D.E. Publicado em 07/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004903-05.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, onde a autora pleiteia a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de seu filho Gabriel Luiz em 05/10/2016.
A inicial sustenta que a autora é trabalhadora rural, atividade que exerce como diarista/bóia-fria, sem registro em CTPS.
Juntou documentos.
Concedidos os benefícios da justiça gratuita.
Citado, o INSS contestou o feito.
Em audiência de 11/09/2017, foi ouvida uma testemunha e proferida sentença que julgou improcedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC.
A autora apelou, pugnando pelo atendimento integral do pedido.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Os arts. 7º, XVIII, e 201, II, da Constituição, asseguram proteção à gestante. A proteção constitucional está regulada pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/91.
A carência para a concessão do benefício está prevista nos arts. 25 e 26 da mesma lei, com a redação dada pela Lei 9.876/99, sendo necessário o correto enquadramento da segurada - empregada, contribuinte individual ou segurada especial:
As alterações introduzidas pela Lei 9.876/99 em relação à carência para as seguradas contribuinte individual, facultativa e especial são objeto das ADIs 2.110/DF e 2.111/DF, ao fundamento da violação ao princípio da isonomia, cuja liminar foi negada pelo STF.
Tratando-se de trabalhadora rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.
Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.
A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.
O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e boias-frias.
A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:
Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.
Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.
Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.
A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:
O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.
Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:
Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.
Tratando-se de segurada empregada, a concessão do benefício independe de carência.
Conforme o art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação vigente na data do nascimento dos filhos, a autora deve comprovar que efetivamente trabalhava como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.
A autora alega ser trabalhadora rural.
Traz certidão de nascimento da criança, constando expressamente a profissão de lavradora. O pai da criança também é qualificado como lavrador.
Não é caso de extensão da atividade. A autora traz início de prova material em nome próprio.
A TNU já decidiu pela flexibilização do início de prova material para concessão do salário-maternidade, nos termos que seguem:
Vinha eu decidindo que o ano do documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o marco inicial dessa atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o julgamento do Recurso Especial n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ evoluiu no sentido de admitir o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa.
A testemunha confirmou o exercício da atividade rural pela autora à época exigida, corroborando, assim, o início de prova material.
Concedo o benefício.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (27/07/2016), nos termos do pedido inicial.
As parcelas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária a partir dos respectivos vencimentos e de juros moratórios a partir da citação.
A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE 870.947, em 20/09/2017.
Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da citação, e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. E serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês, na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente.
Condeno o(a) INSS ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, na forma do art. 85, § 8º, do CPC/2015.
DOU PROVIMENTO à apelação para conceder o salário-maternidade, no valor mensal de um salário mínimo, pelo período de 120 dias, observada a prescrição quinquenal parcelar. Correção monetária, juros e verba honorária, nos termos da fundamentação.
É o voto.
OTAVIO PORT
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