
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011044-40.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: NATALINA RAMALHO SOARES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE EDUARDO BORTOLOTTI - SP246867-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011044-40.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: NATALINA RAMALHO SOARES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE EDUARDO BORTOLOTTI - SP246867-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta nos autos de ação de conhecimento em que se objetiva a concessão da aposentadoria por idade a trabalhadora rural.
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
A regra de transição contida no Art. 143 que tem a seguinte redação:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
O período de 15 anos a que se refere o dispositivo retro citado exauriu-se, assim como as sucessivas prorrogações, em 31.12.2010, como disposto no Art. 2º, da Lei nº 11.718/08:
"Art. 2o Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Assim, a partir de 01.01.2011 há necessidade de recolhimento de contribuições, na forma estabelecida no Art. 3º, da Lei nº 11.718/08.
Acresça-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.08, acrescentou o Art. 14-A à Lei nº 5.889/73, permitindo a contratação de trabalhador rural por pequeno prazo, sem registro em CTPS, mediante a sua inclusão, pelo empregador, na GFIP.
Entretanto, importante frisar que as contribuições previdenciárias dos trabalhadores rurais diaristas, denominados de volantes ou bóia fria, são de responsabilidade do empregador, cabendo à Secretaria da Receita Previdenciária a sua arrecadação e fiscalização.
O e. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso representativo da controvérsia, pacificou a questão no sentido da possibilidade do reconhecimento de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material, conforme julgado abaixo transcrito:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(STJ, REsp 1348633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014)".
Tecidas estas considerações, passo ao exame do caso concreto.
O primeiro requisito encontra-se atendido, pois a autora nascida em 23.12.1956, completou 55 anos no ano de 2011, portanto, anteriormente à data do ajuizamento da ação.
Impõe-se verificar, se demonstrado, ou não, o trabalho rural de modo a preencher a carência exigida de 180 meses.
Com respeito ao alegado exercício da atividade rural, a autora acostou a certidão de seu casamento com José Gonçalo Soares, celebrado em 31.12.1975, na qual seu marido está qualificado como lavrador (fls. 101).
A prova oral produzida em Juízo corrobora a prova material apresentada (transcrição às fls. 130).
Contudo, de acordo com os dados constantes do CNIS (fls. 47), o marido da autora migrou para as lides urbanas em 01.12.1978, descaracterizando a sua condição de trabalhador rural.
Assim, tendo ocorrido a descaracterização da condição de trabalhadora rural antes de implementado o requisito etário, não é possível reconhecer o direito ao benefício pleiteado, nos termos do que decidido pelo e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso especial representativo da controvérsia.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)."
Comprovado que se acha, é de ser averbado no cadastro da autora, independente do recolhimento das contribuições - exceto para fins de carência, e, tão só, para fins de aposentação por idade pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS, o serviço rural no período de 31.12.1975 a 30.11.1978.
Por outro lado, ainda que se reconheça que antes de implementado o requisito etário tenha ocorrido a descaracterização da condição de trabalhadora rural, o benefício pode, em tese, ser concedido nos termos do § 3º, do Art. 48, da Lei nº 8.213/91.
Com efeito, a Lei nº 11.718 de 20.06.2008, que introduziu o §§3 e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91, passou a permitir a concessão de aposentadoria por idade, àqueles segurados que, embora inicialmente rurícolas, passaram a exercer outras atividades e tenham idade mínima de 60 anos (mulher) e 65 anos (homem).
Como se vê dos dados do CNIS, a autora verteu contribuições ao RGPS como contribuinte facultativo no período de 01.01.2009 a 30.09.2019.
Somados o tempo de trabalho rural ora reconhecido e as contribuições vertidas ao RGPS, perfaz a autora 13 anos, 08 meses e 01 dia, não cumprindo a carência exigida para a percepção do benefício de aposentadoria por idade, que é de 180 meses.
Acresça-se que autora, nascida em 23.12.1956 não completou ainda 60 anos de idade.
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença para reconhecer o tempo de serviço rural de 31.12.1975 a 30.11.1978, mantendo a improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade .
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, e no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO RURAL SEM REGISTRO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. DESCARACTERIZAÇÃO.
1. A aposentadoria por idade, no caso de trabalhadores rurais, é devida ao segurado que, cumprido o número de meses exigidos no Art. 143, da Lei 8.213/91, completar 60 anos de idade para homens e 55 para mulheres.
2. Início de prova material corroborada por idônea prova testemunhal.
3. Ocorrendo a descaracterização da condição de trabalhadora rural antes de implementado o requisito etário, não é possível reconhecer o direito ao benefício pleiteado, nos termos do que decidido pelo e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso especial representativo da controvérsia (REsp 1354908/SP).
4. A Lei nº 11.718/2008, ao alterar o Art. 48, da Lei 8.213/91, possibilitou ao segurado o direito à aposentadoria por idade, mediante a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano.
5. A autora não completou ainda 60 anos e não cumpriu a carência necessária, mesmo com a soma do tempo de serviço rural e das contribuições vertidas ao RGPS como contribuinte facultativo.
6. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, e no Art. 86, do CPC.
4. Apelação provida em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
