Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0081238-96.2021.4.03.6301
Relator(a)
Juiz Federal RODRIGO OLIVA MONTEIRO
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 04/03/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. PRESENÇA DE RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA
MATERIAL DO PERÍODO CONTROVERSO QUE FOI CORROBORADO PELA PROVA
TESTEMUNHAL. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – CTC PARA
FINS DE CONTAGEM RECÍPROCA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 96, V, DA LEI 8,213/91.
NECESSÁRIO INDENIZAR AS CONTRIBUIÇÕES CORRESPONDENTES AO PERÍODO DE
ATIVIDADE RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE
PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0081238-96.2021.4.03.6301
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: ELCIO ISMAEL DA SILVA
Advogado do(a) RECORRIDO: SIMARA CRISTINA DE SOUZA MOLINA - SP319155-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0081238-96.2021.4.03.6301
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELCIO ISMAEL DA SILVA
Advogado do(a) RECORRIDO: SIMARA CRISTINA DE SOUZA MOLINA - SP319155-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelo réu de sentença que julgou procedente o pedido
para condenar o INSS “à obrigação de reconhecer o período rural de 25/03/1977 a 31/12/988, o
qual deverá constar do CNIS sem marca de irregularidade. Em consequência, determino que tal
vínculo conste da certidão de tempo de contribuição ( CTC) requerida pela parte autora (vide fls.
14-56 do arquivo 2).”
A parte recorrente aduz que não há início de prova material que comprove o exercício de
atividade rural do período reconhecido e que não é possível a expedição de Certidão de Tempo
de Contribuição (CTC) sem o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias
referente à atividade rural anterior ao advento da Lei 8.213/1991, motivo pelo qual postula a
reforma do julgado.
Não foram apresentadas as contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0081238-96.2021.4.03.6301
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELCIO ISMAEL DA SILVA
Advogado do(a) RECORRIDO: SIMARA CRISTINA DE SOUZA MOLINA - SP319155-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O art. 106, da Lei n.º 8.213/91, dispõe sobre a prova do exercício da atividade rural, mas traz rol
exemplificativo, admitindo-se a demonstração do tempo rural por outros meios, conforme
entendimento jurisprudencial tranquilo (STJ, AgInt no AREsp 807.833/SP, DJe 02/02/2017).
Contudo, será sempre necessário apresentar início de prova material da atividade rural, haja
vista a lei veda a prova do tempo de serviço fundada exclusivamente em depoimento de
testemunhas (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Súmula 149/STJ).
Constituem início de prova material da atividade rural, entre outros: certidão de casamento ou
de nascimento, título de eleitor, certificado de dispensa de incorporação, sempre que constar
nesses documentos a qualificação do requerente ou de algum integrante da família nuclear
como rurícola; comprovante de endereço em zona rural; prova de frequência em escola situada
em zona rural; prova do domínio rural em nome do requerente ou de algum integrante da família
nuclear como rurícola.
Os documentos devem ser contemporâneos dos fatos por provar (Súmula 34/TNU). A utilização
de documentação extemporânea é excepcionalmente admitida, quando extraída de bancos de
dados efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização do INSS (art. 62, § 3º, do Decreto
3.048/98).
Declarações de ex-empregadores ou de terceiros acerca da atividade rural, se extemporâneas,
não servem como prova material para o início de comprovação do tempo rural.
Não se exige prova documental em relação a todos os anos integrantes do período de alegado
exercício de atividade rural (Súmula 14/TNU), porém é necessário que ela se refira a uma
fração desse período, fazendo-se necessária a confirmação do início de prova material por
depoimento de testemunhas. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO RURAL. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL.
ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver
exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o
período que se quer comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea aos fatos alegados
e refira-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal.
2. No caso, o único documento acostado aos autos é a certidão de nascimento da própria
autora. Assim, não há início de prova material, in casu.
3. A prova testemunhal deve estar apoiada em um início razoável de prova material,
contemporâneo à época dos fatos alegados, nos termos da Súmula 149/STJ: "A prova
exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da
obtenção de beneficio previdenciário", o que não ocorre no caso dos autos.
4. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AREsp 380.664/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 01/10/2013, DJe 11/10/2013)
A descontinuidade do exercício do labor rural não impede o reconhecimento do direito, desde
que limitada a 120 dias (art. 11, § 9º, III, da Lei n.º 8.213/91).
No caso concreto, constata-se que, não obstante a relevância das razões apresentadas pela
parte recorrente, o período de atividade rural foi corretamente reconhecido pelo Juízo de
Primeiro Grau, nos seguintes termos:
“A parte autora pretende a averbação do período de atividade rural exercida de 25/03/1977 a
31/12/988 (vide petição inicial), bem como a expedição de certidão de tempo de contribuição
(CTC) que abranja tal período. É de rigor a procedência. Para comprovar o exercício da
atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos: (i) certidão de nascimento
do autor constando anotação de que os pais eram lavradores (fl. 25 do arquivo 2); (ii)
documentos escolares do autor no município de Iporanga/SP (fl. 26 do arquivo 2); e (iii)
matrícula de imóvel rural em nome do genitor (fl. 27-47) Entendo que os documentos
apresentados denotam início de prova material, mormente a certidão de casamento da autora
com alusão à profissão de lavradores dos genitores e os documentos do imóvel rural em nome
do genitor. A parte autora narrou que se criou no Sítio denominado Castelhanos até o o final do
ano de 1988, quando então foi aprovado no concurso da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Afirmou que residia e trabalhava em regime de economia familiar no Sítio de propriedade dos
seus pais, juntamente com os seus nove irmãos. Aduziu que a terra era pequena e não se
utilizava de máquina ou empregados. Plantava milho, feijão, arroz e banana. Narrou que
mudou-se para São Paulo no início do ano de 1989 para assumir a vaga como policial militar. E
quanto aos depoimentos colhidos em juízo, as testemunhas Gervásio, Onésio e Silvana, que
até hoje residem na zona rural do município de Iporanga, afirmaram que conhecem a autora da
região de Castelhanos. Todos os depoentes afirmaram que a autora morava perto em
propriedade rural próxima
juntamente com os pais e irmãos. Aduziram que se recordam de que o autor veio para São
Paulo quando tinha aproximadamente 24 anos. Os depoimentos (arquivos 20-22), prestados
por pessoas compromissadas e apresentados de forma verossímil, confirmaram o trabalho rural
invocado pela parte autora, trabalho esse que já havia sido indicado por início de prova
material. Reitero que o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial
representativo de controvérsia repetitiva, acabou por admitir a possibilidade de reconhecimento
de período rural anterior ao documento mais antigo juntado aos autos como prova material,
desde que haja confirmação mediante prova testemunhal. Tal entendimento acabou sumulado
no enunciado 577: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais
antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o
contraditório. Por fim, faço constar que é possível o cômputo de atividade rural a partir da data
em que o trabalhador completou doze anos de idade. É esse o entendimento da jurisprudência
do E. Tribunal Regional Federal da Terceira Região (TRF3, AC 00463363320114039999,
Desembargador Federal Baptista Pereira, 18/09/2013). Diante dos documentos juntados aos
autos e dos depoimentos prestados, entendo possível o reconhecimento do trabalho rural
efetivo e contínuo no período de de 25/03/1977(quando a autora completou 12 anos de idade) a
31/12/988 (quando a autora passou em concurso e mudou para São Paulo).”
Com efeito, o autor juntou documentação contemporânea do período controverso, consistente
em certidão de matrícula de imóvel, na qual consta a aquisição de propriedade rural pelo genitor
do autor no ano de 1956 e a manutenção do domínio do imóvel até a data da expedição da
matrícula, em 2014 (ID 232577625, fls. 27/28).
Vale ressaltar que a jurisprudência reconhece a validade de documentos em nome de membros
da família como início de prova material. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
DEMONSTRAÇÃO DO TRABALHO NO CAMPO. DOCUMENTOS EM NOME DOS PAIS DA
AUTORA. VÍNCULO URBANO DE UM DOS MEMBROS DA UNIDADE FAMILIAR QUE NÃO
DESCARACTERIZA A CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DOS DEMAIS. 1. A solução integral da
controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. Para o
fim de demonstração de labor rural, são aceitos, como início de prova material, os documentos
em nome dos pais da autora que os qualificam como lavradores, aliados à robusta prova
testemunhal. 3. Recurso Especial não provido.
(REsp 1506744/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
03/11/2015, DJe 02/02/2016).
Portanto, ao contrário do alegado no recurso, há suficiente início de prova material do período
controverso.
O recurso não impugnou o conteúdo dos depoimentos das testemunhas, de maneira que não é
possível a incursão nesse tema por este órgão recursal. Desta forma, deve ser mantido o
reconhecimento da atividade rural.
Contudo, o tempo rural reconhecido não pode integrar Certidão de Tempo de Contribuição para
fins de contagem recíproca sem a prova do recolhimento das correspondentes contribuições.
Com efeito, o art. 96, V, da Lei n. 8.213/91 veda a emissão de CTC com o registro exclusivo de
tempo de serviço, sem a comprovação de contribuição efetiva, salvo nos casos em que o
recolhimento for de responsabilidade do empregador, o que não é a hipótese dos autos.
Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI 8.213/1991. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO
DE CONTRIBUIÇÃO: PRESSUPOSTO PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA.
1. Não viola o art. 535 do CPC/1.973 o acórdão que examina a questão posta pelo recorrente,
ainda que a decida com base em outros fundamentos. Situação em que o INSS alegava
omissão do aresto embargado no tocante a seu direito de revisão de certidão de tempo de
serviço rural concedida sem o prévio recolhimento das contribuições referentes ao respectivo
período de tempo de serviço anterior à edição da Lei 8.213/1991, amparado nos arts. 53 e 54
da Lei 9.784/99; art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e art. 37 da CF. No entanto, o TRF da 4ª Região
entendeu inaplicáveis as normas que autorizam a autarquia previdenciária a promover a revisão
de seus atos administrativos, com amparo nos princípios da segurança jurídica, razoabilidade e
equidade.
2. Tanto a jurisprudência desta Corte quanto a do STF têm entendido que o cômputo, para fins
de aposentadoria estatutária, do tempo de atividade rural anterior à Lei n. 8.213/1991, somente
é possível se houver o recolhimento das contribuições previdenciárias referentes a tal período.
Precedentes.
3. Recurso especial do INSS provido, em parte, para reconhecer a possibilidade de
cancelamento da certidão de tempo de serviço rural, caso a segurada se recuse a efetuar o
pagamento das contribuições referentes ao período de trabalho anterior à Lei 8.213/1991.
(STJ, REsp 1235932/RS, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, julgado em
14/09/2017, publicado em 22/09/2017).
Destarte, não é possível a expedição de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), para fins de
contagem recíproca, sem a prévia indenização do período controverso.
Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso do réu para julgar improcedente o pedido
de expedição de Certidão de Tempo de Contribuição que compreenda o tempo de serviço rural
reconhecido na sentença (25/03/1977 a 31/12/1988), sem o necessário recolhimento das
contribuições previdenciárias.
Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios em relação às partes, tendo em
vista que o art. 55 da Lei nº 9.099/95 prevê que só poderá haver condenação do recorrente
vencido.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. PRESENÇA DE RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA
MATERIAL DO PERÍODO CONTROVERSO QUE FOI CORROBORADO PELA PROVA
TESTEMUNHAL. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – CTC PARA
FINS DE CONTAGEM RECÍPROCA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 96, V, DA LEI 8,213/91.
NECESSÁRIO INDENIZAR AS CONTRIBUIÇÕES CORRESPONDENTES AO PERÍODO DE
ATIVIDADE RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE
PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
