Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0007259-75.2015.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
07/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. CONVERSÃO
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL.
TERMO A QUO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS.
I- Nos termos do art. 492, parágrafo único, do CPC, a sentença deve ser certa, ainda quando
decida relação jurídica condicional. A sentença que condiciona a procedência do pedido à
satisfação de determinados requisitos pelo autor deixa a lide sem solução, negando a segurança
jurídica buscada pela via da jurisdição.
II- Não merece prosperar a alegação da autarquia no tocante à impossibilidade de conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, tendo em vista que o
presente caso é de revisão e não de renúncia de benefício previdenciário, visando à concessão
de outro mais vantajoso, com o cômputo de tempo de contribuição posterior ao afastamento
(desaposentação). Outrossim, se o INSS tivesse observado o preenchimento dos requisitos para
o deferimento da aposentadoria especial ora requerida, como deveria ter feito, ao analisar o
pedido na esfera administrativa, era sua obrigação concedê-la. Tal entendimento veio a ser
expressamente consagrado no art. 621, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de
agosto de 2010, o qual foi ratificado pela posterior Instrução Normativa INSS-PRES nº 77, de 21
de janeiro de 2015, conforme a redação constante do seu art. 687, absolutamente idêntica à
desse art. 621.
III- No que se refere ao reconhecimento do tempo de serviço especial, a jurisprudência é pacífica
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do
princípio tempus regit actum.
IV- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta
a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite
foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi
reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
V- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
VI- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art.
57 da Lei nº 8.213/91.
VII- O termo inicial da conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial deve ser mantido na data da concessão do benefício (15/8/11), não sendo relevante o
fato de a comprovação da atividade especial ter ocorrido apenas no processo judicial, conforme a
adotar a jurisprudência pacífica do C. STJ sobre o referido tema. Neste sentido: REsp nº
1.610.554/SP, 1ª Turma, Relatora Min. Regina Helena Costa, j. 18/4/17, v.u., DJe 2/5/17; REsp nº
1.656.156/SP, 2ª Turma, Relator Min. Herman Benjamin, j. 4/4/17, v.u., DJe 2/5/17 e Pet nº
9582/RS, 1ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 26/8/15, v.u., DJe 16/9/15. Com
relação ao § 8º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, deve ser adotado o posicionamento firmado pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº
791.961 (Tema nº 709).
VIII- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos firmados na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos relativos
a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A taxa de juros deve incidir de acordo
com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação
dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
IX- Declarada, ex officio, a nulidade do decisum na parte em que condicionou a conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial "se for o caso" (ID
107319821, p. 194). Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007259-75.2015.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ISAAC PAFUMI DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: GABRIEL DE MORAIS TAVARES - SP239685-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007259-75.2015.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 20/4/12 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão da aposentadoria especial, mediante o reconhecimento do caráter especial das
atividades mencionadas na petição inicial. Pleiteia, ainda, indenização por dano moral.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quojulgou parcialmente procedente o pedido, “para declarar como trabalhado em
regime especial os períodos compreendidos entre 09.05.1983 a 10.08.1986; e de 03.08.1987
até os dias atuais, (...) devendo o INSS converter e computar tais períodos para fins de revisão
da aposentadoria por tempo de contribuição concedida ao autor, convertendo-a em especial se
for o caso, desde o requerimento administrativo. (...) Os juros de mora devidos são os juros
legais e incidem sobre as parcelas englobadas até a citação à razão de 1% ao mês, nos termos
do art. 406 do Código Civil e do art. 161, § 1°, do Código Tributário Nacional. A correção
monetária incide sobre as diferenças do benefício, desde o ajuizamento da ação, na forma do
antigo Provimento COGE n° 24/97; do atual Provimento COGE n° 64/05; da Resolução CJF
242/01; e ainda da Portaria DForo-SJ/SP n° 92, de 23.10.01” (ID 107319821, p. 194/195). Foi
fixada a sucumbência recíproca. Sem custas.
Inconformada, apelou a autarquia, sustentando a improcedência do pedido. Caso não seja esse
o entendimento, requer a fixação do termo inicial de concessão do benefício a partir da data do
afastamento da atividade especial ou da citação, bem como a incidência da correção monetária
e dos juros de mora nos termos do art. 1º-F, da Lei n.º 9.494/97, com a redação dada pela Lei
n.º 11.960/09.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007259-75.2015.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ISAAC PAFUMI DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: GABRIEL DE MORAIS TAVARES - SP239685-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
observo que, ao apreciar o pleito, o MM. Juiz de primeiro grau lançou o seguinte dispositivo:
"JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial para declarar como trabalhado em
regime especial os períodos compreendidos entre 09.05.1983 a 10.08.1986; e de 03.08.1987
até os dias atuais, (...) devendo o INSS converter e computar tais períodos para fins de revisão
da aposentadoria por tempo de contribuição concedida ao autor, convertendo-a em especial se
for o caso, desde o requerimento administrativo” (ID 107319821, p. 194).
Nos termos do art. 492, parágrafo único, do CPC, a sentença deve ser certa, ainda quando
decida relação jurídica condicional.
Ao determinar a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial "se for o caso" (ID 107319821, p. 194), o Juízo de primeiro grau condicionou os efeitos
do decisum proferido à prova do tempo necessário para a concessão do benefício, em distonia
com o disposto no art. 492, parágrafo único, do CPC. A prova relacionada à expressão "se for o
caso" é matéria alusiva à fase de conhecimento do processo e fundamental para o
reconhecimento da existência do direito à aposentadoria pleiteada. Ou o segurado faz jus ao
benefício, ou não faz, havendo impeço para que a sentença gere incertezas quanto à
composição do litígio. A decisão que condiciona a procedência do pedido à satisfação de
determinados requisitos pelo autor deixa a lide sem solução, tolhendo a segurança jurídica
buscada pela via da jurisdição.
Dessa forma, declaro a nulidade do decisum na parte em que condicionou a conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial "se for o caso" (ID
107319821, p. 194).
Outrossim, não merece prosperar a alegação da autarquia no sentido "DA IMPOSSIBILIDADE
DE TRANSFORMAÇÃO DE APOSENTADORIA EM ESPÉCIE DIVERSA (APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL)" (ID 107319821, p.
202), tendo em vista que o presente caso é de revisão e não de renúncia de benefício
previdenciário, visando à concessão de outro mais vantajoso, com o cômputo de tempo de
contribuição posterior ao afastamento (desaposentação). Outrossim, verifico que se o INSS
tivesse observado o preenchimento dos requisitos para o deferimento da aposentadoria
especial ora requerida, como deveria ter feito, ao analisar o pedido na esfera administrativa, era
sua obrigação concedê-la. Tal entendimento veio a ser expressamente consagrado no art. 621,
da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de agosto de 2010, in verbis: "O INSS deve
conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientar nesse
sentido." Tão justo e salutar é esse dispositivo transcrito que ele foi ratificado pela posterior
Instrução Normativa INSS-PRES nº 77, de 21 de janeiro de 2015, conforme a redação
constante do seu art. 687, absolutamente idêntica à desse art. 621.
Passo à análise do mérito.
No que se refere ao reconhecimento da atividadeespecial, a jurisprudência é pacífica no sentido
de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio
tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até
28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos
anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado
meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário
específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do
Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao
incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da
efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico,
motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei
a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a
partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento
dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C.
Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº
9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14;
AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em
18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de
Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal
Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória
nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o
qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-
se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes
nocivos. O art. 68 do Decreto nº 8.123/13 também traz considerações sobre o referido PPP.
Devo salientar que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não
impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração
expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes
nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era
menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do
trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela
própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando
sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo,
diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030,
nos quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para
aposição da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no
PPP possa prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua
de informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPInão é suficiente para
descaracterizar a especialidadeda atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do
aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do
agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo
referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo
Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso
Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux.
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição
do segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na
Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à
aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de
elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de
trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do
referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário
caso apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao
empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação
de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A
respeito, é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que
"considerar que a declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz
consiste em condição suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será
desenvolvido adiante, para obter relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos
contrários ao cumprimento dessas normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à
Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da
realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente
ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos
econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de
dados confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não
concorre para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da
ineficácia do equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus
de provar que o trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se
pode impor ao empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de
suportar individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são
compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima
mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio
para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a
regra que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do
equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria
especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não
consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º,
CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário,
disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria
constituição".
Quanto à aposentadoria especial, em atenção ao princípio tempus regit actum, o benefício deve
ser disciplinado pela lei vigente à época em que implementados os requisitos para a sua
concessão, devendo ser observadas as disposições do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Cumpre ressaltar que, no cálculo do salário de benefício da aposentadoria especial, não há a
incidência do fator previdenciário, tendo em vista o disposto no inc. II do art. 29 da Lei nº
8.213/91.
Passo à análise do caso concreto.
1) Período: 9/5/83 a 10/8/86.
Empresa: Mococa S/A Produtos Alimentícios.
Atividades/funções: auxiliar de fábrica.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 92 dB.
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº
2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Provas: Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID 107319821, p. 171/172), datado de
23/5/13 e Laudo Técnico (ID 107319821, p. 173/179), datados de 1994.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no
período de 9/5/83 a 10/8/86, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao
agente ruído acima do limite de tolerância.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de
apresentação de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de
80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB,
conforme Decreto nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos
termos do Decreto nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do Recurso EspecialRepetitivo Representativo de Controvérsia nº
1.398.260/PR (2013/0268413-2), firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de
aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no
momento da prestação do serviço.
2) Período: 3/8/87 a 15/8/11.
Empresa: Metalúrgica Mococa S/A.
Atividades/funções: ajudante de litografia (3/8/87 a 31/7/91), operador de máquina de
envernizamento (1º/8/91 a 31/1/97), operador de máquina de litografia na linha de
envernizamento (1º/2/97 a 28/2/98), operador de máquina de litografia na linha de impressão 6
(1º/3/98 a 31/5/07) e encarregado de litografia (1º/6/07 a 15/8/11).
Agente(s) nocivo(s): ruído de 90 dB (3/8/87 a 31/7/91), 87 dB (1º/8/91 a 31/1/97), 89 dB (1º/2/97
a 28/2/98), 91 dB (1º/3/98 a 31/5/04), 94,1 dB (1º/6/04 a 31/5/07) e 93,4 dB (1º/6/07 a 15/8/11).
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº
2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Provas: Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID 107319883, p. 16/17), datado de
6/10/09, PPRAs (ID 107319883, p. 116/223, ID 107319771, p. 4/59 e ID 107319821, p. 4/168) e
PCMSO (ID 107319771, p. 60/185).
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial nos
períodos de 3/8/87 a 5/3/97 e 1º/3/98 a 15/8/11, em decorrência da exposição, de forma
habitual e permanente, ao agente ruído acima do limite de tolerância. Embora no PPP tenha
constado que durante o período de 1º/3/98 a 29/6/99 o autor ficou exposto a ruído de 88 dB,
entendo que deve ser reconhecido o caráter especial de todo o período em que foi exercida a
atividade de “operador de máquina de litografia” no setor “linha impressão 6” (1º/3/98 a
31/5/07). Ora, considerando que não houve a modificação da função exercida, tampouco do
setor da empresa, não se mostra crível que até 29/6/99 o autor estivesse exposto a ruído de 88
dB e, a partir de 30/6/99, estivesse exposto a ruído de 91 dB. Ademais, se em data posterior ao
trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que
a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os
avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com
o passar do tempo. Outrossim, não obstante o PPP esteja datado de 6/10/09, consta do CNIS
que o autor permaneceu trabalhando na mesma empresa e na mesma função (encarregado de
litografia - CBO 3912), não constando do laudo apresentado, em 20/5/13, que tenha havido
alguma alteração no lay-out da empresa. No entanto, não ficou comprovada a especialidade do
labor no período de 6/3/97 a 28/2/98, tendo em vista que a exposição ao ruído foi inferior ao
limite de tolerância.
Dessa forma, somando-se os períodos especiais reconhecidos nos presentes autos, perfaz o
autor mais de 25 anos de atividade especial, motivo pelo qual faz jus à conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial.
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social em momento anterior à Lei nº 8.213/91,
o período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma, o qual, no presente
caso, foi em muito superado.
O termo inicial da conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial deve ser mantido na data da concessão do benefício (15/8/11), não sendo relevante o
fato de a comprovação da atividade especial ter ocorrido apenas no processo judicial. Revendo
posicionamento anterior, passo a adotar a jurisprudência pacífica do C. STJ sobre o referido
tema. Neste sentido: REsp nº 1.610.554/SP, 1ª Turma, Relatora Min. Regina Helena Costa, j.
18/4/17, v.u., DJe 2/5/17; REsp nº 1.656.156/SP, 2ª Turma, Relator Min. Herman Benjamin, j.
4/4/17, v.u., DJe 2/5/17 e Pet nº 9582/RS, 1ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j.
26/8/15, v.u., DJe 16/9/15.
Com relação ao § 8º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, deve ser adotado o posicionamento firmado
pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 791.961 (Tema nº 709).
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
Quadra ressaltar haver constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que “a adoção
do INPC não configura afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de
repercussão geral (RE 870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação
do IPCA-E para fins de correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual
se trata de benefício de natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso
concluir que o INPC, previsto no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção
monetária dos benefícios de natureza previdenciária.” Outrossim, como bem observou o E.
Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira: “Importante ter presente, para a adequada
compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em
referência – INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data
em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de
declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de
um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas
sobre o valor da condenação.” (TRF-4ª Região, AI nº 5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª
Turma, v.u., j. 16/10/19).
A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-
F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
Ante o exposto, declaro, de ofício, a nulidade do decisum na parte em que condicionou a
conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial "se for o
caso" (ID 107319821, p. 194) e dou parcial provimento à apelação do INSS para afastar o
reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas no período de 6/3/97 a 28/2/98,
determinar que seja adotado o posicionamento firmado pelo C. STF, no julgamento da
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 791.961 (Tema nº 709), e fixar os juros de
mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09,
devendo a correção monetária incidir na forma acima indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM
APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO A QUO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS.
I- Nos termos do art. 492, parágrafo único, do CPC, a sentença deve ser certa, ainda quando
decida relação jurídica condicional. A sentença que condiciona a procedência do pedido à
satisfação de determinados requisitos pelo autor deixa a lide sem solução, negando a
segurança jurídica buscada pela via da jurisdição.
II- Não merece prosperar a alegação da autarquia no tocante à impossibilidade de conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, tendo em vista que o
presente caso é de revisão e não de renúncia de benefício previdenciário, visando à concessão
de outro mais vantajoso, com o cômputo de tempo de contribuição posterior ao afastamento
(desaposentação). Outrossim, se o INSS tivesse observado o preenchimento dos requisitos
para o deferimento da aposentadoria especial ora requerida, como deveria ter feito, ao analisar
o pedido na esfera administrativa, era sua obrigação concedê-la. Tal entendimento veio a ser
expressamente consagrado no art. 621, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de
agosto de 2010, o qual foi ratificado pela posterior Instrução Normativa INSS-PRES nº 77, de 21
de janeiro de 2015, conforme a redação constante do seu art. 687, absolutamente idêntica à
desse art. 621.
III- No que se refere ao reconhecimento do tempo de serviço especial, a jurisprudência é
pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à
luz do princípio tempus regit actum.
IV- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se
exposta a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97,
o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite
foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
V- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
VI- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art.
57 da Lei nº 8.213/91.
VII- O termo inicial da conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial deve ser mantido na data da concessão do benefício (15/8/11), não sendo relevante o
fato de a comprovação da atividade especial ter ocorrido apenas no processo judicial, conforme
a adotar a jurisprudência pacífica do C. STJ sobre o referido tema. Neste sentido: REsp nº
1.610.554/SP, 1ª Turma, Relatora Min. Regina Helena Costa, j. 18/4/17, v.u., DJe 2/5/17; REsp
nº 1.656.156/SP, 2ª Turma, Relator Min. Herman Benjamin, j. 4/4/17, v.u., DJe 2/5/17 e Pet nº
9582/RS, 1ª Seção, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 26/8/15, v.u., DJe 16/9/15. Com
relação ao § 8º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, deve ser adotado o posicionamento firmado pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário
nº 791.961 (Tema nº 709).
VIII- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os
juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos
índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos
firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no
Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos
processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A taxa de juros
deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº
9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão
Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº
1.492.221 (Tema 905).
IX- Declarada, ex officio, a nulidade do decisum na parte em que condicionou a conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial "se for o caso" (ID
107319821, p. 194). Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, declarar a nulidade da R. sentença na parte em que
condicionou a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial "se for o caso" (ID 107319821, p. 194) e dar parcial provimento à apelação do INSS,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
