Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2271785 / SP
0005796-66.2016.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO
INSS. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS E QUÍMICOS. REVISÃO. TERMO INICIAL.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA
AUTORA.
1. Recebida a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão
de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex
processual.
2. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado
sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15
(quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a
evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será
concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual
estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em
regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se
excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor
especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada
a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional
nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser
provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA,
PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e
CAT) ou outros meios de prova.
3. No período de 29.04.1995 a 20.08.1996, a autora se encontrava filiada a Regime Próprio de
Previdência Social (IPESP e IAMSPE), consoante certidão de tempo de serviço nº 362/2007. A
averbação de trabalho em condições especiais é uma questão que antecede à contagem
recíproca/compensação das contribuições entre os regimes (vale dizer RPPS e RGPS) para fins
de aposentadoria.
4. No referido período, o labor se deu em regime próprio de previdência e não houve
apresentação da Certidão de Tempo de Contribuição referente à averbação do labor especial
por aqueles institutos (IPESP e IAMSPE), restando, portanto, configurada a ilegitimidade
passiva do INSS quanto ao reconhecimento do exercício especial de tempo de serviço.
5. Incumbe ao INSS o lançamento de tempo de serviço especial o enquadramento e conversão
em tempo comum do interregno em que labore sob as regras da CLT, vinculado ao Regime
Geral de Previdência Social, inclusive com o dever de expedir certidão de tempo de serviço, nos
termos do art. 96 da Lei 8.213/91. Assim, é de rigor que a autora requeira o reconhecimento da
atividade especial nesse intervalo diretamente ao IPESP e IAMSPE. Precedentes.
6. Dessa forma, no caso do reconhecimento das atividades especiais exercidas perante o
Instituto Butantan - sujeitas ao RPPS, a ação deve ser proposta contra o ente público em que
se pleiteia a contagem recíproca, vale dizer do labor especial, que arcará com a indenização ao
órgão concessor, inclusive do tempo ficto.
7. Nesse contexto, de ofício, extinguido o processo, sem resolução do mérito, quanto à
pretensão relativa ao período especial mencionado (29.04.1995 a 19.08.1996), ex vi do art. 267,
inc. VI, do CPC/1973, à falta de pressuposto de existência da relação processual.
8. O PPP às fls. 33/34 revela que, no período de 12.08.1996 a 01.12.2005, a autora trabalhou
no Instituto de Ciências Biomédicas - USP, nos cargos de auxiliar de laboratório e técnica de
laboratório, no setor de anatomia, exposta de forma habitual e permanente aos agentes
biológicos microrganismos e parasitas e aos agentes químicos formol, xilol, parafina e ácidos
(ácido clorídrico, nítrico, bórico, pícrico), iodo, iodato de potássio, formaldeídos, acetona e éter).
Nesse cenário, o período em questão deve ser enquadrado como especial nos itens 1.3.2, 1.2.9
e 1.2.11, do Quadro do Decreto nº 53.831/64; e 1.3.2, 1.2.10 e 1.2.11, do Anexo I do Decreto nº
83.080/79 e 1.0.19 e 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
9. Segundo os Anexos 13 e 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador
a agentes químicos à base de hidrocarbonetos e a agentes biológicos tem sua intensidade
medida a partir de análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da
especialidade do labor.
10. A ausência de informações a respeito da monitoração biológica no PPP decorre de
exigência legal do Conselho Federal de Medicina, não acarretando invalidação das informações
nele constantes, consoante art. 268, inciso V, da Instrução Normativa do INSS nº 77/2015.
11. Por outro lado, registros ambientais extemporâneos, não invalidam as conclusões do PPP a
respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial,
primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução
da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas
experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
12. Não há nos autos a comprovação de que o uso de EPI foi eficaz para quaisquer agentes
nocivos enquadrados. Ademais, o fornecimento de EPI não é suficiente a afastar o malefício do
ambiente de trabalho quando se tratar de agente nocivo qualitativo, tendo em vista a própria
natureza deste, cuja ofensividade decorre da sua simples presença no ambiente de trabalho,
não havendo limites de tolerância ou doses como parâmetro configurador da insalubridade,
tampouco como se divisar que o EPI ou EPC possa neutralizá-la. Isso, no mais das vezes, é
reconhecido pelo próprio INSS.
13. Embora não haja obrigatoriedade do empregado comprovar a prévia fonte custeio, no caso,
em particular, o CNIS assinala que no período de 12.08.1996 a 11/2016, houve recolhimento da
respectiva fonte de custeio do labor especial, apontada pelo indicativo IEAN - Exposição a
agente nocivo informada pelo empregador, passível de comprovação, o que foi efetuado nos
autos até a data limite requerida, 01.12.2005.
14. Reconhecido como especial o período de 12.08.1996 a 01.12.2005, somado ao período
especial incontroverso, já homologado pelo INSS (10.08.1976 a 28.04.1995), computa-se 28
anos e 9 dias de exercício em atividade exclusivamente especial, ficando o INSS condenado a
proceder à revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB.
42/143.778.431-0, a partir de 24/07/2007 (DIB), convertendo-o em aposentadoria especial, eis
que os documentos que possibilitaram o reconhecimento da atividade especial foram fornecidos
ao réu no trâmite do processo administrativo (10.12.2007) e o benefício restou implantado
apenas em 18.12.2007.
15. Deferido o pagamento em 18.12.2007 e ajuizada a ação em 09.08.2016 (fl. 02), reconhecida
a prescrição quinquenal, porquanto decorrido mais de cinco anos do deferimento do benefício.
16. Vencido em maior parte o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, os
quais fixo no patamar de 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença
(Súmula nº 111/STJ), eis que de acordo com a moderada complexidade das questões e
consenso deste Colegiado.
17. A Autarquia Previdenciária, no âmbito da Justiça Federal, está isenta das custas
processuais (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela
parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), (ii) nem do pagamento de
honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido antecipado pela
Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art. 32).
18. Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
19. Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em
24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado
para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas
quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase
de liquidação do julgado.
20. E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº
1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso
de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
21. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a
entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E.
22. Apelação da autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, extinguir
processo, sem resolução do mérito, quanto à pretensão relativa ao período especial de
29.04.1995 a 20.08.1996, conforme o art. 267, inc. VI, do CPC/1973 e dar parcial provimento à
apelação da autora, para condenar o INSS a reconhecer em seu favor o labor especial no
período de 12.08.1996 a 01.12.2005 e a proceder à revisão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição NB. 143.778.431-0, a partir de 24/07/2007 (DIB), convertendo-o em
aposentadoria especial, observada a prescrição quinquenal, acrescidas as parcelas vencidas de
juros de mora e correção monetária na forma acima explicitada, bem como ao pagamento de
honorários advocatícios e custas processuais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
