
| D.E. Publicado em 20/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário, e determinar de ofício a alteração da correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0018513-11.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de reexame necessário e apelação interposta contra a sentença de fls. 72/78 que julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na Inicial, com a seguinte conclusão:
"Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL formulado nos autos desta AÇÃO ORDINÁRIA movida por NELSON GOMES DE FARIAS contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS, para: I) determinar a averbação em favor do autor nos registros do réu dos períodos de 17 de agosto de 1.981 até 31 de janeiro de 1.983, de 1º de março de 1.983 até 12 de fevereiro de 1.986, de 3 de abril de 1.986 até 13 de setembro de 1.986 e de 21 de novembro de 1.991 até 28 de abril de 1.995, como de trabalho em condições especiais, com a consequente necessidade de multiplicação dos dias insertos em tal período pelo fator "1,4", descontado, contudo, o seu cômputo singelo, já realizado; II) em razão do reconhecimento do tempo trabalhado constante do item anterior, condenar o réu ao pagamento ao autor do benefício da aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais, devido a partir da data do ajuizamento (16 de outubro de2.013). Inclui-se o abono anual a que alude o artigo 40 da Lei n.º 8.213/91. No que tange às verbas vencidas, serão devidos correção monetária e juros demora (estes a contar da citação, conforme Súmula 204 do STJ), a serem calculados na forma estabelecida pelo artigo 1º-F, da Lei n.º 9.494/97. Em razão da sucumbência, que lhe é imposta por força do artigo 21, parágrafo único, do Código de Processo Civil, arcará o réu com honorários advocatícios dos patronos do autor, que ora fixo em 10% sobre as prestações vencidas até esta data, devidamente atualizadas, nos termos da Súmula 111 do STJ. O INSS está isento de custas e despesas processuais, por força do artigo 6º, da Lei Estadual n.º 11.608/03." |
O INSS interpôs apelação, argumentando, em síntese, que nos períodos em que o autor trabalhou como motorista não houve a exposição a agentes nocivos.
Contrarrazões da parte autora (fls. 101/111).
Na sequência, subiram os autos a esta Corte.
É o breve relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Antes de se adentrar no mérito, é preciso tecer algumas considerações acerca do labor especial.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
MOTORISTA DE TRANSPORTE DE CARGAS
Os itens 2.4.4, do Quadro do Decreto nº 53.831/64, e 2.4.2, do Anexo II do Decreto nº 83.080/79, apontam a atividade profissional de motorista de caminhões de cargas como passível de enquadramento de labor especial, simplesmente pela categoria profissional, até 28/04/1995.
Nesse caso, o PPP de fls. 14/15 revela que, nos períodos de 17/08/1981 a 31/01/1983 e 01/03/1983 a 12/02/1986, o autor trabalhou como motorista, cuja atividade era dirigir caminhão e fazer entrega de mercadorias, ou seja, transportar cargas.
A cópia da CTPS de fl. 18 indica que, no período de 03/04/1986 a 13/09/1986, o autor trabalhou como motorista na empresa Transportadora Barracão Ltda, justamente no setor de transporte de cargas.
O PPP de fls. 12/13 revela que, no período de 21/11/1991 a 01/06/1995, o autor trabalhou como motorista, cujas atividades eram transportar, coletar e entregar cargas em geral, movimentar cargas volumosas e pesadas, além de destombar e remover veículos avariados, dentre outras.
Desta feita, reconheço como especiais os períodos de 17/08/1981 a 31/01/1983, 01/03/1983 a 12/02/1986, 03/04/1986 a 13/09/1986 e 21/11/1991 a 28/04/1995.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA. ENQUADRAMENTO. RECONHECIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO TEMPO INSUFICIENTE PARA APOSENTADORIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA, E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS |
(...) 15 - Quanto ao período de 26/04/1977 a 15/04/1986, o autor apresentou formulário DSS-8030 de fls. 37/39, que indicam o exercício da função de motorista de caminhão, onde efetuava o transporte de "cana de açúcar dos canaviais para Usina e na entressafra, transportava cana de açúcar para o plantio da mesma, cargas estas todas acima de 6.000 (seis) mil quilos", junto à Cia. Agrícola e Pastoril Campanário. |
16 - Para comprovar que suas atividades, nos períodos de e 15/01/1995 a 28/04/1995, segundo anotação constante em CTPS de fl. 36 e laudo pericial de fl. 112/157, o autor exerceu a função de motorista, junto à empresa "J.F. Garcia & Cia. Ltda", ramo de atividade transportes coletivos. |
17 - A documentação apresentada evidencia o trabalho como motorista de caminhão e de ônibus nos períodos descritos, cabendo ressaltar que a ocupação do requerente encontra subsunção no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79, sendo passível de reconhecimento como atividade especial pelo mero enquadramento da categoria profissional. |
18 - Enquadrados como especiais os períodos de 26/04/1977 a 15/04/1986 e 15/01/1995 a 28/04/1995. (...) |
24 - Remessa necessária, tida por interposta, e apelação do INSS parcialmente providas. |
(TRF 3ª Região, AC nº 0000459-94.2002.4.03.6116, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Carlos Delgado, DE 09/08/2018) |
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
O artigo 201, §7º, I, da Constituição Federal confere ao segurado o direito a aposentadoria por tempo de contribuição integral quando ele conta com 35 anos de contribuição, independentemente da sua idade.
Neste caso, somados os períodos laborados em atividades comuns aos períodos reconhecidos como especiais nesta lide, estes convertidos para comuns, verifica-se que o autor soma 35 anos, 4 meses e 11 dias até 16/10/2013 (planilha anexa, cuja juntada ora determino), o que significa dizer que faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição deferida na origem, a qual fica mantida.
CONSECTÁRIOS
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
HONORÁRIOS
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao reexame necessário e à apelação do INSS, e DETERMINO DE OFÍCIO a alteração da correção monetária, na forma acima explicitada.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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| Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
| Data e Hora: | 13/03/2019 16:34:42 |
