Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2229084 / SP
0001076-85.2016.4.03.6141
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE NOCIVO RUÍDO. DO
USO DE EPI. AUSÊNCIA DE PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO. JUROS DE MORA E
CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS DE OFÍCIO. VERBAS SUCUMBENCIAIS.
1. Recebidos os recursos, já que manejados tempestivamente, conforme certificado nos autos,
e com observância da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
2. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado
sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15
(quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a
evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será
concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual
estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em
regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se
excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor
especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada
a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional
nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da
produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser
provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA,
PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
CAT) ou outros meios de prova.
3. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Diante de tal
evolução normativa e do princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003. O C.
STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do
CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O
limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído
deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do
Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da
LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
4. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da
eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria".
5. Não merece acolhida a alegação do INSS quanto ao uso de EPI, pois, conforme já
destacado, no caso de ruído, o fornecimento de equipamentos de proteção individual não é
suficiente para neutralizar a nocividade do agente, tendo tal tema sido definido pelo E. STF
quando do julgamento do ARE 664335, não havendo como se sonegar tal direito do segurado
sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio e de desequilíbrio financeiro e atuarial
do Sistema Previdenciário (195, §§ 5° e 6°, e art. 201, caput e §1°, ambos da CF/88 e artigo 57,
§§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode
ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
6. Ademais, nesse particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº
664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de
Repercussão Geral, que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos
segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da
preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal
(que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a
correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição
inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o
caso da aposentadoria especial.
7. Os formulários e laudo técnico revelam que o autor, no período de 06/03/1997 a 31/12/2003,
exerceu as atividades de operador de apoio, operador de balanças de chapas, operador de
produção de tratamento térmico e de máquinas de temperatura, no setor de laminação de
chapas grossas da Companhia Siderúrgica Paulista - Cosipa (atual Usiminas), exposto de forma
habitual e permanente ao agente nocivo variável de 81 até 104 dB (até 30.04.2001) e de 94 dB
(no intervalo de 01.05.2001 a 31.12.2003).
8. Nos termos do entendimento pacificado por esta C. Turma, em se tratando de ruído de
intensidade variável, a média não pode ser aferida aritmeticamente, uma vez que a pressão
sonora maior no setor acaba por encobrir a menor, não sendo de se supor, em detrimento do
segurado, que o menor nível de ruído prevalecia no ambiente, em termos de duração, em
relação ao maior (TRF3ª Região; AC 2011.61.83.005763-7/SP; Des. Fed. Paulo Domingues; DJ
24/09/2018; TRF3ª Região, AC 2011.61.04.004900-0/SP, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto,
DE 09/04/2018; TRF3ª Região, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 11/03/2019).
9. O PPP revela que no período de 01.01.2004 a 31.01.2004, o autor era operador de
tratamento térmico, no setor de acabamento de chapas grossas da Usiminas, exposto de forma
habitual e permanente ao agente ruído na intensidade de 85,1 dB.
10. Considerando que se reconhece como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80,0 dB
(até 05/03/1997); superior a 90,0 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85,0 dB (a
partir de 19/11/2003), constata-se que a decisão recorrida andou bem ao reconhecer o período
de 06/03/1997 a 31/12/2003, já que nestes a parte autora sempre esteve exposta a níveis
acima do tolerado pela respectiva legislação de regência. Outrossim, o período de 01/01/2004 a
31/12/2004 também deve ser enquadrado como especial, eis que a exposição foi superior a 85
dB (limite de tolerância estabelecido para a época).
11. Mantido, assim, o benefício de aposentadoria especial deferido na r. sentença.
12. Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
13. Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em
24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado
para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas
quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase
de liquidação do julgado.
14. E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº
1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso
de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
15. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela
deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los,
inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de
repercussão geral.
16. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a
entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E.
17. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, que devem ser
fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ),
eis que de acordo com a moderada complexidade das questões e consenso deste colegiado.
18. Apelação do INSS e recurso adesivo do autor parcialmente providos. Juros de mora e
correção monetária alterados de ofício.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL
PROVIMENTO à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, apenas para também
condenar o réu a reconhecer o período especial de 01.01.2004 a 31.01.2004 e fixar os
honorários advocatícios em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença,
conforme a Súmula nº 111/STJ, e DETERMINAR, DE OFÍCIO, a alteração dos juros de mora e
correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Referência Legislativa
***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-6 PAR-7***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-543CLEG-FED DEC-4882 ANO-2003LEG-FED DEC-2172
ANO-1997***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999***** LICC-42 LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL
LEG-FED DEL-4657 ANO-1942 ART-6***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-195 PAR-5 PAR-6 ART-201 PAR-1LEG-FED LEI-11960 ANO-
2009LEG-FED LEI-9494 ANO-1997 ART-1F***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA
LEG-FED SUM-111
Veja
STF ARE 664.335/SCREPERCUSSÃO GERALTEMA 555;
STJ RESP 1.398.260/PRREPETITIVOTEMA 694
Precedentes
PROC: APCIV 2011.61.04.004900-0/SP ÓRGÃO: SÉTIMA TURMA JUIZ: DESEMBARGADOR
FEDERAL TORU YAMAMOTO AUD: 26/03/2018
DATA: 06/04/2018
