| D.E. Publicado em 07/07/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016862-87.2011.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | RENATO BRAZ ZAPPANI |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE TEMPO DE SERVIÇO. RECONHECIMENTO DE LABOR PRESTADO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. ILEGITIMIDADE DO INSS QUANTO AO PEDIDO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA MATERIAL E TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CTPS. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Fixada pelo STJ a obrigatoriedade do reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público na REsp 1101727/PR, a previsão do art. 475 do CPC torna-se regra, admitido o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos. Conhecida a remessa oficial de sentença meramente declaratória, dado o valor incerto do direito controvertido.
2. Considerando que à época da prestação dos serviços o autor estava vinculado a Regime Próprio de Previdência Social, o INSS é parte ilegítima com relação a pedido de reconhecimento da natureza especial das atividades e sua conversão para tempo comum. Extinto, sem resolução de mérito, o pedido de reconhecimento da especialidade do labor.
3. É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural até 31-10-1991 independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência.
4. A partir de novembro de 1991, pretendendo o segurado especial computar tempo rural para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento das contribuições facultativas (Súmula 272 do STJ).
5. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
6. As anotações constantes da CTPS gozam de presunção juris tantum do vínculo empregatício, salvo alegada fraude, do que não se cuida na espécie.
7. Tendo em vista a sucumbência recíproca e proporcional, devem ser os honorários compensados, na forma do art. 21 do CPC/73 e Súmula 360 do STJ.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de junho de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8263678v7 e, se solicitado, do código CRC 250C9CAF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 30/06/2016 11:21 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016862-87.2011.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | RENATO BRAZ ZAPPANI |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos para:
"a) declarar o trabalho urbano desenvolvido pelo autor na Indústria de Madeiras Berthier de Almeida Ltda entre 01/04/1977 a 01/01/1979; b) retificar o período de trabalho rural desenvolvido pelo autor entre 05/07/1973 a 31/12/1977 para 05/07/1973 a 31/03/1977, devendo o período compreendido entre 01/04/1977 a 01/01/1979 ser computado como labor urbano nos termos do item "a"; c) declarar o labor rural desenvolvido pelo autor entre 02/08/1979 e 31/07/1983."
Diante da sucumbência recíproca, a parte autora foi condenada ao pagamento da metade das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.200,00, suspensa a exigibilidade em razão do art. 12, da Lei 1.060/50. A autarquia, por sua vez, foi condenada ao pagamento de 25% das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.200,00. Foi autorizada a compensação da verba honorária.
A parte autora, nas suas razões recursais, sustenta não haver razões para o não reconhecimento do labor rural no interregno de 01/08/1983 a 31/12/1983, especialmente em razão da presunção de continuidade da atividade agrícola. Outrossim, sustenta comprovada a especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 01/03/1994 a 29/02/1996 e de 29/02/1996 a 01/10/2007 em que laborou junto à Prefeitura Municipal de Abelardo Luz, sendo possível a contagem recíproca para fins de aposentadoria perante o Regime Geral de Previdência Social. Assevera, ainda, a impossibilidade de compensação dos honorários advocatícios.
Com contrarrazões, por força do recurso voluntário interposto pela parte, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (a saber: metas do CNJ), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da remessa oficial
O Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, regulada pelo art. 543-C, do CPC, decidiu que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público. (REsp 1101727/PR, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 03/12/2009).
Assim, o reexame necessário, previsto no art. 475 do CPC, é regra, admitindo-se o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
No caso dos autos, trata-se de sentença meramente declaratória, cujo valor do direito controvertido é incerto, devendo ser conhecida a remessa oficial.
Do mérito
A parte autora ajuizou a presente ação declaratória visando o reconhecimento e averbação de períodos de tempo urbano, rural e especial para fins de futura concessão de aposentadoria.
Requereu, assim:
a) o reconhecimento de tempo urbano compreendido entre 01/04/1977 a 01/01/1979, laborado junto à empresa Indústria de Madeiras Berthier de Almeida Ltda.;
b) o consequente afastamento do reconhecimento efetuado administrativamente do período de 01/04/1977 a 31/12/1977 como tempo rural, eis que exercia atividade urbana;
c) o reconhecimento, como tempo rural, do período de 02/08/1979 a 31/12/1983; e
d) o reconhecimento da especialidade e conversão em comum (pelo fator 1,4) das atividades desempenhadas até 28/05/1998 junto ao Município de Abelardo Luz (períodos de 01/03/1994 a 29/02/1996 e de 29/06/1996 a 01/10/2007.
Da ilegitimidade do INSS quanto ao reconhecimento de especialidade postulado
Requer a parte autora o reconhecimento da especialidade e a conversão em tempo comum dos períodos laborados sob condições prejudiciais à saúde até 28/05/1998 junto ao Município de Abelardo Luz.
A sentença julgou improcedente o pedido considerando que, no período postulado, o autor estava vinculado ao ente público pelo regime estatutário, não fazendo jus à conversão pleiteada.
Com efeito, nos períodos de 01/03/1994 a 29/02/1996 e de 01/03/1996 a 01/10/2007 (DER), o autor exerceu, respectivamente, atividades de serviços gerais e operador de escavadeira junto ao Município de Abelardo Luz (fls. 26 e 66).
De acordo com a Certidão de Tempo de Serviço expedida pelo ente público (fl. 63), até 31/08/1999 os servidores municipais de Abelardo Luz possuíam Regime Próprio de Previdência Social e contribuíam para o IPESC - Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina; apenas a partir de 01/09/1999 é que os ocupantes de cargos efetivos do Município passaram a verter contribuições previdenciárias ao Regime Geral de Previdência Social.
Constata-se, assim, que as atividades com relação às quais pretende o autor ver reconhecida a especialidade e convertidas para tempo comum (desempenhadas até 28/05/1998), foram, em sua integralidade, desempenhadas sob o Regime Próprio de Previdência Social vigente à época.
Destarte, a análise da caracterização da natureza especial deve ser postulada perante o ente público/regime de previdência a que o servidor estava vinculado à época da prestação dos serviços. Uma vez que o trabalhador não estava vinculado ao Regime Geral de Previdência Social na época em que desempenhadas as atividades reputadas especiais, o INSS é parte ilegítima quanto ao pedido de reconhecimento da especialidade.
A possibilidade do cômputo de período especial prestado no Regime Próprio devidamente convertido em comum mediante a contagem recíproca de tempo de serviço a que se refere o art. 40, § 9º, da CF só pode ser analisada após o reconhecimento de tal especialidade perante o RPPS e a expedição da respectiva Certidão de Tempo de Serviço que o ateste.
Tenho, portanto, que, por força da remessa oficial, deve ser reconhecida a ilegitimidade do INSS com relação ao pedido de reconhecimento e conversão de tempo especial em comum, uma vez que, à época da prestação do serviço, o autor estava vinculado a Regime Próprio de Previdência Social; julgando-o extinto, sem resolução do mérito (art. 485, inciso VI, do NCPC). Fica prejudicado o apelo da parte autora quanto ao tópico.
Do tempo de serviço urbano
O tempo de serviço urbano pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo por motivo de força maior ou caso fortuito, a teor do previsto no artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91.
As anotações constantes na CTPS gozam de presunção juris tantum de veracidade (Súmula 12 do TST, Decreto 3.048/99, art. 19), dos vínculos empregatícios ali registrados, presumindo-se a existência de relação jurídica válida e perfeita entre empregado e empregador, salvo eventual fraude, do que não se cuida na espécie. Não obsta o reconhecimento do tempo de serviço assim comprovado a falta de recolhimento das contribuições previdenciárias, porquanto o encargo incumbe ao empregador, nos termos do art. 30, inc. I, alíneas a e b, da Lei nº 8.212/91; não se pode prejudicar o trabalhador pela desídia de seu dirigente laboral em honrar seus compromissos junto à Previdência Social, competindo à autarquia previdenciária o dever de fiscalizar e exigir o cumprimento dessa obrigação legal.
A propósito:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CTPS. PROVA PLENA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E FGTS. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. TRABALHO DESEMPENHADO POR FILHO NA EMPRESA DO PAI. RECONHECIMENTO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. EXISTÊNCIA DE RASURAS NAS ANOTAÇÕES DA CTPS. UTILIZAÇÃO DOS DADOS RELATIVOS A FÉRIAS E ALTERAÇÕES SALARIAIS, CONSTANTES DA CARTEIRA DE TRABALHO. 1. As anotações constantes de CTPS, salvo prova de fraude, constituem prova plena para efeitos de contagem de tempo de serviço. 2. Irrelevante, para o cômputo do tempo de serviço, o fato de não terem sido recolhidas as devidas contribuições previdenciárias e os valores relativos ao FGTS, uma vez que tais obrigações tocavam apenas ao empregador, conforme a legislação vigente à época da prestação dos serviços. (...)
(TRF4, EINF 0005094-08.2005.404.7112, Terceira Seção, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 30/01/2012)
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO COMO EMPREGADO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. BOIA FRIA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O tempo de serviço como empregado pode ser comprovado por início de prova material ou por meio de CTPS, desde que não haja prova de fraude, e deve ser reconhecido independente da demonstração do recolhimento das contribuições, visto que de responsabilidade do empregador.
(...)
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015700-57.2011.404.9999, 5ª Turma, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, D.E. 25/04/2014, PUBLICAÇÃO EM 28/04/2014)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. ANOTAÇÕES CONSTANTES DE CTPS. RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. 1. As anotações constantes de CTPS, salvo prova de fraude, constituem prova plena para efeitos de contagem de tempo de serviço. 2. A assinatura da carteira de trabalho e o recolhimento das contribuições previdenciárias são de responsabilidade do empregador - sendo atribuição do INSS a sua fiscalização -, de maneira que a ausência de registro das contribuições nesse período não pode vir a prejudicar o reconhecimento da qualidade de segurado do falecido. 3. No caso dos autos, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto implementados os requisitos para sua concessão. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2007.72.00.009150-0, 6ª TURMA, Des. Federal NÉFI CORDEIRO, POR UNANIMIDADE, D.E. 17/01/2014, PUBLICAÇÃO EM 20/01/2014)
Ainda que não se verifique no CNIS o recolhimento de contribuições previdenciárias relativas a vínculos constantes da CTPS, o art. 32 do Decreto 3.048/99 autoriza que estes sejam considerados como período contributivo, definindo como tal o "conjunto de meses em que houve ou deveria ter havido contribuição em razão do exercício de atividade remunerada sujeita a filiação obrigatória ao regime de que trata este Regulamento" (§ 22, I).
Postulava o autor o reconhecimento e averbação do período de 01/04/1977 a 01/01/1979, em que teria exercido atividades junto à empresa Indústria de Madeiras Berthler de Almeida Ltda.
In casu, as anotações constantes na CTPS (fl. 55) são hígidas para comprovar o tempo de serviço postulado, não tendo sido objeto de impugnação específica pelo INSS, não apresentam rasuras e apresentam os vínculos empregatícios em ordem cronológica.
Ademais, as testemunhas Tarcílio Martarello e Vilmar Antônio Zatta, ouvidas em audiência de instrução (mídia de fl. 249), foram uníssonas em confirmar as alegações do autor, tendo ambos trabalhado também na mesma serraria.
Conclusão: Fica mantida a sentença quanto ao reconhecimento do seguinte lapso de tempo de serviço urbano comum de 01/04/1977 a 01/01/1979 (1 ano, 9 meses e 1 dia).
Nesse passo, confirma-se também o pleito de retificação do tempo rural averbado pelo INSS na via administrativa. Com efeito, por ocasião do requerimento administrativo, a autarquia reconheceu e averbou, como tempo rural, os períodos de 05/07/1973 a 31/12/1977 e de 01/01/1984 a 30/10/1991. Uma vez reconhecido que, entre 01/04/1977 e 01/01/1979 o autor laborava junto à Indústria de Madeiras Berthler de Almeida Ltda., não é possível computar o interregno de 01/04/1977 a 31/12/1977 também como tempo rural.
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Também não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Em relação aos boias-frias, cujo trabalho rural é caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal. Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
Como destacado acima, na via administrativa foi reconhecido o tempo de atividade rural em regime de economia familiar nos períodos: de 05/07/1973 a 31/12/1977 e de 01/01/1984 a 30/10/1991.
Requerendo a retificação do termo final do primeiro período para 31/03/1977 (o que já foi analisado no tópico anterior), o autor postulava, na inicial, o reconhecimento do exercício de atividade rural em regime de economia familiar também com relação ao período de 02/08/1979 a 31/12/1983.
A sentença, entretanto, reconheceu como tempo rural apenas o lapso de 02/08/1979 a 31/07/1983, mas partindo do pressuposto de que assim havia sido postulado na inicial. Na apelação, insurge-se a parte autora, requerendo o reconhecimento também do período de 01/08/1983 a 31/12/1983.
Com efeito, para a comprovação do trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos:
"- Certidão do Incra de fl. 27 que comprova a propriedade rural do autor e de seu irmão entre 1972 a 1991;
- Certidão do CRI de Xanxerê que comprova a propriedade de imóvel rural pelo autor e seu irmão, adquirida em 1970 (fl. 28), da qual se originou a matrícula n° 1151 (fls. 47/51) da qual se extrai que o autor vendeu parte do imóvel em 1983, arrendou parte do imóvel rural em 1985, vendeu outra parte em 1994 e o remanescente em 2001;
- Certidão de Nascimento de filho do autor, lavrada em 1982 na qual consta a profissão do autor como sendo agricultor (fl. 31);
- Certidão de Nascimento de filha do autor, lavrada em 1985 na qual consta a profissão do autor como sendo agricultor (fl. 32);
- cartão de registro de produtor datado de 1988 (fl. 33);
- documento de sindicato dos produtores rurais datado de 1981 apontando o autor como sendo agricultor (fl. 34);
- ficha cadastral do autor em sindicato de trabalhadores rurais datada de 1981 (fl. 35);
- comprovantes do recolhimento de mensalidades ao sindicato dos trabalhadores rurais datadas de 1981 a 1992 (fl. 36);
- certidão do TRE na qual consta a profissão declarada pelo autor como sendo agricultor (fl. 37);
- Certidão de casamento dos pais do autor datada de 1957 na qual consta a profissão dos pais como sendo agricultores (fl. 38);
- Certidão de Nascimento de irmã do autor datada de 1958 na qual consta que a profissão dos pais do autor era "agricultores" (fl. 39);
- Certidão de Nascimento de irmã do autor datada de 1976 na qual consta que a profissão dos pais do autor era "agricultores" (fl. 40);
- controle de notas fiscais de produtor rural comprovando a emissão de notas pelo autor entre 1988 e 1993 (fls. 41/42);
- Boletim escolar do autor datado de 1973 no qual consta a profissão do pai como sendo agricultor (fl. 44), sendo extemporânea ao período que pretende ver reconhecido;
- nota fiscal de produtor datada de 1989 (fl. 45), sendo extemporânea ao período que pretende ver reconhecido;
- nota fiscal de entrega de produtos datada de 1989 (fl. 46), sendo extemporânea ao período que pretende ver reconhecido;
- certidão do CRI de Xanxerê comprovando a aquisição de imóvel rural pelo pai do autor em 1967 (fl. 52) da qual se originou a matrícula n° 7.060 na qual se constata que até 1999 a propriedade ainda era do pai do autor (fl. 53), servindo de prova apenas até 1982, ano em que o autor casou;
- entrevista rural de fls. 57/58 na qual o autor afirma que residiu no imóvel rural até 1976 tendo retornado para a agricultura em 1980 na qual laborou até 1993;
- ficha cadastral de produtor (fl. 60) da qual se extrai que o autor foi admitido como mini produtor rural em 1986, sendo extemporânea ao período que pretende ver reconhecido;
- Certidão de Casamento de irmão do autor datada de 1996 (fl. 61) na qual se declarou agricultor por ocasião do registro, sendo extemporânea ao período que pretende ver reconhecido." (fls. 256/257)
Do depoimento pessoal do autor (mídia da fl. 249), colhe-se que trabalhou com os pais e os irmãos na agricultura desde os 12 até aproximadamente os 23 anos de idade, quando foi trabalhar em uma serraria; que depois de casar voltou para a lavoura, onde permaneceu por mais 11 anos, plantando milho, feijão e soja com a família e com o uso esporádico de máquinas para plantar.
A prova testemunhal corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais com os pais e irmãos no interior do Município de São Domingos, na localidade de Linha Progresso desde criança até mais ou menos os 23 anos; e que, após 2 anos de trabalho, retornou às lides rurais onde ficou por mais 10 anos, aproximadamente.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material e que a prova testemunhal é precisa quanto ao exercício da atividade rural durante todo o período postulado, inclusive de 01/08/1983 a 31/12/1983 (lapso não contemplado pela sentença).
Ressalta-se, novamente, que não se exige prova documental com relação a todos os anos que se pretende comprovar; nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural. No caso, mesmo que não haja prova material relativa ao ano de 1983, a existência de provas dos anos de 1982 e 1984, conjugada ao depoimento das testemunhas, faz presumir-se a continuidade do labor agrícola, sendo perfeitamente possível o seu reconhecimento.
Conclusão: Fica mantida a sentença quanto ao reconhecimento do seguinte lapso de tempo de serviço rural: de 02/08/1979 a 31/07/1983. Outrossim, reconhece-se também como tempo rural o período de 01/08/1983 a 31/12/1983; totalizando 4 anos e 5 meses de tempo de serviço.
Da Possibilidade de compensação dos honorários advocatícios - sucumbência recíproca e proporcional
Tendo em vista a sucumbência recíproca e proporcional, devem ser os honorários compensados, na forma do art. 21 do CPC/73 e Súmula 360 do STJ.
Ressalto, aqui, que o advento do art. 23 da Lei 8.906/94 apenas alterou a titularidade para o recebimento dos honorários advocatícios, sem revogar o art. 21 do Código Adjetivo. A jurisprudência assentou:
"AGRAVO REGIMENTAL. FGTS. PERDA DE PARTE MÍNIMA DO PEDIDO INICIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. INCIDÊNCIA DO ART. 21, CAPUT, DO CPC. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E DESPESAS PROCESSUAIS. COMPENSAÇÃO. LEI 8906/94 - ESTATUTO DO ADVOGADO.
1. Nas ações onde se pleiteiam a correção monetária dos saldos da conta vinculada ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, restando caracterizada a sucumbência recíproca, impõe-se a compensação entre os litigantes das despesas e honorários advocatícios proporcionalmente, nos termos do art. 21, caput, do Código de Processo Civil.
2. O art. 23 da Lei n.º 8.906/94 - Estatuto da Advocacia - assegura pertencer ao advogado da causa a verba honorária incluída na condenação, todavia, permanecem aplicáveis as normas do Código de Processo Civil relativas ao tema, de sorte que pode o juiz compensar os honorários, sem que importe em violação à referida legislação específica.
3. Agravo regimental a que se nega provimento"
(AGREsp nº 484.172/SP, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ de 01.09.03)
Destaca-se, por oportuno, que tendo sido reconhecida a sucumbência recíproca por sentença proferida sob a égide do CPC de 1973, não se aplica a vedação do art. 85, § 14, do Novo Código de Processo Civil.
Das custas
Também em razão da sucumbência recíproca, as custas devem ser repartidas proporcionalmente entre as partes; suspensa, entretanto, a exigibilidade com relação à parte autora por ser beneficiária da AJG e devendo a autarquia responder por metade das custas devidas, havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual de Santa Catarina, a teor do que dispõe a Lei Complementar nº 156/97 desse Estado, em seu art. 33, parágrafo único, na redação dada pela Lei Complementar nº 161/97.
Conclusão
A remessa oficial, tida por interposta, foi parcialmente provida para o fim de julgar extinto, sem resolução de mérito, o pedido de reconhecimento e conversão de tempo especial, dada a ilegitimidade passiva do INSS no caso específico; prejudicado o apelo da parte autora quanto ao tópico.
O apelo da parte autora, por sua vez, na parte que subsistente, foi parcialmente provido para o fim de reconhecer como tempo rural também o período de 01/08/1983 a 31/12/1983.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação da parte autora.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/06/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016862-87.2011.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00022830920078240001
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr.Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | RENATO BRAZ ZAPPANI |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/06/2016, na seqüência 2, disponibilizada no DE de 07/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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