D.E. Publicado em 29/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 21/06/2018 13:32:23 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020536-61.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra a sentença de fls. 151/153 que julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, condenando o autor ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, fixados no importe de 20% do valor da causa.
O autor interpôs recurso de apelação, aduzindo, em síntese, o seguinte: (i) que os períodos laborados em atividade exposta a ruído já foram reconhecidos administrativamente pelo INSS e são incontroversos, (ii) que a exordial requer a conversão do período comum em especial antes do ano de 1995 (de 01/09/1979 a 25/11/1981, 03/10/1988 a 10/06/1989, 19/06/1989 à 01/03/1990 e, de 04/07/1990 a 01/11/1990, laborados na empresa Laert Romagnolo ME, ARC-SOLDA Industrial LTDA, Texcoblor Textil LTDA e Jansam Comércio e Serviços LTDA), pelo fator de conversão X0,71, assim com a soma dos períodos trabalhados e reconhecidos pelo INSS, o autor perfaz 25 anos de contribuição para obter a aposentadoria especial, (iii) requer, tão somente, nos autos a conversão do período comum em especial, não trabalhado em ambiente insalubre e, portanto, sem laudo, (iv) a litigância de má-fé do apelado, ao contestar período já reconhecido administrativamente, requerendo uma indenização do valor de 20% do valor da causa principal.
Recebida a apelação às fls. 178.
O INSS não apresentou contrarrazões.
Na sequência, subiram os autos a esta Corte.
É o breve relatório.
VOTO
EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Inicialmente, por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 , consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição da MP 1.523, de 11.10.1996, tornou-se legitimamente exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico.
Acresça-se que, para se comprovar a atividade insalubre a partir de 10.12.1997, a Lei 9.528 passou a exigir laudo técnico, elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, para demonstrar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, sendo certo que os agentes ruído e calor sempre exigiram a apresentação de laudo.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Considerando que a Lei 9.032/95 não previu a exigência de LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) como requisito para a concessão da aposentadoria especial, consolidou-se o entendimento de que referido laudo só é exigível a partir de 11/10/06 (MP 1.523-10) e que a menção a EPI ou EPC somente é exigível após 14.12.98 (Portaria MPS 5.404/99).
Admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
Feitas tais ponderações iniciais, já se pode analisar o caso dos autos, em que o autor alega, (i) que os períodos laborados em atividade exposta a ruído já foram reconhecidos administrativamente pelo INSS e são incontroversos, (ii) a exordial requer a conversão do período comum em especial antes do ano de 1995 (de 01/09/1979 a 25/11/1981, 03/10/1988 a 10/06/1989, 19/06/1989 à 01/03/1990 e, de 04/07/1990 a 01/11/1990, laborados na empresa Laert Romagnolo ME, ARC-SOLDA Industrial LTDA, Texcoblor Textil LTDA e Jansam Comércio e Serviços LTDA) pelo fator de conversão X0,71, assim com a soma dos períodos trabalhados e reconhecidos pelo INSS, o autor perfaz 25 anos de contribuição para obter a aposentadoria especial, (iii) requer, tão somente, nos autos a conversão do período comum em especial, não trabalhado em ambiente insalubre e, portanto, sem laudo (iv) a litigância de má-fé do apelado, ao contestar período já reconhecido administrativamente, requerendo uma indenização do valor de 20% do valor da causa principal.
DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Delineado esse quadro normativo, já se pode analisar cada um dos períodos sub judice.
a-) A conversão do período comum em especial antes do ano de 1995 (de 01/09/1979 a 25/11/1981, 03/10/1988 a 10/06/1989, 19/06/1989 à 01/03/1990 e, de 04/07/1990 a 01/11/1990, laborados na empresa Laert Romagnolo ME, ARC-SOLDA Industrial LTDA, Texcolor Textil LTDA e Jansam Comércio e Serviços LTDA), pelo fator de conversão X0,71
A sentença não reconheceu o pedido em tela, sob o fundamento de que a parte não apresentou a documentação necessária para tanto, tais como o PPP ou laudos técnicos correspondentes ao período apontado como insalubre.
Em que pese discordar da fundamentação expendida, tenho que é caso de manter a improcedência do pedido.
Incabível o pedido em tela, porque inviável a conversão ao tempo do pedido administrativo, vale dizer, 24/02/2010 (fl. 79).
Isso porque, como já destacado, quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
Nesse ponto, até o advento da Lei 9.032/95, era possível a conversão de tempo comum em especial, devendo ser respeitado este regramento para o tempo de serviço prestado até a sua vigência em respeito ao princípio do tempus regit actum.
Confira-se a orientação do E. Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentindo, que afasta quaisquer dúvidas:
Esta E. Turma já reiteradamente enfrentou o tema tratando de maneira uníssona, verbis:
In casu, repiso, o seu pedido de aposentadoria foi apresentado somente em 24/02/2010 (fl. 79), razão pela qual não há falar em direito de conversão de tempo comum em especial, como pretende a defesa.
Pelas razões expendidas, não há como se acolher as pretensões do autor, devendo ser mantida a sentença recorrida neste particular.
b-) Da litigância de má-fé imputada ao INSS
Quanto ao argumento relativo à litigância de má-fé, não se vislumbra a ocorrência de quaisquer das hipóteses do art. 80, do Código de Processo Civil/2015 .
Notadamente, o INSS tão-somente exerceu o seu direito de resposta, ainda que tenha levantado na peça argumentos equivocadamente, não se vislumbrando quaisquer das hipóteses disciplinadas na locução em referência, verbis:
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação, mantendo os termos da sentença, por outro fundamento, nos termos do expendido.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 21/06/2018 13:32:20 |