Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003739-12.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
01/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE.
EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP.
1. A insuficiência de prova material apta a comprovar o exercício da atividade rural no período de
carência caracteriza carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do
processo a ensejar a sua extinção sem exame do mérito.
2. Honorários de advogado mantidos a cargo da autora, que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito, observada a gratuidade da Justiça deferida nos autos.
3. Recurso provido. Processo extinto sem resolução de mérito.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Nº
RELATOR:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003739-12.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: IZABEL DE CASSIA LISSONI BARROS
Advogados do(a) APELANTE: HENRIQUE DA SILVA LIMA - MS9979-A, GUILHERME
FERREIRA DE BRITO - MS9982-A, PAULO DE TARSO AZEVEDO PEGOLO - MS10789-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA):Trata-se de
apelação interposta pela parte autora em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade
rural.
A r. sentença de fls. 118/121 julgou improcedente o pedido inicial e condenou a parte autora no
pagamento dos ônus da sucumbência, suspensa a exigibilidade em razão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita.
Em suas razões recursais, a parte autora pugna pela reforma da sentença aduzindo, em
síntese, que restaram comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício
pleiteado.
Requer a reforma da sentença ou, caso seja mantida a sentença que negou a averbação do
período controverso, requer a extinção do o feito sem resolução do mérito, nos termos do art.
485, IV, do CPC, possibilitando à autora nova discussão processual, caso consiga reunir
conjunto probatório suficiente para comprovar o seu pleito.
Regularmente processado o feito, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É O RELATÓRIO.
.
O recibo do Sindicato
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003739-12.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: IZABEL DE CASSIA LISSONI BARROS
Advogados do(a) APELANTE: HENRIQUE DA SILVA LIMA - MS9979-A, GUILHERME
FERREIRA DE BRITO - MS9982-A, PAULO DE TARSO AZEVEDO PEGOLO - MS10789-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA):Recebo a
apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
A parte autora ajuizou a presente ação pretendendo a concessão da aposentadoria por idade
rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I,
na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)"
Para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento
dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo
igual ao da carência exigida para a sua concessão, sendo imperioso observar o disposto nos
artigos 142 e 143, ambos da Lei nº 8.213/91.
Feitas essas considerações, no caso concreto, a idade mínima exigida para a obtenção do
benefício restou comprovada pela documentação trazida aos autos, onde consta que a parte
autora nasceu em 10/11/1960, implementando o requisito etário em 2015.
Segundo a inicial, a autora, desde cedo, trabalhou no meio rural, visto que seus pais eram
agricultores, e viviam exclusivamente do meio rural, com plantação de hortaliças e criação de
animais, como porcos e gado. Em fevereiro de 1979, a autora casou-se com o Sr. Osvaldo
Urias Barros, que já era agricultor mesmo antes do casamento, e continuaram a vida em meio
ao regime de economia familiar, no qual tiveram dois filhos, em que ambos viveram no meio
rural.A autora viveu até 1994 com seu ex-marido em suas terras vivendo exclusivamente da
terra, e por curtos períodos de tempo exerceu função de professora na escola rural, apenas
para ajudar crianças da região, pois não possuía nem a formação escolar. Após sua separação,
a autora passou a viver com seu filho Marciano Urias Barros, que também vive em regime de
economia familiar, e continuou com o trabalho rural devido sua experiência com a terra.
Realizam plantação de cana-de-açúcar, mandioca, além de criação de gados para produção de
leite, conforme notas fiscais anexados nos autos.
Para a comprovação do exercício da atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes
documentos:sua CTPS com vínculos urbanos de curta duração (fls. 16/23); sua certidão de
casamento – em 24/02/1979, onde ele está qualificado como lavrador (fl. 26); averbação da
separação em 1993 (fl. 27); recibo do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de
Nova Alvorada do Sul e Região emitido em 2018 em razão do pagamento feito por atendimento
e serviços (fl. 29); demonstrativo de pagamento do produtor em nome de seu filho Marciano e
Sidinéia da Cruz – 2016 (fl. 30); atestado de vacinação contra brucelose em nome de Marciano
(Projeto Assentamento São João – lote 26 – 2017 (fl. 31); declaração do trabalhador rural (fl.
32/36), onde consta que a autora exerce atividade rural em regime de economia familiar com
início em 29/10/2004 no imóvel de seu filho; extrato de pagamento do produtor – 2018, em
nome de seu filho (fl. 37); Ficha geral de atendimento de saúde onde consta a profissão de
trabalhadora rural (fl. 39); Notas fiscais de comercialização de leite em nome de seu filho e
Sidineia – 2011; 2012; 2013; 2017; 2018 (fl. 41/44 e 48/49) e notas fiscais de comercialização
de leite em nome de seu filho 2006; 2007; 2008; 2009 (fl. 45/47 e 51).
Da análise das provas produzidas, não há início de prova documental suficiente para
demonstrar que a parte autora é trabalhadora rural.
A autora afirma que exerceu atividade rural em regime de economia familiar com seus pais, de
10.11.1972 – 23.02.1979, porém não traz início de prova material do alegado.
Alega ter trabalhado em regime de economia familiar com seu ex-esposo, de24.02.1979 –
19.01.1994, apresentando, unicamente, sua certidão de casamento que, contudo, é muito
anterior ao período de carência .
Para comprovar o labor rural de 1994 aos dias atuais, trouxe documentos em nome de seu filho
e de sua nora que não servem para comprovar, isoladamente, que a autora efetivamente labora
em regime de economia familiar com esse núcleo
Observo que na declaração do trabalhador rural (fl. 32/36), consta que a autora exerce atividade
rural em regime de economia familiar com início em 29/10/2004 no imóvel de seu filho, o que
vai de encontro com suas próprias alegações no sentido de que o início de sua atividade com o
filho teria se dado em 1994, logo após a separação.
O recibo e a ficha de atendimento médico, por si só, também não servem para comprovar o
exercício de atividade rural pela autora, sendo importante destacar, ainda, que as testemunhas
ouvidas conhecem a autora desde 2013, o que não abrange todo o período de carência.
Emerge dos autos a precariedade do conjunto probatório que não se presta a comprovar o
efetivo exercício pela parte autora da atividade rural pelo período de carência exigido.
A parte autora deveria ter comprovado o labor rural, mesmo que de forma descontínua, no
período imediatamente anterior ao implemento da idade , ao longo de, ao menos, 180meses,
conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural pelo
período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo a parte autora
se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de
recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito
propiciando a parte autora intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários.
Por oportuno, transcrevo:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE
DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO
ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os
seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em
conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto
social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais
da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da
Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe
garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na
hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna,
a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental
à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Mantida a condenação da parte autora no pagamento das custas e despesas processuais e dos
honorários advocatícios, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11,
§2º, e 12, ambos da Lei 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à
extinção do processo sem resolução do mérito.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso para julgar extinto o processo, sem resolução do
mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, diante da não comprovação do trabalho rural.
É COMO VOTO.
/gabiv/soliveir...
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE.
EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP.
1. A insuficiência de prova material apta a comprovar o exercício da atividade rural no período
de carência caracteriza carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do
processo a ensejar a sua extinção sem exame do mérito.
2. Honorários de advogado mantidos a cargo da autora, que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito, observada a gratuidade da Justiça deferida nos autos.
3. Recurso provido. Processo extinto sem resolução de mérito.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu , dar provimento ao recurso para julgar extinto o processo, sem resolução
do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, diante da não comprovação do trabalho
rural, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
