Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5176685-87.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
15/02/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/02/2022
Ementa
E M E N T A
SALÁRIO MATERNIDADE. TRABALHADORA URBANA. AUSÊNCIA DE QUALIDADE DE
SEGURADA E CARÊNCIA.
I- Não comprovada a qualidade de segurada da autora e carência na época do parto, não há
como ser deferido o benefício pleiteado.
II- Apelação improvida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5176685-87.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: KETLIN SOARES MARQUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO BUSCAIN DA SILVA - SP406376-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5176685-87.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS visando à concessão de salário maternidade a trabalhadora
urbana
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido.
Inconformada, apelou a parte autora, requerendo a reforma integral da R. sentença.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5176685-87.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: KETLIN SOARES MARQUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO BUSCAIN DA SILVA - SP406376-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos
termos do art. 71 da Lei n.º 8.213/91, in verbis:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento
e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de
ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne
à proteção à maternidade."
Conforme a redação original do artigo 26 do mesmo diploma legal, a concessão do benefício
não dependia de carência.
Porém, com as alterações promovidas pela Lei nº 9.786/99, restringe-se a dispensa da carência
à concessão de "salário-maternidade para as seguradas empregada, trabalhadora avulsa e
empregada doméstica".
No que se refere à segurada contribuinte individual há a exigência do cumprimento da carência
de dez contribuições mensais, conforme dispõe o art. 25, inciso III, da Lei de Benefícios.
Outrossim, no que tange à carência, prevê o art. 24, da Lei de Benefícios, in verbis:
"Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para
que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos
meses de suas competências.
Parágrafo único. Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa
data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da
nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições
exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido." (grifos
meus)
Assim, depreende-se que os requisitos para a concessão do salário maternidade compreendem
a ocorrência do parto e a comprovação da qualidade de segurada da demandante. Em se
tratando de segurada contribuinte individual, há a exigência de um terceiro requisito: carência
de dez contribuições.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
Despicienda qualquer discussão quanto ao atendimento do primeiro requisito porquanto o
documento acostado aos autos comprova, inequivocamente, o nascimento da filha da
requerente em 12/11/15.
Relativamente à prova da qualidade de segurada da autora, a mesma alega que desempenhou
atividade laborativa “para a Prefeitura Municipal de Rifaina, contudo, através de um maquiado
contrato de estágio”.
Devo ressaltar que a atividade deestágiode estudantes somente foi regulamentada com a
edição da Lei nº 6.494/77, a qual estabeleceu, em seu artigo 1º, que as pessoas jurídicas de
Direito Privado e os órgãos da Administração Pública poderiam aceitar, como estagiários, os
alunos regularmente matriculados em cursos vinculados ao ensino público e particular.
Contudo, ressalvou expressamente, em seu artigo 4º, que o estágio não criaria vínculo
empregatício:
"Art. 4ºO estágio não cria vínculo empregatício de qualquer naturezae o estagiário poderá
receber bolsa, ou outra forma de contraprestação que venha a ser acordada, ressalvado o que
dispuser a legislação previdenciária, devendo o estudante, em qualquer hipótese, estar
segurado contra acidentes pessoais."
A Lei nº 11.788/08, que atualmente regulamenta essa atividade, também dispõe
expressamente, em seu artigo 3º, que o estágio não cria vínculo empregatício de qualquer
natureza.
No âmbito do direito previdenciário, observo que a Lei Orgânica da Previdência Social (Lei nº
3.807/60) definia como beneficiários da Previdência Social,"na qualidade de "segurados", todos
os que exercem emprego ou atividade remunerada no território nacional, salvo as exceções
expressamente consignadas nesta Lei".
Com a Lei nº 5.890/73, que alterou o artigo 2º da Lei nº 3.807/60, estabeleceu-se que
segurados seriam"todos os que exercem emprego ou qualquer atividade remunerada, efetiva
ou eventualmente,com ou sem vínculo empregatício, a título precário ou não, salvo as exceções
expressamente consignadas nesta lei"(grifos meus).
Assim, tendo em vista que não se encontravam descritos no rol dos segurados obrigatórios do
art. 5º daquele mesmo diploma legal, conclui-se que os estagiários - entendidos como
estudantes bolsistas que desenvolvem atividade remunerada sem vínculo empregatício -
poderiam inscrever-se na Previdência Social como segurados facultativos, hipótese em que
deveriam proceder ao recolhimento das contribuições previdenciárias.
Nesse sentido, já decidiu o C. STJ,in verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. ESTAGIÁRIO BOLSISTA. FINALIDADE. APRENDIZADO. LEI 5.890/73.
INSCRIÇÃO REGIME PREVIDENCIÁRIO. POSSIBILIDADE. SEGURADO FACULTATIVO.
RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. NECESSIDADE. DESEMPENHO DE ESTÁGIO.
VÍNCULO EMPREGATÍCIO. NÃO CONFIGURADO. TEMPO DE SERVIÇO. APOSENTAÇÃO.
INCABÍVEL. LEI 6.494/77. AGRAVO DESPROVIDO.
I - Da análise dos autos, verifica-se que o recorrido participou de estágio, com base na Portaria
Ministerial 1.002, de 29/09/1967, sem vínculo empregatício, junto à COSERN - Cia. de Serviços
Elétricos do Rio Grande do Norte no período de 09/08/1978 a 21/12/1978, na qualidade de
estudante do curso de Engenharia.
II - Não há se confundir vínculo estabelecido para fins de estágio, cujo interesse é o
aprendizado do bolsista, com a atividade empregatícia, tendo em vista sua natureza diversa,
que é a exploração da mão-de-obra.
III - No que pese a Lei 5.890, de 08 de junho de 1973, que alterou a Lei 3.807 de 26 de agosto
de 1960, em seu artigo 2º, possibilitar que o estagiário figure como segurado, não o enquadra
como segurado obrigatório, consoante os termos do seu artigo 5º.
IV - O artigo 2º da Lei 5.890/73 facultava ao estudante bolsista ou a qualquer outro que
exercesse atividade remunerada, efetiva ou eventual, com ou sem vínculo empregatício, a título
precário ou não, inscrever-se no regime de previdência, como segurado facultativo. Para tanto,
devia verter as contribuições inerentes ao sistema.
V - Na hipótese dos autos, o desempenho de estágio, na Cia. de Energia Elétrica, conforme
documentos acostados aos autos, não configura vínculo empregatício, sendo incabível o
cômputo desse período para fins de aposentação, nos termos do art. 4º da Lei 6.494/77.
VI - Agravo interno desprovido.
(STJ, AgRg no REsp. nº 644.723/RN, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 16/9/04, votação
unânime, DJ 3/11/04, grifos meus).
Atualmente, a Lei nº 8.213/91 mantém os estagiários excluídos do rol dos segurados
obrigatórios, permitindo, todavia, que contribuam facultativamente à Previdência Social.
Assim, conclui-se que os estagiários, não sendo empregados, não possuem deveres
trabalhistas ou previdenciários - e tampouco gozam dos respectivos benefícios -, já que seu
vínculo com a instituição é de ordem educacional.
Tanto é que o recebimento de contraprestação pecuniária se dá a título de bolsa de estudos,
não constituindo hipótese de incidência de tributos destinados à manutenção da Previdência
Social.
Nos dizeres de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior em"Comentários à Lei
de Benefícios da Previdência Social", Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2005, p. 61:"o
estagiário não é segurado da previdência social. O estágio é uma oportunidade para que o
estudante possa complementar sua formação, adquirindo experiência empírica no desempenho
de tarefas afetas à própria futura profissão".
Verifica-se, assim, que o estágio, ainda que remunerado, não se equipara à relação de
emprego, sendo que somente pode ser computado como tempo de serviço para fins
previdenciários na hipótese de ficar comprovada a qualidade de empregado, com
desvirtuamento da atividade de estagiário, ou, ainda, caso tenha havido recolhimento de
contribuições como segurado facultativo.
In casu, com relação ao período de estágio da parte autora, encontram-se acostadas aos autos
os seguintes documentos:
- Cópias de termos de estágio na área jurídica realizado de 24/4/14 a 30/6/15 (ID 221136210).
Os documentos apresentados não comprovam que houve descaracterização da atividade de
estágio, não sendo capazes de demonstrar que a parte autora exerceu suas atividades
comoempregadona instituição em que estagiou.
Ademais, os depoimentos das testemunhas arroladas (sistema de gravação audiovisual – link
de acesso – ID 238848524) não foram robustas no sentido de que tenha havido o
desvirtuamento da atividade de estágio.
Dessa forma,não há como possa ser reconhecido o tempo de serviço referente ao estágio
exercido de 24/4/14 a 30/6/15.
Como bem asseverou o MM. Juiz a quo: “A autora não comprova que era segurada quando do
direito ao benefício. Diz a autora que na época “trabalhava para a Prefeitura Municipal de
Rifaina, contudo, através de um maquiado contrato de estágio”. O ingresso no serviço público
se dá mediante concurso público. Se existe um labor maquiado isto deve ser discutido na seara
adequada com ampla defesa, contraditório e devido processo legal. E, obviamente, com a
participação do tal empregador”.
Dessa forma, não comprovada a qualidade de segurada e a carência da autora na época do
parto, não há como ser deferido o benefício pleiteado.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o meu voto.
E M E N T A
SALÁRIO MATERNIDADE. TRABALHADORA URBANA. AUSÊNCIA DE QUALIDADE DE
SEGURADA E CARÊNCIA.
I- Não comprovada a qualidade de segurada da autora e carência na época do parto, não há
como ser deferido o benefício pleiteado.
II- Apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
