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 664.335 SANTA CATARINA RELATOR :MIN.
LUIZ FUX EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO
CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE
SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO
DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA
PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE.
NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O
TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO
PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À
CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO
RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL.
IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES
PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA
NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto
recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos
mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts.
3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio
ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88).
2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado,
empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente
para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao
erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88),
a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88),
e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88).
3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa
que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime
geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos “casos de atividades
exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando
se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar”.
4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles
trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um
desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo
de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente
nocivo.
5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de
benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário,
sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o
direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional
(em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106
AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93;
RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de
04/09/1998.
6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos
instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da
CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº
9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de
financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este
benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do
art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos
percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a
concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição,
respectivamente.
7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-
FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que
disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos
formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas
continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a
seus trabalhadores.
8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício
de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º),
de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade
notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição
do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador.
9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto
constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o
benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente
exerceu suas atividades laborativas em “condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física”.
10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria
especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo
que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo
constitucional à aposentadoria especial.
11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela
empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a
real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o
Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque
o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar
completamente a relação nociva a que o empregado se submete.
12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima
do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor
auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da
normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito
além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo
será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22
da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis
pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita
a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de
contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os
recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24
de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais,
conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de
aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição,
respectivamente.
13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído
relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é
certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo
ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua
efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas
empresas, quanto pelos trabalhadores.
14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese
de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do
empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do
Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria.
15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário.”
Do entendimento acima exposto, extrai-se que de acordo com as normas vigentes, a
declaração do uso de EPI eficaz nos laudos, formulários e PPP afasta a caracterização da
atividade como nociva. Tais documentos e as condições de trabalho que reproduzem estão
sujeitos à fiscalização do Poder Público, principalmente do INSS e MTE. Por essa razão, gozam
de presunção de veracidade. Contudo, tal presunção, admite prova em contrário.
Quanto a demonstração do uso e eficácia dos equipamentos de proteção, a NR -06, por sua
vez, dispõe o seguinte acerca do EPI: “ Cabe ao empregador quanto ao EPI: a) adquirir o
adequado ao risco de cada atividade; b) exigir seu uso; c) fornecer ao trabalhador somente o
aprovado pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho; d)
orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado, guarda e conservação; e) substituir
imediatamente, quando danificado ou extraviado; f) responsabilizar-se pela higienização e
manutenção periódica; g) comunicar ao MTE qualquer irregularidade observada e (h) registrar o
seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados livros.”
Desta forma, o trabalhador que tenha laborado em condições diversas as declaradas pelo
empregador (em relação ao uso de EPCs e EPIs) tem condições de exigir junto ao empregador
os documentos que demonstram o cumprimento das exigências da Norma. Tratando-se de
fatos cujo meio de prova idôneo é documental, tais documentos devem acompanhar a petição
inicial, salvo comprovada recusa do empregador em fornecê-las, sendo o caso de o autor
requerer diligências do Juízo.
Assim, uma vez comprovado o uso de EPI/EPC eficaz durante o período laboral, tornando
inócua a exposição aos agentes nocivos descritos nos documentos apresentados, fica
descaracterizada a especialidade das atividades desempenhadas.
Ressalto que a utilização do Equipamento de Proteção Individual - EPI, ainda que eficaz, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para o agente nocivo ruído. Nesse sentido, Súmula
nº 09, da Turma Nacional de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados
Especiais Federais.
Da exposição e limites de tolerância para agentes químicos
A exposição aos agentes químicos descritos nos decretos regulamentadores da aposentadoria
especial sempre propiciou a consideração do período como especial, deste que cumpridos os
requisitos formais já descritos retro. Importante asseverar que a partir do Decreto 2.172/97, a
descrição de tais agentes nos anexos passou a ser muito mais minuciosa e detalhada, não
havendo lugar para declarações genéricas acerca dos compostos químicos a que o segurado é
exposto no ambiente de trabalho.
Até 06/05/1999, data da entrada em vigor do Decreto 3.048/99, por outro lado, não havia a
exigência de análise quantitativa relativa aos limites de tolerância para agentes nocivos tais,
para fins de aposentadoria especial. Assim, somente a partir de tal advento passou a ser
aplicado o parâmetro contido na NR-15.
Por outro lado, importante asseverar que para aqueles agentes químicos indicados como
carcinogênicos pela LINACH, não há necessidade de análise quantitativa em nenhum
momento, assim como o uso de EPI, mesmo que indicado como eficaz, não exclui a
especialidade do período. Há que se anotar que a TNU, em recentíssimo julgado em
sistemática de representativo de controvérsia, firmou no Tema 170 a seguinte tese:
“INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
TEMA 170. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES RECONHECIDAMENTE
CANCERÍGENOS PARA HUMANOS. DECRETO 8.123/2013. LINACH. APLICAÇÃO NO
TEMPO DOS CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DA ESPECIALIDADE. DESPROVIMENTO. Fixada
a tese, em representativo de controvérsia, de que "A redação do art. 68, § 4º, do Decreto
3.048/99 dada pelo Decreto 8.123/2013 pode ser aplicada na avaliação de tempo especial de
períodos a ele anteriores, incluindo-se, para qualquer período: (1) desnecessidade de avaliação
quantitativa; e (2) ausência de descaracterização pela existência de EPI". (PEDILEF
50060195020134047204, relatora juíza Federal Luisa Hickel Gamba, eproc 23/08/2018).
Do agente ruído e seus limites de tolerância
De início, cumpre destacar que até 05 de março de 1997 o enquadramento como especial, no
caso do agente ruído, é possível quando a exposição for superior a 80dB(A). Por sua vez, a
partir de 6 de março de 1997 (edição do Decreto n.º 2.172, de 5 de março de 1997) até 18 de
novembro de 2003, o enquadramento como especial somente será efetuado quando a
exposição for superior a 90dB(A). Após, ou seja, a partir de 19 de novembro de 2003, o
enquadramento como especial poderá ser efetuado quando a exposição for superior a 85
dB(A).
Confira-se, a respeito desse tema, o seguinte julgado (grifei):
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM DE TEMPO
DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. INSALUBRIDADE. SERVENTE E
ESTAMPADOR. EXPOSIÇÃO PERMANENTE E HABITUAL A AGENTES AGRESSIVOS.
RUÍDOS SUPERIORES A 80 DECIBÉIS. COMPROVAÇÃO POR MEIO DE FORMULÁRIO
PRÓPRIO. POSSIBILIDADE ATÉ A VIGÊNCIA DO DECRETO 2.172/97. DISSÍDIO
SUPERADO. INCIDÊNCIA DO VERBETE SUMULAR Nº 83/STJ. RECURSO ESPECIAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A controvérsia dos autos reside, em síntese, na possibilidade ou não de se considerar como
especial o tempo de serviço exercido em ambiente de nível de ruído igual ou inferior a 90
decibéis, a partir da vigência do Decreto 72.771/73.
2. In casu, constata-se que o autor, nas funções de servente e de estampador, nos períodos de
1º/8/1973 a 22/6/1983 e de 11/5/1992 a 10/2/1994, respectivamente, trabalhava em condições
insalubres, estando exposto, de modo habitual e permanente, a ruídos superiores a 80 dB,
conforme atestam os formulários SB-40, embasados em laudos periciais.
3. A Terceira Seção desta Corte entende que não só a exposição permanente a ruídos acima
de 90 dB deve ser considerada como insalubre, mas também a atividade submetida a ruídos
acima de 80 dB, conforme previsto no Anexo do Decreto 53.831/64, que, juntamente com o
Decreto 83.080/79, foram validados pelos arts. 295 do Decreto 357/91 e 292 do Decreto 611/92.
4. Dentro desse raciocínio, o ruído abaixo de 90 dB deve ser considerado como agente
agressivo até a data de entrada em vigor do Decreto 2.172, de 5/3/1997, que revogou
expressamente o Decreto 611/92 e passou a exigir limite acima de 90 dB para configurar o
agente agressivo.
5. Não comprovada pelo recorrente a existência do dissídio, na forma do art. 541, parágrafo
único, do CPC, c/c 255 do RISTJ.
6. O aresto impugnado decidiu em conformidade com o entendimento prevalente nesta Corte,
aplicando-se, à espécie, o verbete sumular 83/STJ.
7. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ, Quinta Turma, RECURSO ESPECIAL -
773342/SC, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ 25/09/2006, destacou-se)
Ainda, nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR
URBANO. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO. CONVERSÃO DE TEMPO
ESPECIAL EM COMUM. RUÍDO. USO DO EPI NÃO AFASTA A NATUREZA ESPECIAL DA
ATIVIDADE. - A comprovação da atividade insalubre em que o agente agressor é o ruído
sempre dependeu de laudo técnico para o reconhecimento de atividade especial. - A
disponibilidade ou utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) não afasta a
natureza especial da atividade, por não elidir a insalubridade, mas apenas reduzi-la a um nível
tolerável à saúde humana. - A atividade deve ser considerada especial se o agente agressor
ruído estiver presente em níveis superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto nº. 2.172, de
05/03/1997. A partir de então será considerado agressivo o ruído superior a 90 decibéis. Já
depois da edição do decreto nº. 4882/2003, passou a ser considerado agente agressivo o ruído
acima de 85 decibéis (19/11/2003). - Considera-se para fins de contagem de tempo de serviço o
período de trabalho posterior ao ajuizamento da demanda, dado que os fatos constitutivos,
ocorridos no curso do processo, devem ser levados em conta, competindo ao Juiz ou à Corte
atendê-los no momento em que proferir a decisão, tal como sucede nesta demanda em que a
parte autora continuou a trabalhar até pelo menos junho do corrente ano, conforme consulta ao
CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais). - Apelação à qual se dá parcial provimento.
(TRF3, Turma Suplementar da Terceira Seção, AC 200703990204903, Juíza Louise Filgueiras,
DJF3 18/09/2008.).”
Da técnica de aferição do ruído
Em relação a esta questão, a TNU recentemente julgou o processo 0505614-
83.2017.4.05.8300/PE, destacado como representativo da controvérsia consubstanciando o
tema 174, tendo sido firmada a seguinte tese: (a) "A partir de 19 de novembro de 2003, para a
aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas
na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante
toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma"; (b) "Em caso de
omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição
nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo
ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada
na medição, bem como a respectiva norma".
Em referido julgado restou consolidado, como se vê, que para que haja validade nos registros
constantes do PPP, a partir de novembro de 2003, para fins de consideração de período como
especial, é necessária a informação sobre a técnica de aferição e que tenha sido usada a
metodologia da FUNDACENTRO ou da NR-15, que afasta as medições por “pico de ruído”,
realizadas através de decibelímetro.
Por outro lado, para os períodos anteriores à adoção no método da FUNDACENTRO, seja pela
NR-15, seja pela NHO-01, deve ser diverso o tratamento, na medida em que ainda não haviam
sido editadas as normas previdenciárias relativas à forma de medição adequada do ruído.
Ainda a respeito do exato teor do julgado pela TNU, há que se esclarecer que a metodologia
referendada pelo julgado implica no nível do ruído calculado pelo NEN, que não se confunde
com Leq ou Lavg (TWA).
Neste ponto, trago o voto do relator originário do feito na TNU, Dr. Fábio César dos Santos
Oliveira, que nesta parte foi acompanhado pelo voto divergente e vencedor:
“(...)
25. (...), a aferição do agente nocivo ruído no ambiente de trabalho deve seguir os
procedimentos de avaliação estabelecidos pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de
Segurança e Medicina do Trabalho – FUNDACENTRO, os quais ora obedecem aos parâmetros
descritos na Norma de Higiene Ocupacional (NHO)-01. Da leitura do prefácio do documento de
publicação da NHO-01, extrai-se que ela:
“- substitui as três Normas [NHT – 06-R/E – 1985, NHT-07-R/E-1985, NHT-09-R/E-1986]
anteriormente existentes e trata tanto da avaliação da exposição ocupacional ao ruído contínuo
ou intermitente, quanto da avaliação da exposição ocupacional ao ruído de impacto;
- introduz o conceito de nível de exposição como um dos critérios para a quantificação e a
caracterização da exposição ocupacional ao ruído contínuo ou intermitente e o conceito de nível
de exposição normalizado para interpretação dos resultados;
- adota o valor ‘3’ como incremento de duplicação de dose (q=3);
- considera a possibilidade de utilização de medidores integradores e de medidores de leituras
instantâneas.”
26. Registro que, na NHO-01, define-se “dose” como “parâmetro utilizado para caracterização
da exposição ocupacional ao ruído, expresso em porcentagem de energia sonora, tendo por
referência o valor máximo da energia sonora diária admitida, definida com base em parâmetro
preestabelecido (q, CR, NLI)”. A NHO-01 também conceitua “Nível de Exposição (NE)” como
“nível médio da exposição ocupacional diário”, e “Nível de Exposição Normalizado (NEN)” como
“nível de exposição convertido para uma jornada padrão de 8 horas diárias, para fins de
comparação com o limite de exposição”. No seu item 5.1.2, o NEN é apresentado como
resultado da soma do NE com o log TE/480, sendo TE o tempo de duração da jornada diária de
trabalho em minutos. A expressão matemática do Nível de Exposição Normalizado permite
concluir que, em uma jornada de 8 horas, o valor de TE será igual a 480, o log TE/480
corresponderá a log 480/480, o qual resulta em zero, e NEN será igual a NE. Para TE inferior a
480, o log TE/480 será negativo e, por conseguinte, o valor de NEN será inferior a NE.
27. Não obstante isso, a NHO 01 tem aspecto positivo ao segurado, pois a utilização do valor
‘3’, como dose, implica menor tempo de exposição tolerável ao ruído pelo trabalhador. Mantido
o limite de tolerância fixado pelo Quadro do Anexo I, da NR 15(exposição a 85 dB por 480
minutos), tem-se uma nova correlação de tempo máximo diário de exposição permissível em
função do nível de ruído, que passa a ser de 88dB por 240 minutos, 91dB por 120 minutos e
94dB por 60 minutos. Na disciplina anterior, a correlação era de 90 dB por 240 minutos horas,
95dB por 120 minutos e 100dB por 60 minutos. Os parâmetros utilizados na NHO 01 encontram
suporte técnico suficiente, pois ajustam-se a métodos mais modernos de aferição do agente
nocivo ruído e a orientações mais protetivas à saúde do trabalhador. Nesse sentido, transcrevo
a lição de Sylvio R. Bistafa, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola
Politécnica da USP (Acústica aplicada ao controle do ruído. São Paulo: Ed. Edgard Blücher,
São Paulo, 2006, p. 127):
“Um levantamento das legislações de diversos países relativamente ao nível de ruído nos
ambientes do trabalho, realizado pelo International Institute of Noise Control Engineering [24],
constatou que a maioria das legislações adota 85 ou 90dB (A) como nível-critério normalizado
por um período de 8 h. No estabelecimento desses níveis, aceita-se que, após um período de
muitos anos, haverá perda de audição permanente numa ‘pequena’ fração da população
exposta. O mesmo levantamento indica que, num futuro próximo, na maioria dos países, a
adoção dos níveis-critério inferiores a 85dB(A) é impedida por fatores sócio-econômicos. Tendo
em vista esses fatores não-técnicos, 85dB(A) é o nível-critério recomendado para uma
exposição de 8h.
Se de fato a grandeza física responsável pela Pair é a energia sonora recebida pela orelha, o
fator de troca de 3db(A) é aquele que se encontra tecnicamente mais bem fundamentado. Esse
fator de troca é normalmente adotado pela legislação de vários países. No entanto as indústrias
norte-americanas adotam o fator de troca de 5 dB(A), sendo que a Marinha dos Estados Unidos
adota o fator de troca 4dB(A).
Ainda, conforme consta na referência[24], as evidências científicas parecem indicar que o fator
de troca de 3dB (A) é o mais razoável para a exposição diária ao ruído. É também uma boa
aproximação dos resultados de vários estudos epidemiológicos relativos à exposição a ruídos
intermitentes e com níveis variáveis, muito embora estudos apresentem variações significativas
em torno da média. A conclusão é que não há, por enquanto, formas de refiná-lo, sendo o fator
de troca de 3 dB (A), em certas situações, uma medida apenas aproximada.”
28. A motivação técnica da NHO-01, por instância administrativa competente e capacitada para
tanto, impede que o Judiciário possa afirmar a sua invalidade, pois não há inconstitucionalidade,
ilegalidade ou desproporcionalidade evidente no ato.
(...)”
Com efeito, o nível médio ou equivalente de exposição não leva em consideração a
normalização para a jornada de trabalho, mas sua fórmula considera o tempo de medição,
sendo óbvio que tais períodos podem ser diferentes. A fórmula para o seu cálculo é leq ou
lavg+ 16,61log (Dx8/Tm) + 85, onde Tm é o tempo de medição. O Leq ou Lavg é denominado
NE nas normas da FUNDACENTRO e é um dos componentes da fórmula para o cálculo do
NEN, que considera sempre a jornada de trabalho: NEN=NE+16,6LOG(T/8), onde NE é o nível
de exposição Leq ou Lavg e T é a jornada de trabalho.
Cumpre ressaltar que, quando se trata de jornada de trabalho de 8 horas, o NEN e o NE são
iguais, havendo diferença quando as jornadas são superiores ou inferiores. Nestes termos, é
possível aceitar uma medição indicada em Leq ou Lavg quando comprovada nos autos a
jornada de 8 horas diárias.
Ainda insta apenas esclarecer que, em geral, é usado o Leq quando se observa a taxa de
duplicidade da NHO-01 e a Lavg quando usada a da NR-15, sendo que, para os fins da análise
de tempo especial, isso é irrelevante, já que a TNU pacificou a possibilidade de cálculo do NEN
por qualquer uma das dobras (3, na NHO-01 e 5, na NR-15).
Caso concreto.
Pretende a parte autora a conversão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
em aposentadoria especial mediante a o reconhecimento de labor em atividade especial nos
períodos de 30/10/1986 a 15/09/1987, 18/05/1988 a 29/11/1988, 08/12/1988 a 10/04/1989,
23/04/1989 a 02/05/1990, 03/06/1991 a 03/07/1991, 05/03/1992 a 11/11/1992, 06/03/1997 a
21/01/2002 e 01/04/2009 a 05/08/2015.
De 30/10/1986 a 15/09/1987 (Construtora Andrade Gutierrez S/A).
Em relação ao período acima, verifico que a parte autora laborou para a empresa Construtora
Andrade Gutierrez S/A.
De 30/10/ 1986 a 25/12/1986, desempenhou a função de servente e de 26/12/1986 a 15/
09/1987 a de montador industrial.
Para demonstrar a especialidade anexou aos autos formulário previdenciário DSS 8030 (docs.
75/77).
Embora não haja descrição de agentes nocivos menciona a que o autor laborou em “Condições
ambientais típicas de canteiro de obra civil a céu aberto com exposição a intempéries, poeira e
ruído de máquinas e equipamentos em circulação”.
Aqui vale uma constatação.
A empresa Andrade Gutierrez S.A. tem atividade mundialmente conhecida em construções de
grande porte. A empresa se dedica ao ramo de infraestrutura, energia, óleo e gás e mobilidade
urbana.
Assim, é de conhecimento público que suas obras são em edifícios, barragens, construção de
estradas e etc.
Além disso, consta do formulário que o autor trabalhava na “contrução civil pesada”.
Portanto, pelas condições a que era exposto é possível a verificação de que o autor trabalhava
em edifícios, barragens, pontes e ou torres nos termos do item 2.3.3 do Anexo II do Decreto n.
53.831/64.
Desta forma, sua atuação se dava com alta probabilidade de exposição ocupacional, nos
termos do Tema 205 e 2011/TNU de forma que reconheço o período como laborado em
atividade especial.
De 18/05/1988 a 29/11/1988 (Hospimetal Indústria Metalúrgica de Equipamentos Hospitalares
Ltda).
A CTPS trazida pelo autor aos autos (doc. 36, arquivo 2) demonstra que, no período em
questão, o autor exerceu a função de soldador I.
Desta forma, plenamente possível o enquadramento por categoria profissional para o período
em questão, no item 2.5.3 do Anexo do Decreto 53.831/64 e 2.5.1 do Anexo II do Decreto
83.080/79.
Com efeito, para o enquadramento por atividade profissional basta prova de exercício de uma
das atividades descritas pelos decretos de regência, o que é cabalmente realizado pela
anotação em CTPS.
Portanto, a sentença deve ser reformada.
De 08/12/1988 a 10/04/1989 (Condomínio Edifício Manhattan), 23/04/1989 a 02/05/1990
(Condomínio Edifício Vila Rica), 03/06/1991 a 03/07/1991 (Conscape Construtora e Engenharia
Ltda) e 05/03/1992 a 11/11/1992 (CAL – Construtora Araçatuba Ltda).
Nos períodos acima, verifico que a parte autora laborou para, Condomínio Edifício Manhattan,
Condomínio Edifício Vila Rica, Conscape Construtora e Engenharia Ltda e CAL – Construtora
Araçatuba Ltda.
Pretende a parte autora o reconhecimento da atividade especial com base no Decreto n.
53.831/64, código n. 2.3.3.
A única prova carreada aos autos foi a CTPS (docs. 36/37, arquivo 2).
Nelas consta que o autor laborou como pedreiro.
Nos períodos de 08/12/1988 a 10/04/1989, 23/04/1989 a 02/05/1990 o trabalho se deu em
condomínio de edifícios.
Para os períodos de 03/06/1991 a 03/07/1991 e 05/03/1992 a 11/11/1992 está anotado que
atuou no ramo da construção civil.
Ocorre que em nenhum desses documentos demonstra que o autor laborou na construção de
edifícios, barragens, pontes e torres.
Dessa forma, deixo de reconhecer como atividades especiais os períodos acima mencionados.
De 06/03/1997 a 21/01/2002 (Álcool Azul S/A Alcoazul)
No período acima, verifico que a parte autora laborou para a empresa Álcool Azul S/A Alcoazul,
na condição de operador de ponte rolante.
Como prova da atividade especial autor carreou aos autos PPPs (docs.109/110 e 115, arquivo
2).
Pois bem.
Nos formulários previdenciários constam a exposição a ruído de 70 a 75 decibéis, ou seja,
abaixo de 90 dB(A), estando aquém dos limites estabelecidos pelos Decretos da legislação
previdenciária como dito na fundamentação desde voto.
Quanto à exposição a agente físico (radiação não ionizante), esta de deu forma ocasional.
Em relação aos agentes químico (bagaço de cana, graxas, óleos e hidrocarbonetos), também a
exposição ocorreu de forma ocasional e sem especificar o tipo de compostos químicos, ou seja,
foram mencionados de forma genérica o que impede o reconhecimento da atividade como
especial.
Quanto aos itens ergonômicos e acidente, noto que tais agentes não estão nos quadros dos
Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
Desse modo, deixo de reconhecer como atividade especial o período acima mencionado.
De 01/04/2009 a 05/08/2015 (A S C Tonheiro Eireli ME)
No período acima, verifico que a parte autora laborou para a empresa A S C Tonheiro Eireli ME,
na condição de soldador, e para tanto anexou PPP (docs. 09/10, arquivo 16).
De pronto, trajeto e postura não estão nos quadros dos Decretos n. 3.048/ 99, afastando assim,
esses fatores de risco descrito no PPP.
Tal qual dito na sentença “quanto ao ruído, verifico que não consta a aferição adequada no
PPP. Senão vejamos, o TEMA 174, da Turma Nacional de Uniformização – TNU, com a
seguinte tese firmada: “(a) "A partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído
contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da
FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de
trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (
PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma"; (b) "Em caso de omissão ou dúvida quanto à
indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o
PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o
respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem
como a respectiva norma".
Ora, no PPP apresentado nos autos, não há a metodologia NHO-01 da FUNDACENTRO ou
NR-15, portanto, conforme tema da TNU acima, nem mesmo foi apresentado LTCAT.
Em relação aos demais agentes (radiação não ionizante, poeiras, fumos metálicos e graxa),
verifico que o PPP indica o uso de EPI eficaz o que elide os efeitos deletérios desses agentes.
Com isso, deixo de reconhecer como atividades especiais o período acima vindicado.
Posto isso, dou parcial provimento ao recurso do autor, para reconhecer como especiais os
períodos de 30/10/1986 a 15/09/1987 e de 18/08/1988 a 29/11/1988, determinando sua
averbação bem como a consequente revisão do benefício desde a DER em 13/01/2016, forte
na Súmula 33 da TNU.
Sem condenação do autor em custas e honorários advocatícios, visto que somente o
Recorrente vencido faz jus a tal condenação, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APTC. REVISÃO. RECONHECIMENTO DE PERÍODOS ESPECIAIS.
SOLDADOR. CTPS. RECONHECIMENTO. CONSTRUÇÃO EDIFÍCIOS E BARRAGENS.
RECONHECIMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. AGENTES QUÍMICOS
GENÉRICOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Para a comprovação da atividade especial com base na categoria profissional até o advento
da Lei n. 9.032/95 pode ser feita exclusivamente pela anotação da função na CTPS.
2. Servente e montador industrial em construção civil pesada, atividade especial prevista no
item 2.3.3 do Anexo II do Decreto n. 53.831/64 (edifícios, barragens, pontes e ou torres).
3. O Tema 174/TNU determina que é necessário, para o período laborado após 18/11/2003,
que haja a indicação de aferição do ruído através das metodologias constantes da NHO-01 ou
da NR-15.
4. A exposição ocasional a agentes nocivos afasta o reconhecimento da atividade como
especial.
5. Recurso a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
