Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2268157 / SP
0030200-48.2017.4.03.9999
Relator(a)
JUIZA CONVOCADA LEILA PAIVA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
13/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/05/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ANULADA. CAUSA MADURA PARA
JULGAMENTO, NOS TERMOS DO ART. 1.013, § 3º, II, DO CPC DE 2015. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL SEM REGISTRO EM CTPS.
RECONHECIMENTO DE VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS ANOTADOS EM CTPS. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. TERMO INICIAL NA DATA DA CITAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Recebidas as apelações interpostas sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em
razão de suas regularidades formais, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do
Codex processual.
- Cuida-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante
averbação de labor rural e vínculos empregatícios constantes em CTPS, estando o magistrado
impedido decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra
petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. No caso sub examen, a sentença condicionou a
concessão do benefício à análise dos requisitos pelo ente autárquico, configurando sentença
condicional, eis que expressamente não foi analisado o pedido formulado na inicial (
aposentadoria por tempo de contribuição), restando violado o princípio da congruência
insculpido no art. 492 do CPC/2015, o que impõe a decretação de sua nulidade.
- O caso, contudo, não é de devolução dos autos ao Juízo de origem, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições
para tanto, nos termos do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a
causa está madura para julgamento e que foram observados os princípios do contraditório e da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
ampla defesa, com a citação válida do ente autárquico e, ainda, amparado pela legislação
processual aplicável, ingressado no exame do mérito da demanda.
- Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos,
se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC 20/98,
se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes
estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei
8.213/91, art. 53, I e II). Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o segurado
comprovar, também, o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos
já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de
transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do
benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela
regra permanente do citado art. 25, II.
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- A atividade rural alegada restou satisfatoriamente comprovada no período pleiteado de
01.02.1965 (desde os doze anos de idade do autor) a 16.12.1974, data que antecede seu
primeiro registro em CTPS. O autor era filho de lavradores, nasceu, foi criado e se casou, tudo
na zona rural, não sendo demais entender que desempenhou atividade campesina desde muito
jovem, como é comum acontecer nesse ambiente, em que toda a família, inclusive filhos ainda
em tenra idade, vão para o campo, em prol de suas subsistências. Nesse sentido, as
declarações das testemunhas, que em uníssono e minúcias de detalhes confirmaram o labor
rural do autor, complementado e reforçando as provas materiais. Em reforço, ainda, os vínculos
trabalhistas exercidos na área agrícola, comprovando que a atividade rural sempre permeou a
vida laborativa do autor.
- Dessa forma, reconhecida a atividade exercida como trabalhador rural pelo autor, em regime
de economia familiar, no período de 01.02.1965 a 16.12.1974, data que antecede seu primeiro
registro em CTPS, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias,
devendo ser considerada como tempo de contribuição.
- Com efeito, nos termos do artigo 55, §§1º e 3º, da Lei 8.213/1991, a comprovação do tempo
de serviço, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de
tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme
preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal. No que tange à possibilidade do cômputo da atividade laborativa efetuada pelo
menor de idade, o próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser
interpretadas em benefício do menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o
trabalho remunerado a quem não possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em
seu desfavor, privando o menor do direito de ver reconhecido o exercício da atividade
laborativa, para fins do benefício previdenciário (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de
Moraes, 03/08/2017, RE 906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- As anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem presunção de
veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso o contrário,
representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional de
Informações Sociais - CNIS. Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e
Previdência social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa
a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo
de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conte no
Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)."
- Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que
infirme as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser
considerados como tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das
contribuições previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos
termos do artigo 30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma (TRF 3ª Região,
SÉTIMA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1344300 - 0005016-
55.2005.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em
27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017).
- Em vistas à CTPS do autor, observa-se que os vínculos empregatícios encontram-se em
ordem cronológica, sem rasuras e devidamente assinados pelos empregadores. Por outro lado,
o ente autárquico não os infirmou ou arguiu qualquer nulidade.
- Nesse contexto, acolhida a pretensão do autor e reconhecidos os vínculos empregatícios de
17.12.1974 a 21.10.1975 (Departamento Autônomo de Água), 03.11.1975 a 22.11.1975
(SEMPRE - Serviços e Empreitadas Rurais), 01.12.1988 a 26.07.1989 (Célio Borges de Faria -
Fazenda Santa Helena) e 01.01.1997 a 13.05.2005 (Walter Papin - Sítio Cachoeirinha), que
devem ser averbado pelo INSS, desacolhendo-se seu recurso nesse tocante. Ademais, os
vínculos empregatícios apostos na CTPS devem ser considerados na data de início e término
dos contratos de trabalho.
- Somado o período de labor rural, sem registro em CTPS, aos vínculos empregatícios ora
averbados e registros constantes em CTPS e CNIS, perfaz o autor 37 anos, 11 meses e 6 dias
de tempo de serviço até a data do ajuizamento da ação, fazendo jus ao benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição.
- O termo inicial deve ser fixado na data da citação, 20.03.2014 (fl. 56), quando a autarquia
federal tomou conhecimento da pretensão.
- O termo inicial não restou fixado na data do requerimento administrativo, 03.09.2013, uma vez
que não foi trazido aos autos o processo administrativo, através do qual seria possível dessumir
se a documentação que possibilitou o reconhecimento do direito vindicado também foi
apresentada ao ente autárquico àquela ocasião.
- Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados no patamar
de 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), eis
que de acordo com a moderada complexidade das questões e consenso deste Colegiado.
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora
(artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (ii) nem do pagamento de honorários
periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal,
devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art. 32).
- Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral). Tal índice deve ser aplicado ao caso, até
porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de
declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de
eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do
IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado. E, apesar da recente
decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o
INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto
com o julgado acima mencionado. Dessa forma, se a sentença determinou a aplicação de
critérios de juros de mora e correção monetária diversos daqueles adotados quando do
julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem
observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao
entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada em vigor
da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da
Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios
estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017,
na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados
segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção
monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
- Negado provimento à apelação do INSS.
- Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO DO INSS E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR, para anular
a sentença por ofensa ao artigo 492 do CPC/2015, e, conforme o artigo 1.013, § 3º, II, do
CPC/2015, julgar parcialmente procedente o pedido inicial, para condenar a autarquia federal a:
(i) averbar o labor rurícola, sem registro em CTPS e em regime de economia familiar, no
período de 01.02.1965 a 16.12.1974, independentemente do recolhimento de contribuições
previdenciárias; (ii) averbar os vínculos empregatícios constantes em CTPS, não inseridos no
CNIS, de 17.12.1974 a 21.10.1975, 03.11.1975 a 22.11.1975, 01.12.1988 a 26.07.1989 e
01.01.1997 a 13.05.2005; (iii) considerar os vínculos empregatícios apostos em CTPS
considerando a data de início e término dos contratos de trabalho; e, por fim, (iv) conceder o
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data da citação, 20.03.2014,
acrescidas as parcelas devidas de juros e correção monetária; (v) pagar os honorários
advocatícios, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
