D.E. Publicado em 29/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, e de ofício, corrigir a correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 21/06/2018 13:10:50 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010678-98.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra a sentença de fls. 180/184 julgou procedente o pedido deduzido na inicial, para:
O INSS interpôs apelação, argumentando, em síntese, o seguinte: (i) preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, por ausência de produção de prova relevante requerida, (ii) na empresa FIBRIA CELULOSE o autor exercia eminentemente atividades burocráticas, ficando evidenciado que não estava submetido à exposição habitual (iii) ausência de explicação da metodologia aplicada, eis que o autor era o responsável pela medição de ruído no ambiente fabril, (iv) laudo extemporâneo, (v) na empresa LIMPIDOZ igualmente exercia atividade eminentemente burocrática, sem exposição a ruído, com indícios de corporativismo na elaboração do laudo.
Contrarrazões da parte autora (fls. 211/214).
Na sequência, subiram os autos a esta Corte.
Certificado que a apelação foi interposta dentro do prazo legal (fl.218).
É o breve relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/ 2015, e, em razão da regularidade formal, conforme certidão de fl. 218, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
A hipótese dos autos não demanda reexame necessário.
A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/ 2015 ).
In casu, o INSS foi condenado a revisar a aposentadoria por tempo de contribuição e pagar ao autor as diferenças devidas desde a data da concessão da aposentadoria anterior (01/04/2016, fl. 13).
Por conseguinte pagar o referido benefício desde a referida data, até a data da condenação da autarquia ré, ocorrida em 20/10/2017, por força de sentença que julgou a demanda procedente -, o montante da condenação não excederá a 1.000 (mil) salários mínimos, ainda que o valor da aposentadoria fosse igual ao teto previdenciário.
Vale frisar que, em outubro/2017, quando da prolação da sentença, o salário mínimo era de R$ 937,00 e o teto do salário de benefício era R$5.531,31, correspondendo, pois, a aproximadamente, 5,9 salários mínimos.
Sendo assim, ainda que a parte autora faça jus a uma aposentadoria no valor do teto de salário de benefício previdenciário (5,9 salários mínimos), considerando (i) o termo inicial do benefício (16/08/2013), e (ii) que a sentença foi proferida em 09/02/2017, tem-se que a condenação não ultrapassará 45,34 prestações mensais (de 16/08/2013 a 09/02/2017, inclusive 13°) e a aproximadamente 303,78 salários mínimos (45,34 prestações de 5,9 salários mínimos).
Logo, como acertadamente decidido em primeiro grau, a r. sentença não está sujeita ao reexame necessário.
Nesse sentido, precedente desta C. 7ª Turma:
Pelo exposto, incabível a remessa necessária.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição da MP 1.523, de 11.10.1996, tornou-se legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico.
Acresça-se que, para se comprovar a atividade insalubre a partir de 10.12.1997, a Lei 9.528 passou a exigir laudo técnico, elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, para demonstrar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, sendo certo que os agentes ruído e calor sempre exigiram a apresentação de laudo.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Considerando que a Lei 9.032/95 não previu a exigência de LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) como requisito para a concessão da aposentadoria especial, consolidou-se o entendimento de que referido laudo só é exigível a partir de 11/10/06 (MP 1.523-10) e que a menção a EPI ou EPC somente é exigível após 14.12.98 (Portaria MPS 5.404/99).
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Feitas tais ponderações iniciais, já se pode analisar o caso dos autos, em que o INSS interpôs apelação, argumentando, em síntese, (i) preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, por ausência de produção de prova relevante requerida, (ii) na empresa FIBRIA CELULOSE o autor exercia eminentemente atividades burocráticas, ficando evidenciado que não estava submetido à exposição habitual (iii) ausência de explicação da metodologia aplicada, eis que o autor era o responsável pela medição de ruído no ambiente fabril, (iv) laudo extemporâneo, (v) na empresa LIMPIDOZ igualmente exercia atividade eminentemente burocrática, sem exposição a ruído, com indícios de corporativismo na elaboração do laudo.
DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Delineado esse quadro normativo, já se pode analisar a insurgência posta sub judice.
Preliminar - Da alegação de cerceamento de defesa
Na petição de fl. 177/179, o apelante requereu a produção de vistoria no local de trabalho, argumentando que " (...) tendo em vista a falta de confiabilidade dos documentos encaminhados pela empregadora, requer o INSS a realização de vistoria no local de trabalho, a ser realizada preferencialmente por médico com médico especializada (sic) em segurança do trabalho. (...)"
Na sua apelação, o INSS alega cerceamento ao seu direito de defesa, argumentando que a produção da prova requerida seria imprescindível no caso vertente.
Deveras, da leitura do r. decisum impugnado, extrai-se que ele foi omisso no ponto devendo ter enfrentado a questão e, não o fazendo, incorreu em negativa de prestação jurisdicional.
Todavia, ao se compulsar o PPP de fls. 60, que se encontra, inclusive, respaldado pelo Laudo Técnico do período (fls. 155/158), não se verificam elementos nos autos que infirmem os dados constantes no referido formulário legal.
Deveras, o preenchimento do PPP é de responsabilidade da empresa, e assim o é igualmente a higidez dos dados ali constantes, razão pela qual, ausentes elementos outros que o invalidem, a realização de vistoria no local de trabalho, ou de outra perícia, não é medida impositiva para fins do requerido manifestar sua resistência à pretensão do autor.
Lado outro, se o INSS entende que o PPP foi preenchido de maneira fraudulenta, ou incorreta, a ele cabe, na utilização de seu Poder de Polícia, conjuntamente com os órgãos competentes, apurar a eventual contrafação com a tomada de medidas legais cabíveis no caso.
Em contrapartida, não se pode admitir que, com base em meras suposições ou na irresignação da parte, desacompanhadas de elementos concretos, que o formulário legal, aparentemente preenchido corretamente, seja desprestigiado em virtude de mera insurgência.
Não se olvide, demais disso, que cabe à própria autarquia previdenciária, consoante o texto do art.1º do Decreto 4.882/03, que altera o Decreto 3.048/99, em seu art. 68,§ 3º, a responsabilidade pela fiscalização da conformidade dos referidos relatórios à legislação de regência:
Para finalizar, observo que o INSS em sua análise e decisão técnica de atividade especial, à fl. 77, em sua justificativa de denegação do benefício requerido, não levanta a questão da necessidade de perícia, ou outra prova, para o reconhecimento da atividade especial no período de 01/11/1993 a 28/04/1995, mas aduz, como fundamento para a não comprovação da submissão ao agente nocivo, a necessidade de anexar valores medidos ou memória de cálculo.
De qualquer maneira, toda a argumentação expendida é suficiente a demonstrar que, não obstante a omissão apontada, estando a causa madura para julgamento, não é o caso de se encaminhar os autos à primeira instância, sendo cabível o imediato julgamento do feito, nos termos do que preceitua o artigo 1.013, §3º III, do CPC/15, na forma da jurisprudência desta C. Turma:
Por tais razões, passo a enfrentar o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição especial, na forma do inciso III do §3º do artigo 1.013 do Código de Processo Civil/2015.
Mérito
(i) Da alegação de exercício de atividades eminentemente burocráticas pela parte autora que não caracterizam exposição à atividade de risco habitual nas empresas trabalhadas;
Neste tópico, a mesma linha de raciocínio expendida acima, acerca da presunção de higidez dos dados constantes nos PPP´s, à vista da inexistência de elementos concretos que os infirmem, aqui se replicam, sendo desnecessário estender-se.
Ora, repiso, se nos formulários legais juntados aos autos a empresa empregadora fez constar que o segurado encontrava-se, no exercício de sua atividade cotidiana, exposto ao fator de risco ruído, acima da tolerância máxima legal, inexistentes provas que os contradigam, os dados são suficientes e necessários para demonstrar a atividade especial no período.
(ii) Da metodologia empregada
Nesse passo, importar registrar que não merece acolhida a alegação autárquica, no sentido de que não se poderia reconhecer como especial o período trabalhado pelo autor, em função de a técnica utilizada na aferição do ruído não ter sido explanada.
De todo modo, vale registrar que tal alegação autárquica não autoriza a reforma da decisão apelada, seja porque o INSS sequer alegou que a metodologia utilizada pela empresa empregadora do autor teria ensejado uma aferição incorreta do nível de ruído a que o autor estava exposto, seja porque o segurado não pode ser prejudicado por eventual equívoco da empresa no particular.
Ressalte-se que, em função do quanto estabelecido no artigo 58, da Lei 8.213/91, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, eis que ele não é responsável pela elaboração do documento e porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP e dos laudos técnicos que o embasam.
Não só. A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O art. 58, § 1º, da Lei 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica (Nível de Exposição Normalizado - NEN), não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia. Nesse sentido, já se manifestou o seguinte julgado:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTE NOVIVO RUÍDO. METODOLOGIA DE MEDIÇÃO. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. RECURSO PROVIDO. |
VOTO Trata-se de recurso interposto pelo autor em face da sentença que julgou o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição improcedente. O autor se insurge contra o não reconhecimento especial do período de 04/11/2008 a 19/01/2015. A sentença não o reconheceu pelo seguinte: No que relaciona ao período de 04/11/2008 a 19/01/2015, foi apresentado Perfil Profissiográfico Previdenciário e laudo (anexos 6 e 7), os quais não apontam o uso da metodologia da NHO-01 da FUNDACENTRO. Por isso, toda a informação acerca do agente nocivo ruído o qual estava submetido o autor está inviabilizada em face da ausência de dados indispensáveis. O Decreto nº 4.882/2003 modificou o Decreto nº 3.028, e impôs como requisito da especialidade do ruído "a exposição a Níveis de Exposição Normalizados (NEN) superiores a 85 dB(A)". Se somente aceitamos como especiais a exposição a ruído superior a 85 dB (A), não há por que não exigir também o NEN, sobretudo por se tratar de norma de mesma hierarquia. Regulamentando a matéria, o art. 280 da IN/INSS nº 77/2015 dispõe que: Art. 280. A exposição ocupacional a ruído dará ensejo a caracterização de atividade exercida em condições especiais quando os níveis de pressão sonora estiverem acima de oitenta dB (A), noventa dB (A) ou 85 (oitenta e cinco) dB (A), conforme o caso, observado o seguinte: [...] IV - a partir de 01 de janeiro de 2004, será efetuado o enquadramento quando o Nível de Exposição Normalizado - NEN se situar acima de 85 (oitenta e cinco) dB (A) ou for ultrapassada a dose unitária, conforme NHO 1 da FUNDACENTRO, sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003, data da publicação do Decreto nº 4.882, de 2003, aplicando: a) os limites de tolerância definidos no Quadro do Anexo I da NR-15 do MTE; e b) as metodologias e os procedimentos definidos nas NHO-01 da FUNDACENTRO. Apesar da referida previsão em Instrução Normativa, esta Turma Recursal vem decidindo seguidamente que a menção a uma ou outra metodologia de medição do ruído é irrelevante para desconstituir a conclusão de sujeição do segurado ao ruído, pois se deve ater mais às conclusões dos documentos comprobatórios, do que às técnicas determinadas pelas instruções normativas do INSS. Em geral, se faz menção à dosimetria, à NR 15, decibelímetro ou NHO-01. Em todos os casos, se aceita a nocividade quando acima dos limites toleráveis. Isso porque a previsão de uma ou outra metodologia em Instrução Normativa do INSS exorbita de qualquer poder regulamentar, estabelecendo exigência não prevista em lei. O art. 58, § 1º da LBPS apenas estabelece que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, com base em laudo técnico expedido por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia aceita por suas profissões. De se ressaltar ainda que o PPP se encontra corroborado por LTCAT, o qual tem informações mais detalhadas sobre a medição (anexo 7). O PPP informa que o autor esteve exposto a ruído de 98 dB (A) no desempenho de suas atividades (anexo 6), o que, de acordo com a Pet nº 9.059/RS, garante o direito à contagem especial da atividade. [...] (TRF2 SEGUNDA TURMA RECURSAL Recursos 05100017820164058300 JORGE ANDRÉ DE CARVALHO MENDONÇA 23/03/2018) |
Por tais razões, deve ser rejeitada a alegação do INSS no sentido de que o labor sub judice não poderia ser reconhecido como especial em razão da não identificação da metodologia na medição do ruído.
(iii) Da extemporaneidade do laudo
O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
Nesse sentido é o entendimento desta Egrégia Corte Regional, conforme se verifica dos seguintes julgados:
PREVIDENCIÁRIO. ESPECIAL. RUÍDO. CONTEMPORANEIDADE DO LAUDO PARA PROVA DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESNECESSIDADE. HONORÁRIOS. DANOS MORAIS. |
(...) - Quanto à extemporaneidade do laudo, observo que a jurisprudência desta Corte destaca a desnecessidade de contemporaneidade do laudo/PPP para que sejam consideradas válidas suas conclusões, tanto porque não há tal previsão em lei quanto porque a evolução tecnológica faz presumir serem as condições ambientais de trabalho pretéritas mais agressivas do que quando da execução dos serviços. (...) |
- Recurso de apelação a que se dá parcial provimento. |
(AC 0012334-39.2011.4.03.6183, 8ª Turma, Desembargador Federal Luiz Stefanini, DE 19/03/2018) |
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISIONAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SERRALHEIRO. FUNÇÃO ANÁLOGA À DE ESMERILHADOR. CATEGORIA PROFISSIONAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. COMPROVAÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI VIGENTE À ÉPOCA PRESTAÇÃO DA ATIVIDADE. EPI. PPP EXTEMPORÂNEO. IRRELEVANTE. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. |
(...) VI - O fato de os PPP"s ou laudo técnico terem sido elaborados posteriormente à prestação do serviço não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, além disso, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços. (...) |
XII - Apelação do réu e remessa oficial parcialmente providas. |
(AC/ReO 0027585-63.2013.4.03.6301, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento) |
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO / CONTRIBUIÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. CONVERSÃO INVERSA |
(...) - A apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador. A extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais. (...) |
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial como ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, e negado provimento à apelação da parte Autora. |
(AC/ReO 0012008-74.2014.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, DE 17/10/2017) |
Na mesma linha, temos a Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, publicada no dia Diário Oficial da União aos 24/09/2012, cujo enunciado é o seguinte:
"O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado." |
Dos juros e da correção monetária .
A inconstitucionalidade do critério de correção monetária , introduzido pela Lei nº 11.960/200, foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária , não pode subsistir a sentença na parte em que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária , aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Conclusão
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS e, de ofício, corrijo a correção monetária, nos termos do expendido.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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