Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2263790 / SP
0027391-85.2017.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
08/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/04/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. ART. 1.013, §3º, III, DO CPC.
REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO RURAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS.
- Recebida a apelação interposta pelo INSS, já que manejada tempestivamente, conforme
certificado nos autos, e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de
Processo Civil/2015.
- Inicialmente, observa-se que a sentença julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na
inicial, para condenar o INSS, desde que preenchidos os requisitos nela apontados, após
promover a recontagem do tempo de serviço/contribuição utilizando-se dos períodos
reconhecidamente trabalhados em condições especiais e no meio rural, a conceder à parte
autora o benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Dessa
forma, é de ser reconhecida a ocorrência de julgamento condicional a ensejar a nulidade da
sentença, diante da ofensa ao artigo 492 do CPC/2015 ou 460 do CPC/1973. Entretanto,
estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo 1.013, § 3º,
III, da norma processual e passo ao exame do mérito.
- In casu, considerando que o INSS não foi condenado a implantar a aposentadoria por tempo
de contribuição pleiteada pela parte autora, eis que a sentença nesse ponto restou anulada,
remanesce apenas a averbação do labor rural e especial. Nesse ponto, não se divisa uma
condenação de conteúdo econômico que sujeite a sentença ao reexame necessário. Nesse
sentido: TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, REO - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 872817 -
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
0001658-61.2000.4.03.6104, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA,
julgado em 08/08/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/08/2016. Portanto, a hipótese dos autos não
demanda reexame necessário, o qual não deve ser conhecido.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
- Foi garantida ao segurado especial a possibilidade do reconhecimento do tempo de serviço
rural, mesmo ausente recolhimento das contribuições, para o fim de obtenção de aposentadoria
por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1
(um) salário mínimo, e de auxílio-acidente. No entanto, com relação ao período posterior à
vigência da Lei 8.213/91, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição, cabe ao segurado especial comprovar o recolhimento
das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.
- Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
- No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
- No caso, a atividade rural do autor, em companhia do seu avô, restou comprovada no período
de 1978 a 1982, diante dos registros de pagamento, confirmação do ex-empregador e dos
relatos das testemunhas (também ex-trabalhadores rurais daquela propriedade).
- Em que pesem as testemunhas asseverem o labor do autor desde a infância até o ano de
1982, quando passou a ser registrado em CTPS, seus depoimentos carecem de detalhes que
permitam assegurar o labor por todo o período requerido. Dessa forma, a atividade rural do
autor restou somente comprovada no período de 01.01.1978 a 05.09.1982, data que antecede o
primeiro registro do autor em CTPS.
- Entretanto, adota-se o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a
sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973, no sentido de que a
ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial implica a carência de pressuposto de
constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento
do mérito (art. 485, IV, do NCPC), propiciando ao autor intentar novamente a ação caso reúna
os elementos necessários (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
CORTE ESPECIAL , julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
- Em resumo, com relação ao período de 01/01/1976 a 31/12/1978, no qual o autor alega
também ter trabalhado como rurícola, de ofício, julga-se extinto o processo sem resolução do
mérito, nos termos do art. 485, IV, do NCPC.
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- Presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem
proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário,
seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder
Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.
- Apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e
inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz
de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no
particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- O laudo técnico/PPP não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do
reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro,
porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da
tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas
pelo trabalhador à época da execução dos serviços. Precedentes.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- No período de 10.02.1986 a 29.01.1987, o autor trabalhou na Alumínio Araras Ltda., no cargo
de laminador, exposto de forma habitual e permanente ao agente nocivo ruído na intensidade
de 89,5 dB. Portanto, o período deve ser enquadrado como especial nos itens 1.1.5 e 1.1.6 dos
Decretos 53.831/64 e 83.080/79.
- No intervalo de 01.10.1988 a 17.03.1989, no cargo de montador, o autor reformava estruturas
metálicas para Moroni & Moroni Ltda., lixando a pintura e soldando as estruturas, pelo que
ficava exposto a substâncias da solda, tinta e solventes. A exposição aos agentes químicos
hidrocarbonetos permite o enquadramento especial do período com base nos itens 1.2.10 e
1.2.11 dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79.
- No período de 01.10.1990 a 23.11.1994, exercia o cargo de laminador na Laminação de
Metais Paulista Ltda., exposto de forma habitual e permanente a ruído na intensidade de 91,42
dB e aos agentes químicos hidrocarbonetos benzeno, tolueno, xileno, n-hexano, n-heptano e n-
octano, o que permite o enquadramento especial do período nos itens 1.1.5, 1.1.6 e itens 1.2.10
e 1.2.11 dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79.
- No intervalo de 02.05.1995 a 04.03.1997, exercia o cargo de laminador na Alumínio Araras
Ltda., exposto de forma habitual e permanente ao agente nocivo ruído, na intensidade de 89,5
dB, o que permite o enquadramento especial do intervalo nos itens 1.1.5 e 1.1.6 dos Decretos
53.831/64 e 83.080/79.
- Ademais, os períodos acima também são enquadrados como especial em razão das
atividades do autor na indústria metalúrgica, enumeradas no item 2.5.1 e 2.5.2 dos Decretos
53.831/64 e 83.080 (trabalhadores das indústrias metalúrgicas e mecânicas, tais como
lingoteiros, tenazeiros, caçambeiros, amarradores, dobradores, desbastadores, rebarbadores,
esmerilhadores, marteleiros de rebarbação, laminadores, trefiladores, forjadores e outros),
sendo inegável a natureza especial da ocupação do autor em todo o período.
- Em resumo, reconhecida e confirmada a natureza especial das atividades desempenhadas
pelo autor nos períodos de 10.02.1986 a 29.01.1987, 01.10.1988 a 17.03.1989, 01.10.1990 a
23.11.1994 e 02.05.1995 a 04.03.1997 e determinado ao INSS que proceda a devida
adequação nos registros previdenciários competentes.
- Considerando o tempo de contribuição constantes da CTPS e CNIS e o acréscimo decorrente
da conversão dos períodos especiais reconhecidos judicialmente e do labor rural reconhecido,
perfaz o autor até a data do requerimento administrativo, 24.06.2010, apenas 34 anos, 3 meses
e 26 dias de tempo de serviço, insuficientes para concessão do beneficio de aposentadoria por
tempo de contribuição.
- Somados os períodos de labor até a data do ajuizamento da ação, 04.01.2011, perfaz o autor
apenas 34 anos, 10 meses e 6 dias de tempo de serviço, também insuficientes para concessão
do benefício vindicado.
- Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento do pedido de
aposentadoria por tempo de contribuição, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca,
motivo pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as
partes, na forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas
honorárias, por se tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, §
14, do CPC/15). Por tais razões, com base no artigo 85, §§2° e 3°, do CPC/15, condeno a parte
autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INSS, que fixo em 10% do
valor atualizado da causa, considerando que não se trata de causa de grande complexidade,
mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo
exigido para o seu serviço. Suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, §
3º, do CPC/2015, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
- Reexame necessário não conhecido.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, anular
parcialmente a sentença por ofensa ao artigo 492, do CPC/2015, e, de acordo com o artigo
1.013, § 3º, III, do CPC/2015, c/c artigo 485, IV, do CPC/2015, julgar extinto o processo sem
resolução de mérito, com relação ao pedido de reconhecimento de atividade rural sem registro,
de 01/01/1976 a 31/12/1977, não conhecer do reexame necessário e dar parcial provimento ao
recurso interposto pelo INSS, para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por tempo de
contribuição, mantendo os períodos especiais e parte do período rural (01/01/1978 a
05/09/1982) reconhecidos na r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
