Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5275499-71.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 11/12/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA ANULADA.EXTRA PETITA.LOAS. DEFICIÊNCIA NÃO
COMPROVADA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PREJUDICADA.
1 - Impõe-se reconhecera ocorrência dejulgamentoextra petita,uma vez que a sentença decidiu
pretensão diversa da pleiteada na petição inicial da presente ação,o que impõe a decretação de
sua nulidade, na forma docaput do artigo 492 do CPC/2015.
2 -Condições de imediato julgamento.Incidência doartigo 1.013, § 3º, II, do CPC/2015.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais não preenchidos.
5 - Olaudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui efetivo impedimento
ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo capaz de exercer suas
atividades habituais de forma plenamente autônoma, de modo que não faz jus ao benefício
requerido.
6 - Vencida a parte autora, a ela incumbe o pagamento de custas e despesas processuais -
inclusive honorários periciais -, e dos honorários do advogado, fixados em 10% do valor
atualizado atribuído à causa, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, §
3º, do CPC/2015, por ser ela beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
7 - Sentença anulada, de ofício. Com fulcro no artigo 1.013, § 3º, II, da norma processual,julgada
improcedente a ação.Prejudicado o recurso da autora.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5275499-71.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GERALDA SILVA LOPES
Advogados do(a) APELANTE: EDSON BARBOSA COELHO - SP362801-N, VALDEMAR GULLO
JUNIOR - SP302886-N, ANTONIO GUERCHE FILHO - SP112769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5275499-71.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GERALDA SILVA LOPES
Advogados do(a) APELANTE: EDSON BARBOSA COELHO - SP362801-N, VALDEMAR GULLO
JUNIOR - SP302886-N, ANTONIO GUERCHE FILHO - SP112769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação
interposta pela parte autora GERALDA SILVA LOPES em ação ajuizada em face do INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do Benefício de Prestação
Continuada.
A r. sentença (Id.:135394513) julgou improcedente o pedidode aposentadoria por invalidez ou
subsidiariamente deauxílio-doença e auxílio-acidente,condenando a autora ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da
causa, suspensa a execução, por serbeneficiária da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões de apelação(Id.:135394519), sustenta a parte autorao preenchimento dos
requisitos necessários à concessão do benefício assistencial, vez que restou comprovada sua
deficiência, bem comoa miserabilidade de seu núcleo familiar.
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei
federal e de preceitos constitucionais.
Pugna pela reforma da sentença.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento da apelação (Id.:138018845).
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5275499-71.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GERALDA SILVA LOPES
Advogados do(a) APELANTE: EDSON BARBOSA COELHO - SP362801-N, VALDEMAR GULLO
JUNIOR - SP302886-N, ANTONIO GUERCHE FILHO - SP112769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):Recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal,
possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
Preliminarmente, reconheço a ocorrência dejulgamentoextra petita.
Cuida-se de pedido de concessão dobenefício assistencial, nos termos doartigo 203, inciso V, da
Constituição Federal, e dos artigos 20, 21 e 21-A, da Lei 8.742/1993,estando o magistrado
impedido de decidir além(ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra
petita), consoante disposto no art. 492 do CPC/2015.
No casosub examen, odecisumjulgouimprocedente o pedido de concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou subsidiariamente deauxílio-doença e auxilio-acidente,configurando
sentençaextra petita, eis que expressamente não foi analisado o pedido formulado na inicial,
restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do
CPC/2015, o que impõe a decretação de sua nulidade.
O caso, contudo, não é de devolução dos autos ao Juízo de origem, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para
tanto, nos termos do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil,verbis:
"Art. 1.013, § 3º, II:A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.(...)
§ 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
(...)
II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da
causa de pedir".
Considerando que a causa está madura para julgamento e que foram observados os princípios do
contraditório e da ampla defesa, com a citação válida do ente autárquico e, ainda, amparado pela
legislação processual aplicável, ingresso no exame do mérito da demanda.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal,
e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei
8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo
mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais
pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial,
não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou
desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da
hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com
deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou
em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de
tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao
amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta 9
do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e 2)
desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmente com as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e 2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros, nutritivos
e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser
compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença
de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual
ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente,
para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de circunstâncias
capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de
proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de
prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com
redação dada pela recente Lei 13.981/2020, considera como hipossuficiente para consecução
deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar famíliacuja renda
mensal per capita seja inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo.
O §11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, normatizou que a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente podem ser
aferidos por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade
que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma,
Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª
Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel.
Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
Dito isso, no caso dos autos, o laudo médico pericial (Id.:135394500)atestou que a autora é
portadora de dor lombar baixa (CID M 54.5), gonartrose não especificada(CID M 17.9) e
fibromialgia(CID M 79.7),moléstias que não a incapacitam.O perito é conclusivo no sentido de que
não há doença incapacitante atual, nem deficiência.
Entendo, assim, que o laudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui
efetivo impedimento ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo
capaz de exercer suas atividades habituais de forma plenamente autônoma.
Não comprovada a deficiência ou incapacidade de longo prazo, torna-se desnecessária a análise
de eventual situação de hipossuficiência da parte autora, por se tratarem de requisitos
cumulativos para a concessão do benefício.
Assim, inexistindo outras provas em contrário, entendo que a autora não demonstrou preencher
os requisitos legais, notadamente, oque dizrespeito à deficiência total e permanente, de modo
que não faz jus ao benefício assistencial requerido.
Vencida a parte autora, a ela incumbe o pagamento de custas e despesas processuais - inclusive
honorários periciais -, e dos honorários do advogado, fixados em 10% do valor atualizado
atribuído à causa, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do
CPC/2015, por ser ela beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, reconheço a ocorrência de julgamentoextra petitae, de ofício, declaro nula a
sentença, por afronta ao artigo 492 do Código de Processo Civil/2015 e, com fulcro no artigo
1.013, § 3º, II, da norma processual,julgo improcedente o pedido inicial, restando prejudicadaa
apelação da parte autora.
É COMO VOTO.
/gabiv/gvillela
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA ANULADA.EXTRA PETITA.LOAS. DEFICIÊNCIA NÃO
COMPROVADA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PREJUDICADA.
1 - Impõe-se reconhecera ocorrência dejulgamentoextra petita,uma vez que a sentença decidiu
pretensão diversa da pleiteada na petição inicial da presente ação,o que impõe a decretação de
sua nulidade, na forma docaput do artigo 492 do CPC/2015.
2 -Condições de imediato julgamento.Incidência doartigo 1.013, § 3º, II, do CPC/2015.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais não preenchidos.
5 - Olaudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui efetivo impedimento
ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo capaz de exercer suas
atividades habituais de forma plenamente autônoma, de modo que não faz jus ao benefício
requerido.
6 - Vencida a parte autora, a ela incumbe o pagamento de custas e despesas processuais -
inclusive honorários periciais -, e dos honorários do advogado, fixados em 10% do valor
atualizado atribuído à causa, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, §
3º, do CPC/2015, por ser ela beneficiária da assistência judiciária gratuita.
7 - Sentença anulada, de ofício. Com fulcro no artigo 1.013, § 3º, II, da norma processual,julgada
improcedente a ação.Prejudicado o recurso da autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu reconhecer a ocorrência de julgamentoextra petitae, de ofício, declarar nula
a sentença, por afronta ao artigo 492 do Código de Processo Civil/2015 e, com fulcro no artigo
1.013, § 3º, II, da norma processual,julgar improcedente o pedido inicial, restando prejudicadaa
apelação da parte autora., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
