
| D.E. Publicado em 21/02/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação do INSS e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0023395-45.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço rural, com vistas à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou procedente o pedido para: (i) reconhecer o trabalho rural desempenhado pela autora no período de 9/7/1975 a 13/7/2001; (ii) condenar a autarquia a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral à autora, desde a data do ajuizamento da ação, com os consectários.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual requer, preliminarmente, seja a r. sentença submetida à remessa necessária. No mérito, sustenta a impossibilidade do reconhecimento de tempo de serviço rural, bem como da concessão do benefício. Subsidiariamente, impugna os critérios de aplicação de juros e correção monetária. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Apresentadas as contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
No caso, a toda evidência não se excede esse montante, devendo a certeza matemática prevalecer sobre o teor da súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
Busca a parte autora o reconhecimento da atividade rural desempenhada de 9/7/1975 (quando completou 12 anos de idade) a 13/7/2000 (data imediatamente anterior ao primeiro vínculo empregatício registrado em CTPS).
Com efeito, há início razoável de prova material do trabalho rural , consubstanciado na anotação do primeiro vínculo de trabalho em CTPS, de 14/7/2000 a 20/2/2001, em estabelecimento rural.
No caso vertente, há início razoável de prova material do trabalho rural, consubstanciada nos seguintes documentos: (i) Certidão de casamento dos genitores da autora, na qual a profissão de seu pai consta como lavrador; (ii) Declarações do produtor rural, em nome do marido da autora (1983 a 1990); (iii) Contrato de comodato, no qual o marido da autora figura como comodatário (1986); (iv) Notas fiscais do produtor, em nome do marido da autora ; (v) Ficha de inscrição cadastral do produtor em nome do marido da demandante (1989); Pedido de talonário de produtor - PTP (1997); (vi) Declaração cadastral do produtor em nome do cônjuge da autora, em que; (vii) Escritura de cessão de direitos hereditários, em que a profissão do pai da autora consta como lavrador.
Destaque-se que a jurisprudência admite a extensão da condição de lavrador para a esposa (mormente nos casos do trabalho em regime de economia familiar, nos quais é imprescindível sua ajuda para a produção e subsistência da família).
Nessa esteira, os testemunhos colhidos, sob o crivo do contraditório, foram coerentes com o labor rural alegado pela autora.
A esse respeito, entende-se na jurisprudência ser possível o reconhecimento de tempo de serviço em períodos anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o trabalhador rural tenha iniciado suas atividades antes dos 14 anos.
Nesse sentido, como não há elementos seguros que apontem o início da atividade, pessoalmente entendo ser razoável sua fixação na idade de 16 (dezesseis) anos.
Isso porque o próprio Código Civil de 1916, então vigente, em seu artigo 384, VII, autorizava a realização de serviços pelos filhos menores, desde que adequados a sua idade e condição, sem que isso configurasse relação de emprego para fins trabalhistas ou previdenciários.
Eis o conteúdo de tal norma:
A mim me parece, dessarte, que as atividades realizadas no campo, ao lado dos pais, pelo menor de 16 (dezesseis) anos, não poderiam ser computadas para fins previdenciários, ou mesmo trabalhistas, porquanto não atendidos os requisitos do artigo 3º, caput, da CLT, in verbis:
Por outro lado, se o menor de 16 (dezesseis) anos realizar atividades rurais para reais empregadores - isto é, sem assistência dos pais -, nesse caso se deve, juridicamente, reconhecer a relação de emprego para todos os fins de direito.
Não obstante, o entendimento desta Egrégia Nona Turma é no sentido de que, não havendo elementos seguros que apontem o início da atividade, deve ser computado o tempo de serviço desde os 12 (doze) anos de idade.
Tal se dá porque, conquanto histórica a vedação constitucional do trabalho infantil, na década 1960 a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que nossos constituintes viam, àquela época, como realidade incontestável, que o menor efetivamente desempenhava atividade no campo ao lado dos pais.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (DJ 25.09.2003)
Assim, deve ser ressalvado o entendimento pessoal deste relator convocado, a fim de acompanhar a tese já consolidada na Nona Turma.
Friso que o possível mourejo rural desenvolvido sem registro em CTPS, ou na qualidade de produtor rural em regime de economia familiar, depois da entrada em vigor da legislação previdenciária em comento (31/10/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos da Lei nº 8.213/91, que não contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Nesse sentido, a jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça:
Também, a Súmula n. 272 daquele Colendo Tribunal:
No mesmo sentido, os demais julgados desta Corte: AC n. 2005.03.99.035804-1/SP, Rel. Des. Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJF3 8/10/2010 e ED na AC 2004.03.99.001762-2/SP, Rel. Des. Federal Nelson Bernardes, 9ª Turma, DJF3 29/7/2010.
Desse modo, joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o trabalho rural no intervalo de 9/7/1975 a 31/10/1991, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/91).
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para obtenção da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Por conseguinte, patente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho, até a data do ajuizamento da ação, confere à parte autora mais de 30 anos de profissão, tempo suficiente à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Em decorrência, concluo pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, a partir da data da propositura da presente demanda (24/5/2017).
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux, deferiu, excepcionalmente, efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal Federal do pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente, observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, conheço da apelação autárquica e lhe dou parcial provimento para, nos termos da fundamentação: (i) restringir o reconhecimento do trabalho rural desempenhado ao interstício de 9/7/1975 a 31/10/1991; (ii) ajustar os critérios de aplicação dos juros e da correção monetária. Mantida, no mais, a bem lançada sentença.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | RODRIGO ZACHARIAS:10173 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18121240443F |
| Data e Hora: | 07/02/2019 17:02:20 |
