
D.E. Publicado em 06/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, (i) dar parcial provimento ao recurso do INSS, a fim de (a) afastar o reconhecimento como especial do intervalo de tempo compreendido entre 06.03.1997 a 10.10.2001, mantendo, contudo, o reconhecimento do interregno de 11.10.2001 a 31.12.2008 como especial e, por conseguinte, julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria especial e impor ao INSS a obrigação de revisar a aposentadoria por tempo de contribuição já concedida ao recorrido, levando em consideração o período especial reconhecido; (b) cassar a tutela de urgência concedida na sentença; (c) determinar que a parte autora restitua os valores recebidos indevidamente em razão da tutela de urgência concedida pela decisão apelada, na forma expendida no voto; (d) reconhecer a sucumbência recíproca, condenando ambas as partes ao pagamento da verba honorária na forma delineada no voto; e (ii) de ofício, determinar a alteração da correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005214-71.2015.4.03.6128/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra a sentença de fls. 126/128 que julgou procedente o pedido, apresentando a seguinte conclusão:
Pelo exposto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, julgo procedente o pedido, para condenar o INSS a revisar o benefício de APTC da parte autora, convertendo-o para Aposentadoria Especial, com DIB em 08/08/2008, e RMI correspondente a 100% do salário-de-benefício. |
Condeno o réu, ainda, a pagar, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício, observada a prescrição quinquenal, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, desde a citação (02/2016), nos moldes do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, com a incidência das disposições da Lei 11.960/09. |
Ante a natureza alimentar do benefício concedido, com base no artigo 300 do Código de Processo Civil, antecipo os efeitos da tutela, para determinar ao INSS a implantação da revisão, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, com DIP na data desta sentença. |
Condeno o INSS no pagamento dos honorários da sucumbência, que fixo em 10% do valor dos atrasados até a presente data (Súm. 111 STJ). |
O INSS interpôs apelação, argumentando, em síntese, o seguinte: (i) no período de 06.03.1997 a 10.10.2001, o nível de ruído a que esteve exposta a parte autora seria inferior ao limite de tolerância; (ii) nos períodos posteriores, a medição do ruído não observou a técnica estabelecida no artigo 280, da IN 77/2015; (iii) no caso de reforma da sentença, deve ser determinada a devolução dos valores recebidos em razão da tutela antecipada; e (iv) os juros e correção monetária devem ser computados nos termos da Lei 9.494/97.
Contrarrazões da parte autora (fls. 145/151).
Na sequência, subiram os autos a esta Corte.
Certificado que a apelação foi interposta tempestivamente (fl. 153).
É o breve relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, conforme certidão de fl. 153, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, Resp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, Resp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição da MP 1.523, de 11.10.1996, tornou-se legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico.
Acresça-se que, para se comprovar a atividade insalubre a partir de 10.12.1997, a Lei 9.528 passou a exigir laudo técnico, elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, para demonstrar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, sendo certo que os agentes ruído e calor sempre exigiram a apresentação de laudo.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Considerando que a Lei 9.032/95 não previu a exigência de LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) como requisito para a concessão da aposentadoria especial, consolidou-se o entendimento de que referido laudo só é exigível a partir de 11/10/06 (MP 1.523-10) e que a menção a EPI ou EPC somente é exigível após 14.12.98 (Portaria MPS 5.404/99).
Admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Feitas tais ponderações iniciais, já se pode analisar o caso dos autos, em que se reconheceu como especial o período de 06.03.1997 a 07.04.2008, condenando-se o INSS a conceder a aposentadoria especial requerida.
DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 06.03.97); superior a 90dB (de 06.03.1997 a 17.11.2003); e superior a 85 dB, a partir de 18.11.2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Delineado esse quadro normativo, já se pode analisar o período sub judice, de 06.03.1997 a 07.04.2008, reconhecido como especial pelo MM Juízo de origem.
O PPP de fls. 58/59 revela que a parte autora esteve exposta a ruído de (a) 85,3 dB, no período de 06.03.1997 a 31.10.1997; e (b) de 85,70 dB, no período de 01.11.1997 a 31.12.2008.
Sendo assim, a decisão recorrida não merece reforma no que tange ao reconhecimento como especial do interregno de 18.11.2003 a 31.12.2008, eis que neste período o autor esteve exposto a ruído de 85,70 dB e o limite de tolerância estabelecido na legislação da época era de 85 dB.
No entanto, como a legislação vigente no período de 06.03.1997 a 17.11.2003 estabelecia um limite de tolerância de 90 dB, forçoso é concluir que a decisão recorrida não poderia ter reconhecido como especial o período de 06.03.1997 a 17.11.2003, eis que, nesse intervalo de tempo, a parte autora esteve exposta a ruído inferior ao tolerado (85,3 dB e 85,70 dB).
Verifico, contudo, que, na sua apelação, o INSS pediu, com base na exposição a níveis de ruído inferiores ao limite de tolerância, o afastamento do reconhecimento como especial do período de 06.03.1997 a 10.10.2001.
Logo, à míngua de pedido recursal no particular, não se pode afastar o reconhecimento como especial do período de 11.10.2001 a 17.11.2003, sob pena de se incorrer em julgamento ultra petita e inobservância da regra do tantum devolutum quantum apelatum ou da congruência (art. 492, CPC/15).
Por derradeiro, registro que não merece acolhida a alegação autárquica, no sentido de que o período posterior a 10.10.2001 não poderia ser reconhecido como especial, pelo fato de a técnica utilizada na aferição do ruído não ter observado a Instrução Normativa 77/2015.
Ora, é evidente que tal norma (IN 77/2015), que estabelece uma técnica procedimental, não pode ser aplicada retroativamente - até porque é materialmente impossível que o empregador proceda a uma medição com base numa norma futura -, o que por si só revela que ela não se mostra aplicável à situação dos autos, que tem por objeto o período de 06.03.1997 a 07.04.2008.
Por tais razões, dou parcial provimento ao recurso do INSS, a fim de afastar o reconhecimento como especial do intervalo de tempo compreendido entre 06.03.1997 a 10.10.2001, mantendo, contudo, o reconhecimento do interregno de 11.10.2001 a 31.12.2008 como especial.
DA APOSENTADORIA ESPECIAL
A sentença apelada determinou que o INSS implantasse a aposentadoria especial requerida pelo autor, ao fundamento de que, com o reconhecimento como especial do período de 06.03.1997 a 07.04.2008, o recorrido teria completado 25 anos, 7 meses e 48 dias de atividade especial.
Tendo em vista que nesta decisão se afastou o reconhecimento como especial do período de 06.03.1997 a 10.10.2001 (aproximadamente 4 anos e 7 meses), conclui-se que o autor não atende ao requisito de 25 anos de exercício de atividade especial, o que impõe a reforma da decisão no que tange ao deferimento da aposentadoria especial.
No entanto, diante da manutenção da sentença apelada quanto ao reconhecimento como especial do período de 11.10.2001 a 31.12.2008, condeno o INSS a revisar a aposentadoria por tempo de contribuição já concedida ao recorrido.
DA TUTELA ANTECIPADA NA SENTENÇA RECORRIDA.
A sentença apelada, diante da natureza alimentar da aposentadoria especial concedida, com base no artigo 300 do Código de Processo Civil, antecipou os efeitos da tutela, para determinar ao INSS a implantação da revisão, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, com DIP na data desta sentença.
Ocorre que o recorrido não faz jus à aposentadoria especial, conforme antes demonstrado, motivo pelo qual não há como se manter a tutela antecipada na sentença, sendo de rigor a sua cassação.
Friso, ainda, que não é o caso de se reduzir a extensão da tutela concedida, de modo a substituir a determinação de implantação da aposentadoria especial pela revisão da aposentadoria por tempo de contribuição já concedida ao recorrido (fl. 29).
Ocorre que o autor já recebe um benefício previdenciário, de sorte que não há como se divisar o periculum in mora necessário à concessão da tutela de urgência.
Segundo o artigo 300, do CPC/2015, "A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".
A legislação de regência exige, para a concessão da tutela de urgência (tutela antecipada ou cautelar), que a parte demonstre o periculum in mora e o fumus boni iuris, entendendo-se este como a probabilidade da existência do direito alegado e aquele como o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Levando-se em consideração que o recorrido já recebe um benefício previdenciário (no valor de R$1.699,48, em 08.08.2008), não há como se divisar um perigo de dano irreparável ou de difícil reparação que autorize a tutela de urgência, notadamente no que diz respeito ao pagamento de valores decorrentes de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição, até porque não há nos autos prova de que a não concessão dessa tutela colocará em risco a subsistência da parte autora.
A par disso, via de regra, a tutela de urgência de natureza antecipada não deve ser concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (CPC/15, artigo 300, §3°), mas apenas excepcionalmente, tal como ocorre quando se demonstra que tal providência se faz necessária para a subsistência do requerente.
No caso dos autos, contudo, há risco de irreversibilidade dos efeitos da decisão - considerando a natural dificuldade de o segurado restituir ao INSS valores pagos indevidamente, até mesmo em função da natureza alimentar da verba - e não há provas nos autos de que a antecipação da tutela se faça necessária para garantir a subsistência da parte, verificando-se, em verdade, o oposto, já que, como visto, o recorrido já recebe uma aposentadoria por tempo de contribuição.
Por tais razões, deve ser revogada a tutela de urgência concedida na origem.
DA DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO INSS EM RAZÃO DA TUTELA ANTECIPADA.
Pede a autarquia que a parte autora seja condenada a restituir os valores indevidamente pagos em razão da antecipação dos efeitos da tutela.
Em que pese a divergência jurisprudencial sobre o tema, entendo que razão assiste ao INSS nesse ponto.
O artigo 302, inciso III, do CPC/15, estabelece que "Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se: [...] III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal".
Como se vê, a legislação de regência estabelece a responsabilidade objetiva da parte pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar a outra, ficando, assim, obrigada a restituir os valores recebidos em razão da tutela antecipada caso essa seja revogada.
Isso, também, era o que se extraía do CPC/73, o qual estabelecia no artigo 271, §3°, que "A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A" e no artigo 588, I, que "A execução provisória da sentença far-se-á do mesmo modo que a definitiva, observados os seguintes normas: I - corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os prejuízos que o executado venha a sofrer".
Forte nisso e na exigência da reversibilidade da tutela antecipada, a Primeira Seção do C. STJ, no julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia 1.401.560/MT, consolidou o entendimento de que é devida a restituição de valores percebidos pelo segurado, em virtude do cumprimento de decisão judicial precária posteriormente revogada, independentemente da natureza alimentar da verba e da boa-fé do beneficiário, fazendo-o nos seguintes termos:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO. O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária (declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) dispensava. Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1401560 / MT, RECURSO ESPECIAL 2012/0098530-1, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 13/10/2015, Ministro ARI PARGENDLER) |
Sendo assim, deve o recorrido restituir os valores recebidos indevidamente em razão da tutela de urgência concedida pela decisão apelada e ora revogada.
Destaque-se, contudo, que mesmo diante do parcial provimento do recurso do INSS, a parte autora continuará fazendo jus à revisão da sua aposentadoria - em razão da manutenção do reconhecimento, como especial, do período de 11.10.2001 a 31.12.2008 - e, consequentemente, dos respectivos valores atrasados.
Por isso, determino que a importância indevidamente recebida pelo recorrido em decorrência da tutela provisória deverá ser descontada dos valores a que ele faz jus em razão da revisão do benefício que já lhe foi deferido.
DA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento parcial do pedido de reconhecimento de trabalho em condições especiais e com o indeferimento do pedido de aposentadoria especial, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca, motivo pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as partes, na forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas honorárias, por se tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, § 14, do CPC/15).
Por tais razões, com base no artigo 85, §§2° e 3°, do CPC/15, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INSS, que fixo em 10% do valor atualizado da causa, considerando que não se trata de causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço.
Suspendo, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
Por outro lado, vencido o INSS no que tange ao reconhecimento como especial de parte do período pleiteado na inicial e à revisão da aposentadoria da parte autora, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios no particular, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a sentença (Súmula nº 111/STJ).
DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA.
A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não pode subsistir a sentença na parte em que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, voto por (i) dar parcial provimento ao recurso do INSS, a fim de (a) afastar o reconhecimento como especial do intervalo de tempo compreendido entre 06.03.1997 a 10.10.2001, mantendo, contudo, o reconhecimento do interregno de 11.10.2001 a 31.12.2008 como especial e, por conseguinte, julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria especial e impor ao INSS a obrigação de revisar a aposentadoria por tempo de contribuição já concedida ao recorrido, levando em consideração o período especial reconhecido; (b) cassar a tutela de urgência concedida na sentença; (c) determinar que a parte autora restitua os valores recebidos indevidamente em razão da tutela de urgência concedida pela decisão apelada, na forma expendida no voto; (d) reconhecer a sucumbência recíproca, condenando ambas as partes ao pagamento da verba honorária na forma delineada no voto; e (ii) de ofício, determinar a alteração da correção monetária, nos termos expendidos no voto.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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