D.E. Publicado em 14/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e fixar o termo inicial do benefício na data do nascimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002738-53.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de seus filhos Octavio Augusto e Pedro Henrique, em 26/10/2013.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria, sem registro em CTPS.
Juntou documentos.
Concedidos os benefícios da justiça gratuita às fls. 19.
Citado, o INSS contestou o feito.
Audiência de conciliação, instrução e julgamento em 24/06/2015, com a oitiva das testemunhas.
O juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido para conceder o benefício, para cada filho da autora, no valor de um salário mínimo mensal cada. Correção monetária e juros nos termos da Lei 11.960/2009. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação.
Sentença não submetida ao duplo grau de jurisdição.
O INSS apelou, pugnando pela improcedência do pedido.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada - empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento dos filhos, a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
Nos termos de iterativa jurisprudência, a condição de rurícola do pai da criança se estende à mãe, para fins de concessão do benefício.
O art. 16, § 6º, do Decreto 3.048/1999 define a união estável como aquela verificada entre homem ou mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem. É situação que a seguridade social não pode desconsiderar a ponto de negar proteção aos dependentes.
A documentação apresentada (CTPS) configura-se como início de prova material, pois traz a profissão do pai da criança como rurícola em de maio a julho de 2013, como colhedor.
As testemunhas ouvidas confirmaram o exercício da atividade rural pela autora à época exigida, corroborando, assim, o início de prova material.
Vinha eu decidindo que o ano do documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o marco inicial dessa atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
As testemunhas ouvidas confirmaram o exercício da atividade rural pela autora à época exigida, corroborando, assim, o início de prova material.
Fixo o termo inicial do benefício na data do nascimento.
A correção monetária das parcelas vencidas incide na forma das Súmulas 08 deste Tribunal, e 148 do STJ, bem como da Lei 6.899/81 e da legislação superveniente, descontando-se eventuais valores já pagos.
Os juros moratórios são fixados em 0,5% ao mês, contados da citação até o dia anterior à vigência do novo CC (11.01.2003); em 1% ao mês a partir da vigência do novo CC, nos termos de seu art. 406 e do art. 161, § 1º, do CTN; e, a partir da vigência da Lei 11.960/09 (29.06.2009), na mesma taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, conforme seu art. 5º, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97.
As parcelas vencidas serão acrescidas de juros moratórios a partir da citação. As parcelas vencidas a partir da citação serão acrescidas de juros moratórios a partir dos respectivos vencimentos.
De ofício, fixo o termo inicial do benefício na data do nascimento.
NEGO PROVIMENTO à apelação e, de ofício, fixo o termo inicial do benefício na data do nascimento.
É o voto.
MARISA SANTOS
Desembargadora Federal
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