Apelação Cível Nº 5002357-43.2016.4.04.7117/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
APELADO: GILBERTO ROMAN (RÉU)
RELATÓRIO
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS ajuizou ação de cobrança em 31/05/2016, objetivando a condenação de GILBERTO ROMAN a ressarcir à Previdência Social todos os valores que recebeu indevidamente a título de benefício de auxílio-doença (NB 546.969.301-1) no período compreendido entre 01/07/2011 e 19/09/2013, por erro administrativo ou errônea interpretação da lei. Assevera que o benefício foi indevido porque houve concomitante recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado, caracterizando exercício de atividade.
Devidamente intimado por meio de mandado (
), a parte ré deixou transcorrer in albis o prazo de contestação (Evento 13), razão pela qual foi decretada sua revelia ( ).Sobreveio sentença, proferida em 10/01/2017 nos seguintes termos (
):III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido pelo INSS, extinguindo o processo com resolução do mérito, forte no art. 487, I do Código de Processo Civil.
Embora sucumbente, deixo de condenar o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor da parte requerida tendo em vista que o réu é revel, não tendo procurador constituído.
Custas ex lege (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Tendo em conta que a condenação em desfavor do INSS representa valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, não está sujeita a decisão a reexame necessário (ex vi art. 496, §3º, I, do CPC).
Interposto recurso de apelação, intime-se a parte adversa para apresentar contrarrazões no prazo legal (art. 183, caput, e/ou 1.010, §1º, do CPC). Após, deve ser dada vista ao recorrente caso sejam suscitadas pelo recorrido as matérias referidas no §1º do art. 1.009, nos termos do §2º do mesmo dispositivo. Por fim, remetam-se os autos ao Egrégio TRF da 4ª Região, nos termos do 1.010, §3º, do Código de Processo Civil, independentemente de juízo de admissibilidade.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
O INSS, em suas razões, requer, em síntese, a devolução dos valores recebidos indevidamente pelo autor, ainda que de boa-fé, por erro administrativo ou errônea interpretação da lei. Sustenta que a má-fé do segurado reside no recolhimento de contribuições previdenciárias enquanto recebia o benefício previdenciário por incapacidade.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Nesta instância, o feito foi sobrestado no aguardo do julgamento do Tema 979 do STJ - Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração da Previdência Social.
É o relatório.
VOTO
Tema 979 do STJ
Em face do julgamento do Tema 979 pela Primeira Seção do STJ, não mais remanesce motivo para a suspensão do feito, pelo que determino seu levantamento.
Juízo de Admissibilidade
Recebo o recurso de apelação, visto que adequado e tempestivo.
Da má-fé do segurado
Alega que a má-fé da parte autora reside no recolhimento de contribuições previdenciárias enquanto recebia o benefício previdenciário por incapacidade.
Extrai-se da sentença recorrida a bem lançada análise do feito, realizada pelo magistrado a quo (
):Não diferente é a certeza de que até prova em contrário, as aferições técnicas levadas a efeito durante a manutenção do benefício gozam da mesma presunção acima destacada, o que significa dizer que para revisão do ato de concessão das prestações a título de auxílio doença, a autarquia federal deve necessariamente instruir os autos com provas cabais acerca do elemento de fato que reputa ocorrer no caso concreto.
No entanto, o que observo é que o ato administrativo de revisão das prestações pagas ao segurado a título de auxílio doença decorre de mera suposição. Desencadeando a exigência do crédito a título de ressarcimento, interpretou a Administração que o segurado teria retornado às suas atividades laborais, pelo fato deste ter dado sequência aos recolhimentos que vinha fazendo em GFIP desde a competência 05/2008 - período anterior ao benefício de incapacidade, conforme revela a consulta CNIS (PROCADM2, p. 12).
Como se vê, o fundamento único que ampara o pretenso ressarcimento de valores baseia-se em uma carga indiciária de exercício de atividade laboral enquanto incapacitado o segurado. Ocorre que tal elemento, por si só, não é capaz de afastar a elementar da concessão do benefício, que diz respeito à efetiva incapacidade para o exercício da atividade profissional, aferição de cunho nitidamente técnico, que não pode ser substituído pela frágil constatação de recolhimentos no CNIS, na qualidade de contribuinte individual.
Fato é que este registro de modo algum conduz à necessária recuperação do segurado, até porque o recolhimento já vinha anteriormente a data de início do benefício, demonstrando mais se prestar a um acréscimo ou continuidade de contribuições para futura aposentadoria.
Ademais, embora não se trate do caso em tela, o próprio regulamento da previdência social prevê hipóteses de concessão do benefício previdenciário de auxílio doença de modo paralelo ao exercício de outra atividade não comprometida pela incapacidade do segurado (art. 73, do Decreto nº 3.048/99).
Fato é que constitui ônus do autor a demonstração da efetiva capacidade laboral ao tempo do gozo do auxílio doença cessado, que leve à má-fé no recebimento do benefício. Com efeito, há uma verdadeira inversão do ônus probatório, em razão da presunção de boa-fé e da natureza alimentar dos benefícios, cabendo ao INSS fazer prova de que o segurado agiu de forma maliciosa, hipótese em que deve restituir os valores recebidos.
Por estar em consonância com o entendimento desta Relatoria, uma vez que a má-fé não se presume, a sentença merece ser mantida no tópico pelos seus próprios fundamentos os quais adoto como razões de decidir.
Da devolução de valores recebidos por interpretação errônea, erro material ou operacional do INSS
O poder de autotutela da Autarquia Previdenciária, expresso no poder-dever de revisar e de anular os atos de concessão de benefícios quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF), decorre da vinculação dos atos administrativos ao princípio da legalidade e encontra limite temporal em face do princípio da segurança jurídica.
A Primeira Seção do STJ no julgamento do REsp 1381734/RN, afetado à sistemática dos recursos repetitivos (Tema 979), firmou a seguinte tese:
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
Ocorre que a modulação dos efeitos do julgado restringiu sua aplicabilidade aos processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do acórdão (23/04/2021).
O presente feito foi ajuizado em 31/05/2016; aplica-se, portanto, o entendimento anteriormente firmado nesta Corte de que em face da natureza alimentar do benefício previdenciário não cabe a devolução dos valores recebidos de boa-fé no interregno 01/07/2011 e 19/09/2013 (NB 546.969.301-1), os quais se presumem consumidos para a manutenção da subsistência do beneficiário hipossuficiente.
Ônus de sucumbência
Nada obstante a sucumbência da Autarquia, o julgador monocrático deixou de condená-lo ao pagamento dos honorários advocatícios em face da revelia parte ré, sem procurador constituído.
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais, a teor do que preceitua o art. 4º da Lei n. 9.289/96.
Conclusão
Mantida a sentença de improcedência.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
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Apelação Cível Nº 5002357-43.2016.4.04.7117/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
APELADO: GILBERTO ROMAN (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE COBRANÇA. VALORES RECEBIDOS POR ERRO DO INSS. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. MÁ-FÉ. NÃO COMPROVADA. TEMA 979 DO STJ. DEVOLUÇÃO INDEVIDA.
1. A ausência de elementos nos autos que permitam inferir que o segurado tenha tido a intenção de induzir o Instituto Previdenciário em erro ou de alterar a verdade dos fatos, causa óbice ao reconhecimento de má-fé. 2. Nas ações ajuizadas anteriormente ao julgamento do Tema 979 do STJ, aplica-se o entendimento firmado à época nesta Corte, no sentido de que em face da natureza alimentar do benefício previdenciário, não cabe a devolução dos valores recebidos de boa-fé, os quais se presumem consumidos para a manutenção da subsistência do beneficiário hipossuficiente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de dezembro de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 06/12/2021 A 14/12/2021
Apelação Cível Nº 5002357-43.2016.4.04.7117/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PRESIDENTE: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
APELADO: GILBERTO ROMAN (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/12/2021, às 00:00, a 14/12/2021, às 16:00, na sequência 1552, disponibilizada no DE de 25/11/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Juíza Federal ANDRÉIA CASTRO DIAS MOREIRA
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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