
| D.E. Publicado em 16/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0025244-57.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de sua filha Ana Clara, em 13/08/2014.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria, sem registro em CTPS.
Deferida a gratuidade da justiça. Citação/contestação.
Determinada a juntada de declarações em substituição a depoimentos.
Proferida sentença posteriormente anulada por força de apelação.
Baixando os autos à vara de origem, foi designada audiência de instrução e julgamento para 25/09/2017.
O autor se manifestou, pleiteando seja utilizada a prova produzida no processo 0003130-72.2014.8.26.0627, onde a autora obteve o benefício por conta de nascimento de outra filho/filha, em 28/06/2014 (carta de concessão de fls. 85).
O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido de cancelamento da audiência porque a utilização de prova emprestada subverteria o disposto na decisão que determinou a baixa dos autos para oitiva de testemunhas. Ainda, define que, sem prejuízo, a autora poderá se valer da aludida prova emprestada, desde que atendidos os pressupostos atinentes (que a parte ex adversa tenha participado no processo da qual se originou, tendo sido oportunizados o contraditório e a ampla defesa).
A autora juntou a carta de concessão de benefício já deferida (início de vigência em 28/06/2014), para fins de reforço de prova material, afirmando expressamente que aguarda a audiência.
A audiência (designada para 25/09/2017) restou prejudicada porque a autora e suas testemunhas não compareceram, pleiteando o advogado pela redesignação.
A autora alegou que o não comparecimento foi ocasionado por problema de transporte, requerendo novamente fosse marcada nova audiência.
O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido porque a alegação não foi devidamente comprovada, declarando preclusa a produção de prova oral. Não houve insurgência da autora. Em alegações finais, a autora não se manifestou quanto a tal preclusão.
A sentença de fls. 99/100 julgou improcedente o pedido porque a autora não produziu a prova oral, nos termos determinados na decisão deste Tribunal. Honorários advocatícios fixados em R$ 300,00,
Sentença proferida em 23/03/2018.
Apelação da autora, alegando início de prova material e a ausência da análise da prova emprestada a que se referiu em manifestações posteriores.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada - empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento dos filhos, a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
A autora alega ser trabalhadora rural.
Traz, entre outros documentos, atestado emitido pela Fundação Itesp, atestando que é benefíciária e residente em lote do Assentamento Haroldina com sua mãe, desde 06/05/2009, conforme consta no processo ITESP 974/97. Atestado datado de 19/08/2009; e certidão de residência e atividade rural expedida pelo mesmo órgão, declarando a exploração do lote agrícola, datada de 03/10/2011 (anexo, folha da caderneta de campo).
A TNU já decidiu pela flexibilização do início de prova material para concessão do salário-maternidade, nos termos que seguem:
Vinha eu decidindo que o ano do documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o marco inicial dessa atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
No caso concreto, a autora não cumpriu determinação judicial, a saber, não apresentou as testemunhas (prova expressamente requerida na inicial).
Não trouxe aos autos cópia da prova produzida em processo relativo ao nascimento de seu outro filho/filha.
A produção da prova oral em audiência propicia ao réu a impugnação do testemunho, reperguntas etc. Em suma, é instrumento pelo qual se faz valer o princípio do contraditório.
A prova testemunhal produzida num processo não pode ser aproveitada em outro, por força do princípio da identidade física do juiz.
O juízo de primeiro grau declarou preclusa a produção de prova oral, decisão não impugnada pela autora.
Sem a prova oral a corroborar o início de prova material, fica mantida a sentença.
NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
MARISA SANTOS
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