D.E. Publicado em 23/08/2017 |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALARIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. DIARISTA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016819-70.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária objetivando a concessão de salário maternidade de trabalhadora rural.
A sentença julgou procedente o pedido, condenando a autarquia ao pagamento das parcelas referentes ao benefício previdenciário de salário-maternidade à autora, em razão do nascimento de sua filha, correspondente a quatro salários-mínimos, com incidência de juros legais a partir da data do nascimento de sua filha, ocorrido em 07.02.2014, com incidência de juros de mora e correção monetária. Condenou, ainda, a requerida ao pagamento das despesas processuais, não abrangidas pela isenção de que goza, bem como honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o total das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ (fls. 55-60).
O INSS interpôs apelação e aduziu, em síntese, que a autora não preencheu os requisitos ensejadores à obtenção do salário-maternidade, motivo pelo qual requer a improcedência do pedido (fls. 71-81).
Com as contrarrazões (fls. 85-92) subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016819-70.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária proposta com vistas à concessão do benefício de salário-maternidade à trabalhadora rural.
O salário-maternidade está previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 71 a 73 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e nos arts. 93 a 103 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, consistindo, segundo Sérgio Pinto Martins, "na remuneração paga pelo INSS à segurada gestante durante seu afastamento, de acordo com o período estabelecido por lei e mediante comprovação médica" (Direito da Seguridade Social. 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2003, p. 387).
O benefício é devido à segurada da Previdência Social durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, nos termos do art. 71, caput, da Lei nº 8.213/91.
Depreende-se que para a concessão do referido benefício é necessário que a beneficiária possua a qualidade de segurada e comprove a maternidade.
O artigo 71 da Lei Previdenciária, em sua redação original, apenas contemplava a empregada, urbana ou rural, a trabalhadora avulsa e a empregada doméstica como beneficiárias do salário-maternidade. Este rol foi acrescido da segurada especial pela Lei n.º 8.861, de 25 de março de 1994 e posteriormente, com a edição da Lei n.º 9.876, de 26 de novembro de 1999, foram contempladas as demais seguradas da Previdência Social.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é:
Apenas as seguradas contribuintes individuais (autônomas, eventuais, empresárias etc.) devem comprovar o recolhimento de pelo menos 10 (dez) contribuições para a concessão do salário-maternidade. No caso de empregada rural ou urbana, trabalhadora avulsa e empregada doméstica tal benefício independe de carência.
Ressalte-se que a trabalhadora rural, diarista, é empregada e segurada da Previdência Social, enquadrada no inciso I, do artigo 11, da Lei 8.213/91. Sua atividade tem características de subordinação e habitualidade, dada a realidade do campo, distintas das que se verificam em atividades urbanas, pois na cidade, onde o trabalho não depende de alterações climáticas e de períodos de entressafra, ao contrário, é possível manter o trabalho regido por horário fixo e por dias certos e determinados.
A trabalhadora em regime de economia familiar, considerada segurada especial, não necessita comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias, bastando apenas demonstrar o exercício da referida atividade nos 12 (doze) meses anteriores ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
Neste sentido o entendimento de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari:
O vínculo com a Previdência Social, contudo, não se extingue com a extinção da relação de emprego. Nas hipóteses do art. 15 da lei nº 8.213/91, se mantém por um período de graça, dentro do qual o trabalhador continua sendo segurado da Previdência Social e, portanto, tem direito aos benefícios dela decorrentes, entre eles o salário - maternidade.
Saliento que o Regulamento da Previdência Social foi introduzido no ordenamento jurídico pelo decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, antes, portanto, do advento da lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, que alterou a redação do artigo 71 da lei nº 8.213/91. Quando foi editado, o artigo 97 do decreto nº 3.048/99 não era ilegal, considerando-se a redação anterior do artigo 71. Com a alteração do dispositivo legal, no entanto, perdeu seu suporte de validade e eficácia, não podendo mais ser aplicado pela autarquia previdenciária.
Não há que se falar em criação de novo benefício sem a correspondente fonte de custeio. Pelo que foi exposto até aqui, verifica-se que de novo benefício não se trata, haja vista a expressa previsão legal para concessão do benefício.
Quanto à fonte de custeio, o salário - maternidade, no caso de segurados que estejam no período de graça, será custeado da mesma forma que os demais benefícios concedidos a pessoas que se encontrem em período de graça. Aliás, essa é a própria essência do período de graça previsto na lei - deferir benefícios a pessoas que já contribuíram, mas que não estejam contribuindo no momento da concessão, respeitado o limite de tempo previsto na lei. A se aceitar a tese defendida pelo INSS, perderia o sentido o próprio artigo 15 da lei nº 8.213/91.
No mesmo sentido aqui esposado, admitindo o pagamento do salário - maternidade independentemente da manutenção de relação de emprego, vejam-se os seguintes arestos:
Do caso concreto.
Alega a parte autora que exerce atividade rural, na condição de trabalhadora rural e que permaneceu trabalhando até o nascimento de sua filha, em 07.02.2014, conforme certidão de nascimento de fls. 22.
Para comprovar a atividade rural, a autora colacionou aos autos, cópia dos seguintes documentos: CTPS de André Luiz Pontes de Lima (pai de sua filha), com anotações de vínculos de emprego de natureza rural nos períodos de 01.01.2002 a 03.07.2002, de 08.11.2004 a 22.04.2005, de 17.11.2005 a 28.04.2006, de 16.01.2007 a 08.02.2007 e de 14.09.2011 a 23.10.2011 (fls. 17-21)
Ressalto que o reconhecimento da qualidade de segurada especial apta a receber o específico benefício tratado nos autos desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida, a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal e, finalmente, para obtenção do salário maternidade ora questionado, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício, como define o § 2º do art. 93 do Decreto 3.048 /99.
Ante as disposições contidas no art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213 /91, os documentos apresentados pela parte autora, para que sirvam como início de prova material do labor rural; devem ser dotados de integridade probante autorizadora de sua utilização, não se enquadrando em tal situação aqueles documentos não contemporâneos ou posteriores ao nascimento do filho em razão do qual o benefício é requerido.
Com efeito, a certidão de nascimento da filha, e em razão do qual o benefício é requerido, cuja emissão é posterior ao período que se quer comprovar, trata-se de prova isolada e não corroborada por qualquer outro documento que qualifique a autora como lavradora, não sendo hábil a constituir início de prova material do labor rural da parte autora.
Ressalte-se, por oportuno, que é possível que os documentos do companheiro sejam considerados como início de prova material do labor rural da autora, pois, devido às peculiaridades da vida campesina, tem-se admitido que a condição de rurícola comprovada por documento pertencente ao marido seja estendida à esposa.
Nessa linha, julgados da Corte Superior:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO ONDE CONSTA O MARIDO LAVRADOR. EXTENSÃO DA QUALIDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR À ESPOSA. PRECEDENTES.
1. Conforme consignado na análise monocrática, consta dos autos a certidão de casamento da autora com o Sr. Sebastião Maurilio da Silva, já falecido, e lá qualificado como lavrador que, aliada à prova testemunhal, dão conta do exercício de atividade rural exercido em regime de economia familiar. Tal fato é reconhecido pela própria Corte.
2. Ora, se o Tribunal de origem reconheceu que há documento público do qual se consta como profissão do marido da autora lavrador e que houve testemunha para corroborar o depoimento da recorrente, não poderia ter decidido que "o Plano de Benefícios da Previdência Social, Lei n.º 8.213/91, não admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço, dispondo em seu artigo 55, parágrafo 3º, que a prova testemunhal só produzirá efeito quando baseada em início de prova material." Isto, frise-se novamente, porque há certidão de casamento onde a profissão de seu falecido esposo como rurícola.
3. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o documento probante da situação de camponês do marido é extensível à esposa, ainda que desenvolva tarefas domésticas, ante a situação de campesinos comum ao casal.
4. Saliente-se, por fim, que não há violação do enunciado da Súmula 7/STJ quando a decisão desta Corte se fundamenta nas próprias premissas traçadas pela Corte de origem para fundamentar sua decisão.
Agravo regimental improvido.". (AgRg no REsp 1448931/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. EXTENSÃO À ESPOSA.
1. A jurisprudência do STJ há muito firmou entendimento de que, diante da dificuldade de comprovação da atividade rural, em especial da mulher, há de se presumir que, se o marido desempenha este tipo de labor, a esposa também o fazia, em razão das características da atividade.
2. A execução em maior parte de tarefas domésticas pela autora não é óbice para a concessão da aposentadoria rural, visto a situação de campesinos comum ao casal.
3. Precedente: "Verificando-se, na certidão de casamento, a profissão de rurícola do marido, e de se considerar extensível a profissão da mulher, apesar de suas tarefas domésticas, pela situação de campesinos comum ao casal." (EREsp 137697/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 13.5.1998, DJ 15.6.1998, p. 12.) Agravo regimental improvido."
(AgRg no REsp 1309123/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 08/05/2012, DJe 15/05/2012).
Entretanto, alegando a autora ser companheira do possuidor dos documentos, para que haja a extensão da condição de rurícola, necessária a comprovação da união estável entre eles.
De início, observa-se que os documentos juntados aos autos não se mostram suficientes à correspondente comprovação, tendo em vista que foi trazida apenas a certidão de nascimento da filha em que são qualificados como genitores da criança (fl. 22).
Ademais, as testemunhas em nada esclareceram com relação à existência da união estável entre a autora e o pai de sua filha.
Nesse contexto, diante da inexistência de vida comum no período exigido, não é possível a extensão da condição de rurícola e a formação de início de prova material do labor rural da autora.
Ante a ausência de início de prova material, não restaram comprovados o trabalho rural da autora e sua condição de segurada à época da gestação, não satisfazendo o requisito imposto.
Portanto, não há se falar em deferimento de salário-maternidade à parte autora.
Dessa forma, não preenchidos os requisitos legais, é indevido o benefício pleiteado.
Consequentemente, condeno a parte autora ao pagamento da verba honorária, que ora estipulo em R$ 1.000,00 (hum mil reais), na esteira da orientação erigida pela E. Terceira Seção desta Corte (Precedentes: AR 2015.03.00.028161-0/SP, Relator Des. Fed. Gilberto Jordan; AR 2011.03.00.024377-9/MS, Relator Des. Fed. Luiz Stefanini). Sem se olvidar tratar-se de parte beneficiária da justiça gratuita, observar-se-á, in casu, a letra do art. 98 , parágrafo 3º, do CPC/2015.
Ante o exposto DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido.
É como voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 07/08/2017 18:17:25 |