Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5027756-20.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
27/11/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/11/2018
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL.
TRABALHADORA RURAL. ENQUADRAMENTO DA BÓIA-FRIA/DIARISTA COMO SEGURADA
EMPREGADA. INICIO DE PROVA MATERIAL. REAFIRMAÇÃO PELA PROVA TESTEMUNHAL.
VÍNCULO URBANO DO PAI DA CRIANÇA EM PARTE DO PERÍODO DE CARÊNCIA.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149 DO STJ.
- A CF/88 assegura proteção à gestante (arts. 7º, XVIII, e 201, II), com a respectiva
regulamentação nos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
- Com a criação do PRORURAL, os trabalhadores rurais tiveram acesso à proteção social (Lei
Complementar 11/1971).
- O direito ao salário-maternidade somente foi assegurado às trabalhadoras rurais com a CF/88,
regulamentado na Lei 8.213/91.
- Apesar da ausência de enquadramento previdenciário expresso em lei para o trabalhador rural
diarista/bóia-fria, as características da atividade exercida por esses trabalhadores, com
subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados,
entendimento sufragado pela jurisprudência. O INSS, na IN 78/2002 e seguintes, reconheceu o
enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado.
- O trabalhador rural não pode ser responsabilizado pela falta de recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que
lhes prestam serviços, pois cabe ao INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
- No caso da segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência, nos termos
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
da legislação vigente à data do nascimento.
- Tratando-se de segurada empregada, não há carência.
- O art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento de seu filho, determina
que a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de
início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
- A TNU já decidiu pela flexibilização do início de prova material para concessão do salário-
maternidade ((Pedilef 2009.32.00704394-5/AM, Relator Juiz federal Paulo Ricardo Arena Filho,
publicação em 28/10/2011).
- Com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de
relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir
o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo,
desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
- O único início de prova material pretensamente apto é a CTPS do pai da criança, onde, apesar
de indicar também vínculos rurais, traz vínculo de natureza urbana em construção civil de
02/04/2015 a 01/07/2015.
- O início de prova material do pai da criança se estende, quando muito, até 01/04/2015. Não
apresentada prova em nome próprio, a autora não tem direito ao benefício.
- Impossibilidade de comprovação da atividade rural somente por prova testemunhal. Súmula 149
do STJ.
- Apelação improvida.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5027756-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: VANESSA CRISTINA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA CARDOSO DA SILVA - SP393807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO (198) Nº 5027756-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: VANESSA CRISTINA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA CARDOSO DA SILVA - SP393807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Ação ajuizada contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora
pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de seu filho Isaac Vinicius
em 13/07/2015.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria,
sem registro em CTPS.
Juntou documentos.
Concedida a gratuidade da justiça.
Citação/contestação.
Audiência de instrução e julgamento em 25/04/2018, com a oitiva de duas testemunhas.
O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido.
Sentença proferida em audiência.
A autora apelou, alegando existência de início de prova material e pleiteando a reforma integral
da sentença, com a concessão do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5027756-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: VANESSA CRISTINA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA APARECIDA CARDOSO DA SILVA - SP393807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção
constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a
redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada -
empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
III - salário-maternidade para as seguradas de que tratam os incisos V e VII do art. 11 e o art. 13:
dez contribuições mensais, respeitado o disposto no § único do art. 39 desta Lei.
Parágrafo único. Em caso de parto antecipado, o período de carência a que se refere o inciso III
será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que o parto foi
antecipado."
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
VI - salário-maternidade para as seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada
doméstica.
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas
contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao
fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto
enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina
jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social
exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta
serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito
legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas,
tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao
art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Art. 4º Os empregados que prestam exclusivamente serviços de natureza rural às empresas
agroindustriais e agrocomerciais são considerados beneficiários do PRORURAL, ressalvado o
disposto no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. Aos empregados referidos neste artigo que, pelo menos, desde a data da Lei
Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, vem sofrendo, em seus salários, o desconto da
contribuição devida ao INPS é garantida a condição de segurados desse Instituto, não podendo
ser dispensados senão por justa causa, devidamente comprovada em inquérito administrativo a
cargo do Ministério do Trabalho e Previdência Social.
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador
infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no
meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao
salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-
fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses
trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com
subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados,
entendimento sufragado pela jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. ART. 557, §1º, DO CPC. PENSÃO POR
MORTE. TRABALHADOR RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA... II - A
regulamentação administrativa da própria autarquia previdenciária (ON 2, de 11/3/1994, artigo 5º,
item "s", com igual redação da ON 8, de 21/3/97) considera o trabalhador volante, ou bóia-fria,
como empregado. III - A responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias
relativa à atividade rural exercida pelo de cujus, na condição de empregado, cabia aos seus
empregadores, não podendo recair tal ônus sobre seus dependentes. ...
(AC 200803990604685, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, DJF3 CJ1 17/03/2010).
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução
Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas
posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do
Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
É antes crer que o legislador haja querido exprimir o consequente e adequado à espécie do que
evidentemente injusto, descabido, inaplicável, sem efeito. Portanto, dentro da letra expressa,
procure-se a interpretação que conduza a melhor consequência para a coletividade.
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que
lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para
impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento dos filhos, a
autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de
prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
O único início de prova material pretensamente apto é a CTPS do pai da criança, onde, apesar de
indicar também vínculos rurais, traz vínculo de natureza urbana em construção civil de
02/04/2015 a 01/07/2015.
O início de prova material do pai da criança se estende,quando muito, até 01/04/2015. Não
apresentada prova em nome próprio, a autora não tem direito ao benefício.
Ressalto a orientação jurisprudencial da Súmula 149 do STJ, segundo a qual "A prova
exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da
obtenção de beneficio previdenciário".
NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL.
TRABALHADORA RURAL. ENQUADRAMENTO DA BÓIA-FRIA/DIARISTA COMO SEGURADA
EMPREGADA. INICIO DE PROVA MATERIAL. REAFIRMAÇÃO PELA PROVA TESTEMUNHAL.
VÍNCULO URBANO DO PAI DA CRIANÇA EM PARTE DO PERÍODO DE CARÊNCIA.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149 DO STJ.
- A CF/88 assegura proteção à gestante (arts. 7º, XVIII, e 201, II), com a respectiva
regulamentação nos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
- Com a criação do PRORURAL, os trabalhadores rurais tiveram acesso à proteção social (Lei
Complementar 11/1971).
- O direito ao salário-maternidade somente foi assegurado às trabalhadoras rurais com a CF/88,
regulamentado na Lei 8.213/91.
- Apesar da ausência de enquadramento previdenciário expresso em lei para o trabalhador rural
diarista/bóia-fria, as características da atividade exercida por esses trabalhadores, com
subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados,
entendimento sufragado pela jurisprudência. O INSS, na IN 78/2002 e seguintes, reconheceu o
enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado.
- O trabalhador rural não pode ser responsabilizado pela falta de recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que
lhes prestam serviços, pois cabe ao INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
- No caso da segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência, nos termos
da legislação vigente à data do nascimento.
- Tratando-se de segurada empregada, não há carência.
- O art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento de seu filho, determina
que a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de
início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
- A TNU já decidiu pela flexibilização do início de prova material para concessão do salário-
maternidade ((Pedilef 2009.32.00704394-5/AM, Relator Juiz federal Paulo Ricardo Arena Filho,
publicação em 28/10/2011).
- Com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de
relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir
o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo,
desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
- O único início de prova material pretensamente apto é a CTPS do pai da criança, onde, apesar
de indicar também vínculos rurais, traz vínculo de natureza urbana em construção civil de
02/04/2015 a 01/07/2015.
- O início de prova material do pai da criança se estende, quando muito, até 01/04/2015. Não
apresentada prova em nome próprio, a autora não tem direito ao benefício.
- Impossibilidade de comprovação da atividade rural somente por prova testemunhal. Súmula 149
do STJ.
- Apelação improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA