APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005166-15.2011.4.04.7009/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | JOAO MIELKE |
ADVOGADO | : | JOÃO MANOEL GROTT |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
previdenciário. comprovação do tempo de serviço. trabalhador rural. regime de economia familiar descaracterizado. início de prova material em nome do membro que exerceu atividade urbana. ausência de documentos relativos ao labor rural de forma individual.
1. Para caracterizar o regime de economia familiar, é necessário que o trabalho dos membros da família seja indispensável à própria sobrevivência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração. Por essa razão, o § 9º do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, afasta a qualidade de segurado especial do membro de grupo familiar que exerça outra atividade enquadrada no regime geral de previdência social ou em outro regime.
2. Se as circunstâncias do caso concreto indicam que a principal fonte de subsistência do grupo familiar continua sendo a atividade rural, a descaracterização da condição de segurado especial do integrante que trabalha em outra atividade não afeta todo o grupo familiar, já que os demais membros da família podem dedicar-se à atividade agrícola de forma individual.
3. Ainda que a legislação previdenciária admita o exercício individual da atividade pelo segurado especial, não se pode ignorar a repercussão da atividade urbana realizada por um dos integrantes da família para a comprovação do exercício da atividade rural pelos demais. A relevância da questão manifesta-se no caso em que as provas materiais do labor rural estão em nome do membro do grupo familiar que não ostenta a qualidade de segurado especial, por possuir fonte de renda derivada de atividade urbana. A matéria já foi enfrentada pelo STJ no REsp nº 1.304.479, julgado no regime dos recursos repetitivos, firmando-se entendimento no sentido de que, descaracterizado o regime de economia familiar, não é possível a extensão da prova em nome daquele que exerce trabalho urbano aos demais membros da família.
4. Não há prova inequívoca de que as atividades agrícolas fossem indispensáveis à manutenção da família, visto que o pai do autor exerceu atividade urbana no período cujo reconhecimento é postulado. Restando descaracterizado o regime de economia familiar, caberia ao autor apresentar início de prova material em seu próprio nome que demonstrasse efetivamente o exercício da atividade rural de forma individual.
5. Apelação desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de agosto de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos de reconhecimento e averbação do exercício de atividade rural exercida pelo autor em regime de economia familiar, nos interregnos de 19/07/1969 a 31/12/1974 e 01/01/1976 a 29/03/1978, e de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O autor sustenta que comprovou a sua atividade rural desde a infância, através de provas materiais e de depoimentos de testemunhas, devendo ser reconhecido o tempo de serviço nos termos do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991. Aponta que a ausência de um ou outro documento em um interregno de poucos anos não permite a desconsideração de todo o período, presumindo-se que o segurado nascido no meio rural tenha permanecido participando das lides rurais com a família até seu primeiro vínculo urbano. Argumenta que se entende por regime de economia familiar a atividade em que trabalham os membros da família, com mútua dependência e colaboração, sendo indispensável à própria subsistência. Assevera que trabalhou com sua família no cultivo de milho, feijão, arroz e outros, ajudando no sustento da casa e de sua família. Sustenta haver provas suficientes para comprovar o seu trabalho rural, não se exigindo do trabalhador rural prova escrita de atividade rural em todo o período, quando ficou claramente demonstrado no decorrer do processo que o apelante trabalhou na sua infância na lavoura.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, ainda, por força da remessa necessária, tratando-se de sentença proferida sob a égide do antigo CPC.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005166-15.2011.4.04.7009/PR
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
O apelo não merece prosperar. A sentença apreciou as questões controvertidas com clareza e acerto, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir:
II.a) Da atividade rural
A comprovação de tempo de serviço deve se dar nos termos do artigo 55, § 3°, da Lei 8.213/1991, é dizer, deve estar baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Neste sentido, está consolidado o entendimento dos Tribunais, valendo transcrever a Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça: 'A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário'.
Quanto ao reconhecimento de tempo de serviço rural, tenho admitido como regra a averbação de período a partir da primeira prova material, sendo possível estender o reconhecimento da atividade rural para aquém ou além dos marcos emprestados pelas provas materiais, quando comprovada a vocação rural da família, no primeiro caso, e, no segundo caso, o conjunto probatório autorizar a presunção de continuidade do labor rural pelo segurado para os períodos posteriores à prova material mais recente.
Visando atender aos reclames de prova material, foram apresentados os seguintes documentos:
a) Certidão de casamento do autor, na qual consta a profissão como instrutor agrícola em 10/05/1980 (CERTCAS3, evento 01);
b) Certidão da 16ª Circunscrição de Serviço Militar afirmando que o autor declarou que exercia a profissão de lavrador quando se alistou na Junta de Serviço Militar nº. 111 (Canoinhas/SC) em 1975, lavrada em 15/10/2010 (CMILITA4, evento 01);
c) Declaração de exercício de atividade rural nº. 58/2010, expedida pelo Sindicato dos Produtores Rurais de Bela Vista do Toldo (DSINRURAL9, evento 01);
d) Certidão de Registro de Imóveis, concernente a imóvel rural em nome do genitor do autor na localidade de Paciência, no qual consta a profissão de lavrador do pai do requerente (OUT10, evento 01).
Primeiramente, observe-se que os documentos em nome de terceiros (pai, filho, marido, esposa) podem ser admitidos para a comprovação do trabalho rural exercido pelos outros membros da família que laboram em regime de economia familiar, desde que o restante do conjunto probatório conforte o exercício de atividade rural pelo próprio segurado. Este entendimento, inclusive, já foi consolidado na Súmula nº 73, do egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com a seguinte redação: 'admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental'.
Embora a prova documental não seja robusta, há início de prova material, já que os documentos juntados demonstram a vocação rurícola do autor e dos membros do seu grupo parental no período controvertido nos autos. Infere-se dos documentos colacionados que o genitor do autor era proprietário rural e possuía vocação rurícola, além de existir elemento que vincula diretamente o requerente ao labor campesino.
Satisfeito o requisito de prova material, passo à análise da prova oral produzida em audiência de instrução e julgamento (evento 28).
Em depoimento pessoal, a parte autora afirmou que seu pai era agricultor, e que possui onze irmãos, sendo que cinco trabalham na lavoura até a data de hoje, na mesma propriedade da família. Aduz que começou a trabalhar no campo aos dez anos de idade e saiu para trabalhar como técnico agrícola, após aprovação em concurso na empresa Souza Cruz, pois as terras eram pequenas para toda a família tirar o sustento. Relata que plantavam milho, feijão e fumo. E ninguém da família trabalhava em outra atividade. Informa, ainda, que durante um pequeno lapso temporal seu genitor teve comércio, um boteco, entre 1968 a 1972, na mesma localidade em que residiam. Alega que durante esse período a família não se afastou da lavoura, pois o pai trabalhava com o comércio mais nos finais de semana. Explica que não auxiliavam o genitor no comércio. E afirma que saiu do campo em março de 1978. Registra, por derradeiro, que o pai e a irmã mais velha são aposentados como rurais.
Depreende-se da carta precatória nº. 0003703-31.2012.824.0015, autuada na 2ª Vara Cível da Comarca de Canoinhas/SC, com a finalidade de ouvir as testemunhas arroladas pelo requerente, os seguintes depoimentos (evento 53):
A primeira testemunha, João Pedro Fernandes Corrêa, depois de compromissada, relatou que: 'o autor saiu da localidade onde o depoente mora há uns 20 anos; que quando conheceu o autor ele trabalhava na lavoura; que a renda do autor, na época, era exclusivamente da lavoura; que apenas a família do autor trabalhava com ele e não possuía empregados; que estima que o autor tinha 10 anos de idade quando começou a trabalhar na lavoura; que começou a trabalhar no terreno do seu pai; que o terreno era pequeno e não sabe precisar a área, que eles plantavam milho, feijão, fumo; que plantavam para o consumo e o fumo para venda; que o depoente morava a mais ou menos 1 km de distância do autor; que o via com frequência; que via o autor trabalhando na lavoura, inclusive, que o autor ficou até uns 20 anos de idade trabalhando na lavoura' (PRECATORIA4, p. 7, evento 53).
O segundo testigo, Miguel Salaça, após prestar compromisso, informou que: 'quando conheceu o autor ele trabalhava na lavoura; que os pais do depoente eram amigos dos pais do autor; que eram vizinhos; que plantavam na época para sobreviver, milho, feijão, arroz; que na época o autor e sua família viviam apenas na agricultura; que não sabe precisar a idade que o autor começou a trabalhar na lavoura, mas que normalmente na época já desde mais ou menos 8 anos de idade já se começava a trabalhar; que presenciou o autor trabalhando desde criança; que o autor trabalhava inicialmente em terreno de seu avô (da família); que o terreno era pequeno; que o depoente saiu da lavoura com uns 20 anos e acredita que o autor ficou até uns 20 anos de idade também; que não sabe precisar a data, mas que o autor saiu mais ou menos na mesma época que o depoente' (PRECATORIA4, p. 8, evento 53).
Analisando o teor dos depoimentos, percebe-se que as testemunhas da parte autora apresentam uma versão harmônica dos fatos: que o requerente desenvolveu o labor rural na infância e adolescência na qualidade de trabalhador rural, prestando atividades agrícolas juntamente com a sua família, na localidade onde residiam.
Por outro lado, percebe-se que algumas informações prestadas no depoimento da própria parte autora descaracterizam o enquadramento como segurado especial, cumprindo ressaltar a informação de que seu pai possuía um estabelecimento comercial - 'boteco'.
No tocante às provas materiais, verifica-se que o único documento que vincula o requerente ao meio rural no período controvertido se trata da declaração de alistamento militar, em que consta a informação de que o autor alegou exercer a profissão de lavrador em 1975 (PROCADM3, p. 01, evento 65).
Não se pode olvidar que os demais documentos colacionados constituem, a priori, indícios da vocação rurícola do grupo parental do requerente. A documentação demonstra que os genitores do autor eram proprietários rurais e que já residiam naquela região antes de 1969.
É sabido que estes dados levam à presunção, geralmente confirmada, de que os outros membros do grupo parental também estivessem afetos à lide campesina.
Entretanto, no caso sub judice, há uma peculiaridade a ser considerada, consistente nas profundas alterações do modo de vida da família do postulante.
Constata-se, inicialmente, que no ano de 1959 o genitor do autor abriu uma firma individual, consoante declaração de firma individual e guias de recolhimento juntadas no processo administrativo, mantendo a atividade por logo período, diverso do informado pelo autor em juízo (PROCADM2, p. 1/5, evento 65). Deve-se levar em consideração, ainda, que já no ano de 1978 o requerente contraiu vínculo empregatício perante a Companhia de Cigarros Souza Cruz, após aprovação em concurso, conforme depoimento pessoal e anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS7, evento 01).
Assim, embora exista documentação que indique a propriedade de imóvel rural de propriedade da família, esta não constitui, por si só, prova inequívoca do alegado labor rural do autor.
Conclui-se, portanto, que o único indício do exercício das atividades agrícolas do postulante se trata da declaração emitida pela 16ª Circunscrição de Serviço Militar afirmando que o autor declarou que exercia a profissão de lavrador quando se alistou na Junta de Serviço Militar nº. 111 em 1975, lavrada em 15/10/2010 (CMILITA4, evento 01). Na Certidão de casamento do autor já consta a profissão como instrutor agrícola em 10/05/1980 (CERTCAS3, evento 01);
Cumpre registrar que, acerca da necessidade do lastro probatório mínimo, duas são as situações decorrentes do reconhecimento de labor rural. A primeira diz respeito aos trabalhadores rurais - desde sempre rurais - , que postulam os benefícios mínimos de que tratam os artigos 39, inciso I, e 143, ambos da Lei nº 8.213/91. A segunda se refere aos ex-trabalhadores rurais que buscam o reconhecimento desta espécie de labor para fins de concessão de benefícios previdenciários pelo RGPS por meio da benesse do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/91, como é o caso dos autos.
Ora, com respeito aos primeiros, é dizer, aos trabalhadores rurais que perseguem concessão de benefício mínimo, é razoável que a exigência de 'início de prova material' se satisfaça com apresentação de documentos idôneos que, ainda que distantes do tempo chamado 'período de carência', indiquem a condição de rurícola do segurado. Isto pela singela razão de que, em relação a estes trabalhadores que buscam benefício mínimo, opera presunção de que sempre trabalharam na lavoura, já que de regra inexiste qualquer indicativo de alteração de atividade. Os segurados rurais que fazem jus ao benefício mínimo nascem no campo, aprendem com a família e lá continuam. Evidentemente, em casos tais, que um único documento de registro público, possa por vezes atender o reclame de prova material. Mas não é só, as testemunhas de que se valem se referem ao que conhecem de modo geral, tendo conhecimento básico do exercício da atividade e sua continuidade ao longo da vida do segurado.
Já no que alude aos trabalhadores urbanos que buscam aproveitar o tempo rural para fins de concessão de benefícios calculados com base no salário-de-benefício (artigo 29, da Lei 8.13/91), como não ocorre aquela presunção de continuidade do exercício de atividade rural, é de se emprestar maior rigor à satisfação do que se tem por elementos materiais hábeis a confortar a prova testemunhal. Nestas hipóteses, a exigência de prova material não se compagina com apenas um elemento material, solto no espaço de tempo. Exige-se mais.
Não é de se olvidar que nestes casos de aproveitamento de tempo rural para fins previdenciários no RGPS, o reconhecimento do trabalho rural, pelo juiz, ganha em relevância. Cada dia de labor rural que tenha o magistrado por comprovado propiciará ao segurado trabalhador urbano, sem qualquer contribuição, a dispensa de um dia de trabalho para que faça jus à aposentadoria por tempo de contribuição. Cada ano de reconhecimento conduz à redução de um ano para a concessão de aposentadoria, tendo como desdobramento lógico a ausência de contribuição pelo ano dispensado e, mais, a antecipação da concessão da aposentadoria também em um ano. Como declarar sem certeza, se é que certeza existe?
Tem-se presente que os trabalhadores rurais em sua imensa maioria levam a cabo seus afazeres diários sem a preocupação em documentá-lo de molde a lhe possibilitar a inativação. Porém, é razoável a exigência de prova documental, não somente porque a prova testemunhal é sempre produzida já com o fim de se prestar à solução de controvérsia já instaurada, mas porque o gênero humano é precário no registro de datas e acontecimentos e ligeiro a auxiliar o próximo, notadamente quando a repercussão do auxílio não lhe atinge, ao menos diretamente.
Então a forma legal de se reduzir a concessão ilegal de benefícios previdenciários é acertada: deve haver documentação contemporânea atinente ao fato ou circunstância que se deseja comprovar.
De outro norte, é sabido que, conforme pacífica jurisprudência, podem ser ampliados, em determinados casos, os efeitos probantes dos documentos existentes no feito para aquém do marco inicial emprestado pela prova documental, especialmente em se tratando de trabalhadores volantes (boias-frias). Quanto a estes, a exigência de lastro probatório mínimo deve ser vista com temperamento, em razão da evidente dificuldade de obtenção de documentos comprobatórios do labor campesino.
Ocorre que, no caso dos autos, além da prova do labor rural ser frágil e escassa, a prova testemunhal não se mostrou satisfatória para a comprovação do labor rural, limitando-se a relatos superficiais de atividade rural. Note-se, ainda, que a existência de estabelecimento comercial do genitor do autor.
Como o vestígio material é escasso, a prova oral deveria ser convincente a ponto de não pairarem dúvidas sobre as atividades do requerente como trabalhador rural, o que não ocorreu.
É certo que o mero exercício de atividade urbana por um dos membros da família não descaracteriza, por si só, o regime de economia familiar do núcleo, consoante interpretação literal da Súmula 41 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais ('A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto').
Todavia, considerando todo o conjunto probatório dos autos, permanecem fundadas dúvidas sobre o exercício de atividades rurais pelo requerente no período em análise. Como o genitor do autor possuiu vínculo urbano, o reconhecimento de período rural necessitaria da comprovação inequívoca de que as atividades agrícolas eram exercidas pelos demais membros do grupo, e de que eram indispensável à manutenção da família.
Na hipótese trazida à apreciação, não existem elementos de convicção que permitam concluir que as atividades exercidas pela parte autora eram, de fato, indispensáveis para a manutenção do grupo familiar.
Repise-se que, como o genitor do autor possuía vínculo urbano, as atividades rurais precisariam ser cabalmente demonstradas nos autos, o que não ocorreu.
Cumpre salientar que o regime de economia familiar é definido pela Lei nº 8213/91, artigo 11, §1º, como aquele 'em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do grupo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes'. Portanto, deve-se exigir que a dedicação do trabalhador ao cultivo da terra seja substancial, sem a qual não possa subsistir.
O fim buscado pelo legislador foi amparar pessoas, que, se excluídas do rol dos segurados, não teriam, na velhice ou na doença, como fazer frente às necessidades mais básicas, uma vez que nunca colaboraram para a Previdência. Daí ser necessária a exata comprovação da condição de segurado especial, nos termos do artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, por ser uma exceção ao princípio da contraprestação.
No caso em tela, embora exista indício do exercício de atividade rural pelo requerente - o que é revelado pelo documento emitido pela 16ª Circunscrição de Serviço Militar -, o conjunto probatório dos autos permite concluir que a manutenção da família advinha principalmente da renda o pai do autor, que supria as principais necessidades do lar, tornando apenas complementar a renda proveniente das atividades agrícolas eventualmente exercidas pelo autor, conforme acima fundamentado.
Nesse viés, mostra-se inviável o reconhecimento do período postulado nos autos, uma vez que, ainda que o autor tenha exercido atividades rurais nos períodos de 19/07/1969 a 31/12/1974 e 01/01/1976 a 29/03/1978 - o que não restou devidamente comprovado nos autos -, não ficou configurada a mútua dependência econômica, inerente ao regime de economia familiar, o que afasta, por conseguinte, a qualidade de segurado especial do requerente.
Destarte, impossível o reconhecimento do o período rural pleiteado na exordial. Nesses termos, a improcedência da pretensão inicial medida que se impõe.
Cabe fazer algumas considerações a respeito dos argumentos vertidos na apelação.
Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. O dispositivo refere-se aos beneficiários do FUNRURAL, categoria que abrangia tanto o empregado rural como o produtor rural em regime de economia familiar. A jurisprudência admite também o cômputo do período de atividade rural de todos os membros do grupo familiar incluídos na categoria de segurado especial que trabalhem em regime de economia familiar, com base no art. 11, inciso VII, da Lei nº 8.213/1991, sem o recolhimento de contribuições.
Para caracterizar o regime de economia familiar, é necessário que o trabalho dos membros da família seja indispensável à própria sobrevivência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração. Por essa razão, o § 9º do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, afasta a qualidade de segurado especial do membro de grupo familiar que exerça outra atividade enquadrada no regime geral de previdência social ou em outro regime. No entanto, se as circunstâncias do caso concreto indicam que a principal fonte de subsistência do grupo familiar continua sendo a atividade rural, a descaracterização da condição de segurado especial do integrante que trabalha em outra atividade não afeta todo o grupo familiar, já que os demais membros da família podem dedicar-se à atividade agrícola de forma individual.
Ainda que a legislação previdenciária admita o exercício individual da atividade pelo segurado especial, não se pode ignorar a repercussão da atividade urbana realizada por um dos integrantes da família para a comprovação do exercício da atividade rural pelos demais. A relevância da questão manifesta-se no caso em que as provas materiais do labor rural estão em nome do membro do grupo familiar que não ostenta a qualidade de segurado especial, por possuir fonte de renda derivada de atividade urbana. A matéria já foi enfrentada pelo STJ no REsp nº 1.304.479, julgado no regime dos recursos repetitivos, firmando-se entendimento no sentido de que, descaracterizado o regime de economia familiar, não é possível a extensão da prova em nome daquele que exerce trabalho urbano aos demais membros da família. Eis a ementa do julgado:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas provas em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está em conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1304479/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
No caso presente, a firma individual do pai do autor foi aberta em 1959. No período de 1969 a 1972, houve o recolhimento de contribuições à previdência social como contribuinte individual. O fato de a atividade comercial ter sido exercida junto à propriedade rural não a descaracteriza como urbana, nem demonstra que a renda obtida no comércio fosse secundária à atividade rural. Como bem assinalou a sentença, inexiste prova inequívoca de que as atividades agrícolas fossem indispensáveis à manutenção da família entre 19/07/1969 a 31/12/1974 e 01/01/1976 a 29/03/1978. Para tanto, imprescindível que fosse apresentado início de prova material relativo ao próprio autor que demonstrasse efetivamente o labor rural no período. O único documento em nome da parte autora é o certificado de dispensa do serviço militar, dando conta que foi declarada a profissão de lavrador em 1975. Cabe assinalar, ainda, que o pai do autor declarou a profissão de comerciante na escritura pública de cessão de direitos hereditários, lavrada em 05/03/1970 (evento 1, out10, fl. 07/08). Assim, tenho por não comprovado o exercício individual da atividade rural pelo autor no período pleiteado.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005166-15.2011.4.04.7009/PR
ORIGEM: PR 50051661520114047009
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | JOAO MIELKE |
ADVOGADO | : | JOÃO MANOEL GROTT |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/08/2017, na seqüência 102, disponibilizada no DE de 15/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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| Signatário (a): | Suzana Roessing |
| Data e Hora: | 29/08/2017 17:12 |
