
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348355-33.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIR ALVES
Advogados do(a) APELADO: MARCIO FRANCA DA MOTTA - SP322096-N, FERNANDA PINHEIRO DE SOUZA - SP220799-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348355-33.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIR ALVES
Advogados do(a) APELADO: MARCIO FRANCA DA MOTTA - SP322096-N, FERNANDA PINHEIRO DE SOUZA - SP220799-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL
INÊS VIRGÍNIA
: Trata-se de apelação interposta peloINSS
em face da sentença que julgouPROCEDENTE
a ação de concessão de benefício previdenciário nos seguintes termos:“Ante o exposto, considerando tudo o mais que dos autos consta, JULGO
PROCEDENTE
o pedido, o que faço com fulcro no art. 487, I do Código de Processo Civil,bcondenando o réu a implementar o benefício previdenciário de auxílio-doença em favor do autor,
desde a data do pedido administrativo (15/12/2017), não devendo ser cessado o auxílio doença até que o segurado seja dado como reabilitado para o desempenho de outra atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerada não recuperável pelo INSS, for aposentado por invalidez, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213/91. Eventuais verbas concedidas administrativamente ou por liminar nesse período devem ser abatidas do valor devido. O valor das parcelas vencidas, cujo montante será indicado em planilha a ser elaborada pela Autarquia Previdenciária, deve sofrer correção monetária desde a data em que deveriam ter sido pagas, com acréscimo de juros e de correção monetária, que deverão ser calculados segundo o manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal para matéria previdenciária vigente ao tempo da liquidação, observada a prescrição disposta no artigo 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/91 e eventuais compensações devidas. Condeno o INSS, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios da parte adversa, e, sendo possível verificar, desde já, que a condenação não ultrapassa os 200 (duzentos) salários mínimos, ainda que ilíquida, (art. 85,§3º, I, CPC),fixo
oshonorários advocatícios
da parte adversa, equitativamente, em10%
dovalor da condenação
, abrangidas para este fim as prestações vencidas até a data desta sentença, nos termos da Súmula 111, do STJ, atualizáveis a partir da publicação desta. Autarquia ré isenta de custas (art. 6° da Lei Estadual nº 11.608/03). Em razão do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil, esta sentença não está sujeita a reexame necessário.”A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O INSS pede a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos:
- as provas do labor rural se encerram em 2014 e a perda da visão ocorreu em 2017, assim, à altura do início de incapacidade, o autor já não mais detinha qualidade de segurado, devendo a ação ser julgada improcedente;
- não há incapacidade para a função alegada.
Regularmente processado o feito, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348355-33.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAUDIR ALVES
Advogados do(a) APELADO: MARCIO FRANCA DA MOTTA - SP322096-N, FERNANDA PINHEIRO DE SOUZA - SP220799-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL
INÊS VIRGÍNIA
: Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
Para comprovar a qualidade de segurado especial como trabalhador rural, o autor, nascido em 1984, acostou: certidão de nascimento da filha em 2013, onde está qualificado como “lavrador”; escritura pública de cessão e transferência de direitos possessórios, lavrada em 2016, onde está qualificado como “lavrador”; cópia da CTPS com registro de 2009 a 2011 como “ajudante geral” e de março a setembro de 2014 como “serviços gerais rurais”; parte de uma declaração emitida por sindicato e não homologada.
Há também termo de consentimento informado para fins de perícia médica, firmado em 2019 pelo autor, onde ele declarou sua atividade como sendo “ajudante de pedreiro” e que sempre exerceu a mesma função.
A perícia fixou como data de início da incapacidade o ano de 2017. A conclusão da perícia é de que há incapacidade parcial e permanente para atividades relacionadas com altura e equilíbrio.
No caso, não há documentos que comprovem que o autor trabalhava como rurícola à altura do início da incapacidade. Ademais, o próprio autor declarou ocupação diversa na perícia - ajudante de pedreiro.
A seu turno, a prova testemunhal não é capaz de, por si só, comprovar o labor campesino no período de carência. Lembre-se que a comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Por outro lado, nenhuma prova da qualidade de segurado em relação a outra função declarada – ajudante de pedreiro – , a qual o autor alegou que sempre exerceu.
Considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural pelo período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito propiciando à parte autora intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários.
Por oportuno, transcrevo:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, e julgo prejudicado o apelo do INSS.
É o voto.
(atsantos)
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: TRABALHO RURAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A ausência de prova material apta a comprovar o exercício da atividade rural caracteriza carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo a ensejar a sua extinção sem exame do mérito.
2. Honorários de advogado a cargo da autora, que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito, observada a gratuidade da Justiça deferida nos autos.
3. De ofício, processo extinto sem resolução de mérito. Apelação prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, e julgar prejudicado o apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
