Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2296364 / SP
0006995-53.2018.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
08/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/04/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. ART. 1.013, §3º, III, DO CPC.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL. TRABALHO EM
CONDIÇÕES ESPECIAIS. HONORÁRIOS RECURSAIS.
- Recebida a apelação interposta pelo INSS, já que manejada tempestivamente, conforme
certificado nos autos, e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de
Processo Civil/2015.
- Inicialmente, observa-se que a sentença julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na
inicial, para condenar o INSS, desde que preenchidos os requisitos nela apontados, após
promover a recontagem do tempo de serviço/contribuição utilizando-se dos períodos
reconhecidamente trabalhados em condições especiais, a conceder à parte autora o benefício
previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Dessa forma, é de ser
reconhecida a ocorrência de julgamento condicional a ensejar a nulidade da sentença , diante
da ofensa ao artigo 492 do CPC/2015 ou 460 do CPC/1973. Entretanto, estando o processo em
condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo 1.013 , § 3º, III, da norma processual
e passo ao exame do mérito.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- No caso, em que pesem as declarações das testemunhas, assegurando a atividade rural do
autor, a prova material necessita de reforço. Por outro lado, considerando que o conjunto
probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural, seria o caso de se julgar
improcedente a ação, uma vez que parte autora não se desincumbiu do ônus probatório que lhe
cabia, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
- Entretanto, adota-se o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a
sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973, no sentido de que a
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial implica a carência de pressuposto de
constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento
do mérito (art. 485, IV, do NCPC ), propiciando ao autor intentar novamente a ação caso reúna
os elementos necessários (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
CORTE ESPECIAL , julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
- Em resumo, com relação ao período de 10/05/1979 a 30/06/1985, no qual o autor alega ter
trabalhado como rurícola, de ofício, julga-se extinto o processo sem resolução do mérito, nos
termos do art. 485, IV, do NCPC
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- Presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem
proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário,
seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder
Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.
- Apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e
inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz
de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no
particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente , ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- Com efeito, até 28.04.1995, o enquadramento como atividade especial poderia ser feito com
base na categoria profissional, não havendo necessidade de produzir provas da exposição ao
agente nocivo, havendo uma presunção da nocividade. No caso, pelos documentos produzidos
presume-se a nocividade das atividades do autor, no período de 01/07/1985 a 22/08/1986, nos
termos do item 1.2.12 do Decreto 83.080/1979; 01/11/1986 a 09/12/1991 e de 01/07/1992 a
08/04/1994, nos termos do item 1.2.10 do Decreto 83.080/1979.
- Com relação aos períodos de 01/11/2007 a 19/04/2011 e de 02/04/2012 a 19/01/2016 (data da
expedição do PPP), entende-se que ambos devem ser considerados como especiais, já que o
autor esteve exposto a ruído acima do limite de tolerância (maior que 85 dB), conforme atestou
os PPP's regularmente preenchidos. Ademais, com relação a esses períodos, verifica-se do
procedimento administrativo, que a especialidade das atividades somente não foi reconhecida
pelo uso de EPI eficaz. No entanto, conforme acima fundamentado, inexistindo prova de que o
uso de EPI foi capaz de neutralizar o agente nocivo, a dúvida beneficia o trabalhador, não
podendo ser afastada a especialidade de sua atividade por esse motivo, mormente quando se
diz respeito ao ruído. Da mesma forma com relação a habitualidade e permanência das funções
desempenhadas pelo autor, características que se presumem, diante das descrições das
atividades constantes dos PPP's e ausência de prova ao contrário.
- Em resumo, dever ser reconhecida e confirmada a natureza especial das atividades
desempenhadas pelo autor, nos períodos de 01/07/1985 a 22/08/1986, 01/11/1986 a
09/12/1991, 01/07/1992 a 08/04/1994, 01/11/2007 a 19/04/2011 e de 02/04/2012 a 19/01/2016
(data da expedição do PPP) e determino que o INSS proceda a devida adequação nos registros
previdenciários competentes.
- Os períodos de serviços especiais devem ser convertidos em tempo comum, pelo fator de
1,40, acarretando um acréscimo no tempo de contribuição de 06 anos, 01 mês e 12 dias.
- Considerando o tempo de contribuição incontroverso (27 anos, 08 meses e 15 dias) e o
acréscimo decorrente da conversão dos períodos especiais reconhecidos judicialmente em
tempo comum (06 anos, 01 mês e 12 dias), verifica-se que o autor possuía 33 anos, 09 meses
e 27 dias de tempo de contribuição na data do requerimento administrativo, não fazendo jus,
portanto, ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição nos termos em que
requerido.
- Vencido o INSS na maior parte, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, que
foram adequadamente fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da
sentença (Súmula nº 111/STJ). Anoto que os honorários recursais foram instituídos pelo
CPC/2015, em seu art. 85, § 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios,
e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional
exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na
sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei. Assim, desprovido o apelo do INSS
interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser
majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
- Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, anular
parcialmente a sentença por ofensa ao artigo 492, do CPC/2015, e, conforme o artigo 1.013 , §
3º, III, do CPC/2015, c/c artigo 485, IV, do CPC/2015, julgar extinto o processo sem resolução
de mérito, com relação ao pedido de reconhecimento de atividade rural sem registro, de
10/05/1979 a 30/06/1985; negar provimento ao recurso interposto pelo INSS, majorando a
verba honorária em razão dos honorários recursais, e dar parcial provimento ao recurso
interposto pela parte autora, para reconhecer a natureza especial das atividades
desempenhadas nos períodos de 01/11/2007 a 19/04/2011 e de 02/04/2012 a 19/01/2016,
mantendo os períodos reconhecidos na sentença, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
