Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001159-49.2020.4.03.6307
Relator(a)
Juiz Federal CLECIO BRASCHI
Órgão Julgador
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
24/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 03/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONCESSIVA DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO, MEDIANTE O RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE EXERCIDA SOB
CONDIÇÕES ESPECIAIS. ATIVIDADES DE APRENDIZ DE AJUDANTE DE PRENSISTA E DE
AJUDANTE DE PRENSISTA. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA CATEGORIA
PROFISSIONAL PREVISTA NO CÓDIGO 2.5.2 DO DECRETO 83.080/1979, COM BASE NA
ANOTAÇÃO DA CTPS. NA ATIVIDADE DE APRENDIZ SÃO EXECUTADAS AS MESMAS
ATIVIDADES E A LEGISLAÇÃO NÃO DISCRIMINA O AJUDANTE E O APRENDIZ.
POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO DA ATIVIDADE DE CARTEIRO MOTORIZADO
COMO ATIVIDADE ESPECIAL, EM RAZÃO DA PERICULOSIDADE. LEI 12.997/2014, QUE
ACRESCENTOU AO ARTIGO 193 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO A
ATIVIDADE DE TRABALHADOR CONDUTOR DE MOTOCICLETA. PORTARIA MTE 1.565/2014.
APLICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NOS TEMAS
REPETITIVOS 1.031 e 534. DEVER JUDICIAL DE OBSERVÂNCIA DA COERÊNCIA E
INTEGRIDADE DO DIREITO. PRESENTES AS MESMAS RAZÕES, IMPÕE-SE A MESMA
SOLUÇÃO ADOTADA PELO STJ AO RECONHECER O TEMPO ESPECIAL DO VIGILANTE E
DO ELETRICISTA, DESDE QUE COMPROVADO O EXERCÍCIO HABITUAL E PERMANENTE
DESSAS ATIVIDADES COM RISCO EFETIVO À INTEGRIDADE FÍSICA. RECURSO DO INSS
DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001159-49.2020.4.03.6307
RELATOR:5º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: VANDERLEI VILLA DE MELO
Advogados do(a) RECORRENTE: HELLON ASPERTI - SP406811-A, ALBERIONE ARAUJO
DA SILVA - SP297034-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001159-49.2020.4.03.6307
RELATOR:5º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: VANDERLEI VILLA DE MELO
Advogados do(a) RECORRENTE: HELLON ASPERTI - SP406811-A, ALBERIONE ARAUJO
DA SILVA - SP297034-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Recorrem a parte autora e o INSS da sentença, cujo dispositivo é este: “Julgo parcialmente
procedente o pedido para condenar o réu a converter em comuns os períodos especiais de
01/07/1983 a 30/08/1985 e 01/07/1986 a 31/01/1988, conceder aposentadoria por tempo de
contribuição à parte autora, bem como pagar os atrasados apurados pela contadoria, o que
extingue o processo com resolução do mérito nos termos do artigo 487, I, do Código de
Processo Civil. Deverá o INSS pagar por meio de complemento positivo as prestações vencidas
não incluídas no cálculo judicial. Sem condenação em honorários advocatícios”.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001159-49.2020.4.03.6307
RELATOR:5º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: VANDERLEI VILLA DE MELO
Advogados do(a) RECORRENTE: HELLON ASPERTI - SP406811-A, ALBERIONE ARAUJO
DA SILVA - SP297034-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a
comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Observa-se o regramento da
época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero
enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as
anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do
trabalho, a depender do período em que a atividade especial foi executada (REsp 1151363/MG,
Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011). No
mesmo sentido: “as Turmas da Terceira Seção deste Superior Tribunal já consolidaram o
entendimento no sentido de que o período de trabalho exercido em condições especiais, em
época anterior à referida lei restritiva, por esta não será abrangido. A caracterização e a
comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na
legislação em vigor na época da prestação do serviço. Desse modo, antes da lei restritiva, era
inexigível a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos, porque o reconhecimento do
tempo de serviço especial era possível apenas em face do enquadramento na categoria
profissional do trabalhador, à exceção do trabalho exposto a ruído e calor, que sempre se exigiu
medição técnica. (REsp 436.661/SC, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, Quinta Turma, DJ de
2/8/2004; REsp 440.955/RN, Rel. Min. PAULO GALLOTTI, Sexta Turma, DJ de 1º/2/2005.)”
(REsp 689.195/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em
07/06/2005, DJ 22/08/2005, p. 344).
Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais
para comum após 1998. A partir da última reedição da MP 1.663, parcialmente convertida na
Lei 9.711/1998, o texto legal tornou-se definitivo, sem a parte do texto que revogava o § 5º do
art. 57 da Lei 8213/91 (REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011). Na interpretação da Turma Nacional de
Uniformização, é possível a conversão do tempo de serviço especial em comum do trabalho
prestado em qualquer período (Súmula 50 da Turma Nacional de Uniformização).
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei 3807/60. O critério de especificação
da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas
por decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei 8213/91.
O Poder Executivo editou os Decretos 53.831/64 e 83.080/79, relacionando em seus anexos
atividades profissionais consideradas penosas, insalubres ou perigosas. As atividades
profissionais que se enquadrassem no decreto editado pelo Poder Executivo eram
consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação dessa
natureza por laudo técnico. Bastava a anotação da função em Carteira de Trabalho e
Previdência Social - CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40,
consistente em informações prestadas pelo empregador à Previdência Social descrevendo a
exposição do segurado a agentes agressivos.
O artigo 57 da Lei 8.213/91, na redação original, alude apenas às atividades profissionais
sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. O artigo 58
dessa lei, também na redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto
de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até
então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas
a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Continuaram em vigor
os Decretos 53.831/64 e 83.080/79, até serem revogados, a partir de 6/3/1997, pelo Decreto
2.172, de 5/3/1997.
Até 5/3/97, salvo quanto ao ruído e ao calor, as atividades profissionais informadas nos
formulários SB/40 que constavam dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79 e foram executadas
durante a vigência destes são passíveis de conversão do tempo especial para o comum. Para a
comprovação da exposição aos agentes nocivos ruído e calor, sempre foi necessária a
apresentação de laudo pericial, mesmo quando a atividade fora exercida sob a égide dos
Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 (AgRg no AREsp 859.232/SP, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 26/04/2016; AgInt no
AREsp 845.879/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
21/11/2017, DJe 07/02/2018). O perfil profissiográfico previdenciário espelha as informações
contidas no laudo técnico, razão pela qual pode ser usado como prova da exposição ao agente
nocivo (REsp 1573551/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
18/02/2016, DJe 19/05/2016).
Até o advento da Lei 9.032/95, publicada em 29.4.1995, é possível o reconhecimento do tempo
de serviço especial pelo mero enquadramento na categoria profissional cuja atividade é
considerada especial. A partir de 29.4.1995, quando publicada a Lei 9032/1995, há necessidade
de que a atividade tenha sido exercida com efetiva exposição a agentes nocivos, de modo
permanente, não ocasional nem intermitente, comprovada por meio dos formulários SB-40 e
DSS-8030, expedidos pelo INSS e preenchidos pelo empregador.
A conversão em especial do tempo de serviço prestado em atividade profissional elencada
como perigosa, insalubre ou penosa em rol expedido pelo Poder Executivo (Decretos 53.831/64
e 83.080/79), antes da edição da Lei n.º 9.032/95, independentemente da produção de laudo
pericial comprovando a efetiva exposição a agentes nocivos. Quanto ao lapso temporal
compreendido entre a publicação da Lei n.º 9.032/95 (29/04/1995) e a expedição do Decreto n.º
2.172/97 (05/03/1997), há necessidade de que a atividade tenha sido exercida com efetiva
exposição a agentes nocivos, sendo que a comprovação, no primeiro período, é feita com os
formulários SB-40 e DSS-8030, e, no segundo, com a apresentação de laudo técnico (REsp
597.401/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 10/02/2004, DJ
15/03/2004, p. 297). A partir do advento do Decreto 2.172/97 passou-se a exigir laudo técnico
das condições ambientais do trabalho para comprovação da atividade especial (STJ, PETIÇÃO
Nº 9.194-PR (2012/0096972-7), RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA).
As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum constantes da cabeça do artigo 70 do Decreto 3.048/1999, que prevê fatores de
conversão para mulher e para homem, respectivamente, de 2,00 e 2,33 (15 anos), 1,50 e 1,75
(20 anos) e 1,20 e 1,40 ( anos), aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período, por força
do § 2º desse artigo, incluído pelo Decreto 4.827/2003, norma essa a cuja observância está o
INSS vinculado, porque editada pelo Presidente da República. De resto, o Superior Tribunal de
Justiça decidiu que o critério normativo aplicável, quanto ao fator de conversão, é o vigente por
ocasião do preenchimento dos requisitos para a aposentadoria (EDcl no REsp 1310034/PR,
Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe
02/02/2015).
O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade
especial do segurado (Súmula 68 da Turma Nacional de Uniformização). Mas é importante
fazer esta ressalva: o entendimento resumido nesse verbete 68 da TNU foi consolidado com
base na premissa da existência de laudo técnico posterior ao período de atividade especial.
Nessa situação, o laudo posterior ratifica a natureza especial do período anterior, confirmando-
o, caso não tenha ocorrido alteração no ambiente de trabalho. Na situação em que o laudo
pericial é anterior ao período que se afirma especial, ele não serve para ratificar a natureza
especial de períodos posteriores à data em que produzido (o laudo). Não seria possível
antecipar no laudo pericial a realidade e prever as condições de trabalho no futuro, isto é, a
manutenção dos fatores de risco e que as medidas de proteção coletiva e individual não
reduziram nem eliminaram a ação dos agentes nocivos. Na verdade, sendo anterior o laudo ao
período trabalhado, não existe nenhum laudo pericial contemporâneo a tal período ou posterior
a ele. A questão é de falta absoluta de laudo pericial para o período. Essa distinção foi feita pela
própria TNU (PEDILEF 05043493120124058200, JUIZ FEDERAL WILSON JOSÉ WITZEL,
TNU, DOU 06/11/2015 PÁGINAS 138/358.). Desse julgamento destaco o seguinte trecho:
“Situação diferente seria se o laudo fizesse referência a medições ambientais em período
anterior ao requerido pelo segurado. Nessa hipótese, penso que não haveria como ser
presumida a permanência da nocividade outrora reconhecida, uma vez que os avanços
tecnológicos e da medicina e segurança do trabalho poderiam ter eliminado o fator de risco”.
Ainda sobre o sentido e o alcance da interpretação resumida no verbete da Súmula 68 da TNU,
segundo a qual “O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à
comprovação da atividade especial do segurado”, no julgamento do PEDIDO DE
UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI Nº 0500940-26.2017.4.05.8312/PE (TEMA
208 DA TNU), a Turma Nacional de Uniformização estabeleceu as seguintes teses: “1. Para a
validade do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) como prova do tempo trabalhado em
condições especiais nos períodos em que há exigência de preenchimento do formulário com
base em Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), é necessária a
indicação do responsável técnico pelos registros ambientais, sendo dispensada a informação
sobre monitoração biológica. 2. A ausência da informação no PPP pode ser suprida pela
apresentação de LTCAT ou por elementos técnicos equivalentes, cujas informações podem ser
estendidas para período anterior ou posterior à sua elaboração, desde que acompanhados da
declaração do empregador sobre a inexistência de alteração no ambiente de trabalho ou em
sua organização ao longo do tempo”. Segundo a fundamentação exposta no voto proferido pelo
Excelentíssimo Juiz Federal relator, ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, “a informação sobre
o responsável técnico está atrelada à existência de laudo técnico ou documento substitutivo,
sendo indispensável no preenchimento do formulário PPP. O tempo lastreado pela existência
de responsável técnico tem correspondência com as informações constantes em laudo técnico,
sendo que, não havendo tal informação, a empresa poderá supri-la mediante informação
apropriada e legítima de que não houve alteração do ambiente laboral, o que valida o laudo não
contemporâneo e, portanto, dispensa aquele lapso de contar com o responsável técnico na
época não contratado”.
No julgamento do Pedido de Uniformização Regional nº 0000653-86.2018.403.9300, a Turma
Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da Terceira Região fixou as
seguintes interpretações: “a) O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), por si só, não possui
força probatória para comprovar a especialidade do trabalho desempenhado pelo segurado em
período posterior à data de sua emissão; b) O enquadramento de tempo de serviço especial
para além da data da emissão do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) depende da
apresentação de outros meios de prova da continuidade da exposição do segurado a condições
nocivas de trabalho”.
Para reconhecimento de condição especial de trabalho antes de 29/4/1995, a exposição a
agentes nocivos à saúde ou à integridade física não precisa ocorrer de forma permanente
(Súmula 49 a Turma Nacional de Uniformização).
“Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita
em Regulamento” (Súmula do extinto TFR, Enunciado nº 198). “No tocante ao exercício de
atividade com exposição a agente nocivo, a matéria já foi decidida pela Primeira Seção deste
Tribunal, pelo rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543 do CPC, no qual foi
chancelado o entendimento de que: ‘À luz da interpretação sistemática, as normas
regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do
trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e
a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja
permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais’ (art. 57, § 3º, da Lei
8.213/1991).’ (REsp 1.306.113/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 7/3/2013)” (AgInt no
AREsp 1126121/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
21/11/2017, DJe 27/11/2017). Sem a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos,
descabe o enquadramento por equiparação a categoria profissional. “Incabível o
reconhecimento do exercício de atividade não enquadrada como especial, se o trabalhador não
comprova que efetivamente a exerceu sob condições especiais” (AgRg no REsp 842.325/RJ,
Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 21/09/2006, DJ
05/02/2007, p. 429).
Considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até
05/03/1997. A partir de 06/03/1997, data da publicação do Decreto 2.172/1997, considera-se
prejudicial a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis, até 18/11/2003. A partir de
19/11/2003, data da publicação do Decreto 4.882/2003, o limite de tolerância ao agente físico
ruído é de 85 decibéis, conforme resolvido pelo Superior Tribunal de Justiça, em julgamento
submetido ao rito dos recursos repetitivos (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Primeira Seção, DJe 5/12/2014). “A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do REsp n. 1.398.260/SP, submetido ao regime de recursos repetitivos, fixou o
entendimento de que a disposição contida no Decreto n. 4.882/03, que reduziu o parâmetro de
ruído para efeito de reconhecimento de trabalho especial, fixando-o em 85 decibéis, não
retroage” (AgInt no REsp 1629906/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA
TURMA, julgado em 05/12/2017, DJe 12/12/2017).
Acerca da habitualidade e permanência da exposição aos agentes nocivos, na interpretação
adotada pelo próprio Presidente da República, no artigo 65 Decreto 3.048/1999, considera-se
tempo de trabalho permanente aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente,
no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo
seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. De resto, conforme
assinalado acima, antes da Lei 9.032/1995, a exposição ao agente nocivo não precisa ser
permanente. Além disso, constando do PPP a informação acerca da exposição a ruídos, o fato
de não constar expressamente que a exposição a esse agente nocivo foi habitual e permanente
não impede o reconhecimento do tempo de serviço especial, se o nível de ruído é superior aos
limites normativos de tolerância. O PPP não contém campo próprio para o empregador informar
se a exposição foi habitual e permanente. No caso do agente físico ruído contínuo medido
segundo os critérios e procedimentos previstos na NR-15, pressupõe a exposição a esse
agente físico durante toda a jornada de trabalho, sendo suficiente para comprovar o contato
habitual e permanente com esse agente nocivo a observância dessa norma técnica.
No caso concreto, a sentença resolveu que: “São especiais os períodos de 01/07/1983 a
30/08/1985 e 01/07/1986 a 31/01/1988, em que o autor trabalhou como ajudante de prensista
em indústria metalúrgica (pág. 30, anexo n.º 2)), por enquadramento no código 2.5.2 dos
Decretos n.ºs 53.831/64 e 83.080/79. De 15/12/1999 a 29/03/2017 o autor ativou-se como
carteiro motorizado (págs. 80/83, anexo n.º 2).Embora a legislação trabalhista considere
perigosa a atividade de trabalhador em motocicleta (art. 193, Consolidação da Leis
Trabalhistas, com redação dada pela Lei n.º 12.997/14), não há qualquer determinação legal
nesse sentido para fins previdenciários. Tendo em vista que o perfil profissiográfico
previdenciário –PPP não faz referência a qualquer agente nocivo ou à periculosidade, referido
período também não é especial. Não há demonstração de exposição a agente nocivo no
período de 30/03/2017 a 21/05/2019. Remetidos os autos à contadoria e elaborada nova
contagem, apurou-se que o autor conta com 35 anos, 4 meses e 20 dias de tempo de
contribuição, razão pela qual faz jus ao benefício pleiteado”.
Recurso do INSS. Períodos especiais de 01/07/1983 a 30/08/1985 e 01/07/1986 a 31/01/1988.
Afirma que “CABE FRISAR QUE A ATIVIDADE DE ‘aprendiz de ajudante de prensista ou
ajudante de prensista’ NÃO ENCONTRAM PREVISÃO EXPRESSA NOS DECRETOS. (...)
Ainda que se entenda que as relações nos anexos dos decretos não são exaustivas, o
raciocínio feito acima continua válido: o trabalhador terá de provar que exercia as atividades da
categoria considerada especial, sem desvio de função, sob pena de os períodos não poderem
ser considerados especiais. Se a denominação usada para o cargo gera dúvida sobre o
enquadramento, a prova evidentemente não poderá ser feita com a simples anotação em
carteira de trabalho. Será necessário documento que contenha a descrição das atividades
desempenhadas, como o formulário de atividade especial. O AUTOR APRESENTOU ALGUNS
FORMULÁRIOS QUE NÃO INFORMAM ATIVIDADES QUE POSSAM SER EQUIPARADAS AS
CATEGORIAS PROFISSIONAIS ACIMA. PARA OS PERÍODOS NO QUAL O AUTOR JUNTA
APENAS A CTPS, NÃO É POSSÍVEL SEQUER VERIFICAR QUAIS AS FUNÇÕES
EFETIVAMENTEEXERCIDAS PELO AUTOR. No período de 1/7/1983 A 30/8/1985 o autor
exerceu atividade de ‘APRENDIZ’ não sendo crível, portanto, que tenha desempenhado as
mesmas funções que o ‘prensista’, como reconhecido na sentença. ASSIM, neste caso, a
categoria de ‘ajudante de prensista’ não se encontra nos anexos aos Decretos nos 53.831/1964
e 83.080/1979 e não há nos autos prova de que a parte autora tenha trabalhado nas
circunstâncias descritas nesses diplomas”.
O recurso do INSS não pode ser provido. A sentença deve ser mantida pelos próprios
fundamentos, com os seguintes acréscimos. A atividade de prensista (ou de prensador) está
expressamente prevista no código 2.5.2 do Decreto 83.080/1979 (FERRARIAS, ESTAMPARIAS
DE METAL A QUENTE E CALDEIRARIA. Ferreiros, marteleteiros, forjadores, estampadores,
caldeireiros e prensadores. Operadores de forno de recozimento, de têmpera, de cementação,
forneiros, recozedores, temperadores, cementadores. Operadores de pontes rolantes ou talha
elétrica).
As anotações na CTPS dos cargos de “aprendiz de ajudante de prensista” e “ajudante de
prensista” servem como prova apta ao enquadramento da atividade pela categoria profissional,
mormente se considerada a observação feita pelo empregador de que o segurado permaneceu
exercendo a mesma função durante todo o vínculo empregatício, conforme atestado na própria
CTPS. A legislação não faz nenhuma discriminação em relação ao ajudante e ao aprendiz que
exercem a atividade principal classificada como especial. Ainda que exercida a atividade
classificada como especial na forma de aprendiz ou de ajudante, ela não deixa de ser especial.
O ajudante e o aprendiz executam as mesmas atividades, com exposição aos fatores de risco a
elas inerentes. Não cabe fazer distinção não prevista na lei, discriminação essa, de resto, que
seria incompatível com o princípio constitucional da igualdade.
Recurso do autor. Período de 15/12/1999 a 21/05/2019. O autor afirma que “O artigo 193 da
Consolidação das Leis do Trabalho foi acrescentado o §4º, com redação dada pela Lei nº
12.997, de 18/06/2014, segundo o qual são também consideradas perigosas as atividades
laborais com utilização de motocicleta, conferindo ao trabalhador o direito à percepção de
adicional de periculosidade de 30% sobre o salário base. O referido diploma legal foi
regulamentado pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, através da Portaria nº 1.565,
publicada no DOU de14/10/2014, que acrescentou o anexo 5 à NR-16, estabelecendo que, ‘As
atividades laborais com utilização de motocicleta ou motoneta no deslocamento de trabalhador
em vias públicas são consideradas perigosas’. Neste sentido, cabe ressaltar que apesar de
haver diferenciação de conceitos na matéria trabalhista e previdenciária, no caso concreto o
recorrente apresentou o documento hábil a comprovar o trabalho em condições penosas por
riscos de acidentes na atividade de motociclista, sendo a periculosidade benefício devido
aquele que corre acentuados riscos físicos de grandes proporções e de maneira súbita (...)
Assim deve ser considerada a atividade desempenhada em motocicleta com exposição ao
agente nocivo periculosidade, em data posterior a edição do decreto 2172/97 quando o laudo
aponta risco a saúde por permanente exposição a perigo”.
O recurso do autor deve ser parcialmente provido. A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT:
“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação
aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de
trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:
I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;
II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança
pessoal ou patrimonial.
§ 1º - O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30%
(trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou
participações nos lucros da empresa.
§ 2º - O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja
devido.
§ 3º Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza
eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo.
§ 4oSão também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta”.
A CLT classifica como perigosas a exposição permanente do trabalhador a inflamáveis,
explosivos ou energia elétrica, roubos ou outras espécies de violência física nas atividades
profissionais de segurança pessoal ou patrimonial e condução de motocicleta na execução do
trabalho de modo não eventual.
Nesse sentido a Portaria MTE 1.565/2014:
O Ministro de Estado do Trabalho e Emprego, no uso das atribuições que lhe conferem o inciso
II do parágrafo único do art. 87 da Constituição Federal e os arts. 155, 193 e 200 da
Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio
de 1943,
Resolve:
Art. 1º Aprovar o Anexo 5 - Atividades Perigosas em Motocicleta - da Norma Regulamentadora
nº 16 - Atividades e Operações Perigosas, aprovada pela Portaria 3.214, de 8 de junho de
1978, com a redação constante no Anexo desta Portaria.
Art. 2º Os itens 16.1 e 16.3 da NR16, aprovada pela Portaria 3.214, de 8 de junho de 1978,
passam a vigorar com a seguinte redação:
16.1. São consideradas atividades e operações perigosas as constantes dos Anexos desta
Norma Regulamentadora - NR.
16.3. É responsabilidade do empregador a caracterização ou a descaracterização da
periculosidade, mediante laudo técnico elaborado por Médico do Trabalho ou Engenheiro de
Segurança do Trabalho, nos termos do artigo 195 da CLT.
Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
MANOEL DIAS
ANEXO
ANEXO 5 - ATIVIDADES PERIGOSAS EM MOTOCICLETA
1. As atividades laborais com utilização de motocicleta ou motoneta no deslocamento de
trabalhador em vias públicas são consideradas perigosas.
2. Não são consideradas perigosas, para efeito deste anexo:
a) a utilização de motocicleta ou motoneta exclusivamente no percurso da residência para o
local de trabalho ou deste para aquela;
b) as atividades em veículos que não necessitem de emplacamento ou que não exijam carteira
nacional de habilitação para conduzi-los;
c) as atividades em motocicleta ou motoneta em locais privados.
d) as atividades com uso de motocicleta ou motoneta de forma eventual, assim considerado o
fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido.
Dentre essas atividades, o Superior Tribunal de Justiça entende que as de vigilante e as
executadas com exposição à eletricidade, desde que comprovado o exercício habitual e
permanente delas com risco efetivo à integridade física, podem ser reconhecidas como
especiais para fins previdenciários. Nesse sentido os julgamentos dos temas repetitivos 1.031 e
534, respectivamente:
“I. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMÁTICA DE RECURSOS REPETITIVOS.
ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA DE FOGO. II.
POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA VIA DA JURISDIÇ]ÃO, COM APOIO
PROCESSUAL EM QUALQUER MEIO PROBATÓRIO MORALMENTE LEGÍTIMO, APÓS O
ADVENTO DA LEI 9.032/1995, QUE ABOLIU A PRÉ-CLASSIFICAÇÃO PROFISSIONAL PARA
O EFEITO DE RECONHECIMENTO DA SITUAÇÃO DE NOCIVIDADE OU RISCO À SAÚDE
DO TRABALHADOR, EM FACE DA ATIVIDADE LABORAL. SUPRESSÃO PELO DECRETO
2.172/1997. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. III. ROL DE ATIVIDADES
E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO, DADA A
INESGOTABILDIADE REAL DA RELAÇÃO DESSES FATORES. AGENTES PREJUDICIAIS
NÃO PREVISTOS NA REGRA POSITIVA ENUNCIATIVA. REQUISITOS PARA A
CARACTERIZAÇÃO DA NOCIVIDADE. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM
INTERMITENTE A FATORES DE RISCO (ART. 57, § 3o., DA LEI 8.213/1991). IV. RECURSO
ESPECIAL DO INSS A QUE NEGA PROVIMENTO, EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL.
1. É certo que no período de vigência dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 a especialidade
da atividade se dava por presunção legal, de modo que bastava a informação acerca da
profissão do Segurado para lhe assegurar a contagem de tempo diferenciada. Contudo, mesmo
em tal período se admitia o reconhecimento de atividade especial em razão de outras
profissões não previstas nestes decretos, exigindo-se, nessas hipóteses provas cabais de que a
atividade nociva era exercida com a exposição aos agentes nocivos ali descritos.
2. Neste cenário, até a edição da Lei 9.032/1995, nos termos dos Decretos 53.080/1979 e
83.080/1979, admite-se que a atividade de Vigilante, com ou sem arma de fogo, seja
considerada especial, por equiparação à de Guarda.
3. A partir da vigência da Lei 9.032/1995, o legislador suprimiu a possibilidade de
reconhecimento de condição especial de trabalho por presunção de periculosidade decorrente
do enquadramento na categoria profissional de Vigilante. Contudo, deve-se entender que a
vedação do reconhecimento por enquadramento legal não impede a comprovação da
especialidade por outros meios de prova. Aliás, se fosse proclamada tal vedação, se estaria
impedindo os julgadores de proferir julgamentos e, na verdade, implantando na jurisdição a
rotina burocrática de apenas reproduzir com fidelidade o que a regra positiva contivesse. Isso
liquidaria a jurisdição previdenciária e impediria, definitivamente, as avaliações judiciais sobre a
justiça do caso concreto.
4. Desse modo, admite-se o reconhecimento da atividade especial de Vigilante após a edição
da Lei 9.032/1995, desde que apresentadas provas da permanente exposição do Trabalhador à
atividade nociva, independentemente do uso de arma de fogo ou não.
5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois o
novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes considerados
nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente, aqueles
classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto qualquer referência a
atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da
legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa conclusão, porém, seria a
negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar na crença - nunca confirmada - de
que as regras escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os
acidentes, podem ser controlados pelos enunciados normativos.
6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à aposentadoria
especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua
saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1o. e 202, II da
Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes
constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de específico,
próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia jurídica dos bens da vida
digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais.
7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes perigosos não significa que
eles - os agentes perigosos - tenham sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou
que a sua eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada.
Também não se pode intuir que não seja mais possível o reconhecimento judicial da
especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente
superior, traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do Trabalhador.
8. Corroborando tal assertiva, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do 1.306.113/SC,
da lavra do Eminente Ministro HERMAN BENJAMIN, em regime repetitivo, fixou a orientação de
que a despeito da supressão do agente nocivo eletricidade, pelo Decreto 2.172/1997, é possível
o reconhecimento da especialidade da atividade submetida a tal agente perigoso, desde que
comprovada a exposição do Trabalhador de forma permanente, não ocasional, nem
intermitente. Esse julgamento deu amplitude e efetividade à função de julgar e a entendeu como
apta a dispensar proteções e garantias, máxime nos casos em que a legislação alheou-se às
poderosas e invencíveis realidades da vida.
9. Seguindo essa mesma orientação, é possível reconhecer a possibilidade de caracterização
da atividade de Vigilante como especial, com ou sem o uso de arma de fogo, mesmo após a
edição do Decreto 2.172/1997, desde que comprovada a exposição do Trabalhador à atividade
nociva, de forma permanente, não ocasional, nem intermitente, com a devida e oportuna
comprovação do risco à integridade física do Trabalhador.
10. Firma-se a seguinte tese: é admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de
Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto
2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer
meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico
ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem
intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do
Segurado.
11. Deve-se compreender que a profissão de Vigilante expõe, intuitivamente, o Trabalhador a
riscos, nocividades, perigos, danos físicos e emocionais de não pequena monta, que
frequentemente se manifestam na proximidade da velhice sob forma de fobias, síndrome de
perseguição, neuroses, etc.
12. Não há na realidade das coisas da vida como se separar a noção de nocividade da noção
de perigo, ou a noção de nocividade da noção de dano ou lesão, pois tudo isso decorre,
inevitavelmente, da exposição da pessoa a fatores inumeráveis, como a ansiedade prolongada,
o medo constantes, a inquietação espiritual diante de perseguições e agressões iminentes, etc.
13. Análise do caso concreto: no caso dos autos, o Tribunal reconhece haver comprovação da
especialidade da atividade, a partir do conjunto probatório formado nos autos, especialmente, o
Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP e os testemunhos colhidos em juízo. Nesse cenário,
não é possível acolher a pretensão do recursal do INSS que defende a impossibilidade de
reconhecimento da atividade especial de Vigilante após a edição da Lei 9.032/1995 e do
Decreto 2.172/1997.
14. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento” (REsp 1830508/RS, Rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2020, DJe
02/03/2021).
“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ
8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL.
AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57
E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER
EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA
CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART.57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de
prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo
Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo
especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato
normativo.
2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos
de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido
como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como
prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente,
em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ.
3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e
na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por
consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento
fixado pelo STJ.
4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da
Resolução 8/2008 do STJ” (REsp 1306113/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013).
“PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 535 DO CPC. ACOLHIMENTO
PARCIAL. FUNDAMENTOS DO VOTO-VISTA AGREGADOS AO VOTO CONDUTOR. ART.
543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO
DECRETO 2.172/1997. ANÁLISE DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE.
1. Trata-se de Embargos de Declaração contra acórdão proferido nos termos do art. 543-C do
CPC e da Resolução STJ 8/2008, sob a seguinte fundamentação: a) inexiste exame da tese de
falta de suporte constitucional (art. 201, § 1º, da CF) para a consideração do perigo como fato
determinante para contagem majorada de tempo de serviço; b) não foi apreciado o ponto que
defende a não aplicação da Lei 7.369/1985 no âmbito do Regime Geral de Previdência Social; e
c) houve contradição do acórdão que teria confundido atividade prejudicial e perigosa.
2. Esta Turma desproveu o recurso com motivação clara e suficiente, consubstanciada pelas
razões do voto condutor e do voto-vista proferido pelo eminente Ministro Arnaldo Esteves Lima.
3. Acolhem-se em parte os Embargos de Declaração para agregar ao voto condutor do acórdão
as razões assentadas pelo voto-vista.
4. Ademais, os argumentos do embargante denotam mero inconformismo e intuito de rediscutir
a controvérsia, não se prestando os aclaratórios a esse fim.
5. Sob pena de invasão da competência do STF, descabe analisar questão constitucional (arts.
201, § 1º, da CF) em Recurso Especial, mesmo que para viabilizar a interposição de Recurso
Extraordinário.
6. Embargos de Declaração parcialmente providos” (EDcl no REsp 1306113/SC, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2013, DJe 21/05/2013).
As mesmas razões devem ser aplicadas para reconhecer o tempo especial do trabalhador que,
de modo habitual e permanente, utiliza motocicleta ou motoneta no deslocamento em vias
públicas para exercer suas atribuições. Tais atividades, consideradas perigosas pela legislação
trabalhista, caracterizam também a periculosidade para fins previdenciários, consoante
intepretação adotada pelo Superior Tribunal de Justiça para o vigilante e o eletricista.
O Código de Processo Civil dispõe no artigo 926 que os tribunais devem uniformizar sua
jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. A coerência e a integridade do Direito são
observadas aplicando-se as mesmas razões a situações semelhantes.
Para lembrar a metáfora do “romance em cadeia” de que fala Ronald Dworkin, cabe ao juiz
reconstruir a história institucional do Direito, a fim de dar-lhe continuidade, como se estivesse a
escrever mais um capítulo do mesmo romance. O juiz não pode pular um capítulo desse
romance nem alterar o curso ou o sentido da história. O juiz deve se colocar na posição de
intérprete junto com diferentes romancistas, todos com a obrigação de escrever os capítulos de
um único romance da mesma natureza, respeitando a obra escrita pelo romancista do capítulo
anterior. Cada romancista deve ser, ao mesmo tempo, intérprete e criador de uma mesma obra,
dando-lhe continuidade com coerência e integridade. Cabe ao juiz interpretar o que já foi escrito
e criar uma continuação para a mesma história, mas sempre mantendo a coerência e a
integridade do Direito. O juiz não pode pular um capítulo do romance. É a tese do Direito como
integridade, em uma comunidade de princípios, de que fala Dworkin.
Descabe pular um capítulo do romance em cadeia escrito pelo Superior Tribunal de Justiça em
tema de reconhecimento do tempo de serviço especial para as atividades descritas no artigo
193 da CLT, a fim de manter a coerência e a integridade do Direito, isto é, dar continuidade “ao
romance em cadeia” que começou a ser escrito pelo Superior Tribunal de Justiça nos referidos
julgamentos.
Presente essa realidade, é juridicamente possível reconhecer o tempo de serviço especial do
trabalhador que comprovar, de modo habitual e permanente, a utilização de motocicleta ou
motoneta no deslocamento em vias públicas para exercer suas atribuições.
Essa prova foi produzida na espécie. Segundo o PPP exibido pelo autor, no período de
13/10/2014 a 29/03/2017 ele trabalhou como carteiro utilizando motocicleta.
O período anterior não pode ser reconhecido como especial porque não consta do PPP que
fora a atividade executada com exposição a fator de risco, tendo em vista que tal atividade
passou a ser considerada perigosa a partir da Portaria 1.565/2014 MTE, que regulamentou a
Lei 12.997/2014. Esta não contém nenhuma disposição de sua incidência retroativa. Ao
contrário: dispõe que vigora a partir de sua publicação, sem determinar a produção de eficácia
retroativa.
Também não se pode reconhecer o tempo especial posterior a 29/03/2017 porque não consta
do PPP a descrição da atividade de carteiro com utilização de motocicleta posterior a essa data.
Recurso do INSS desprovido. Recurso do autor parcialmente provido para reconhecer como
tempo de serviço especial o período de 13/10/2014 29/03/2017, mantida no restante a
sentença, nos termos do artigo 46 da Lei nº. 9.099/1995, por seus próprios fundamentos, com
acréscimos. Com fundamento no artigo 55 da Lei 9.099/1995, condeno o INSS, parte recorrente
integralmente vencida, a pagar os honorários advocatícios, arbitrados no percentual de 10%
sobre as prestações vencidas até a data da sentença, nos termos do enunciado da Súmula nº
111 do Superior Tribunal de Justiça ("Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias,
não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença"). O regime jurídico dos honorários
advocatícios é regido exclusivamente pela Lei 9.099/1995, lei especial, que neste aspecto
regulou inteiramente a matéria, o que afasta o regime do Código de Processo Civil. Os
honorários advocatícios são devidos, sendo a parte representada por profissional da advocacia,
apresentadas ou não as contrarrazões, uma vez que o profissional permanece a executar o
trabalho, tendo que acompanhar o andamento do recurso (STF, Pleno, AO 2063 AgR/CE, Rel.
Min. Marco Aurélio, Redator para o acórdão Min. Luiz Fux, j. 18.05.2017; AgInt no REsp
1429962/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
27/06/2017, DJe 02/08/2017).
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONCESSIVA DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO, MEDIANTE O RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE EXERCIDA SOB
CONDIÇÕES ESPECIAIS. ATIVIDADES DE APRENDIZ DE AJUDANTE DE PRENSISTA E DE
AJUDANTE DE PRENSISTA. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA CATEGORIA
PROFISSIONAL PREVISTA NO CÓDIGO 2.5.2 DO DECRETO 83.080/1979, COM BASE NA
ANOTAÇÃO DA CTPS. NA ATIVIDADE DE APRENDIZ SÃO EXECUTADAS AS MESMAS
ATIVIDADES E A LEGISLAÇÃO NÃO DISCRIMINA O AJUDANTE E O APRENDIZ.
POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO DA ATIVIDADE DE CARTEIRO MOTORIZADO
COMO ATIVIDADE ESPECIAL, EM RAZÃO DA PERICULOSIDADE. LEI 12.997/2014, QUE
ACRESCENTOU AO ARTIGO 193 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO A
ATIVIDADE DE TRABALHADOR CONDUTOR DE MOTOCICLETA. PORTARIA MTE
1.565/2014. APLICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
NOS TEMAS REPETITIVOS 1.031 e 534. DEVER JUDICIAL DE OBSERVÂNCIA DA
COERÊNCIA E INTEGRIDADE DO DIREITO. PRESENTES AS MESMAS RAZÕES, IMPÕE-
SE A MESMA SOLUÇÃO ADOTADA PELO STJ AO RECONHECER O TEMPO ESPECIAL DO
VIGILANTE E DO ELETRICISTA, DESDE QUE COMPROVADO O EXERCÍCIO HABITUAL E
PERMANENTE DESSAS ATIVIDADES COM RISCO EFETIVO À INTEGRIDADE FÍSICA.
RECURSO DO INSS DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo
decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do réu e dar parcial provimento ao
recurso do autor, nos termos do voto do Relator, Juiz Federal Clécio Braschi. Participaram do
julgamento os Excelentíssimos Juízes Federais Uilton Reina Cecato, Alexandre Cassettari e
Clécio Braschi., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA