Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2275839 / SP
0035475-75.2017.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/06/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. TRABALHO AGRÍCOLA NA
LAVOURA CANAVIEIRA. PLEITO SUBSIDIÁRIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO CONCEDIDO. TERMO INICIAL NA DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CRITÉRIOS DE CÁLCULO DA
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. TUTELA ANTECIPADA CONCEDIDA.
- O autor instruiu os autos com cópia de sua CTPS, formulários e PPP's relativos aos períodos
em que deseja ser reconhecida a especialidade do labor, documentos suficientes para a análise
vindicada e seus conteúdos/validade/autenticidade não foram impugnados durante a instrução
probatória pelo ente autárquico, pelo que rejeitada a preliminar de nulidade da sentença em
razão do cerceamento de defesa (não configurado).
- Comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos,
se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à EC 20/98,
se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras permanentes
estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional (Lei
8.213/91, art. 53, I e II). Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o segurado
comprovar, também, o cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos
já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de
transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do
benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela
regra permanente do citado art. 25, II.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem
a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir
que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido
trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou
integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação
contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para
fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em
regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o
labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- Não há como se sonegar o direito do segurado à averbação da atividade especial sob o
argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6°
e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser
atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia. Nesse
particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de
Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de Repercussão Geral,
que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à
aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio
financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal (que veda a criação,
majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio),
contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício
criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
- Nos períodos de 03/11/1980 a 31/03/1981, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a
15/04/1982, 03/05/1982 a 23/10/1982, 03/11/1982 a 31/03/1983, 18/04/1983 a 30/11/1983,
01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a
31/10/1985, 11/11/1985 15/05/1986, 27/05/1986 a 29/11/1986, 01/12/1986 a 15/04/1987,
21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a 30/03/1988 e 11/04/1988 a 30/04/1988, consoante
CTPS e PPP à fls. 33/43 e 90/94, o autor exerceu a atividade de serviços gerais da carpa de
cana, desempenhando as seguintes atividades: (...) executava serviços de corte de canas cruas
ou queimadas, catação de canas, capina e arranque de pragas, utilizando facão, enxada e
enxadão."
- Nos períodos de 03/05/1988 a 31/10/1988, 22/11/1988 a 24/04/1989, 02/05/1989 a
31/10/1989, conforme CTPS às fls. 38/39 e 44/45, exerceu a atividade de rurícola da
agropecuária na Agropecuária Bellodi - Fazenda Santa Adélia.
- No período de 11/05/1990 a 29/10/1990, consoante PPP às fls. 77/78, exerceu a atividade de
cortador de cana para Agropecuária Gino Bellodi.
- No período de 09/11/1990 a 30/12/1990 exerceu a atividade de rurícola da agropecuária na
Balbo S/A - Agropecuária (CTPS - fl. 45).
- Nos períodos de 18/03/1991 a 26/10/1991 e 21/12/1991 a 01/07/1996, consoante formulário
às fls. 79/80, o autor trabalhou como rurícola no cultivo/corte de cana-de-açúcar para a Balbo
S/A.
- Com efeito, até 28.04.1995, o enquadramento como atividade especial poderia ser feito com
base na categoria profissional, não havendo necessidade de produzir provas da exposição ao
agente nocivo, havendo uma presunção da nocividade.
- Os trabalhadores rurais da agropecuária e os dedicados ao cultivo e corte de cana -de-açúcar
e empregados agroindustriais exercem atividades ostensivamente insalubres, dada às
peculiaridades das tarefas (grandes esforços físicos, uso em grande escala de defensivos
agrícolas, etc.), o que permite o enquadramento como insalubre no código 2.2.1 do anexo ao
Decreto 53.841/64. Precedentes desta corte.
- Com tais considerações, os períodos de 03/11/1980 a 31/03/1981, 22/04/1981 a 23/09/1981,
01/10/1981 a 15/04/1982, 03/05/1982 a 23/10/1982, 03/11/1982 a 31/03/1983, 18/04/1983 a
30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985,
02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 15/05/1986, 27/05/1986 a 29/11/1986, 01/12/1986 a
15/04/1987, 21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a 30/03/1988, 11/04/1988 a 30/04/1988,
22/11/1988 a 24/04/1989, 02/05/1989 a 31/10/1989, 11/05/1990 a 29/10/1990, 09/11/1990 a
30/12/1990, 18/03/1991 a 26/10/1991 e 21/12/1991 a 28/04/1995 devem ser averbados como
de natureza especial.
- Somados os períodos ora reconhecidos como especiais, o autor reúne apenas 12 anos, 6
meses e 29 dias exclusivamente em atividades especiais, insuficientes para concessão da
aposentadoria especial.
- Somados os períodos ora reconhecidos como especiais, convertidos em tempo comum pelo
fator 1,40, aos demais períodos de labor constantes da CTPS e CNIS, perfaz o autor até a data
do requerimento administrativo, 27.06.2016, perfaz o autor, 35 anos e 17 dias de tempo de
serviço. Verifica-se, portanto, que o autor, na data do requerimento administrativo (27.06.2016),
fazia jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, porquanto possuía,
na data do ajuizamento da ação, mais de 35 anos de tempo de contribuição e mais de 180
meses de carência.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo,
27.06.2016, quando apresentada à autarquia federal a documentação necessária para o
reconhecimento do benefício vindicado.
- Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
- Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela
Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação
do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral). Tal índice deve ser aplicado ao caso, até
porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de
declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de
eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do
IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado. E, apesar da recente
decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o
INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto
com o julgado acima mencionado. Dessa forma, se a sentença determinou a aplicação de
critérios de juros de mora e correção monetária diversos daqueles adotados quando do
julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem
observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao
entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
- Assim, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária aplicam-se, (1) até a entrada
em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça
Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da
condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros
moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos
termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009;
e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-E..
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora
(artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (ii) nem do pagamento de honorários
periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal,
devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art. 32).
- Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto nesta decisão, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, é de se antecipar os
efeitos da tutela, conforme requerido nas razões de apelo.
- Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar
arguida e DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do autor, para condenar o INSS a
reconhecer a especialidade do labor desempenhada nos períodos de 03/11/1980 a 31/03/1981,
22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982, 03/05/1982 a 23/10/1982, 03/11/1982 a
31/03/1983, 18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984,
19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 15/05/1986, 27/05/1986 a
29/11/1986, 01/12/1986 a 15/04/1987, 21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a 30/03/1988,
11/04/1988 a 30/04/1988, 22/11/1988 a 24/04/1989, 02/05/1989 a 31/10/1989, 11/05/1990 a
29/10/1990, 09/11/1990 a 30/12/1990, 18/03/1991 a 26/10/1991 e 21/12/1991 a 28/04/1995 e a
conceder -lhe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde data do
requerimento administrativo, 27.06.2016, acrescidas as parcelas devidas de correção monetária
e juros de mora, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios, no patamar de 10%
sobre o valor da condenação na data da sentença e conceder a tutela antecipada, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
