Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2243857 / SP
0016678-51.2017.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/10/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ANULAÇÃO DE OFÍCIO. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO.
HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO. SENTENÇA TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
CORROBORADO POR OUTRAS PROVAS. POSSIBILIDADE. TRABALHO EM CONDIÇÕES
ESPECIAIS. ATIVIDADE ESPECIAL NA AGROPECUÁRIA. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
TERMO INICIAL NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CRITÉRIO DA
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
- De ofício, observado que a sentença proferida é condicional, uma vez que julgou procedente o
pedido deduzido na inicial, para condenar o INSS a reconhecer vínculo empregatício rural e
caso tenha havido o cumprimento do período necessário, a conceder a aposentadoria por
tempo de contribuição, desde a data da citação. Dessa forma, é de ser reconhecida a
ocorrência de julgamento condicional a ensejar a nulidade parcial da sentença, diante da ofensa
ao artigo 492 do CPC/2015. Entretanto, estando o processo em condições de imediato
julgamento, aplica-se a regra do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual e examinado o
mérito.
- Pela regra anterior à Emenda Constitucional 20, de 16.12.98 (EC 20/98), a aposentadoria por
tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição) poderia
ser concedida na forma proporcional, ao segurado que completasse 25 (vinte e cinco) anos de
serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino, restando
assegurado o direito adquirido, para aquele que tivesse implementado todos os requisitos
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
anteriormente a vigência da referida Emenda (Lei 8.213/91, art. 52). Após a EC 20/98, aquele
que pretende se aposentar com proventos proporcionais impõe-se o cumprimento das
seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da Emenda; contar
com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos de idade, se mulher; somar no mínimo 30 anos,
homem, e 25 anos, mulher, de tempo de serviço; e adicionar o "pedágio" de 40% sobre o tempo
faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional. Vale lembrar que, para
os segurados filiados ao RGPS posteriormente ao advento da EC/98, não há mais que se falar
em aposentadoria proporcional, sendo extinto tal instituto.
- De outro lado, comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30
(trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores
à EC 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras
permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração
constitucional (Lei 8.213/91, art. 53, I e II). Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o
segurado comprovar, também, o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei
8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142
(norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à
obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180
exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
- Nos termos do artigo 55, §§1º e 3º, da Lei 8.213/1991, a comprovação do tempo de serviço,
seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de
serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua
o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.
- O autor requereu averbação de vínculo empregatício, na qualidade de trabalhador rural,
prestado no intervalo de 01.02.1999 a 03.04.2009, para Antônio José Azevedo Costa Pereira
Lima (Fazendas Contendas de Baixo), que restou reconhecido em ação trabalhista. Importante
consignar que aludido vínculo empregatício se iniciou em 25.01.1988, porém o empregador
deixou de verter as respectivas contribuições previdenciárias a partir de fevereiro de 1999.
- Para comprovar que ainda detinha o vínculo, o autor trouxe aos autos cópia de sua CTPS,
sem anotação da rescisão, que somente restou anotada após ajuizamento da ação trabalhista.
- Verifica-se que no julgamento da reclamatória trabalhista nº 000.574/2009-RTOrd, ajuizada
perante a Justiça do Trabalho de Mococa/SP, que as partes fizeram um acordo, devidamente
homologado pelo Juízo, não tendo o INSS feito parte desta ação. Com efeito, as anotações de
vínculos empregatícios decorrentes de sentença judicial proferidas em reclamatórias
trabalhistas devem ser analisadas com ressalvas, mormente quando constituídas de acordo
entre as partes, no qual o INSS sequer participa, não tendo a decisão homologatória ingressado
no mérito do pedido. Ganham maior importância, no entanto, quando há análise de mérito da
reclamatória pelo Juízo Trabalhista, com trânsito em julgado, reconhecendo-se o vínculo
pleiteado e por vezes obrigando o empregador a regularizar os recolhimentos previdenciários
devidos.
- Além de cópia dos autos e da sentença trabalhista, com a determinação de que deixasse sua
habitação na fazenda, o autor trouxe aos autos recibos de pagamentos de salários relativos às
competências de fevereiro, maio e setembro de 1999, bem como de julho de 2005 e fevereiro
de 2007, com a menção de descontos por habitação e contribuições previdenciárias, carteira
profissional sem a anotação da rescisão, carteira profissional com a anotação da rescisão do
vínculo empregatício, realizada perante à Justiça do Trabalho e prova testemunhal.
- A sentença trabalhista, mesmo que decorrente de celebração de acordo, pode ser recebida
como início de prova material, sendo necessária, de toda a forma, sua análise com as demais
provas da ação previdenciária. Em reforço, os precedentes desta E. Turma (TRF3ª Região, AC
2013.03.99.033935-3/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF 3ª Região, AC nº
0003027-61.2008.4.03.6120, Sétima Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 08/08/16), bem
como a Súmula 31 da TNU, in verbis: "A sentença proferida na esfera trabalhista reveste-se de
início de prova material para fins previdenciários".
- In casu, diante do início de prova material, complementado e ratificado pela prova
testemunhal, resta por comprovado o vínculo empregatício do autor no intervalo de 01.02.1999
a 03.04.2009.
- Eventual não recolhimento das contribuições previdenciárias devidas nesse período não pode
ser atribuído ao autor, nos termos do artigo 30, inciso I da Lei 8.212/1991 e devem, portanto,
ser computado para fins de carência e cômputo de tempo de serviço, independentemente de
indenização aos cofres da Previdência Social.
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- Não há como se sonegar o direito do segurado à averbação de labor exercido em condições
especiais sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e
artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição
não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de
polícia.
- Ademais, nesse particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº
664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de
Repercussão Geral, que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos
segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da
preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal
(que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a
correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição
inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o
caso da aposentadoria especial.
- Com efeito, até 28.04.1995, o enquadramento como atividade especial poderia ser feito com
base na categoria profissional, não havendo necessidade de produzir provas da exposição ao
agente nocivo, havendo uma presunção da nocividade.
- Os trabalhadores rurais da agropecuária exercem atividades ostensivamente insalubres e
estão previstas como insalubres no código 2.2.1 do anexo ao Decreto 53.841/64. Precedente.
- Com tais considerações, apenas o período de 25.01.1988 a 28.04.1995 pode ser reconhecido
como especial, nos termos do item 2.2.1 do Decreto 53.831/64, e convertido para tempo comum
pelo fator de conversão 1,40, não sendo possível averbar os demais períodos requeridos como
especiais, pois não foram trazidos aos autos formulários, PPP e/ou laudos técnicos para
comprovar a exposição a agentes nocivos ou que a atividade agrícola tenha sido realizada
concomitantemente com a pecuária.
- Somados o vínculo empregatício e especial, convertido em tempo comum pelo fator 1,40, ora
reconhecidos, acrescidos dos períodos comuns constantes em CTPS e CNIS, até a data do
requerimento administrativo, 19.03.2014 (26 anos, 1 mês e 17 dias), 19.03.2014, perfaz o autor
39 anos, 2 meses e 26 dias de tempo de serviço, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo,
19.03.2014, porquanto a documentação que permitiu o reconhecimento da atividade especial e
rural do autor foi apresentada à autarquia federal à época.
- Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral). Tal índice deve ser aplicado ao caso, até
porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de
declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de
eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do
IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado. E, apesar da recente
decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o
INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto
com o julgado acima mencionado. Dessa forma, se a sentença determinou a aplicação de
critérios de juros de mora e correção monetária diversos daqueles adotados quando do
julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem
observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao
entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral. Assim, para o cálculo dos juros
de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os
índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009,
considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio
STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados segundo o índice
de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei
9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção monetária, segundo
o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
- Vencido em maior parte o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, os
quais fixo no patamar de 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença
(Súmula nº 111/STJ), eis que de acordo com a moderada complexidade das questões e
consenso deste Colegiado.
- De ofício, anulada a sentença por ser condicional e analisado o mérito nos termos do art.
1.013, §3º, III, do CPC de 2015.
- Prejudicadas as apelações.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, anular a r.
sentença, por ofensa ao art. 492 do CPC/2015, por se tratar de decisão condicional e de acordo
com o artigo 1.013, § 3º, III, do mesmo diploma legal, julgar parcialmente procedente o pedido,
para condenar o ente autárquico a averbar o vínculo empregatício de 01.02.1999 a 03.04.2009
e o labor especial no intervalo de 25.01.1988 a 28.04.1995 e a conceder o benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo,
19.03.2014, com os devidos consectários legais, bem como ao pagamento de honorários
advocatícios, restando por prejudicadas as apelações, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
