Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002477-11.2018.4.03.6126
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
25/05/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 05/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE NOCIVO
ELETRICIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. JUROS DE MORA E
CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ANTECIPADA.
1. Recebida a apelação interposta pelo INSS, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
2. A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art.
4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
3. Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a
aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho
permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao
labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento,
desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de
forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho
podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral
(PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030
e CAT) ou outros meios de prova.
4. Nos termos do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.8., reputa-se especial a atividade desenvolvida
pelo segurado sujeito à tensão elétrica superior a 250 volts. Considerando que o rol trazido no
Decreto nº 2.172/97 é exemplificativo e não exaustivo, conforme decidido pelo Egrégio Superior
Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº
1.306.113/SC), o fato de nele não ter sido previsto o agente agressivo eletricidade não afasta a
possibilidade de se reconhecer a especialidade do trabalho que importe sujeição do trabalhador à
tensão elétrica superior a 250 volts, desde que comprovada por meio de prova pericial a
exposição de forma habitual e permanente a esse fator de risco.
5. O INSS questiona apenas o período reconhecido como especial relativo ao agente nocivo
eletricidade 01/03/2002 a 18/08/2017.
6. No caso dos autos, o PPP (ID 122729237 – págs. 21/26) traz a informação de que a parte
autora, no período de 06/03/1997 a 31/12/2003, estava exposta à tensão elétrica superior a 250
volts, agente nocivo que configura o labor especial alegado. Além disso, a descrição das
atividades constante do documento não deixa dúvidas de que a exposição à tensão elétrica
superior a 250 volts era de forma habitual e permanente.
7. Por outro lado, não consta dos autos nenhum documento comprobatório que indique o trabalho
em condições especiais no intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
8. Conforme dito anteriormente, para o reconhecimento do exercício de atividade em condições
especiais é necessária a comprovação do labor por meio de instrumentos previstos nas normas
de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
9. Destarte, existindo prova da efetiva exposição do segurado a tensão elétrica superior a 250
volts no período de 01/03/2002 a 23/06/2017, de rigor a caracterização da especialidade do labor
nesse intervalo, conforme se infere da jurisprudência desta Colenda Turma. Precedentes.10.
Reconhecido, portanto, como de trabalho em condições especiais, o período de 01/03/2002 a
23/06/2017, restando afastada a especialidade do labor no intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
11. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica à hipótese dos autos,
em que o reconhecimento da especialidade do labor e a concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição foi deferida apenas judicialmente.
12. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
13. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
14. Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, é de se manter a
antecipação dos efeitos da tutela deferida na origem.
15. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão de trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos em lei.
16. Provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente,
descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002477-11.2018.4.03.6126
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE LUIZ LOPES
Advogados do(a) APELADO: MAICON JOSE BERGAMO - SP264093-A, SEBASTIAO CARLOS
FERREIRA DUARTE - SP77176-N, ROSANGELA MARIA DALCIN DUARTE - SP327297-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002477-11.2018.4.03.6126
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE LUIZ LOPES
Advogados do(a) APELADO: MAICON JOSE BERGAMO - SP264093-A, SEBASTIAO CARLOS
FERREIRA DUARTE - SP77176-N, ROSANGELA MARIA DALCIN DUARTE - SP327297-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Cuida-se de
apelação interposta contra a sentença (ID 122729269) que julgou os pedidos deduzidos na Inicial,
com a seguinte conclusão:
“Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, na forma do artigo 487, I, do Código de
Processo Civil, para(a) reconhecer a especialidade dos interregnos de 17/03/1995 a 08/11/1996 e
de 01/03/2002 a 18/08/2017,(b) condenar o INSS a conceder a aposentadoria por tempo de
contribuição, desde a data do requerimento administrativo feito em 18/08/2017- 42/185.191.643-9;
(c) condenar o INSS ao pagamento das parcelas em atraso, desde a data em que se tornaram
devidas, as quais deverão ser corrigidas monetariamente desde o vencimento e acrescidas de
juros de mora desde a citação, em conformidade, respectivamente, com o item 4.3.1 e 4.3.2, do
Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 134/2010 do CJF. Arcará o
INSS com os honorários advocatícios, ora fixados no patamar mínimo dos incisos do parágrafo 3º
do artigo 85 do CPC, observada a Súmula 111 do STJ, a serem apurados em liquidação. Entendo
restar preenchidos os requisitos legais para o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela,
em face do caráter alimentar do benefício, determinando que o INSS implante o benefício
postulado no prazo de 30 dias de sua intimação desta decisão. Ressalvo que o pagamento das
parcelas vencidas não está incluído neste provimento, devendo ser observado o rito próprio
estatuído para o pagamento de débitos da Fazenda Pública para seu adimplemento.”
O INSS interpôs apelação (ID 122729271), sustentando, em síntese, (i) a partir de 05/03/1997 o
trabalhador exposto a tensões elétricas superiores a 250 volts não tem mais sua atividade
caracterizada como especial, (ii) o PPP foi emitido em 23/06/2017, o que significa dizer que não
pode ser considerado especial o intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017, (iii) não pode ser
concedido o benefício na data de entrada do requerimento administrativo, pois o autor seguiu
trabalhando e (iv) a correção monetária deve obedecer ao disposto na Lei nº 11.960/09.
Sem contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Egrégia Corte.
É o Relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002477-11.2018.4.03.6126
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE LUIZ LOPES
Advogados do(a) APELADO: MAICON JOSE BERGAMO - SP264093-A, SEBASTIAO CARLOS
FERREIRA DUARTE - SP77176-N, ROSANGELA MARIA DALCIN DUARTE - SP327297-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a
apelação interposta pelo INSS sob a égide do CPC/2015.
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA
Como é sabido, pela regra anterior à Emenda Constitucional 20, de 16.12.98 (EC 20/98), a
aposentadoria por tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de
contribuição) poderia ser concedida na forma proporcional, ao segurado que completasse 25
(vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo
masculino, restando assegurado o direito adquirido, para aquele que tivesse implementado todos
os requisitos anteriormente a vigência da referida Emenda (Lei 8.213/91, art. 52).
Após a EC 20/98, aquele que pretende se aposentar com proventos proporcionais impõe-se o
cumprimento das seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da
Emenda; contar com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos de idade, se mulher; somar no
mínimo 30 anos, homem, e 25 anos, mulher, de tempo de serviço; e adicionar o "pedágio" de
40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.
Vale lembrar que, para os segurados filiados ao RGPS posteriormente ao advento da EC/98, não
há mais que se falar em aposentadoria proporcional, sendo extinto tal instituto.
De outro lado, comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30
(trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à
EC 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras
permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional
(Lei 8.213/91, art. 53, I e II).
Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar, também, o cumprimento
da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Registro que a regra transitória introduzida pela EC 20/98, no art. 9º, aos já filiados ao RGPS,
quando de sua entrada em vigor, impõe para a aposentadoria integral o cumprimento de um
número maior de requisitos (requisito etário e pedágio) do que os previstos na norma
permanente, de sorte que sua aplicabilidade tem sido afastada pelos Tribunais.
Ainda, insta salientar que o art. 4º, da referida Emenda estabeleceu que o tempo de serviço
reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, para efeito de
aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
E, nos termos do artigo 55, §§1º e 3º, da Lei 8.213/1991, a comprovação do tempo de serviço em
atividade urbana, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de
tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme
preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal.
No que tange à possibilidade do cômputo da atividade laborativa efetuada pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor.
Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não possua
idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do direito de
ver reconhecido o exercício da atividade laborativa, para fins do benefício previdenciário (ARE
1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE 906.259, Rel: Ministro Luiz Fux,
in DJe de 21/09/2015).
Nesse sentido os precedentes desta E. 7ª Turma: AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Fed.
Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017; AC 2003.61.25.001445-4, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ
09/04/2018.
Por fim, as anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado têm
presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso o
contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional
de Informações Sociais - CNIS.
Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e Previdência social (CTPS) em
relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de
presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins
previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conte no Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS)."
Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que infirme
as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser considerados como
tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das contribuições
previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos termos do artigo
30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA,
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1344300 - 0005016-55.2005.4.03.6105, Rel.
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1
DATA:06/12/2017).
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado
sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15
(quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei
8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais
que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos,
químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até
então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional,
presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente
insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente
"aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do
empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da
produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se
exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o
labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos
pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto
n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a
fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como
especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de
agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como
distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao
obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições
especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o
entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum,
reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de
regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do
art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para
configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no
período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do
Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o
patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento
do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo
C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no
qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito
à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à
época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se
frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a
apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo
para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do
PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do
segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações
constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes
mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à
aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua
saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa
mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI),
não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade
especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual
estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que
aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres
e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de
trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que
aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que
comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido
em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como
nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se
permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do
segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e
(iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Feitas tais premissas, passo à análise do caso concreto, em que o INSS questiona apenas o
período reconhecido como especial relativo ao agente nocivo eletricidade 01/03/2002 a
18/08/2017.
AGENTE NOCIVO ELETRICIDADE
Nos termos do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.8., reputa-se especial a atividade desenvolvida
pelo segurado sujeito à tensão elétrica superior a 250 volts.
Considerando que o rol trazido no Decreto nº 2.172/97 é exemplificativo e não exaustivo,
conforme decidido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo
de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.306.113/SC), o fato de nele não ter sido previsto o agente
agressivo eletricidade não afasta a possibilidade de se reconhecer a especialidade do trabalho
que importe sujeição do trabalhador à tensão elétrica superior a 250 volts, desde que comprovada
por meio de prova pericial a exposição de forma habitual e permanente a esse fator de risco.
Veja:“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ
8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL.
AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E
58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER
EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA
CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE,
NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).1. Trata-se de
Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de
que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997
(Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei
8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo. 2. À luz da interpretação
sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades
nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a
técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o
trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º,
da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ.3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se
em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o
trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que
está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ. 4. Recurso Especial não provido. Acórdão
submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.”
No caso dos autos, o PPP (ID 122729237 – págs. 21/26) traz a informação de que a parte autora,
no período de 06/03/1997 a 31/12/2003, estava exposta à tensão elétrica superior a 250 volts,
agente nocivo que configura o labor especial alegado. Além disso, a descrição das atividades
constante do documento não deixa dúvidas de que a exposição à tensão elétrica superior a 250
volts era de forma habitual e permanente.
Por outro lado, não consta dos autos nenhum documento comprobatório que indique o trabalho
em condições especiais no intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
Conforme dito anteriormente, para o reconhecimento do exercício de atividade em condições
especiais é necessária a comprovação do labor por meio de instrumentos previstos nas normas
de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Destarte, existindo prova da efetiva exposição do segurado a tensão elétrica superior a 250 volts
no período de 01/03/2002 a 23/06/2017, de rigor a caracterização da especialidade do labor
nesse intervalo, conforme se infere da jurisprudência desta Colenda Turma:
“PREVIDENCIARIO. APOSENTADORIA ESPECIAL (46). ATIVIDADE ESPECIAL
COMPROVADA. ELETRICIDADE. RESP N. 1.306.113/SC. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA.
BENEFÍCIO CONCEDIDO.
1. Dispõe o art. 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, conforme
dispuser a Lei.
2. Por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu
em vigor o parágrafo 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo plenamente
possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum
relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998.
3. Conforme decidido pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva
(RESP N. 1.306.113/SC), o fato de nele não ter sido previsto o agente agressivo eletricidade não
afasta a possibilidade de se reconhecer a especialidade do trabalho que importe sujeição do
trabalhador à tensão superior a 250 volts, desde que comprovada exposição de forma habitual e
permanente a esse fator de risco.
4. Computando-se apenas os períodos de atividades especiais ora reconhecidos, somados ao
período incontroverso homologado pelo INSS até a data do requerimento administrativo
(11/08/2009) perfaz-se 27 anos, 02 meses e 28 dias, suficientes para a concessão da
aposentadoria especial, conforme previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
5. Cumpridos os requisitos legais, faz jus o autor à concessão da aposentadoria especial desde o
requerimento administrativo (11/08/2009), momento em que o INSS ficou ciente da pretensão.
6. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
7. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% sobre o valor da condenação,
conforme entendimento desta Turma (art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015), aplicada a Súmula 111
do C. STJ.
8. Apelação do autor provida. Benefício concedido.”
(AC nº 0015487-51.2009.4.03.6183, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DE
22/03/2018)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICIDADE. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO
PREVIDENCIÁRIO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. RECONHECIMENTO. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS.(...) 12 - Para
comprovar que suas atividades foram exercidas em condições especiais, o autor coligiu aos autos
o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 47/48, o qual aponta a submissão ao agente
agressivo eletricidade, com tensão acima de 250 volts, no período de 21/06/1982 a 30/11/2002,
ao desempenhar as funções de "Ajudante Emendador", "Ajudante Cabista", "Inst-Reparador de
La", "Auxiliar Técnico Telecomunicações" e "Operador Serviços Banda Larga" junto à
"Telecomunicações de São Paulo S/A - TELESP".13 - O acervo fático-probatório amealhado aos
autos demonstra, ao contrário do que alega a Autarquia, que a exposição ao agente nocivo
ocorreu efetivamente de modo habitual e permanente.14 - Possível o enquadramento da
especialidade da atividade desempenhada no período compreendido entre 21/06/1982 e
30/11/2002, cabendo ressaltar que o PPP apresentado não indica a exposição a qualquer fator de
risco no interregno entre 01/12/2002 e 07/10/2005, razão pela qual o mesmo deverá ser
computado como tempo de serviço comum.15 - Importante ser dito que restou superada a
questão relacionada à supressão do agente "eletricidade" do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos
termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela
Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça. (...)20 - Remessa necessária e apelação
do INSS parcialmente providas.”(AC nº 0048862-75.2008.4.03.9999, Relator Desembargador
Federal Carlos Delgado, DE 20/03/2018)Reconhecido, portanto, como de trabalho em condições
especiais, o período de 01/03/2002 a 23/06/2017, restando afastada a especialidade do labor no
intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
DA LIMITAÇÃO DO ART. 57, §8º DA LEI Nº 8.213/91
A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica à hipótese dos autos, em
que o reconhecimento da especialidade do labor e a concessão do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição foi deferida apenas judicialmente.
Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos
termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos
agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei
8.231/91, determina que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade
terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei 8.231/91, revela que o segurado que
estiver recebendo aposentadoria especial terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente
ao exercício da atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício e,
consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a continuidade do
exercício da atividade especial se houver (i) a concessão do benefício e, posteriormente, (ii) o
retorno ao labor especial.
No caso, não houve a concessão administrativa da aposentadoria especial, tampouco o retorno
ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o INSS o indeferiu na esfera
administrativa, circunstância que, evidentemente, levou o segurado a continuar a trabalhar, até
mesmo para poder prover a sua subsistência e da sua família.
Considerando que o reconhecimento da especialidade do labor só foi efetivado na esfera judicial
e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas sim continuou nele
trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento administrativo, tem-se que a situação
fática verificada in casu não se amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte
que esse dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra o trânsito
em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já decidiu que "Não há que se falar
na impossibilidade do beneficiário continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do
benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível com a própria
natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob condições especiais na pendência
de ação judicial, na qual postula justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do
segurado e não atenta contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma
protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650 / SP
0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa interpretação extensiva,
aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, a casos em que o reconhecimento da especialidade dá-se
apenas judicialmente, impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria no
período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo, não se coaduna com a
interpretação teleológica, tampouco com o postulado da proporcionalidade e com a proibição do
venire contra factum proprium (manifestação da boa-fé objetiva).
De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger a saúde do trabalhador,
vedando que o beneficiário de uma aposentadoria obtida com o reconhecimento da especialidade
do labor continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando que tal norma
visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para prejudicar aquele que se viu na
contingência de continuar trabalhando pelo fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu
benefício.
A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria do período em que
ele, após o indevido indeferimento do benefício pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente
nocivo significa, a um só tempo, beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a
autarquia deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido indevidamente o
requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se viu na contingência de continuar
trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando já tinha direito ao benefício que fora
indevidamente indeferido pelo INSS - o que colide com os princípios da proporcionalidade e da
boa-fé objetiva (venire contra factum proprium).
Ademais, referida questão está pendente de análise pelo Supremo Tribunal Federal - STF, no RE
79161/PR, pela sistemática da repercussão geral da matéria (art. 543-B do CPC/1972).
Nesse sentido: TRF3ª Região, 2014.61.33.003554-0/SP, Desembargador Federal PAULO
DOMINGUES, DJ 08/04/2019; TRF3ª Região, AC 2011.61.11.003372-2/SP, Desembargador
Federal CARLOS DELGADO, DJ 08/04/2019; TRF3ª Região, AC 2016.61.83.008772-0/SP,
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, DJ 08/04/2019.
Por tais razões, reconheço que o disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica ao
caso dos autos, ao menos até que ocorra o trânsito em julgado da decisão que concedeu a
aposentadoria especial e que esta seja implantada. Por conseguinte, não há que se falar em
descontos, na fase de liquidação, das parcelas atrasadas dos períodos em que a parte autora
permaneceu exercendo atividades consideradas especiais.JUROS DE MORA E CORREÇÃO
MONETÁRIA
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
TUTELA ANTECIPADA
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, é de se manter a
antecipação dos efeitos da tutela deferida na origem.
HONORÁRIOS RECURSAIS
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão de trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos em lei.
Provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida,
no caso, a sua condenação em honorários recursais.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS, para afastar o
reconhecimento do caráter especial do labor desempenhado no período de 24/06/2017 a
18/08/2017, e DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração dos juros de mora e correção monetária, na
forma acima explicitada, mantida, no quanto mais, a sentença.
É o voto.
lcpaula
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE NOCIVO
ELETRICIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. JUROS DE MORA E
CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ANTECIPADA.
1. Recebida a apelação interposta pelo INSS, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
2. A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art.
4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
3. Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a
aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho
permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade
física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao
labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento,
desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de
forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho
podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral
(PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030
e CAT) ou outros meios de prova.
4. Nos termos do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.8., reputa-se especial a atividade desenvolvida
pelo segurado sujeito à tensão elétrica superior a 250 volts. Considerando que o rol trazido no
Decreto nº 2.172/97 é exemplificativo e não exaustivo, conforme decidido pelo Egrégio Superior
Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº
1.306.113/SC), o fato de nele não ter sido previsto o agente agressivo eletricidade não afasta a
possibilidade de se reconhecer a especialidade do trabalho que importe sujeição do trabalhador à
tensão elétrica superior a 250 volts, desde que comprovada por meio de prova pericial a
exposição de forma habitual e permanente a esse fator de risco.
5. O INSS questiona apenas o período reconhecido como especial relativo ao agente nocivo
eletricidade 01/03/2002 a 18/08/2017.
6. No caso dos autos, o PPP (ID 122729237 – págs. 21/26) traz a informação de que a parte
autora, no período de 06/03/1997 a 31/12/2003, estava exposta à tensão elétrica superior a 250
volts, agente nocivo que configura o labor especial alegado. Além disso, a descrição das
atividades constante do documento não deixa dúvidas de que a exposição à tensão elétrica
superior a 250 volts era de forma habitual e permanente.
7. Por outro lado, não consta dos autos nenhum documento comprobatório que indique o trabalho
em condições especiais no intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
8. Conforme dito anteriormente, para o reconhecimento do exercício de atividade em condições
especiais é necessária a comprovação do labor por meio de instrumentos previstos nas normas
de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
9. Destarte, existindo prova da efetiva exposição do segurado a tensão elétrica superior a 250
volts no período de 01/03/2002 a 23/06/2017, de rigor a caracterização da especialidade do labor
nesse intervalo, conforme se infere da jurisprudência desta Colenda Turma. Precedentes.10.
Reconhecido, portanto, como de trabalho em condições especiais, o período de 01/03/2002 a
23/06/2017, restando afastada a especialidade do labor no intervalo de 24/06/2017 a 18/08/2017.
11. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se aplica à hipótese dos autos,
em que o reconhecimento da especialidade do labor e a concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição foi deferida apenas judicialmente.
12. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
13. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
14. Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, é de se manter a
antecipação dos efeitos da tutela deferida na origem.
15. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão de trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos em lei.
16. Provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente,
descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento
do caráter especial do labor desempenhado no período de 24/06/2017 a 18/08/2017, e
determinar, de ofício, a alteração dos juros de mora e correção monetária, mantida, no quanto
mais, a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
