
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5074750-96.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO TIBURCIO
Advogados do(a) APELADO: ARTUR MARCHIONI - SP426541-N, JULIO MARCHIONI - SP347542-N, LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5074750-96.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO TIBURCIO
Advogados do(a) APELADO: ARTUR MARCHIONI - SP426541-N, JULIO MARCHIONI - SP347542-N, LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
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R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), ajuizado por Benedito Tibúrcio em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS, na qual sustenta a não comprovação do labor rural e o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
A parte autora apresentou réplica.
Foi elaborado laudo pericial.
Sentença pela procedência do pedido, para reconhecer os períodos de 01.11.1986 a 19.10.1987, 03.11.1987 a 31.07.1990, 01.07.1998 a 28.09.1998, 01.10.1998 a 02.05.2000, 02.10.2000 a 02.08.2004 e 18.12.2007 a 10.08.2011 como sendo de natureza especial e determinar a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora, fixando a sucumbência.
Apelação do INSS, pelo não acolhimento do pedido formulado na exordial.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5074750-96.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO TIBURCIO
Advogados do(a) APELADO: ARTUR MARCHIONI - SP426541-N, JULIO MARCHIONI - SP347542-N, LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 14.09.1958, a averbação de atividade rural sem registro em CTPS, no período de 1970 a 1981, bem como o reconhecimento do exercício de atividades especiais, nos períodos de 02.05.1986 a 13.10.1986, 01.11.1986 a 19.10.1987, 01.07.1998 a 28.09.1998, 01.10.1998 a 02.05.2000, 02.10.2000 a 02.08.2004, 01.03.2005 a 14.05.2007 e 18.12.2007 a 10.08.2011, com a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 27.06.2018).
O MM. Juízo a quo, ao proferir a sentença, deixou de examinar o pedido de reconhecimento do exercício de atividade rural, expressamente formulado na inicial, proferindo, assim, sentença citra petita.
Com efeito, cabe ao juiz analisar a integralidade dos pedidos formulados na exordial, sendo nula por error in procedendo a decisão que decide aquém do pedido, consoante o disposto no art. 492 do Código de Processo Civil.
Insta observar, outrossim, que o julgamento antecipado do mérito somente é cabível nas hipóteses previstas nos incisos do artigo 355 do Código de Processo Civil:
"Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:
I - não houver necessidade de produção de outras provas;
II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349."
Por outro lado, é certo que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, nos termos da Súmula 149: (...) A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário (...).
Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. CERTIDÃO DE CASAMENTO. MARIDO LAVRADOR. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL.
1. A comprovação da atividade laborativa do rurícola deve-se dar com o início de prova material, ainda que constituído por dados do registro civil, como certidão de casamento onde consta à profissão de lavrador atribuída ao marido da Autora. Precedentes da Terceira Seção do STJ.
2. Recurso especial conhecido em parte e provido (...). (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de14/3/2005)
Importante anotar, contudo, que não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal amplie a eficácia probatória dos documentos.
No mesmo sentido:
“AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE AGRÍCOLA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL AMPLIADO POR PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO PROCEDENTE.
1. É firme a orientação jurisprudencial desta Corte no sentido de que, para concessão de aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do labor agrícola se refira a todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a ampliar a eficácia probatória dos documentos, como na hipótese em exame.
2. Pedido julgado procedente para, cassando o julgado rescindendo, dar provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença (...). (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012)
A matéria, a propósito, foi objeto de Recurso Especial Representativo de Controvérsia:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(STJ - 1ª Seção, REsp 1.348.633/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 28.08.2013, Dje 05.12.2014) - grifo nosso.
Nesse contexto, impossível aferir a existência do trabalho rural alegado, sem registro em CTPS, caso o início de prova material apresentado não seja confirmado e estendido pela oitiva de testemunhas por todo o período indicado.
Ao Tribunal, por também ser destinatário da prova, é permitido o reexame de questões pertinentes à instrução probatória, não sendo alcançado pela preclusão. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é neste sentido:
"PROVA. DISPENSA PELAS PARTES. DILAÇÃO PROBATÓRIA DETERMINADA PELA 2ª INSTÂNCIA. ADMISSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO.
Em matéria de cunho probatório, não há preclusão para o Juiz. Precedentes do STJ. Recurso especial não conhecido (...)". (REsp 262.978 MG, Min. Barros Monteiro, DJU, 30.06.2003, p. 251)
"PROCESSO CIVIL. INICIATIVA PROBATÓRIA DO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO POR PERPLEXIDADE DIANTE DOS FATOS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO QUE NÃO RENOVA PRAZO RECURSAL CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU PROVA PERICIAL CONTÁBIL. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PROVIMENTO DO RECURSO PARA QUE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA PROSSIGA NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO.
Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda, podem determinar as provas que lhes aprouverem, a fim de firmar seu juízo de livre convicção motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.
A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de provas de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.
Não é cabível a dilação probatória quando haja outros meios de prova, testemunhal e documental, suficientes para o julgamento da demanda, devendo a iniciativa do juiz se restringir a situações de perplexidade diante de provas contraditórias, confusas ou incompletas (...)". (REsp 345.436 SP, Min. Nancy Andrighi, DJU, 13.05.2002, p. 208)
Desse modo, ante a omissão da sentença e a impossibilidade de apreciação do mérito, consoante o disposto no art. 1.013, § 3º, III, do Código de Processo Civil, em razão da necessidade da produção da prova testemunhal para a demonstração do labor rural, de rigor sua anulação.
Ante o exposto, de ofício, anulo a sentença proferida nos autos e julgo prejudicada a análise da apelação.
Retornem os autos ao Juízo de origem para regular processamento do feito, com a designação de audiência para a colheita dos depoimentos testemunhais, com oportuna prolação de nova decisão de mérito que aprecie a totalidade dos pedidos formulados na inicial.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA EX OFFICIO.
1. O MM. Juízo a quo, ao proferir a sentença, deixou de examinar o pedido de reconhecimento do exercício de atividade rural, expressamente formulado na inicial, proferindo, assim, sentença citra petita.
2. Cabe ao juiz analisar a integralidade dos pedidos formulados na exordial, sendo nula por error in procedendo a decisão que decide aquém do pedido, consoante o disposto no art. 492 do Código de Processo Civil.
3. É impossível a confirmação do início de prova produzido nos autos sem a oitiva das testemunhas a serem oportunamente arroladas, porquanto, para o reconhecimento do exercício de atividade rural, é imprescindível que a prova testemunhal amplie a eficácia probatória dos documentos juntados aos autos.
4. Sentença anulada, de ofício. Prejudicada a análise da apelação.
