D.E. Publicado em 03/10/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher a preliminar de sentença ultra petita para restringi-la aos limites do pedido, rejeitar as preliminares de nulidade da sentença por ausência de fundamentação e suspensão do cumprimento da decisão que concedeu a tutela antecipada e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do INSS e não conhecer da remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000686-04.2007.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 2/2/07 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição desde a data do requerimento administrativo (3/11/05), mediante o reconhecimento do caráter especial das atividades desenvolvidas nos períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 13/10/82 a 14/1/84, 2/5/84 a 10/2/85, 12/2/86 a 22/3/88, 1º/8/88 a 23/11/92 e 10/5/93 a 5/3/97. Pleiteia, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita e indeferida a tutela antecipada (fls. 59/60).
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 13/10/82 a 14/1/84, 2/5/84 a 10/12/85, 12/2/86 a 22/3/88, 1º/8/88 a 23/11/92 e 10/5/93 a 4/11/97, bem como condenar o INSS ao pagamento da aposentadoria por tempo de serviço a partir da data do requerimento administrativo (3/11/2005 - fls. 17), observada a prescrição quinquenal. "Os juros moratórios são fixados à base de 6% ao ano, a partir da citação até 10/01/03, e, após, à razão de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do CC e art. 161, § 1º, do CTN. A correção monetária incide sobre as diferenças apuradas desde o momento em que se tornaram devidas, na forma do atual Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela resolução 561/2007 do Presidente do Conselho da Justiça Federal" (fls. 150). Os honorários advocatícios foram arbitrados em 15% sobre o valor total da condenação. "O INSS encontra-se legalmente isento do pagamento de custas" (fls. 150). Concedeu a tutela específica, conforme o art. 461 do CPC/73.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando em breve síntese:
a) Preliminarmente:
- a nulidade da R. sentença por ausência de fundamentação;
- a violação aos arts. 128 e 460 do CPC/73, uma vez que, na petição inicial, o autor requereu o enquadramento como especial do período de 10/5/93 a 5/3/97, sendo que, no entanto, o Juízo a quo reconheceu tempo especial até 4/11/97;
- a suspensão do cumprimento da decisão, nos termos do art. 558, parágrafo único, do CPC/73, tendo em vista que a "concessão da tutela antecipada causará lesão grave e de difícil reparação ao apelante" (fls. 165).
b) No mérito:
- que, com relação ao cálculo da aposentadoria por tempo de serviço, seja computado "tempo de serviço apenas até 16.12.1998 ou o apelado deve se submeter às regras do artigo 9º da EC 20/98" (fls. 169);
- a impossibilidade de reconhecimento, como especial, dos períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 12/2/86 a 22/3/88 e 1º/8/88 a 23/11/92, conforme o código 2.5.1 do Decreto nº 83.080/79, uma vez que o demandante não laborou em indústrias metalúrgicas e mecânicas, bem como que as atividades de retificador, fresador ferramenteiro e aprendiz não se encontram abrangidas pelo referido código;
- a ausência de laudo para os períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 12/2/86 a 22/3/88 e 1º/8/88 a 23/11/92;
- a impossibilidade de enquadramento do período de 13/10/82 a 14/1/84 como especial, tendo em vista que não se encontra acostado aos autos laudo que comprove a exposição a ruído;
- a impossibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas no período de 2/5/84 a 10/12/85, uma vez que não ficou comprovada a exposição ao ruído acima dos limites de tolerância;
- a impossibilidade de enquadramento da especialidade do período de 10/5/93 a 5/3/97 pela exposição ao agente nocivo ruído;
- a necessidade de laudo técnico contemporâneo ao exercício das atividades para o reconhecimento do período especial e
- a neutralização do agente nocivo, tendo em vista a utilização dos Equipamentos de Proteção Individual - EPI, conforme comprovam os documentos acostados aos autos.
- Caso não sejam acolhidas as alegações acima mencionadas, requer a aplicação do fator de conversão de 1.20 para períodos anteriores a 24/7/91, bem como a redução dos honorários advocatícios para 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da publicação da R. sentença.
Sem contrarrazões, e submetida a sentença ao duplo grau de jurisdição, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000686-04.2007.4.03.6183/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente, da leitura da exordial, verifica-se que o pedido restringe-se à concessão de aposentadoria, mediante o reconhecimento do caráter especial das atividades desenvolvidas nos períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 13/10/82 a 14/1/84, 2/5/84 a 10/2/85, 12/2/86 a 22/3/88, 1º/8/88 a 23/11/92 e 10/5/93 a 5/3/97. O MM. Juiz a quo julgou procedente o pedido, para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 3/2/75 a 16/6/81, 13/10/82 a 14/1/84, 2/5/84 a 10/12/85, 12/2/86 a 22/3/88, 1º/8/88 a 23/11/92 e 10/5/93 a 4/11/97.
Conforme dispõe o artigo 141 do Código de Processo Civil/2015, o juiz decidirá a lide nos limites propostos pelas partes. Igualmente, o artigo 492 do mesmo diploma legal trata da correlação entre o pedido e a sentença.
Assim sendo, caracterizada a hipótese de julgado ultra petita, a teor do disposto nos artigos 141, 282 e 492 do CPC/2015, declaro a nulidade da sentença em relação ao reconhecimento da especialidade do período de 6/3/97 a 4/11/97, pois não pleiteado na exordial.
No que tange à preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, cumpre anotar que o juiz não é obrigado a examinar todos os fundamentos trazidos pela parte, desde que encontre e explicite argumentos outros suficientes para a solução do litígio. Imprescindível, sim, que no contexto do caso concreto, decline motivadamente os argumentos embasadores de sua decisão, em respeito ao princípio constitucional da motivação das decisões judiciais.
Com relação ao reconhecimento da especialidade dos períodos pleiteados na exordial, o MM. Juiz de primeiro grau, na fundamentação da R. sentença, dispôs: "No caso dos autos, os documentos de fls. 18 a 50 expressam de forma clara como se deu o trabalho em condições insalubres, nos períodos indicados na inicial, sendo suficientes para a prova dos fatos à época destes" (fls. 146).
Dessa forma, ainda que tenha decido de forma sucinta, observo que o MM. Juiz a quo reconheceu o caráter especial de todos os períodos pleiteados pela parte autora na petição inicial, conforme os documentos apresentados pela mesma, quais sejam, formulários e laudos técnicos. Ademais, não houve prejuízo ao INSS no tocante ao contraditório e a ampla defesa, uma vez que o mesmo, em suas razões de apelação, impugnou, detalhadamente, todos os períodos reconhecidos pelo Juízo de primeiro grau.
Outrossim, o pedido de suspensão do cumprimento da decisão deve ser rejeitado. Conforme jurisprudência pacífica das C. Cortes Superiores é plenamente possível a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública, e também em desfavor do INSS. A respeito: "A jurisprudência desta Corte está consolidada quanto à inexistência de vedação legal à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária, como ocorre na espécie." (AgRg no REsp nº 1.236.654/PI, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, v.u., j. 23/02/16, DJe 04/03/16).
Ademais, não merece acolhida o argumento de que a medida é irreversível. A antecipação de tutela, nos casos de natureza previdenciária, tem por escopo a proteção de direitos fundamentais relevantes do segurado, de maior importância que a defesa de interesses de caráter econômico. Assim, cabível a concessão de antecipação de tutela em ações previdenciárias.
Ainda, encontravam-se presentes os requisitos da antecipação de tutela, especialmente a verossimilhança das alegações, tendo em vista a prolação de sentença que reconheceu o direito do segurado à aposentadoria postulada.
Passo, então, à análise do mérito.
No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até 28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico, motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim dispôs:
Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo, diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo referido agente agressivo. Nesse sentido, quadra mencionar o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, no qual foram fixadas duas teses, in verbis:
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito, é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Com relação à conversão de tempo especial em comum, parece de todo conveniente traçar um breve relato de sua evolução histórica na ordenação jurídica brasileira.
Inicialmente, observo que a aposentadoria especial foi instituída pelo art. 31 da Lei nº 3.807, de 26/8/60 (Lei Orgânica da Previdência Social).
A Lei nº 6.887/80 acrescentou o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890/73, dispondo: "O tempo de serviço exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei, sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a respectiva conversão segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie."
Após diversas alterações legislativas, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a aposentadoria especial em seus artigos 57 e 58.
A possibilidade de conversão do tempo especial em comum havia sido revogada pela edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98. No entanto, o referido dispositivo legal foi suprimido quando da conversão na Lei nº 9.711/98, razão pela qual, forçoso reconhecer que permanece em vigor a possibilidade dessa conversão. Ademais, a questão ficou pacificada com a edição do Decreto nº 4.827, de 3/9/03, que incluiu o § 2º ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99, estabelecendo que "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período." Nesse sentido, cabe ressaltar que o C. Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de ser possível a conversão de tempo especial em comum no período anterior a 1º/1/81, bem como posterior à edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98.
A questão relativa ao fator de conversão foi objeto de julgamento pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.151.363/MG (2009/0145685-8). O E. Relator Ministro Jorge Mussi, em seu voto, bem explicitou a regra que se deve adotar ao asseverar: "Importa notar que a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação da atividade sob condições especiais, conforme dispõe o § 1º supra. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. Diversamente, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. Por essa razão, o § 2º deixa expresso que as regras de conversão do art. 70 aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Isso é possível porque a adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático. Explica-se: O fator de conversão é o resultado da divisão do numero máximo de tempo comum (35 para homem e 30 para mulher) pelo número máximo de tempo especial (15, 20 e 25). Ou seja, o fator a ser aplicado ao tempo especial laborado pelo homem para convertê-lo em comum será 1,40, pois 35/25=1,40. Se o tempo for trabalhado por uma mulher, o fator será de 1,20, pois 30/25=1,20. Se o tempo especial for de 15 ou 20 anos, a regra será a mesma. Trata-se de regra matemática pura e simples e não de regra previdenciária. Observando-se os Decretos ns. 53.831/1964 e 83.080/1979, os quais traziam a lista de agentes nocivos e atividades insalubres, extrai-se a informação de que, em ambos os decretos, o tempo máximo de exposição aos agentes a que esteve exposto o recorrido (ruído e frio) era de 25 anos. Todavia, o tempo de serviço comum, para efeito de aposentadoria, constante daqueles decretos, era de, no máximo, 30 anos; portanto, o fator de conversão utilizado nessa hipótese era de 1,2. Destarte, o índice de 1,2 para conversão de tempo especial em aposentadoria comum com 30 anos de contribuição e o índice de 1,4 em relação à aposentadoria com 35 anos têm a mesma função. Converter para comum o tempo de serviço especial relativo à atividade com limite de 25 anos utilizando o fator de 1,2 seria prejudicial ao segurado (homem), porquanto a norma de regência exige, como tempo de contribuição, os 35 anos, como é de notório conhecimento.(...) Nesse contexto, com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/99, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pelas novas regras da tabela definida no artigo 70, que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1, 40. É o que se denota do artigo 173 da Instrução Normativa n. 20/2007". (grifos meus)
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum:
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Passo à análise do caso concreto.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2), firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço.
De acordo com a Circular nº 15 de 08/09/1994 do próprio INSS, as funções de ferramenteiro, torneiro-mecânico, fresador e retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, devem ser enquadradas como atividades especiais, nos termos do código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79. Neste sentido, transcrevo o seguinte julgado, in verbis:
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. FRESADOR FERRAMENTEIRO. RECONHECIMENTO. CONCESSÃO. |
(...) |
- Da análise da documentação trazida pelo autor e do processo administrativo, juntados aos autos, verifica-se a presença do formulário SB-40, onde consta que o autor exerceu atividade profissional de fresador ferramenteiro, junto à indústria metalúrgica, em que esteve exposto, de modo habitual e permanente, à poeira metálica desprendida das operações e produtos químicos, tais como óleo de corte e óleo solúvel, enquadrada como especial nos códigos 2.5.1 e 2.5.3 do anexo II do Decreto nº 83.080/79. |
- A própria autarquia previdenciária, através da Circular nº 15, de 08.09.1994, determina o enquadramento das funções de ferramenteiro, torneiro-mecânico, fresador e retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do anexo II Decreto nº 83.080/79. |
- Desnecessidade de laudo pericial para a comprovação das condições da atividade insalubre do trabalho, salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, no período anterior à Lei nº 9.528/97, ante a inexistência de previsão legal. |
(...) |
- Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes. Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Apelação do autor provida." |
(Embargos de declaração em AC nº 2002.61.26.011114-2, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Diva Malerbi, v.u., j. 10/11/09, DJe 18/11/09, grifos meus) |
Cito, ainda, precedente do Conselho de Recursos da Previdência Social:
"As funções exercidas como TORNEIRO MECANICO, FERRAMENTEIRO E FRESADOR, a própria Autarquia, por meio da Circular nº 15, expedida em 08/09/1994, determinou o enquadramento dessas funções, além das de retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto no 83.079/80." |
(Conselho de Recursos da Previdência Social, Proc. nº 44232.066769/2014-46, 13ª Junta de Recursos, Rel. Cons. Priscila Conceição Felix, v.u., j. 17/07/14) |
Relativamente ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, observo que convertendo os períodos especiais em comuns (3/2/75 a 16/6/81, 13/10/82 a 14/1/84, 2/5/84 a 10/2/85, 12/2/86 a 22/3/88, 1º/8/88 a 23/11/92 e 10/5/93 a 15/5/96) e somando-os aos demais períodos trabalhados (fls. 126/134), perfaz o requerente o total de:
Assim, se computado o trabalho exercido até a data da Emenda Constitucional nº 20/98, o autor possui o total de 30 anos, 2 meses e 10 dias de tempo de serviço, ficando cumpridos os requisitos exigidos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço proporcional, nos termos do art. 53, inc. II, da Lei de Benefícios, em sua redação original.
Uma vez que, no presente caso, o requisito etário não ficou preenchido, pois o demandante, nascido em 13/8/59 (fls. 15), completou 53 anos somente em 13/8/12, não poderá computar tempo de serviço posterior à EC nº 20/98 para majorar o coeficiente da aposentadoria por tempo de serviço proporcional, à razão de 5% (cinco por cento) por ano de tempo de serviço, nos termos da legislação acima mencionada até o advento da Lei nº 9.876/99.
Cumpre ressaltar que, se computado tempo de serviço posterior a 28/11/99 até a DER (3/11/05), totalizará 36 anos, 1 mês e 1 dia, devendo ser observados os dispositivos constantes da referida Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, inclusive o fator previdenciário, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089-2, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Dessa forma, sendo possível a concessão do benefício em mais de uma hipótese, deve ser assegurada à parte autora o direito à opção pela aposentadoria mais benéfica, de acordo com a legislação mencionada na fundamentação acima.
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social em momento anterior à Lei nº 8.213/91, o período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma, o qual, no presente caso, foi em muito superado.
Com relação aos honorários advocatícios, nos exatos termos do art. 20 do CPC/73:
Assim raciocinando, a verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado.
No que se refere à sua base de cálculo, devem ser levadas em conta apenas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111, do C. STJ.
Considerando que a sentença tornou-se pública, ainda, sob a égide do CPC/73, entendo não ser possível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria e Enunciado nº 7 do C. STJ: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, §11, do NCPC."
Por fim, o § 3º do art. 496 do CPC, de 2015, dispõe não ser aplicável a remessa necessária "quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a: I) 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público".
No tocante à aplicação imediata do referido dispositivo, peço vênia para transcrever os ensinamentos do Professor Humberto Theodoro Júnior, na obra "Curso de Direito Processual Civil", Vol. III, 47ª ed., Editora Forense, in verbis:
Observo que o valor da condenação não excede a 1.000 (um mil) salários mínimos, motivo pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório.
Ante o exposto, acolho a preliminar de sentença ultra petita para restringi-la aos limites do pedido nos termos do voto, rejeito as preliminares de nulidade da sentença por ausência de fundamentação e suspensão do cumprimento da decisão que concedeu a tutela e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS para excluir o reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas no período de 16/5/96 a 5/3/97, bem como fixar a verba honorária na forma acima indicada e não conheço da remessa oficial.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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