
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081032-24.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ALINE PEREIRA DOS REIS
Advogado do(a) APELANTE: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081032-24.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ALINE PEREIRA DOS REIS
Advogado do(a) APELANTE: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por ALINE PEREIRA DOS REIS em face do INSS, objetivando a concessão do benefício de salário-maternidade.
A autora requer o recebimento do salário-maternidade, indeferido pelo INSS por entender que não ficou demonstrada a condição de qualidade de segurada especial (trabalhadora rural).
A r. sentença (ID 267896517) julgou o pedido inicial improcedente, condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, ressalvando-se, contudo, a concessão da justiça gratuita.
Interposto recurso de apelação pela autora (ID 267896522), em que pugna pela reforma da r. sentença. Sustenta, em síntese, que as provas carreadas comprovaram o exercício da atividade campesina pelo tempo necessário à concessão do benefício.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte Regional.
Em decisão de ID 268036223, o apelo interposto foi recebido em ambos os efeitos, nos termos do art. 1.012, caput, do CPC.
É o relatório.
vmn
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081032-24.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ALINE PEREIRA DOS REIS
Advogado do(a) APELANTE: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Inicialmente, tempestivo o recurso e presentes os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da insurgência propriamente dita, considerando a matéria objeto de devolução.
Cinge-se a controvérsia em dirimir se a autora, ostentava ou não a qualidade de segurada rural no período necessário à concessão do salário-maternidade.
Ressalto que, em observância ao princípio tempus regit actum, a concessão do benefício deverá observar os requisitos previstos na legislação vigente ao tempo da maternidade ou adoção.
Do salário-maternidade
O benefício do salário-maternidade tem previsão constitucional no artigo 201, inciso II, da Constituição da República, que prevê a “proteção à maternidade, especialmente à gestante”, à qual é garantido o direito, previsto no artigo 7º, inciso XVIII, à “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”.
A Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS), Lei nº 8.213/91, disciplina o tema em seus artigos 71 a 73, e o Regulamento da Previdência Social (RPS), Decreto nº 3.048/99, trata do assunto em seus artigos 93 a 103.
Consiste o salário-maternidade na prestação da Previdência Social que tem como fato gerador o parto, a adoção ou a guarda para fins de adoção.
Do período de concessão do salário-maternidade
O benefício é devido pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias, sempre condicionado ao afastamento do trabalho ou da atividade desempenhada, nos termos dos artigos 71, 71-A e 71-C da Lei nº 8.213/91.
É cediço que, a Lei nº 11.770, de 09/09/2008, prorrogou a licença-maternidade por mais 60 (sessenta) dias, estabelecendo em seu artigo 3º, inciso I, que “a empregada terá direito à remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS)”. Essa remuneração, no entanto, deve ser paga pela empresa empregadora, mediante a concessão de incentivo fiscal, conforme o denominado Programa Empresa Cidadã.
O início do direito ao benefício, no caso da maternidade, tem por termo o período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação, conforme o artigo 71 da LBPS.
No caso das mães de crianças acometidas por sequelas neurológicas decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, foi assegurado o recebimento do benefício por 180 (cento e oitenta) dias, na forma do artigo 18, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 13.301/16.
Na hipótese de aborto não criminoso, comprovado mediante atestado médico, a segurada terá direito ao salário-maternidade correspondente a duas semanas (artigo 93, § 5º, do Decreto n.º 3.048/99).
O C. STF foi instado a conferir interpretação conforme à Constituição Federal aos referidos comandos normativos, para fins de considerar a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe como termo inicial da licença-maternidade e do salário-maternidade, o que ocorrer por último.
Ao conceder a Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI-MC 6.327, o eminente Relator, Ministro Edson Fachin, prestigiou o comando do artigo 24 da Convenção sobre os Direitos da Criança, Decreto nº 99.710/1990, bem como Estatuto da Primeira Infância, veiculado pela Lei nº 13.257/2016, que alterou a redação do Estatuto da Criança e do Adolescente, para reconhecer a necessidade de proteção das crianças recém-nascidas e do momento pós-parto às mães.
A referida Medida Cautelar foi referendada pela C. Suprema Corte que decidiu, em sessão plenária virtual de 27 de março a 2 de abril de 2020, por maioria de votos, preliminarmente, na conformidade com a ata de julgamento, “conhecer da Ação Direta de Inconstitucionalidade como Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e, no mérito, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, referendar a liminar deferida a fim de conferir interpretação conforme à Constituição ao artigo 392, §1º, da CLT, assim como ao artigo 71 da Lei 8.213/1991 e, por arrastamento, ao artigo 93 do seu Regulamento (Decreto 3.048/1999), e assim assentar a necessidade de prorrogar o benefício, bem como considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder as duas semanas previstas no art. 392, §2º, da CLT, e no art. 93, §3º, do Decreto 3.048/1999, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Marco Aurélio, que indeferia a liminar”.
Trago a ementa do v. acórdão, in verbis:
“REFERENDO DE MEDIDA CAUTELAR. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ADI. IMPUGNAÇÃO DE COMPLEXO NORMATIVO QUE INCLUI ATO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO. FUNGIBILIDADE. ADPF. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. REQUISITOS PRESENTES. CONHECIMENTO. PROBABILIDADE DO DIREITO. PROTEÇÃO DEFICIENTE. OMISSÃO PARCIAL. MÃES E BEBÊS QUE NECESSITAM DE INTERNAÇÃO PROLONGADA. NECESSIDADE DE EXTENSÃO DO PERÍODO DE LICENÇA MATERNIDADE E DE PAGAMENTO DE SALÁRIO-MATERNIDADE NO PERÍODO DE 120 DIAS POSTERIOR À ALTA. PROTEÇÃO À MATERNIDADE E À INFÂNCIA COMO DIREITOS SOCIAIS FUNDAMENTAIS. ABSOLUTA PRIORIDADE DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS. DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR. MARCO LEGAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA. ALTA HOSPITALAR QUE INAUGURA O PERÍODO PROTETIVO.
1. Preliminarmente, assento, pela fungibilidade, o conhecimento da presente ação direta de inconstitucionalidade como arguição de descumprimento de preceito fundamental, uma vez que impugnado complexo normativo que inclui ato anterior à Constituição e presentes os requisitos para a sua propositura.
2. Margem de normatividade a ser conformada pelo julgador dentro dos limites constitucionais que ganha relevância no tocante à efetivação dos direitos sociais, que exigem, para a concretização da igualdade, uma prestação positiva do Estado, material e normativa. Possibilidade de conformação diante da proteção deficiente. Precedente RE 778889, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/03/2016.
3. O reconhecimento da qualidade de preceito fundamental derivada dos dispositivos constitucionais que estabelecem a proteção à maternidade e à infância como direitos sociais fundamentais (art. 6º) e a absoluta prioridade dos direitos das crianças, sobressaindo, no caso, o direito à vida e à convivência familiar (art. 227), qualifica o regime de proteção desses direitos.
4. Além disso, o bloco de constitucionalidade amplia o sistema de proteção desses direitos: artigo 24 da Convenção sobre os Direitos da Criança (Decreto n.º 99.710/1990), Objetivos 3.1 e 3.2 da Agenda ODS 2030 e Estatuto da Primeira Infância (Lei n.º 13.257/2016), que alterou a redação do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069/1990), a fim de incluir no artigo 8º, que assegurava o atendimento pré e perinatal, também o atendimento pós-natal. Marco legal que minudencia as preocupações concernentes à alta hospitalar responsável, ao estado puerperal, à amamentação, ao desenvolvimento infantil, à criação de vínculos afetivos, evidenciando a proteção qualificada da primeira infância e, em especial, do período gestacional e pós-natal, reconhecida por esta Suprema Corte no julgamento do HC coletivo das mães e gestantes presas (HC 143641, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 20/02/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 08-10-2018 PUBLIC 09-10-2018).
5. É indisputável que essa importância seja ainda maior em relação a bebês que, após um período de internação, obtêm alta, algumas vezes contando com já alguns meses de vida, mas nem sempre sequer com o peso de um bebê recém-nascido a termo, demandando cuidados especiais em relação a sua imunidade e desenvolvimento. A alta é, então, o momento aguardado e celebrado e é esta data, afinal, que inaugura o período abrangido pela proteção constitucional à maternidade, à infância e à convivência familiar.
6. Omissão inconstitucional relativa nos dispositivos impugnados, uma vez que as crianças ou suas mães que são internadas após o parto são desigualmente privadas do período destinado à sua convivência inicial.
7. Premissas que devem orientar a interpretação do art. 7º, XVIII, da Constituição, que prevê o direito dos trabalhadores à “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias.” Logo, os cento e vinte dias devem ser considerados com vistas a efetivar a convivência familiar, fundada especialmente na unidade do binômio materno-infantil.
8. O perigo de dano irreparável reside na inexorabilidade e urgência da vida. A cada dia, findam-se licenças-maternidade que deveriam ser estendidas se contadas a partir da alta, com o respectivo pagamento previdenciário do salário-maternidade, de modo a permitir que a licença à gestante tenha, de fato, o período de duração de 120 dias previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição.
9. Presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, defiro a liminar, a fim de conferir interpretação conforme à Constituição ao artigo 392, §1º, da CLT, assim como ao artigo 71 da Lei n.º 8.213/91 e, por arrastamento, ao artigo 93 do seu Regulamento (Decreto n.º 3.048/99), e assim assentar (com fundamento no bloco constitucional e convencional de normas protetivas constante das razões sistemáticas antes explicitadas) a necessidade de prorrogar o benefício, bem como considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder as duas semanas previstas no art. 392, §2º, da CLT, e no art. 93, §3º, do Decreto n.º 3.048/99.” (ADI 6327 MC-Ref, Relator Ministro EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, j. 03/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO, publ.19/06/2020)
Em conformidade ao que foi estabelecido na ADI-MC 6.327, o INSS editou a Portaria Conjunta nº 28, de 19/03/2021, prevendo em seu artigo 1º, §§ 2º e 3º, a prorrogação do salário-maternidade durante todo o período de internação e, ainda, por mais 120 dias, contados a partir da alta do recém-nascido e/ou da mãe, o que ocorrer por último, descontado o período de pagamento da benesse antes do parto. Todavia, a norma prevê aplicação apenas aos requerimentos com fato gerador a partir de 13/03/2020.
Ainda a respeito do prazo da licença-maternidade, este deve ser equiparado ao da licença-adotante, conforme assentou o C. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 778.889, estabelecendo a tese de repercussão geral do Tema 782/STF: “Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada”, (Tribunal Pleno, j.10/03/2016, trans. em julgado 26/08/2016).
Dos beneficiários do salário-maternidade
Tem direito à percepção do salário-maternidade, como sujeito ativo do benefício, as seguradas: a) empregadas, b) trabalhadoras avulsas e c) empregadas domésticas, conforme a redação original da LBPS. Posteriormente, foi estendido às d) seguradas especiais, pela Lei nº 8.861, de 25/03/1994. Por sua vez, foram contempladas as seguradas e) contribuintes individuais e f) facultativas, na forma da Lei nº 9.876, de 26/11/1999.
Além disso, a partir da Lei nº 10.421, de 15/04/2002, o direito foi estendido à g) segurada que adotar ou h) àquela que obtiver a guarda judicial, conforme o artigo 71-A incluído à LBPS. Ainda, foi ampliado o rol de beneficiários para alcançar, na forma da Lei n. 12.873, de 24/10/2013, que deu nova redação ao artigo 71-A, também os i) segurados da Previdência que adotarem ou obtiverem a guarda judicial para fins de adoção, independentemente da idade da criança.
Com a vigência da Lei nº 12.873/13, em 25/10/2013, também se garantiu direito ao salário-maternidade ao segurado, e não apenas à segurada, que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança.
A prestação não poderá ser recebida por mais de um segurado, decorrente do mesmo processo de adoção ou guarda, ainda que o cônjuge ou companheiro seja submetido a Regime Próprio da Previdência Social, nos termos do artigo 71-A, § 2º, da LBPS.
Na hipótese de falecimento da segurada ou do segurado, o restante do período devido será pago ao cônjuge ou companheiro sobrevivente, que tenha a qualidade de segurado, contanto que este se afaste do trabalho ou da atividade, e requeira até o último dia do prazo para término da prestação, consoante o artigo 71-B da LBPS.
Cumpre observar, ainda, que o indígena pode ser reconhecido como segurado especial, sob certas condições, de acordo com o disposto na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45, que diz:
“Art. 7º É segurado na categoria de segurado especial, conforme o inciso VII do art. 9º do RPS, a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
(...)
§ 3º Enquadra-se como segurado especial o índio reconhecido pela Fundação Nacional do Índio - FUNAI, inclusive o artesão que utilize matéria-prima proveniente de extrativismo vegetal, desde que atendidos os demais requisitos constantes no inciso V do § 4 deste artigo, independentemente do local onde resida ou exerça suas atividades, sendo irrelevante a definição de indígena aldeado, indígena não-aldeado, índio em vias de integração, índio isolado ou índio integrado, desde que exerça a atividade rural individualmente ou em regime de economia familiar e faça dessas atividades o principal meio de vida e de sustento.” (Alterada pela IN INSS/PRES Nº 61, DE 23/11/2012).
Ademais, é devido o benefício à genitora indígena com idade inferior a 16 (dezesseis) anos. Precedentes: RE 1061044 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, j. 22/02/2019, publ. 18/03/2019.
Quanto a segurada especial (trabalhadora rural), no que tange à comprovação da atividade campesina, registro que a comprovação do tempo de serviço, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Nesse sentido, o enunciado de Súmula n.º 149 do c. Superior Tribunal de justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário".
Consoante o entendimento firmado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do CPC/1973, bem como do enunciado de Súmula nº 577, é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.
Contudo, o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, ou seja, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro.
Nesse sentido, tem-se o enunciado de Súmula nº 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU ("Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar."), bem como os seguintes precedentes do c. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte:
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO LEGAL DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA. INEXISTÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149/STJ. AÇÃO IMPROCEDENTE. 1. Nenhum dos documentos apresentados comprova o exercício da atividade rural no período de carência (138 meses - artigos 142 e 143 da Lei nº 8213/91) imediatamente anterior ao requerimento do benefício (2004), havendo apenas a prova testemunhal colhida. 2. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que "conquanto não se exija a contemporaneidade da prova material durante todo o período que se pretende comprovar o exercício de atividade rural, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, admitida a complementação da prova mediante depoimentos de testemunhas" (AgRg no REsp 1150825/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 23/10/2014). 3. Incide a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário"), cuja orientação foi confirmada no julgamento do REsp n. 1.133.863/RN, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador Convocado do TJ/SP), Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011, submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, uma vez que, no presente caso, a prova testemunhal não se fez acompanhar de qualquer documento contemporâneo ao tempo de atividade reclamado. 4. Ação rescisória improcedente." (STJ, 3ª Seção, AR 3994, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, v.u., DJe 23.09.2015)
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. ÓBITO DO CÔNJUGE. INÍCIO MATERIAL DE PROVA. AUSÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESP 1.352.721/SP. - A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. - Possibilidade de demonstração do labor campesino, mediante utilização de princípios de provas em nome do cônjuge da postulante da aposentadoria por idade, mesmo após o falecimento deste. - Nessa circunstância, os documentos indiciários devem guardar proximidade ao lapso de carência, exigindo-se, ainda, prova testemunhal robusta, no sentido de que a solicitante persistiu a labutar nas lides rurais, até completar a idade mínima à aposentação postulada. - In casu, muito embora as testemunhas tenham afirmado que a parte autora exerceu labor rural pelo interregno de carência, os elementos havidos como princípios de prova documental desservem à finalidade probante, à falta de contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual haveria de ser demonstrada a faina campestre. - Precedente do STJ submetido à sistemática dos recursos representativos de controvérsia (REsp nº 1.352.721/SP), no qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material do labor campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito. - Embargos infringentes desprovidos. - Extinção do processo, de ofício, sem resolução do mérito.(TRF3, 3ª Seção, EI 00330343420114039999, relatora Desembargadora Federal Ana Pezarini, v.u., DJe 01.12.2017)
Entende a jurisprudência ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural (confira-se: STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05/03/2015).
Em complementação ao tema, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
Também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Registra-se que o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o empregado, diarista, volante etc., eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.
Nesse sentido, consigno trecho do voto condutor da relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, no julgamento proferido, em 22/06/2017, desta 3ª Seção, referente à Ação Rescisória n.º 2015.03.00.004818-6:
"[...] O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais e filhos, e em outras hipóteses nas quais presente o parentesco.
No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho desempenhado.
Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem, mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos. [...]"
Da carência para o salário-maternidade
Independe de carência a concessão do salário-maternidade às seguradas empregadas urbanas e rurais, trabalhadoras avulsas e empregadas domésticas, conforme preconiza o inciso VI do artigo 26 da Lei nº 8.213/91.
No que se refere à segurada especial, o parágrafo único do artigo 39 do referido diploma legal, incluído pela Lei n.º 8.861/94, exigia a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.
Todavia, a partir de 29/11/1999, a carência foi reduzida para 10 meses, por meio da Lei n.º 9876/99, razão pela qual o parágrafo único do artigo 39 da Lei de Benefícios foi tacitamente revogado, prevalecendo o artigo 25 inciso III da Lei n.º 8213/91 com a redação dada pela Lei n.º 9876/99, por ser norma posterior, sendo este o posicionamento administrativo do INSS. Confira-se:
“Artigo 346 da Instrução Normativa INSS n.º 77 de 2015 – O direito ao salário-maternidade para a segurada especial foi outorgado pela Lei nº 8.861, de 25 de março de 1994, sendo devido o benefício a partir de 28 de março de 1994, conforme segue:
I - até 28 de novembro de 1999, véspera da Lei n.º 9.876, de 1999, para fazer jus ao benefício era obrigatória a comprovação de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos doze meses anteriores ao parto; e
II - a partir de 29 de novembro de 1999, data da publicação da Lei nº 9.876, de 1999, o período de carência a ser comprovado pela segurada especial foi reduzido de doze meses para dez meses anteriores à data do parto, mesmo que de forma descontínua.”
Cumpre ressaltar que, a partir da Lei nº 13.846/2019, a redação atual do art. 25 da LBPS voltou a exigir doze meses para concessão do aludido benefício, conforme se transcreve a seguir:
“Art. 25 - A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...) III - salário-maternidade para as seguradas de que tratam os incisos V e VII do caput do art. 11 e o art. 13 desta Lei: 10 (dez) contribuições mensais, respeitado o disposto no parágrafo único do art. 39 desta Lei; e (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019).”
(...) Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
(...) Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário-mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.”
Porém, não se pode perder de vista que a norma que regula a concessão do benefício vindicado é a vigente na época do nascimento/parto, que, na hipótese vertente, era o artigo 25 inciso III, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99, que estabelecia a demonstração do período de carência de 10 meses anteriores à data do parto, consoante art. 346 da mencionada Instrução Normativa INSS nº 77 de 2015.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei nº 8.213/91, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição da Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Esse prazo, entretanto, é menor no caso de parto antecipado, pois o parágrafo único do artigo 25 da LBPS estabelece que o período de carência “será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que o parto foi antecipado”, conforme a redação da Lei nº 9.876/1999.
Da decadência
Durante o período compreendido entre 25/03/1994 a 10/12/1997, na vigência da Lei nº 8.861, de 25/03/1994, que alterou o artigo 71 da Lei nº 8.213/1991, havia na ordem jurídica a regra estabelecendo o prazo de até 90 (noventa) dias após o parto para requerimento do benefício de salário-maternidade devido às seguradas rurais e domésticas. Essa regra foi revogada pela Lei nº 9.528/1997.
Todavia, esse comando sobre a decadência não deve ser aplicado, em observância do que foi pacificado pelas Cortes Superiores.
Nesse sentido, o C. STF cristalizou o Tema 313/STF: “I – Inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário; II – Aplica-se o prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefícios concedidos, inclusive os anteriores ao advento da Medida Provisória 1.523/1997, hipótese em que a contagem do prazo deve iniciar-se em 1º de agosto de 1997”. (RE 626.489, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, j. 16/10/2013, Repercussão Geral – Mérito, publ. 23/09/2014; redação tese em Sessão 09/12/2015).
O C. STJ, revisitando a sua r. jurisprudência, reconheceu a inaplicabilidade do prazo decadencial de 90 (noventa) dias para a concessão do salário-maternidade, superando o entendimento acerca da aplicação da referida norma, já revogada, inclusive no período de sua vigência. Precedente: AgRg no AREsp 593.933/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/04/2018.
Destaque-se, ainda, no que concerne ao decurso de prazo decadencial para obtenção de fruição futura de benefício, decorrente de revisão de ato do INSS de “indeferimento, cancelamento ou cessação”, o C. STF decretou a inconstitucionalidade, em parte, do artigo 24 da Lei nº 13.846, de 18/06/2019, que alterou o referido artigo 103, no julgamento da ADI 6096, sob o entendimento de que a incidência de decadência na hipótese atenta contra a preservação do fundo de direito.
Da fonte de custeio
A questão acerca de violação ao princípio da precedência da fonte de custeio e ao equilíbrio financeiro atuarial, consagrado no artigo 195, § 5º, da Constituição da República, resta prejudicada, porquanto a contribuição social sobre o salário-maternidade, emanada do exercício do direito tributário da União, nos termos do artigo 28, § 2º, e parte final da alínea a, do § 9º, da Lei nº 8.212, de 24/07/1991, a denominada Lei de Custeio da Previdência Social, foi considerada inconstitucional.
O C. STF pacificou esse entendimento no julgamento do RE nº 576.967, cristalizando o Tema 72/STF: “É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade”.
Assim, os segurados não podem ser privados da percepção de benefício previdenciário por incongruência no exercício do direito de tributar por parte União. A pessoa jurídica de direito público tem o dever de criar os tributos, para os quais lhe foi outorgada competência pelo Poder Constituinte, sempre observando as máximas constitucionais que garantem a efetividade do valor segurança jurídica, especialmente, o princípio da estrita legalidade tributária.
Feitas estas observações, cumpre analisar a presença dos requisitos legais necessários à concessão do benefício vindicado.
Do caso dos autos
A autora pleiteia o benefício de salário-maternidade, em virtude do nascimento de seu filho, Ícaro Ryan Pereira Gregório, ocorrido em 09/03/2019, conforme certidão de nascimento (ID 267896381 – fl. 01).
No presente feito, a parte autora busca a demonstração do direito na qualidade de segurada especial, para a qual é preciso a comprovação do labor rural durante os 12 (doze) meses anteriores ao nascimento.
A comprovação da atividade rural pode ser realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da LBPS, in verbis:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...) § 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
A interpretação desse dispositivo legal foi assentada pelo C. STJ no verbete da Súmula 149, “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, j. 07/12/1995, DJ 18/12/1995).
Portanto, é vedado o reconhecimento de tempo de trabalho rurícola mediante prova exclusivamente testemunhal, impondo-se que o conjunto probatório seja orientado pela harmonia das provas material e testemunhal idônea.
Na exordial, a demandante afirma trabalhar em regime de economia familiar e como diarista “boia fria” para diversos produtores rurais, afirma que trabalha na lavoura, e na qualidade de segurada especial, requereu a concessão do benefício de salário-maternidade na agência da Previdência Social. Entretanto, o benefício restou injustamente indeferido pelo INSS, ensejando a propositura do presente feito.
Para demonstrar as alegações, a demandante juntou os seguintes documentos:
- Certidão de nascimento da primeira filha (nascida em 13/02/2006), constando a profissão do genitor e companheiro da autora como lavrador (ID 267896381 – fl. 02);
- CNIS e CTPS da autora em que consta vínculo empregatício, como trabalhadora na olericultura, no período de 26/11/2014 a 02/11/2015 (ID 267896435 e 267896437);
- CNIS do genitor do filho da autora e companheiro da autora, Sr. Edvaldo José Ribeiro Gregório, em que consta vínculo empregatício no período de 01/09/2017 a 02/01/2018 (ID 267896470).
Cabe ressaltar a existência de prova oral. A audiência foi realizada em 25/05/2022, perante o Juízo da 2ª Vara da Comarca de Ibiúna/SP, e foram ouvidas duas testemunhas (mídias digitais – ID 272519404 e 272519406).
- Testemunha Jocelia Santos Silva, disse que conhece a autora há 5 ou 6 anos, mora no bairro Vila Morais, na cidade Piedade, autora mora bairro Furnas, em Piedade. Declarou que autora estava grávida do Ícaro quando trabalhou em Ibiúna, e depois que ele nasceu (Ícaro) foi morar em Furnas (cidade de Piedade/SP), disse que conhece o companheiro da autora, o Edvaldo e que ele trabalha na roça. Declarou que a autora trabalha na roça, com plantação, que a autora tem mais 2 filhos, e que nesse período em que conhece a autora, a autora sempre trabalhou na roça, para vários empregadores rurais (Laércio, Takioshi) e que já trabalhou com o companheiro da autora na roça também.
- Testemunha Tatiana Fernandes da Luz: disse que conhece a autora há 8 anos, mora no bairro Coitianos, na cidade de Piedade, a autora mora no bairro Furnas, em Piedade, disse que conheceu a autora na roça, que nesses 8 anos sempre trabalharam juntas na roça, quando a autora estava grávida do Ícaro a autora trabalhava na roça, teve o bebê em Ibiúna, quando trabalhava para o “Takioshi”, que a autora sempre trabalhou na roça e que a autora trabalha na roça até os dias de hoje. Declarou que conhece o companheiro da autora, que trabalha na roça também, disse que a autora tem outros dois filhos e que enquanto estava grávida do Ícaro, a autora trabalhava na roça para o “Takioshi”, que a autora e o esposo sempre exerceram trabalho rural.
Assim, os testemunhos foram uníssonos em afirmar que a autora exerce atividade rural e trabalhou na lavoura (roça) quando gestante.
E os documentos juntados constituem início de prova material, o que foi corroborado pela prova testemunhal, confirmando a atividade campesina da parte autora.
Nesse contexto, os depoimentos das testemunhas ouvidas no curso da instrução confirmam que a autora exerceu atividade de rural e trabalhou na lavoura quando gestante. Cabe lembrar que a concessão do aludido benefício à segurada especial, com fundamento na Lei nº 8.213/91, dispensa a comprovação de recolhimentos de contribuições.
Diante dessas considerações, o início de prova material e a prova testemunhal formam um conjunto harmônico, apto a demonstrar que a parte autora exerceu o labor campesino no período exigido em lei. Portanto, a reforma da r. sentença é medida que se impõe.
Portanto, reconheço o exercício de atividade rural no período de carência imediatamente anterior ao parto, sendo devido a percepção do benefício no valor de um salário mínimo mensal, vigente no vigésimo oitavo dia antecedente à data do parto, ocorrido em 09/03/2019, sendo-lhe devido o total de quatro salários mínimos, nos termos do art. 71 e seguintes da Lei nº 8.213/91.
Dos juros de mora e correção monetária
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se os critérios constantes no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE nº 870.947 até a publicação da EC nº 113/2021 (ocorrida em 09/12/2021), a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic, acumulada mensalmente, ficando vedada a incidência da taxa Selic com juros e correção monetária.
Das custas e despesas processuais
As autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal, a teor do disposto no art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96. A normatização sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da competência delegada, nos termos do art. 1º, §1º, deste diploma legal, é delegada à legislação estadual.
Desta feita, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal e naquelas aforadas na Justiça do Estado de São Paulo, por força da Lei Estadual/SP nº 11.608/03 (art. 6º).
Quanto aos processos que tramitaram no Estado de Mato Grosso do Sul, nos termos da Lei nº 3.779/09 (art. 24, §§1º e 2º), é de se atribuir ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais, ressaltado que, em observância ao disposto no art. 27 do CPC, o recolhimento somente deve ser exigido ao final da demanda, se sucumbente.
A isenção referida não abrange as demais despesas processuais, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), bem como aquelas eventualmente devidas a título de reembolso à parte contrária.
Honorários Advocatícios
Tendo sido o direito pleiteado reconhecido apenas com o julgamento do recurso de apelação, incumbe o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor das prestações vencidas até a data do acórdão. Precedentes: STJ - REsp: 2068610, Rel. BENEDITO GONÇALVES, Dje 15/05/2023; TRF3 - ApCiv: 50050438720174036183 SP, Rel. Des. Fed. NILSON LOPES, Décima Turma, Dje 17/12/2021.
Dispositivo
Diante do exposto, dou provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHO RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE CAMPESINA. PROVA MATERIAL INDICIÁRIA EXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL SUFICIENTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
- O salário-maternidade consiste na prestação da Previdência Social que tem como fato gerador o parto, a adoção ou a guarda para fins de adoção.
- No que se refere à segurada especial, o parágrafo único do art. 39 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei nº 8.861/94, exigia a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.
- A partir de 29/11/1999, a carência foi reduzida para 10 meses, por meio da Lei nº 9876/99, razão pela qual o parágrafo único do artigo 39 da LBPS foi tacitamente revogado, prevalecendo o artigo 25 inciso III da Lei nº 8.213/91 com a redação dada pela Lei n.º 9876/99, por ser norma posterior, sendo este o posicionamento administrativo do INSS (art. 346 da Instrução Normativa INSS n.º 77 de 2015).
- Com o advento da Lei nº 13.846/2019, a redação atual do art. 25 da Lei de Benefícios voltou a exigir doze meses para concessão do aludido benefício. Porém, não se pode perder de vista que a norma que regula a concessão do benefício vindicado é a vigente na época do nascimento/parto, que, na hipótese vertente, era o artigo 25 inciso III, com a redação dada pela Lei n.º 9.876/99, que estabelecia a demonstração do período de carência de 10 meses anteriores à data do parto, consoante art. 346 da mencionada Instrução Normativa INSS n.º 77 de 2015.
- No que tange à comprovação da atividade campesina, registro que a comprovação do tempo de serviço, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Nesse sentido, o enunciado de Súmula n.º 149 do c. Superior Tribunal de justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário".
- A qualidade de segurada especial restou comprovada por meio de início razoável de prova material, corroborado por prova testemunhal.
- A concessão do benefício à segurada especial, com fundamento no parágrafo único do artigo 39 da Lei nº 8.213/91, dispensa a comprovação de recolhimentos de contribuições.
- Reconhecido o exercício de atividade rural no período de carência imediatamente anterior ao parto, a autora faz jus à percepção do benefício no valor de um salário mínimo mensal, vigente no vigésimo oitavo dia antecedente à data do parto, ocorrido em 09/03/2019, sendo-lhe devido o total de quatro salários mínimos, nos termos do art. 71 e seguintes da Lei n.º 8.213/91.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE nº 870.947, até a edição da EC nº 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
- Honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor das prestações vencidas até a data do acórdão.
- A teor do disposto no art. 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/96, as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal.
- Apelação da parte autora provida.
