
| D.E. Publicado em 13/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e dar parcial provimento ao apelo da Autarquia Federal, para julgar improcedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria por idade de trabalhador rural e declarar a inexigibilidade de débito e a inviabilidade do desconto do benefício de pensão por morte no valor inferior a um salário mínimo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030204-85.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Cuida-se de reivindicatória de restabelecimento de aposentadoria por idade de trabalhador rural c.c. declaratória de inexistência de débito de R$ 77.179,34, cobrado administrativamente, referente a valores recebidos a título de aposentadoria. Pede dano moral e tutela antecipada.
Foi deferida a fls. 205 a tutela provisória para determinar que o réu providenciasse o cancelamento do desconto de 30% no benefício de pensão por morte pago à autora.
O INSS pleiteou agravo de instrumento da decisão de fls. 205, que deferiu tutela de urgência para determinar a cessação dos descontos realizados no benefício da autora, o qual foi negado.
A r. sentença julgou a ação procedente condenando o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, no valor de um salário mínimo, desde a data da cessação administrativa, 30.09.2014, com renda mensal inicial no valor de 1 salário mínimo. Declarou inexigível o débito de R$ 77.179,34, cobrado pela ré referente ao período de 01.02.2005 a 30.09.2014 (pgns 123/128). As prestações em atraso deverão ser pagas com correção monetária e juros de mora. Arcará a Autarquia com os honorários advocatícios fixados em 10% dez por cento do montante devido até a data da sentença. Isentou de custas. Concedeu tutela antecipada.
Inconformada apela a Autarquia Federal, sustenta, em síntese, ausência de prova material, não houve o recolhimento das contribuições previdenciárias, nem o cumprimento do período de carência legalmente exigido e inadmissibilidade da prova exclusivamente testemunhal. Requer alteração do termo inicial, correção monetária, juros, honorária e isenção de custas. Pleiteia a devolução dos valores indevidamente recebidos de aposentadoria por idade rural no período de 01.02.2005 a 30.09.2014 totalizando o débito de R$ 77.179,34.
Em contrarrazões a parte autora alega que a apelação interposta pela ré não merece ser conhecida por ser intempestiva.
Regularmente processados, subiram os autos a este E. Tribunal.
É o relatório.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030204-85.2017.4.03.9999/SP
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Primeiramente, verifico que o procurador federal foi regularmente intimado acerca da realização da audiência de instrução e julgamento, em 04.04.2017 (fls. 239), embora tenha deixado de comparecer ao ato.
Não obstante, considera-se intimado no momento em que foi proferida a decisão em audiência, realizada em 04.04.2017, de modo que a contagem do prazo iniciou-se em 05.04.2017 (quarta-feira), com o término em 22.05.2017, (segunda-feira), tendo em vista que a Autarquia Federal possui 30 dias úteis contados a partir do dia subsequente à data da referida audiência, levando-se em conta o TJ - Provimento CSM N°2.394/2016:
Diante disso, tem-se por tempestivo o recurso autárquico interposto em 22.05.2017.
No mérito, o pedido para reconhecimento da atividade exercida na lavoura, referente ao período indicado na inicial, para fins de aposentadoria por idade funda-se nos documentos carreados aos autos, dos quais destaco:
- Cédula de identidade (nascimento em 25.03.1946).
- Extrato de conta de telefone operadora Vivo constando o endereço na Rua Altino Ferreira das Neves, 257, Santa Fé do Sul - SP.
- Certidão de casamento em 16.01.1971, qualificando o marido como motorista.
- Certidão de óbito do cônjuge, atestando sua profissão como industrial.
- Certidão do cartório de registro de imóveis de Aparecida do Taboado do Estado do Mato Grosso do Sul apontando que o Sr. Joaquim Schimaher, genitor da requerente, adquiriu um imóvel rural com área de 72,60 hectares, denominada Fazenda Santa Fé, em 17.09.1962.
- Matrícula de um imóvel rural de 18.02.1976, da cidade de Rondonópolis, com área de 449,0 hectares, constando como proprietário o cônjuge, Tassimo Yoshida, qualificado como motorista e o sogro.
- Título de transmissão, título, cédula rural hipotecária da referida fazenda de 19.01.1983.
- Matrícula do referido imóvel de 26.09.1983 constando que por escritura de 28.11.1984 os proprietários transmitiram por venda as terras aos srs. Valter Gabiatti e Eduardo Gabiatti.
- Matrícula de 19.07.1983 apontando que o marido, qualificado como industrial e a autora adquiriram o imóvel e transmitiram em 03.07.1989, constando o cônjuge como industrial.
- Matrícula de um imóvel urbano em nome da requerente em 24.11.1997.
- Declaração de conhecidos.
A Autarquia juntou consulta efetuada ao sistema Dataprev, constando que a requerente possui cadastro como contribuinte individual de 10.1992 a 02.1993, recebeu aposentadoria por idade rural em 21.02.2005, cessado em 22.04.2015, por constatação de fraude e recebe pensão por morte, comerciário, no valor de um salário mínimo, desde 14.07.1992.
Em 29.09.2014 a autora recebeu ofício expedido pela Previdência Social informando o cancelamento de sua aposentadoria por idade rural, em razão de irregularidade verificada por não comprovação do efetivo exercício de atividade rural em período imediatamente anterior a data do requerimento.
Em 03.10.2014 o gerente do APS de Aparecida do Taboado/MS expediu ofício informando que lendo os relatórios conclusivos do procedimento de apuração do processo administrativo da requerente não foi identificado o enquadramento da irregularidade (erro administrativo, fraude, dolo, má-fé).
Em depoimento pessoal afirma que exerceu atividade rural, inicialmente com o seu genitor e, após, com seu marido, até 1980 trabalhou no sítio em Rondonópolis, depois se mudou para Santa Fé do Sul, mas continuou trabalhando no Sítio em Paranaíba. Informa que o marido trabalhou no sítio até o ano de 1987 ou 1988, após o falecimento do marido, em 1992, continuou trabalhando na lide rural em um pedaço de terra do irmão no Mato Grosso. A propriedade de seu irmão tinha um caseiro, tirava leite, fazia queijo e doce. Morava em Santa Fé do Sul e passava a semana trabalhando no sítio do irmão em Mato Grosso. Informa que os filhos são pedreiros e serventes de pedreiros.
Os depoimentos das testemunhas são vagos e imprecisos quanto à atividade rural exercida pela autora. A primeira testemunha não presenciou a autora trabalhando no sítio, informa que a autora ficou viúva e foi morar com o irmão, afirma que o filho da requerente é dentista. A segunda depoente conheceu a requerente em Aparecida do Taboado vendendo produtos da zona rural, frango, queijo, o sítio era de propriedade do irmão da requerente, presenciou a autora trabalhando nesta época, depois a autora se mudou para uma chácara.
Segundo o preceito do art. 143 da Lei nº 8.213/91, o trabalhador rural, na forma da alínea "a" do inciso I, IV, ou VII do art. 11, pode requerer a aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados da vigência dessa legislação, desde que prove ter exercido atividade rurícola, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício, conforme tabela inserta no art. 142. Além disso, deve atender os requisitos etários do art. 48, § 1º.
Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11, fica garantida a concessão da aposentadoria por idade, nos termos do artigo 39, inciso I da Lei nº 8.213/91, dispensado do cumprimento da carência, de acordo com o art. 26, inciso III.
Além do que, a eficácia do artigo 143, com termo final em julho de 2006, foi prorrogada pela Medida Provisória nº 312, de 19/07/2006, convertida na Lei nº 11.368, de 9 de novembro de 2006, estendendo para mais dois anos o prazo do referido artigo, para o empregado rural.
Acrescente-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.2008, tornou a estender o prazo até 31.12.2010.
Bem, neste caso, embora a autora tenha completado 55 anos em 2001, a prova produzida não é hábil a demonstrar o exercício da atividade no campo, pelo período de carência legalmente exigido, segundo o artigo 142 da Lei 8.213/91, de 120 meses.
Compulsando os autos, verifica-se que a prova material é frágil e os depoimentos das testemunhas são vagos e imprecisos e contraditórios com o depoimento pessoal, não esclarecendo detalhes sobre a atividade campesina da requerente, apenas afirmando genericamente o labor rural. A autora informa que os filhos são pedreiros e servente de pedreiros e uma das testemunhas relata que a autora tem um filho dentista. Uma das testemunhas não presenciou a atividade rural da requerente e a outra depoente só conheceu a autora no primeiro sítio de propriedade do irmão e depois se mudou para uma chácara.
Além do que, foram juntadas matrículas de imóveis rurais de grande extensão e não foi juntado qualquer documento em que pudesse se verificar a existência ou não de empregados e a produção da propriedade rural onde alega ter laborado, como ITR, CCIR, notas fiscais de produtor.
Observa-se que não há um documento sequer que qualifique a requerente como lavradora.
Por fim, não é possível estender à autora a condição de lavrador do marido, como pretende, eis que, dos registros cíveis vem qualificação do marido como motorista e do sistema Dataprev extrai-se que recebeu aposentadoria por idade/comerciário, descaracterizando o regime de economia familiar.
Verifico que o STJ, em análise de casos similares, de aposentadoria por idade de trabalhador rural, entende que resta desqualificado o trabalho rural por quem exerce atividade urbana posterior. Há precedentes destacando que os documentos de registro civil apresentados pela parte autora, qualificando como lavrador o seu cônjuge, não servem como início de prova material em virtude da aposentadoria urbana dele. (Precedente: AgRg no Resp 947.379/sp, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 26.11.2007).
Esclareça-se que, as declarações de exercício de atividade rural firmada por ex-empregadores, equivalem-se à prova testemunhal, com o agravante de não ter passado pelo crivo do contraditório, não podendo ser considerada como prova material.
Cumpre salientar que o regime de economia familiar pressupõe que os membros da família trabalhem no imóvel rural, sem o auxílio de empregados, para sua própria subsistência, o que não ficou comprovado no presente feito.
Dessa forma, as provas são insuficientes para concessão do benefício pleiteado.
Neste sentido, orienta-se a jurisprudência, consoante decisão do E. S.T.J., cujo aresto transcrevo:
Do conjunto probatório dos autos, portanto, verifica-se que não houve cumprimento dos requisitos exigidos pelos artigos 142 e 143 da Lei 8.213/91, segundo os quais, ainda que descontínuo, esse trabalho deve corresponder ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência.
Quanto ao reembolso dos valores indevidamente pagos pelo INSS, há previsão legal, conforme disposto no art. 115, inc. II, da Lei n.º 8.213/91.
De outro lado, o C. STJ firmou entendimento de que, demonstrado o recebimento de boa-fé pelo segurado ou beneficiário, não são passíveis de devolução os valores recebidos a título de benefício previdenciário, posto que se destinam à sua própria sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
Nesse sentido, confira-se:
Quanto à cobrança das parcelas, verifico que a requerente teve reconhecida na via administrativa o direito à aposentadoria por idade rural, desde 01/02/2005. Contudo, o INSS realizou a revisão no benefício, concluindo que não restou demonstrado o tempo de serviço rural necessário à concessão da aposentadoria. Assim, em 24/06/2014 a requerente foi noticiada para apresentar defesa administrativa. Em 29/09/2014 houve a intimação da autora, informando a suspensão do benefício, bem como a cobrança de R$ 68.013,68, relativos aos valores pagos indevidamente.
Posteriormente, passaram a ser efetuados descontos no benefício de pensão por morte recebido pela autora, desde 14/07/1992.
Com efeito, o poder de autotutela autoriza a Autarquia Previdenciária, a qualquer tempo rever os seus atos para cancelar ou suspender benefícios, quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmula 473 do E. STF).
Considero ser plenamente possível a cobrança dos valores indevidamente pagos, desde que respeitado o contraditório e a ampla defesa, em respeito ao princípio da moralidade administrativa (art. 37, caput, da Constituição Federal), que obstaculiza o recebimento de valores indevidos da previdência social, custeada por contribuições de toda a sociedade, bem como levando-se em conta o princípio da vedação do enriquecimento sem causa, além da previsão legal de ressarcimento dos prejuízos sofridos com os pagamentos indevidos, a teor dos artigos 115, da Lei nº 8.213/91, e 154, do Decreto nº 3.048/99.
Não obstante, na situação em análise, verifico que a requerente recebe benefício de pensão por morte, no valor de um salário mínimo, conforme documento do Sistema Dataprev, a fls. 164.
Neste caso, importa destacar que a realização de descontos no benefício pago no valor mínimo caracteriza ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana e fere a garantia constitucional, prevista no art. 201, § 2º, de que nenhum benefício previdenciário terá valor mensal inferior ao salário mínimo.
O E. Supremo Tribunal Federal já proferiu, inclusive, decisões monocráticas a respeito do tema, conforme se vê, dentre outras:
No mesmo sentido é a jurisprudência desta E. Corte, que ora colaciono:
Assim, se o benefício de pensão por morte já é pago em valor mínimo, inviável o desconto realizado pela Autarquia.
Por fim, o pedido de indenização por danos morais feito pela parte autora não comporta acolhimento. Não restou demonstrado nos autos que a autora tenha sido atingida, desproporcionalmente, em sua honra. Nesses termos, se não comprova a ofensa ao seu patrimônio moral, resta incabível a indenização, porquanto o desconforto gerado pelo não-recebimento das prestações, caso fosse confirmado o direito ao benefício (o que, frise-se, não ocorreu) resolver-se-ia na esfera patrimonial, através do pagamento de todos os atrasados, devidamente corrigidos.
Neste sentido, confira-se:
Em face da inversão do resultado da lide, restam prejudicados os demais pontos do recurso do INSS.
Pelas razões expostas, rejeito a preliminar e dou parcial provimento ao apelo da Autarquia Federal, para reformar parcialmente a sentença, julgando improcedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria por idade de trabalhador rural e declarando a inexigibilidade de débito e a inviabilidade do desconto do benefício de pensão por morte no valor inferior a um salário mínimo. Condeno a parte autora no pagamento das custas e dos honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (hum mil reais), observando-se o disposto no artigo 98, § 3º do CPC/2015, por ser beneficiária da gratuidade da justiça. Casso a tutela antecipada.
Oficie-se.
É o voto.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 28/11/2017 14:47:10 |
