Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória, com fundamento no art. 966, inciso V, do CPC, contra acórdão prolatado nos autos da ação ordinária nº 50026392620164047103/RS, transitada em julgado em 14-6-2018, na qual o INSS foi condenado, em sede de recurso, à revisão da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição (professor - espécie 57) da parte autora, mediante a exclusão da incidência do fator previdenciário.
O INSS aduz que o acórdão rescindendo violou literal disposição de lei (Lei n. 8.213/1991, art. 29, inciso I e § 9º, II e III). Sustenta que é inaplicável a Súmula 343 do STF, por duas razões: 1) o aresto combatido está baseado em declaração de inconstitucionalidade de normas legais, conforme reconhecido expressamente em seu texto, e, conforme jurisprudência pacífica deste TRF da 4ª Região, quando a questão é constitucional, a Súmula 343/STF somente se aplica se houver ocorrido mudança de um entendimento que já existia no STF, isto é, quando o acórdão rescindendo esteve baseado em entendimento do STF que, posteriormente, veio a ser alterado. Argui que o STF jamais adotou tese contrária à defendida pelo INSS sobre a incidência do fator previdenciário nas aposentadorias de professor. Destaca que precedente tão antigo como a ADI 2.111-MC já declarava o 'art. 29, "caput", incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91 constitucionais, sem fazer ressalvas'; 2) sob a ótica infraconstitucional, a questão já estava pacificada pelo STJ ao tempo do acórdão rescindendo (como ainda está hoje), em sentido contrário ao que entendeu este Tribunal Regional, logo, o fato demonstra que não havia 'controvérsia nos tribunais', mas apenas decisão do próprio tribunal contrariando a interpretação uniformizada do STJ e do STF. Por conseguinte, em juízo rescisório, deve ser mantida a sentença de improcedência proferida no processo de conhecimento originário com reconhecimento da aplicabilidade do fator previdenciário no cálculo da renda mensal do benefício. Requer a antecipação dos efeitos da tutela para suspender tanto a fase de cumprimento nos autos originários, quanto o acréscimo da renda mensal decorrente da decisão rescindenda, até final julgamento desta rescisória.
Indeferida a liminar requestada (ev. 2).
A ré Simara Teresinha Saldanha Migotto, devidamente citada (evento 8), permaneceu silente (evento 10), motivo pelo qual foi declarada a sua revelia, sem, contudo, acarretar-lhe a presunção prevista no art. 344 do CPC.
Vieram os autos para julgamento.
O feito foi retirado de pauta na sessão do dia 26-8-2020.
É o relatório.
Peço dia.
Documento eletrônico assinado por FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001948842v5 e do código CRC f7ae97f5.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FERNANDO QUADROS DA SILVA
Data e Hora: 30/4/2021, às 4:40:42
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
VOTO
DIREITO INTERTEMPORAL
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16-3-2015, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinadas segundo as normas do CPC de 2015 tão somente as ações rescisórias ajuizadas a contar do dia 18-3-2016.
TEMPESTIVIDADE DA AÇÃO
A ação rescisória foi movida dentro do prazo decadencial de 2 anos, nos termos do art. 975 do CPC, visto que o trânsito em julgado do acórdão rescindendo ocorreu em 14-6-2018, e o ajuizamento da presente ação deu-se em 2-3-2020.
SÚMULA Nº 343 DO STF
Quanto à arguição de violação à literal disposição de lei pelo acórdão, impõe-se examinar a demanda frente ao disposto na Súmula nº 343, do Supremo Tribunal Federal, cujo teor é o seguinte:
Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.
Conforme interpretação conferida pela Corte Especial deste Tribunal Regional Federal ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 590.809/RS, o critério para definir se a Súmula nº 343 do STF se aplica em matéria constitucional é a existência de firme posicionamento do Supremo Tribunal Federal que ulteriormente tenha sido modificado.
Nesse sentido, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. DESAPOSENTAÇÃO. SÚMULA 343 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INAPLICABILIDADE.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 590.809/RS, assentou que a superveniente alteração de sua jurisprudência não autoriza, por si só, a rescisão de decisão proferida à luz de entendimento daquele Tribunal Superior que à época de sua prolação era firme.
2. O precedente originado do julgamento do RE 590.809/RS não se aplica nas ações rescisórias que visam desconstituir decisões que reconheceram o direito à desaposentação.
3. O Supremo Tribunal Federal não tinha uma posição uniforme e firme no sentido de que os segurados têm direito à desaposentação. Nunca sinalizou, de forma pacífica, óptica nesse sentido, a ser seguida pelos tribunais.
4. No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação', sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91 (RE 661.256/DF, submetido à sistemática de repercussão geral - Tema 503). (AR nº 5027168-83.2013.4.04.0000, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, julgado em 26-10-2017).
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. TR. DÉBITO JUDICIAL DA FAZENDA PÚBLICA. PERÍODO ANTERIOR AO PRECATÓRIO. JUROS MORATÓRIOS. POUPANÇA. QUESTÃO CONSTITUCIONAL. SÚMULA 343 DO STF. APLICABILIDADE. TEMA 810 DA REPERCUSSÃO GERAL NO STF. INCONSTITUCIONALIDADE DA TR. CONSTITUCIONALIDADE DOS JUROS DE POUPANÇA. AÇÃO RESCISÓRIA PARCIALMENTE PROCEDENTE.
1. A Corte Especial deste Regional, interpretando o julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 590.809/RS, compreendeu que a superveniente alteração da jurisprudência do STF não autoriza a rescisão de decisão judicial proferida à luz do anterior posicionamento da Corte, hipótese em que aplicável a Súmula 343 do STF. De outra parte, inexistindo posição do Supremo Tribunal sobre a questão constitucional debatida, é admissível a ação rescisória (TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017).
2. Como à época da decisão rescindenda não havia posição do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade da TR como indexador de correção monetária de débitos judiciais fazendários, é inaplicável a Súmula 343 do STF, admitindo-se, portanto, a rescisória.
3. No julgamento do RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), realizado na sessão de 20.09.2017, o STF declarou a inconstitucionalidade da TR para a correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública e reconheceu a constitucionalidade dos juros de poupança incidentes sobre seus débitos judiciais não-tributários quanto ao período anterior à tramitação da requisição de pagamento (precatório ou RPV).
4. Estando a decisão rescindenda em parcial desacordo com as teses firmadas pelo STF no Tema 810 da repercussão geral, tem lugar a rescisão do julgado quanto à fixação dos juros moratórios.
5. Ação rescisória julgada parcialmente procedente. (AR nº 0000872-75.2014.4.04.0000/SC, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. p/ acórdão Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, publicado em 10-5-2018).
Na hipótese vertente, ao julgar o RE nº 1.221.630 (Tema 1091 - transitado em julgado em 27-6-2020), o Supremo Tribunal Federal manifestou-se expressamente no sentido de reafirmar a sua jurisprudência anterior, concluindo por cassar julgado deste Regional que havia afastado a incidência do fator previdenciário na aposentadoria do professor.
Vejamos:
Recurso extraordinário. Direito Previdenciário. Benefício previdenciário. Fator Previdenciário. Constitucionalidade. Existência de repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Recurso extraordinário provido para cassar o acórdão recorrido e determinar de que a Corte de origem profira novo julgamento observando a orientação jurisprudencial emanada do Plenário do STF. Tese de repercussão geral: É constitucional o fator previdenciário previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99. (RE 1221630 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 04/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-154 DIVULG 18-06-2020 PUBLIC 19-06-2020)
Aliás, no voto do relator restou consignado que a matéria em debate já estava pacificada no Plenário e em ambas as Turmas de Direito Previdenciário. Transcrevo:
Por essas razões, reputo pertinente que o Supremo Tribunal Federal estenda esse entendimento, objeto de pacífica jurisprudência do Pleno e de ambas as Turmas desta Corte, à sistemática da repercussão geral, com todos os benefícios daí decorrentes, notadamente com a fixação de tese a ser observada pelos demais órgãos julgadores pátrios.
Nessa linha de entendimento, colaciono precedente desta Seção:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS EM FACE DO ACÓRDÃO QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO MANEJADO CONTRA O INDEFERIMENTO LIMINAR DA AÇÃO RESCISÓRIA QUE PRETENDE RESCINDIR ACÓRDÃO NO QUAL O INSS RESTOU CONDENADO A REVISAR A RENDA MENSAL INICIAL DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DE TITULARIDADE DA PARTE RÉ, MEDIANTE A EXCLUSÃO DA INCIDÊNCIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO. JULGAMENTO DO RE 1.221.630 (TEMA 1091) PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM REPERCUSSÃO GERAL, MANIFESTANDO EXPRESSAMENTE A REAFIRMAÇÃO DA SUA JURISPRUDÊNCIA ANTERIOR QUE ENTENDE PELA CONSTITUCIONALIDADE DO FATOR PREVIDENCIÁRIO. INEXISTÊNCIA DE DECISÕES PELA SUPREMA CORTE ACERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DA INCIDÊNCIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO NA APOSENTADORIA DO PROFESSOR, NÃO HAVENDO QUE SE FALAR EM ALTERAÇÃO SUPERVENIENTE DE SUA JURISPRUDÊNCIA A TORNAR INADMISSÍVEL A RESCISÓRIA. HIPÓTESE DE JULGAMENTO ANÁLOGA ÀS AÇÕES RESCISÓRIAS RELATIVAS A JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA (TEMA 810). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES, PARA DAR PROVIMENTO AO AGRAVO, POSSIBILITANDO O PROCESSAMENTO DA DEMANDA.
1. Embargos de declaração opostos em face do acórdão que negou provimento ao agravo interno manejado contra o indeferimento liminar da ação rescisória que pretende rescindir acórdão no qual o INSS restou condenado a revisar a renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição de titularidade da parte ré (professor - espécie 57), mediante a exclusão da incidência do fator previdenciário.
2. Hipótese em que o voto vencido mantinha a decisão que indeferiu a petição inicial da presente ação desconstitutiva, fundamentando-se em decisões desta Terceira Seção no sentido da improcedência da rescisória em casos similares.
3. Precedentes citados, entretanto, anteriores ao julgamento do RE 1.221.630 (Tema 1091) pelo Supremo Tribunal Federal, prolatado em repercussão geral e transitado em julgado em 27-06-2020, no qual a Suprema Corte, manifestando expressamente a reafirmação de sua jurisprudência anterior, concluiu por cassar julgado deste Regional que afastou a incidência do fator previdenciário na aposentadoria do professor.
4. Portanto, se o Plenário do STF está afirmando que sua jurisprudência sobre a matéria está sendo reafirmada, se em seu voto o relator desse último julgado cita e transcreve decisões anteriores no mesmo sentido, não é caso de “manifesta inadmissibilidade da rescisória fundada em alteração superveniente da jurisprudência do Supremo caracterizada no caso da incidência do fator previdenciário para professor”.
5. Em nenhum momento o STF decidiu pela inconstitucionalidade da incidência do fator previdenciário na aposentadoria do professor. Nesse sentido, não há de se falar em alteração da jurisprudência dessa Corte Superior.
6. Julgamento desta rescisória que poderá pautar-se pelo decidido inúmeras vezes por esta Terceira Seção em ações rescisórias relativas aos juros e correção monetária (Tema 810).
7. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para dar provimento ao agravo, possibilitando o processamento da demanda. (AR nº 5047811-86.2018.4.04.0000/RS, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 23-9-2020)
Assim, no caso dos autos em que se busca em juízo rescisório a incidência de fator previdenciário na aposentadoria por tempo de contribuição de professor não se aplica a Súmula nº 343 do STF, porquanto não houve alteração da jurisprudência da Magna Corte - tanto que em nenhum momento decidiu pela inconstitucionalidade da incidência do fator previdenciário na aposentadoria do professor - na medida em que se manifestou de forma expressa pela reafirmação de sua jurisprudência anterior.
Nessa perspectiva, verifica-se que, à época da prolação do acórdão rescindendo não havia, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, controvérsia acerca da exegese do art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99, sendo cabível a presente rescisória.
CASO CONCRETO
No julgamento da apelação, a 6ª Turma desta Corte, por unanimidade de votos, manteve a sentença proferida, julgando procedente o pedido vertido na inicial sob os seguintes fundamentos (evento 5, originário):
A controvérsia posta nos autos diz respeito aos critérios de cálculo utilizados para a apuração da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição deferido à parte autora, sob a regência da Lei n. 9.876/1999, que introduziu o chamado 'fator previdenciário'.
As Turmas Previdenciárias desta Corte vinham entendendo que a aposentadoria de professor, apesar das peculiaridades e regras próprias previstas na legislação, não é uma aposentadoria especial nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91, mas, para o professor que tenha desempenhado exclusivamente funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, uma aposentadoria por tempo de contribuição com redução quanto ao número de anos exigido, considerando o disposto no art. 201, § 8º, da Constituição Federal e no art. 56 da Lei 8.213/91, e tratamento diferenciado na aplicação do fator previdenciário, mediante majoração do tempo de contribuição (variável a ser considerada no respectivo cálculo, conforme § 9º do art. 29 da Lei 8.213/91). Assim, não incidiria a regra do inciso II do art. 29 do mesmo diploma legal, a qual afasta a utilização do fator previdenciário no cálculo do salário de benefício.
A matéria encontrava-se uniformizada no âmbito dos Juizados Especiais Federais, no incidente assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO INFANTIL E DO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO. FATOR PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE. O tempo de magistério, na vigência da Lei 8.213/91, não é tempo especial. A aposentadoria por tempo de serviço do professor deve ser calculada com o fator previdenciário, salvo direito adquirido anterior à 29.11.99. Incidente de Uniformização conhecido e provido.
(TRF4, INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 2007.72.52.000293-4, Turma Regional De Uniformização, Juiz LUÍSA HICKEL GAMBA, D.E. 03/07/2009)
No entanto, a Corte Especial deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao apreciar o Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.4.04.0000, em julgamento por maioria finalizado na sessão de 23/06/2016, afirmou a inconstitucionalidade do inciso I do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sem redução do texto, e dos incisos II e III do §9º do mesmo dispositivo, com redução de texto, nos termos do voto do Relator, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira.
Em seu voto, Sua Excelência frisou que a análise aprofundada da validade das normas que disciplinam a incidência do fator previdenciário na aposentadoria do professor está a indicar a ausência de constitucionalidade no tratamento que a Lei n. 8.213/91, na redação que lhe foi dada pela Lei n. 9.876/99, confere especificamente às aposentadorias por tempo de contribuição dos professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, isso porque o § 8º do artigo 201 da Constituição Federal, ao reconhecer ao professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio o direito à aposentadoria por tempo de contribuição com redução de cincos anos, certamente conferiu à categoria e, por extensão, ao benefício, status diferenciado; agregou-lhes valor que deve ser respeitado pelo legislador ordinário. A disciplina do direito assegurado pela Constituição, assim, deve ser feita de forma adequada. Norma que restrinja de alguma forma o direito assegurado pela Constituição, portanto, somente será válida se guardar a devida proporcionalidade e o respeito às demais cláusulas constitucionais.
Assim analisou o texto da Lei n. 8.213/91, na redação que lhe foi dada pela Lei n. 9.876/99:
Art. 29. O salário-de-benefício consiste:
I - para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário;
......
§ 7º O fator previdenciário será calculado considerando-se a idade, a expectativa de sobrevida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar, segundo a fórmula constante do Anexo desta Lei.
§ 8º Para efeito do disposto no § 7º, a expectativa de sobrevida do segurado na idade da aposentadoria será obtida a partir da tábua completa de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos.
§ 9º Para efeito da aplicação do fator previdenciário, ao tempo de contribuição do segurado serão adicionados:
I - cinco anos, quando se tratar de mulher; (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
II - cinco anos, quando se tratar de professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio;
III - dez anos, quando se tratar de professora que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
(grifei)
Para compensar o fato de que a aposentadoria do professor se dá com tempo reduzido, determina a lei o acréscimo de tempo fictício ao tempo de contribuição (cinco anos se homem e dez anos se mulher), para obtenção do fator previdenciário.
Conquanto a previsão legal possa acarretar redução dos efeitos negativos do fator previdenciário para a aposentadoria do professor, parece-me que não dá ela adequado tratamento ao direito fundamental assegurado pela Constituição, por ausência de proporcionalidade, ofendendo, ademais, o princípio da isonomia, consagrado no caput do artigo 5º da Constituição Federal, pois deixa de tratar desiguais observada a medida de suas desigualdades.
Explico.
O fator previdenciário, nos termos da Lei 8.213/91, é calculado considerando-se a idade, a expectativa de sobrevida e o tempo de contribuição do segurado ao se aposentar, segundo fórmula constante do Anexo do citado Diploma:
f= Tc*a/Es*[1+(Id+Tc*a)/100)]
Onde:
f = fator previdenciário;
Es = expectativa de sobrevida no momento da aposentadoria;
Tc = tempo de contribuição até o momento da aposentadoria;
Id = idade no momento da aposentadoria;
a= alíquota de contribuição correspondente a 0,31.
Da análise da fórmula constata-se que, a partir da situação particular do segurado, duas variáveis impactam o cálculo do fator previdenciário (multiplicador que se inferior a 1 diminuirá a renda mensal inicial do benefício, e, se superior a 1, aumentará a renda mensal inicial do benefício):
(i) a idade do segurado, que, em rigor, incide duas vezes, haja vista a consideração, também, da expectativa de sobrevida na equação, e o
(ii) tempo de contribuição, que, da mesma forma, incide duas vezes na equação.
Mais do que isso, percebe-se que dentre as variáveis ligadas à situação particular do segurado, a idade é a que tem tendência a influir mais no valor final obtido.
Com efeito, se tomarmos a situação de uma mulher com 55 anos de idade e 30 anos de tempo de contribuição, por exemplo, e que tem pela Tábua Completa de Mortalidade do IBGE uma expectativa de sobrevida de 25,5 anos, percebemos que seu fator previdenciário será igual a 0,5992.
Acrescidos 10 anos ao tempo de contribuição no caso de uma mulher com cinquenta anos, haveria a obtenção de fator previdenciário superior. Teria a mulher 55 anos de idade, 40 anos de tempo de contribuição e a mesma expectativa de sobrevida (25,5 anos). O fator previdenciário seria igual a 0,8140.
Agora vejamos o resultado se forem acrescidos 10 anos à idade, mantidos, todavia, 30 anos de contribuição. A mulher, neste caso, teria 30 anos de contribuição e 65 anos de idade. Sua expectativa de sobrevida seria de 18,00 anos. O fator previdenciário seria igual a 0,9005.
Percebe-se, pois, que:
- Tomada a situação de uma mulher com 55 anos de idade e 30 anos de contribuição, com média de salários-de-contribuição, suponhamos, de R$ 2.000,00, seu salário-de-benefício, com a incidência do fator previdenciário, seria de R$ 1.198,40 (R$ 2.000,00*0,5992);
- Se esta mulher tivesse 55 anos de idade, mas 40 anos de contribuição, seu salário-de-benefício, com a incidência do fator previdenciário, seria de R$ 1.627,60 (R$ 2.000,00*0,8140);
- Se esta mulher tivesse 30 anos de contribuição, mas 65 anos de idade, seu salário-de-benefício, com a incidência do fator previdenciário, seria de R$ 1.800,80 (R$ 2.000,00*0,9005).
Os exemplos acima apresentados evidenciam que duas variáveis obtidas concretamente a partir da situação particular do segurado (idade e tempo de contribuição) influenciam no cálculo do fator previdenciário e, mais do que isso, que a variável idade tem uma influência um pouco maior.
Voltemos agora ao caso dos professores.
O que fez a Lei 8.213/91 (com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.876/99) para, considerando o valor especial conferido à aposentadoria por tempo de contribuição dos professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, conferir-lhe um tratamento ajustado à ordem constitucional? Determinou, em seu artigo 29, § 9º, o acréscimo, ao tempo de contribuição, de 05 anos, quando se tratar de professor, e de 10 anos, quando se tratar de professora. Em relação à variável idade, justamente aquela que tem maior impacto no cálculo do fator previdenciário, todavia, não foi adotada qualquer medida tendente a obviar de alguma forma os eventuais efeitos deletérios causados no cálculo do fator previdenciário.
Veja-se, novamente a título ilustrativo, que se uma professora com 50 anos de idade (expectativa de sobrevida de 29,2 anos) se aposentasse atualmente com 25 anos de contribuição, o acréscimo de 10 anos ao tempo de contribuição determinado pelo artigo 29, § 9º, da Lei 8.213/91 (por ficção teria 35 anos de tempo de contribuição) acarretaria a obtenção de um fator previdenciário igual a 0,5895. Assim, seu salário-de-benefício, tomada uma média hipotética de salários-de-contribuição de R$ 2.000,00, seria de R$ 1.179,00 (R$ 2.000,00*0,5895). Se a esta mesma professora fossem acrescidos não somente 10 anos ao tempo de contribuição (por ficção teria 35 anos de tempo de contribuição), mas também 10 anos à idade (por ficção teria 60 anos de idade e expectativa de sobrevida de 21,6 anos), o fator previdenciário seria igual a 0,8935. Assim, seu salário-de-benefício, tomada a mesma média hipotética de salários-de-contribuição de R$ 2.000,00, seria de R$ 1.787,00 (R$ 2.000,00*0,8935)
Os exemplos referidos no parágrafo anterior demonstram que o adequado tratamento à aposentadoria por tempo de contribuição dos professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, benefício que tem especial dignidade constitucional, somente seria alcançado se os efeitos da idade tivessem sido igualmente mitigados pelo legislador ordinário.
Note-se que se a Constituição estabelece que o professor e a professora têm direito a se aposentar com 30 e 25 anos de tempo de contribuição respectivamente (enquanto os demais trabalhadores têm direito a se aposentar ordinariamente com 35 e 30 anos de tempo de contribuição) evidentemente que o constituinte ponderou o fato de que a aposentadoria, necessariamente, para os professores, ocorreria com idade inferior aos demais trabalhadores. A conclusão é lógica.
Trabalhemos novamente com exemplos para demonstrar o desacerto da sistemática estabelecida.
Tomado o caso de um professor que tenha começado a trabalhar aos 16 anos de idade (atualmente a idade mínima para ingresso no mercado de trabalho - artigo 7º inciso XXXIII, da CF, na redação dada pela EC 20/98), ao completar 30 anos de tempo de contribuição, ela terá 46 anos de idade. Menos, evidentemente, do que um homem, não professor, que terá de trabalhar 35 anos para se aposentar, e que atingirá isso aos 51 anos de idade. Por presunção, a fim de reduzir o impacto no cálculo do fator previdenciário, como determinado pela Lei 8.213/91, será considerado para o professor tempo de contribuição igual a 35 anos (acréscimo de 05 anos). Mas, cabe a pergunta: se a presunção é de que o professor trabalhou por 35 anos, embora tenha somente 46 anos de idade, seria lógico e razoável considerar que ele, também por presunção, teria ingressado no mercado de trabalho aos 11 anos de idade? Evidentemente que não, até porque isso atentaria contra a Constituição Federal, que veda o trabalho dos menores de 16 anos. A conclusão que se pode extrair a partir de uma interpretação afeiçoada à Constituição Federal, é de que se ao professor com 46 anos de idade e 30 anos de contribuição reconhece-se, por determinação legal, tempo de contribuição de 35 anos, sua idade, também por presunção, necessariamente seria necessariamente de 51 anos de idade.
Em outras palavras: conferido tratamento diferenciado ao cálculo do fator previdenciário para o professor mediante consideração de mais 05 ou 10 anos de tempo de contribuição, este período acrescido, jurídica e cronologicamente, só pode ser referente ao tempo futuro; jamais ao passado. A majoração do tempo de contribuição sem a consideração dos impactos na variável idade subverte a lógica, e, consequentemente, viola o ordenamento jurídico. Volta-se a frisar: o tempo a mais de contribuição (referente a atividade presumidamente exercida pelo professor), jurídica e cronologicamente, só pode ser para frente (futuro); jamais para trás (passado).
Voltando ao princípio da proporcionalidade, o quadro acima delineado está a evidenciar que o tratamento dispensado pelo legislador à aposentadoria do professor não confere ao benefício, que tem especial atenção do constituinte, adequado tratamento. A sistemática estabelecida pelo legislador não resiste ao crivo da adequação (Geeignetheit), e mesmo da proporcionalidade em sentido estrito (Verhältnismässigkeit). A densidade do direito fundamental não restou, na sistemática estabelecida, respeitada pelo legislador infraconstitucional, pois, ainda que constitucional genericamente o fator previdenciário, aos professores especificamente foi impingida, em rigor, uma perda maior no cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição do que aos demais trabalhadores, e isso simplesmente porque, justamente por força de norma constitucional, eles estão autorizados a se aposentar mais precocemente.
Ao mesmo tempo a sistemática estabelecida ofende o princípio da igualdade, consagrado no artigo 5º, caput, da Constituição Federal, pois, como sabido, seu verdadeiro sentido é o tratamento isonômico aos iguais, mas, também, o tratamento diferenciado aos desiguais, na medida de suas desigualdades. Deixando de tratar os professores na medida da desigualdade de sua situação específica, que se apresenta como um valor constitucional, a Lei 8.213/91, na redação que lhe foi dada pela Lei 9.876/99, violou o artigo 5º, caput da Constituição Federal.
A solução, assim, é o reconhecimento da inconstitucionalidade, sem redução de texto, do inciso I do artigo 29 da Lei 8.213/91, para afastar a interpretação que conduza à aplicação do fator previdenciário ao caso dos professores, e bem assim da inconstitucionalidade, com redução de texto evidentemente, dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo.
Registro que a solução cabível é, de fato, o pronunciamento da inconstitucionalidade nos termos propostos. Há uma disciplina legal sobre a incidência do fator previdenciário ao caso dos professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, a qual está estabelecida na aplicação conjugada dos artigos 56 e 29, inciso I, e § 9º, incisos II e III da Lei 8.213/29. Não há, assim, como se reconhecer eventual direito à aposentadoria por tempo de contribuição para esses profissionais, com afastamento do fator previdenciário, sem que ocorra a pronúncia da invalidade das normas que disciplinam justamente a incidência do elemento de cálculo em discussão. A observância da cláusula do 'full bench' no caso em apreço impõe-se, até em observância à Súmula Vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal:
Súmula Vinculante nº 10. Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte.
Ao arremate, consigno que ao judiciário, de regra, não é dado atuar como legislador positivo. No caso em apreço não há possibilidade de o judiciário, diante da inconsistência da sistemática estabelecida pela legislação de regência, determinar a alteração da fórmula do cálculo do fator previdenciário para os professores, ou mesmo a modificação das variáveis a serem consideradas na referida fórmula, de modo a mitigar, nos termos em que reputar mais acertados (portanto mediante juízo de discricionariedade incompatível com a atuação judicial), os efeitos da idade no resultado final a ser obtido. Só resta, assim, reconhecer, quando aos professores, a inconstitucionalidade do fator previdenciário.
E assim concluiu:
a) Segundo o Supremo Tribunal Federal, a aposentadoria dos professores é uma aposentadoria por tempo de contribuição;
b) Também segundo o Supremo Tribunal Federal, a incidência do fator previdenciário no cálculo do salário-de-benefício das aposentadorias por tempo de contribuição não viola a Constituição Federal;
c) não obstante, pelo fato de não dar especificamente à aposentadoria do professor, direito fundamental que tem relevante densidade constitucional, adequado tratamento, principalmente no que toca à variável idade, o artigo 29 da Lei 8.213/91 viola os artigos 5º, caput, 6º, e 201, § 8º, e bem assim o princípio da proporcionalidade.
Ante o exposto, voto por afirmar a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 29 da Lei 8.213/91, sem redução do texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo, com redução de texto, em relação aos professores que atuam na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
Assim, pelas razões acima e que ora adoto, o benefício de aposentadoria especial de professor da parte autora deve ser revisado, para que seja afastado do cálculo da renda mensal inicial o fator previdenciário.
Com relação ao termo inicial dos efeitos financeiros da revisão, a jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que deve retroagir à data da concessão do benefício, respeitada eventual prescrição quinquenal, tendo em vista que o deferimento representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado (in Apelação Cível nº 5002265-17.2015.4.04.7112/RS, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 19/10/2016).
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que 'diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados'. (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016, e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicada a apelação no ponto.
Honorários
Os honorários advocatícios seguem a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando o trabalho adicional em grau de recurso, aplica-se o comando do § 11º do referido artigo, devendo ser observadas, conforme o caso, as disposições dos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º, todos do citado dispositivo legal.
No caso dos autos, o juízo de primeiro grau postergou a fixação dos honorários advocatícios para a fase de liquidação, na forma do artigo 85, § 4º, inciso II, do CPC/2015.
Assim, com base no artigo 85, § 4º, e artigo 1.046, ambos do CPC/2015, estabeleço a majoração da verba honorária mediante acréscimo da sua metade, vale dizer, aumento de 50% sobre no percentual a ser fixado pelo juízo de primeiro grau na execução, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015.
Caso o valor da condenação a ser apurada em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual médio da faixa subsequente, e assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III, e 5º do referido dispositivo legal.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação da revisão do benefício da parte autora, desde a competência da publicação, a ser efetivada em 45 dias.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação da revisão do benefício.
Contra o acórdão rescindendo o INSS interpôs recurso extraordinário, sobre o qual o Supremo Tribunal Federal, ao examinar o Tema nº 960, reconheceu a ausência de repercussão geral da matéria por não se tratar de matéria constitucional, motivo pelo qual foi-lhe negado seguimento pela Vice-Presidência deste TRF/4ª Região (evento 30, originário).
Com efeito, nos autos do RE nº 1.029.608/RS, em 24-8-2017, foi reconhecida a inexistência de repercussão geral do tema, na medida em que ocorre apenas ofensa reflexa em matéria constitucional, sendo a incidência ou não do fator previdenciário na aposentadoria do professor de índole essencialmente infraconstitucional.
De outra banda, também aviou recurso especial, o qual não foi conhecido pelo Superior Tribunal de Justiça, sob o seguinte fundamento (evento 28 - OUT1, p. 101, originário): A matéria de fundo foi resolvida no acórdão recorrido sob o enfoque estritamente constitucional, sendo a sua apreciação de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, do permissivo constitucional.
MÉRITO
Em juízo rescindendo, impõe-se desconstituir o acórdão proferido no julgamento da apelação, tendo em vista a orientação das Cortes Superiores (tema 1.091/STF e tema 1.011/STJ).
Uma vez desconstituído o acórdão rescindendo, seria o caso de se proceder ao novo julgamento da apelação nos autos originários (interposta, no caso concreto, pela parte ora requerida).
Ocorre que, muito embora a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos especiais repetitivos (tema 1.011), tenha decidido que o cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição de professores vinculados ao Regime Geral de Previdência Social está sujeito à incidência do fator previdenciário, definiu que esse entendimento abrangerá apenas as ações em andamento, não valendo para os processos transitados em julgado.
Logo, tendo transitado em julgado o acórdão rescindendo, em prol da segurança jurídica e da coisa julgada, deve ser mantido o julgamento de procedência da ação originária.
CONCLUSÃO
A pretensão inicial merece prosperar no tocante à alegada violação manifesta à norma jurídica. Todavia, em virtude do limite preconizado na decisão do tema 1.011/STJ, havendo trânsito em julgado do acórdão rescindendo, deve ser mantido o julgamento de procedência da ação originária.
Logo, em virtude de o pedido vertido na peça vestibular não ter sido atendido em sua totalidade, impõe-se a parcial procedência da ação rescisória.
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA
Em face da sucumbência recíproca, as partes devem ser condenadas pro rata ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, devidamente atualizados, vedada a compensação, a teor do disposto no art. 85, §14, do CPC.
Suspensa a exigibilidade dessas verbas, todavia, no caso de a parte ré ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96).
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de julgar parcialmente procedente a ação rescisória.
Documento eletrônico assinado por FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001948843v9 e do código CRC 37eaae1f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FERNANDO QUADROS DA SILVA
Data e Hora: 30/4/2021, às 4:40:42
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
VOTO DIVERGENTE
O ilustre Relator decide por bem julgar parcialmente procedente a ação rescisória., nestes termos:
Em juízo rescindendo, impõe-se desconstituir o acórdão proferido no julgamento da apelação, tendo em vista a orientação das Cortes Superiores (tema 1.091/STF e tema 1.011/STJ).
Uma vez desconstituído o acórdão rescindendo, seria o caso de se proceder ao novo julgamento da apelação nos autos originários (interposta, no caso concreto, pela parte ora requerida).
Ocorre que, muito embora a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos especiais repetitivos (tema 1.011), tenha decidido que o cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição de professores vinculados ao Regime Geral de Previdência Social está sujeito à incidência do fator previdenciário, definiu que esse entendimento abrangerá apenas as ações em andamento, não valendo para os processos transitados em julgado.
Logo, tendo transitado em julgado o acórdão rescindendo, em prol da segurança jurídica e da coisa julgada, deve ser mantido o julgamento de procedência da ação originária.
Peço vênia para dissentir da solução.
O Relator depois de reconhecer a violação de norma jurídica, mesmo que os precedentes sejam posteriores, reconhece que deve ser mantida a sentença em razão da modulação. Penso que a modulação, respeitando o trânsito em julgado, se equivale a um juízo de inconstitucionalidade do fator previdenciário na aposentadoria do professor até o momento em que o precedente passa a valer, e aí então vai-se discutir a incidência da Súmula 343 do STF e outras questões relativas à AR. A modulação também representa que não caberá AR para discutir a aderência das decisões anteriores ao precedente. Portanto, não sendo aplicável a tese, o judicioso entendimento de Sua Excelência, que não aplica a tese e, ao mesmo tempo, a excepciona, com a máxima vênia, não me parece adequado. A hipótese, assim como no caso do tema 709, é de improcedência, senão mesmo de não conhecimento da AR, e não de parcial procedência, porque nenhuma sucumbência existe ao reú, que tem a sentença rescindenda integralmente mantida.
Ressalte-se, por outro lado, que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1.011 do regime dos recursos especiais repetitivos, ao afastar da incidência da tese jurídica aqueles processos com sentença já transitada em julgado, não está a modular eventuais efeitos rescisórios da decisão que cria o precedente federal obrigatório, mas apenas reafirmando que o julgamento posterior da questão infraconstitucional pelo STJ, mesmo em recurso repetitivo, não tem aptidão para desconstituir a coisa julgada formada anteriormente em sentido contrário (AR 4.443/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2019, DJe 14/06/2019).
Dessarte, afastada expressamente pelo STJ a aplicação da tese jurídica do Tema 1.011 aos casos definitivamente julgados, e tendo havido mudança de orientação do STF quanto à questão constitucional ora em exame, como bem pontuado pelo ilustre Relator (“A decisão no RE nº 1.221.630/SC, portanto, agregou fundamento novo, estendendo à aposentadoria dos professores a tese sobre a constitucionalidade do fator previdenciário”), tenho que a ação rescisória deve ser julgada improcedente, e não parcialmente procedente, porque nenhuma sucumbência existe ao reú, que tem a sentença rescindenda integralmente mantida!
Deixo de condenar o INSS ao pagamento de honorários, uma vez que a parte contrária não constituiu procurador nos autos (e. 12).
Ante o exposto, com a vênia do eminente Relator, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002528392v3 e do código CRC 1f3893fe.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 30/4/2021, às 17:26:28
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Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal João Batista Pinto Silveira - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3191 - www.trf4.jus.br - Email: gbatista@trf4.jus.br
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
VOTO-VISTA
Pedi vista com a intenção de melhor analisar os votos trazidos na última sessão e pontuar minha compreensão sobre a matéria.
1 – Contextualização
A Corte Especial deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em precedente vinculante, declarou a inconstitucionalidade do inciso I do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sem redução do texto, e dos incisos II e III do §9º do mesmo dispositivo, com redução de texto. Com isso, afastou a aplicação do fator previdenciário no cálculo do salário de benefício da aposentadoria por tempo de contribuição do professor de ensino infantil, fundamental e médio como se vê da ementa a seguir transcrita:
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. ARGUIÇÃO DE INCONSTUCIONALIDADE. APOSENTADORIA DOS PROFESSORES DE ENSINO INFANTIL, FUNDAMENTAL E MÉDIO. INCIDÊNCIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 29, I, E § 9º, INCISOS II E III DA LEI Nº 8.213/91. ARTS. 5º, 6º, E 201, §§ 7º E 8º DA CF. ADEQUADO TRATAMENTO DE BENEFÍCIO DOTADO DE DENSIDADE CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. RECONHECIMENTO DE INCONSTITUCIONALIDADE ESPECIFICAMENTE EM RELAÇÃO À SITUAÇÃO DOS PROFESSORES DE ENSINO INFANTIL, FUNDAMENTAL E MÉDIO. - Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal a aposentadoria dos professores de ensino infantil, fundamental e médio caracteriza modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição. - Também segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, a incidência do fator previdenciário no cálculo do salário-de-benefício das aposentadorias por tempo de contribuição não viola a Constituição Federal. - O § 8º do artigo 201 da Constituição Federal, porém, ao reconhecer ao professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o direito à aposentadoria por tempo de contribuição com redução de cincos anos, conferiu à categoria e, por extensão, ao benefício, status diferenciado; agregou-lhes valor que deve ser respeitado pela lei ordinária, não se podendo olvidar, ademais, que a previdência social constitui direito social (art. 6º da CF), logo fundamental, a ser prestigiado pelo legislador infraconstitucional. - A regulamentação, pela legislação infraconstitucional, de direito assegurado pela Constituição Federal, e dotado de especial proteção, deve ser feita de forma adequada, de modo a respeitar a densidade que lhe foi conferida pelo constituinte. Assim, norma infraconstitucional que restrinja o direito assegurado pela Constituição somente será válida se guardar a devida proporcionalidade e o respeito às demais cláusulas constitucionais. - A densidade do direito fundamental à aposentadoria diferenciada a que têm direito os professores de ensino infantil, fundamental e médio, não foi respeitada pelo legislador ordinário na disciplina estabelecida pelo artigo 29 da Lei 8.213/91, pois, ainda que se tenha por hígido, genericamente, o fator previdenciário, foi-lhes impingida, em rigor, com ofensa ao princípio da proporcionalidade, uma perda maior no cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição, e isso simplesmente porque, justamente por força de norma constitucional, estão autorizados a se aposentar mais precocemente. - A sistemática estabelecida, ofende também o princípio da igualdade, consagrado no artigo 5º, caput, da Constituição Federal, pois, como sabido, seu verdadeiro sentido compreende o tratamento diferenciado aos desiguais, na medida de suas desigualdades. Deixando de tratar o professor educação infantil e no ensino fundamental e médio na medida da desigualdade de sua situação específica em relação aos demais trabalhadores, a Lei 8.213/91, na redação que lhe foi dada pela Lei 9.876/99, violou o artigo 5º, caput da Constituição Federal. - Mesmo que o fator previdenciário, segundo a dicção do Supremo Tribunal Federal, no plano genérico, seja constitucional, o adequado tratamento à aposentadoria por tempo de contribuição dos professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, pressupõe sistemática que considere não somente a mitigação dos efeitos da variável tempo de contribuição, mas, também, da variável idade, até porque esta tem influência mais incisiva na apuração do índice multiplicador em discussão (fator previdenciário). - Ao judiciário, de regra, não é dado atuar como legislador positivo, não se mostrando possível, assim, diante da inconsistência da sistemática estabelecida pela legislação de regência, determinar a alteração da fórmula do cálculo do fator previdenciário para os professores, ou mesmo a modificação das variáveis a serem consideradas na referida fórmula, de modo a mitigar, nos termos em que reputar mais acertados (logo mediante juízo de discricionariedade incompatível com a atuação judicial), os efeitos da idade no resultado final a ser obtido. Só resta, assim, reconhecer, especificamente quanto aos professores da educação infantil e do ensino fundamental e médio, a inconstitucionalidade do fator previdenciário. - Reconhecimento da inconstitucionalidade do inciso I do artigo 29 da Lei 8.213/91, sem redução do texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo, com redução de texto, pelo fato de não terem conferido à aposentadoria do professor de ensino infantil, fundamental e médio, direito fundamental que tem relevante densidade constitucional, adequado tratamento, com o consequente afastamento da incidência do fator previdenciário. (TRF4, ARGINC 5012935-13.2015.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 08/07/2016)
No caso concreto que deu origem ao incidente, foi interposto recurso extraordinário e que foi julgado prejudicado porque o Supremo havia considerado não haver repercussão geral na matéria de fundo (evento 79 daquele feito). E, de fato, no julgamento do Tema 960 da Repercussão Geral (“incidência do fator previdenciário no cálculo da renda mensal inicial de aposentadoria por tempo de contribuição de professor, quando reunidos os requisitos após a edição da Lei n. 9.876/1999”), o STF definiu que a matéria não tinha repercussão geral em 08/2017. O inteiro teor do julgamento, contudo, revela que a Suprema Corte, na realidade, “constata a ausência de matéria constitucional a ser analisada, eis que demanda análise da legislação infraconstitucional aplicável à espécie, ou seja, das Leis 9.876/99 e 8.213/91”. O Relator, inclusive, diferenciou o caso dos professor da tese geral relativa à constitucionalidade do fator previdenciário. A ausência de repercussão geral teve fundamento no caráter infraconstitucional da matéria, vencido apenas o Ministro Marco Aurélio (RE 1029608 RG, Relator Min. EDSON FACHIN, julgado em 24/08/2017) .
Diante do cenário de divergência entre os tribunais inferiores, em 05/2019, o Superior Tribunal de Justiça afetou para julgamento a matéria em regime de recursos repetitivos (“Incidência ou não do fator previdenciário no cálculo da renda mensal inicial da aposentadoria por tempo de contribuição de professor, quando a implementação dos requisitos necessários à obtenção do benefício se der após a edição da Lei 9.876/1999” – Tema n.º 1011, STJ).
Na sequência, contudo, o Supremo, em “reafirmação de jurisprudência", admitiu e deu provimento a recurso extraordinário com repercussão geral que envolvia a “Constitucionalidade do fator previdenciário, previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99” (Tema n.º 1091, STF). Tal como cadastrado, o tema dá margem para a interpretação que haveria a reafirmação da jurisprudência consagrada acerca da constitucionalidade do fator previdenciário. Contudo, a leitura das razões demonstra que, na realidade, a Corte estaria revendo a posição específica sobre a constitucionalidade do fator previdenciário em relação aos professores.
O recurso extraordinário em questão, por envolver “reafirmação de jurisprudência” não foi regularmente distribuído e teve como relator o Presidente Ministro Dias Toffoli. Segundo Sua Excelência, era “oportuno” que houvesse manifestação da Corte “à luz da multiplicidade de demandas” e da “centralidade do Supremo Tribunal Federal no sistema de precedentes obrigatórios na condição de imperativo legal e de política pública de Administração da Justiça”, “para melhor orientar os jurisdicionados e os tribunais, bem como racionalizar a prestação jurisdicional”. Destacou, inclusive, que a mesma postura já havia sido tomada em outros casos, com o rejulgamento da matéria relativa ao creditamento do IPI por aquisição de insumos isentos (Tema 844 e Tema 136 da repercussão geral).
Após "reafirmar" a jurisprudência, em torno da constitucionalidade do fator previdenciário, o Ministro Dias Toffoli detalhou o regramento dos professores e expressamente destacou a aplicabilidade do fator inclusive para esses casos. Confira-se o seguinte trecho:
“Em relação à questão de fundo, é relevante perceber que o Supremo Tribunal Federal entende pela impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum na função de magistério após a Emenda Constitucional nº 18/81. Isso porque até esse marco normativo a atividade de professor era considerada penosa. Posteriormente, passou a ser espécie de benefício por tempo de contribuição, com requisito etário reduzido, então hipótese autorizadora de aposentadoria especial. Nessa linha, houve "reafirmação" dessa compreensão jurisprudencial no Tema nº 772 da repercussão geral, cujo paradigma é o ARE nº 703.550/PR-RG, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 21/10/14.”
Ao término do voto, a tese fixada foi a seguinte: “É constitucional o fator previdenciário previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99”. O acórdão foi publicado em 19/06/2020. O recurso extraordinário – que envolvia a aposentadoria do professor – foi provido “com a cassação do acórdão recorrido e a determinação de que a Corte de origem profira novo julgamento observando a orientação jurisprudencial emanada do Plenário desta Corte, conforme fixado nesta decisão”.
Cabe, então, indagar se cabe ação rescisória em face das decisões transitadas em julgado que tenham reconhecido o direito à aposentadoria de professores sem a incidência do fator previdenciário em desrespeito à jurisprudência superveniente do Supremo Tribunal Federal que admitiu a repercussão. Para tanto, é necessário relembrar o papel da coisa julgada no ordenamento jurídico, bem como a interpretação sobre rescisória fundada em manifesta violação de norma jurídica.
2 – A garantia da coisa julgada e a ação rescisória
De início, cabe lembrar que os contornos da ação rescisória estão diretamente relacionados com a segurança jurídica e a autoridade da coisa julgada.
A segurança jurídica, enquanto valor constitucional (art. 5º, caput, da CF/88), representa, segundo José Afonso da Silva o “’conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida’”. E, prossegue ele, “uma importante condição da segurança jurídica está na relativa certeza que os indivíduos têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem perdurar ainda quando tal norma seja substituída” (SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 136).
A coisa julgada, por seu turno, como desdobramento do direto à segurança jurídica, dá estabilidade ao pronunciamento judicial “para que o titular do direito aí reconhecido tenha a certeza jurídica de que ele ingressou definitivamente no seu patrimônio” (Idem, p. 137). No mesmo sentido, Araken de Assis destaca que todos os demais direitos fundamentais seriam “simples promessas soltas no ar” se o resultado do processo judicial “não se encontrasse blindado a controvérsias futuras”. E justamente para assegurar que o bem jurídico conquistado por decisão judicial “não seja subtraído do patrimônio jurídico do beneficiado” é que surge o instituto da coisa julgada (ASSIS, Araken de. Processo civil brasileiro, vol. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 515).
A garantia de estabilidade do resultado do processo blinda a sentença de ataques posteriores de qualquer autoridade – seja ela legislativa ou judiciária – que queira “subtrair os direito de alguém, objeto de processo pretérito” (Idem, p. 516). Trata-se, portanto, de garantia constitucional que, segundo Sérgio Porto, protege o titular contra “qualquer alteração estatal futura e não apenas a alteração futura promovida por lei” (PORTO, SÉRIO. Ação rescisória atípica: instrumento de defesa da ordem jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 51). Realmente, de quê adiantaria conferir estabilidade à relação jurídica em face da lei e negar essa mesma estabilidade diante de atos judiciais?
Os limites da coisa julgada, porém, são detalhados pelas normas infraconstitucionais. Com isso, por exemplo, é admitida a desconstituição de decisão que padeça de grave vício devidamente previsto na legislação. A simples “injustiça” da decisão, como lembra Alexandre Freitas Câmara, não é causa de rescinbilidade (CÂMARA, Alexandre Freitas. Ação rescisória. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 35). As decisões rescindíveis, na verdade, são aquelas cujos vícios estão detalhados na lei. O rol é taxativo e de interpretação restritiva, já que o acolhimento da rescisória flexibiliza o direito fundamental à segurança e a garantia constitucional da coisa julgada. Dentre as hipóteses de rescisão está a violação manifesta de norma jurídica.
3 – Ação rescisória por violação manifesta de norma jurídica
A decisão de mérito transitada em julgado pode ser rescindida quando violar manifestamente norma jurídica (art. 966, V, CPC). Admite-se, portanto, a desconstituição da decisão de mérito que desrespeita manifestamente uma norma jurídica. Espera-se que as decisões judicias sejam proferidas em observância às normas vigentes. O pronunciamento judicial deve estar conformado com a ordem jurídica. Assim, o sistema jurídico prevê que a decisão transitada em julgado que afronte manifestamente norma jurídica possa ser desconstituída: a decisão que viola manifestamente norma jurídica carrega o vício da rescindibilidade, justificando o ataque por rescisória.
Trata-se de uma escolha em prol da efetividade da ordem vigente em detrimento da segurança, já que a cadeia recursal deveria ser suficiente para suplantar vícios no julgamento promovido. Quando uma decisão viola manifestamente norma jurídica, em verdadeira má aplicação do direito, ela pode ser controlada pelos recursos cabíveis. Não por outra razão, a violação de norma federal, presentes os demais requisitos, autoriza o manejo de recurso especial perante o Superior Tribunal de Justiça. Por outro lado, existente violação de norma constitucional, é viável o emprego de recurso extraordinário perante o Supremo Tribunal Federal. No sistema brasileiro, em conflitos individuais, a palavra final sobre a norma jurídica de caráter constitucional, se houver repercussão geral, é dada pelo STF em recurso extraordinário. A necessidade de repercussão geral ao recurso extraordinário, que nem sempre estará presente, confirma que a interpretação constitucional, isto é, o sentido e o alcance da norma constitucional porventura aplicável ao caso, é promovida por todos os envolvidos na relação processual e não apenas pelo Supremo.
O difícil equilíbrio entre a segurança jurídica trazida pela autoridade da coisa julgada e a efetividade do preceito normativo desrespeitado se dá com a adjetivação do vício que justifica a ação rescisória. Não é toda a violação de norma jurídica que permite a desconstituição de decisão transitada em julgado, mas somente aquela qualificada como manifesta (art. 966, V, CPC). A redação atual da codificação processual aperfeiçoa a antiga noção de “literal disposição de lei” (art. 485, V, CPC/73; art. 798, I, c, CPC/39). E tanto cá como lá, quanto mais se ampliar o sentido de “manifesta violação” ou “literal disposição”, tanto menor será a garantia constitucional da coisa julgada.
Em torno da violação a “literal disposição de lei”, cabe citar a seguinte passagem ainda válida dos ensinamentos de PONTES DE MIRANDA:
“Para o cabimento da ação rescisória, o que importa é que tenha havido infração da regra jurídica, ofensa ao direito em tese. Quais os degraus que subiu o juiz para a conclusão, qual o caminho tortuoso que tomou, mesmo se reproduz a regra jurídica, se lhe acentua os conceitos, se põe em relevo os seus dizeres, há rescindibilidade da sentença se não atendeu ao preciso sentido da regra jurídica, tal com ela se insere no sistema jurídico. Infringe regra jurídica quem a interpreta erradamente. Ao juízo rescindente cabe a missão de apurá-lo” (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado da ação rescisória das sentenças e de outras decisões. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 297).
Logo se passou a entender, porém, que a existência de divergências na interpretação da norma jurídica pelo tribunais afastaria a “violação literal”. É realmente difícil aceitar uma violação “literal”, quando a literalidade é entendida de formas diferentes por diferentes julgadores. Ora, havendo dúvidas importantes na aplicação da norma jurídica, seria possível justificar, posteriormente, a desconstituição de julgamento fundado em entendimento anterior legítimo? A resposta negativa deu origem à Súmula n.º 343 do Supremo Tribunal Federal. Editada em 1963, a proposição se funda, dentre outros, em voto do Ministro Victor Nunes Leal, segundo o qual “para corrigir interpretação de lei, possivelmente errônea, não cabe ação rescisória” (STF. RE 50.046, Relator Min. Victor Nunes, Segunda Turma, julgado em 05/04/1963).
A Súmula n.º 343 do STF enuncia o seguinte: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais” (STF, Sessão Plenária de 13/12/1963).
É preciso compreender o entendimento sumular no seu contexto histórico: eram outras as concepções em torno da função dos tribunais, da hermenêutica jurídica, da teoria do direito e da própria jurisdição constitucional. Grosso modo, o enunciado diz que não há violação manifesta à norma jurídica quando existe divergência na sua interpretação pelos tribunais. Por conseguinte, não cabe ação rescisória por violação a norma jurídica nesses casos.
A violação de norma constitucional, porém, passou a ensejar dúvidas quanto à vedação da rescisória. Uma parcela da doutrina passou a defender que a vedação de rescisória por divergência na interpretação da norma jurídica não alcançaria as discordâncias sobre o sentido da Constituição (com amplas referências: CRAMER, Ronaldo. Ação rescisória por violação da norma jurídica. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2012, p 225-230).
4 – Violação de norma constitucional segundo o Supremo
Na jurisprudência do Supremo, a questão da rescisória por violação de norma constitucional é delicada até hoje. Uma análise mais detalhada dos casos já julgados, porém, permite identificar pelo menos quatro momentos históricos diferentes, antes que se identifique a posição atual da Corte.
O primeiro momento envolve a elaboração da Súmula n.º 343 do STF. Naquela época, o Supremo concentrava as competências hoje divididas com o Superior Tribunal de Justiça. Não se fazia distinção entre normas constitucionais e infraconstitucionais para fins de ação rescisória.
O segundo momento é inaugurado com voto vencedor do Ministro Gilmar Mendes. Em linhas gerais, Sua Excelência defendeu prevalecer a força normativa da Constituição. Para ele a Súmula 343 deveria ser revista, especialmente quanto a “processos que identificam matéria contraditória à época da discussão originária, questão constitucional, bem como jurisprudência supervenientemente fixada, em favor da tese do interessado”. Conforme Sua Excelência, a ação rescisória se traduz na “última via de correção para o sistema judicial” e permite o ajuste de decisões contrárias à interpretação constitucional feita pelo Supremo. No seu entendimento, em síntese: (a) o sistema jurídico prevê soluções diferentes para controvérsia na interpretação da lei e controvérsia na interpretação da norma constitucional; (b) a violação da norma constitucional é mais grave do que a violação da norma infraconstitucional; (c) a manutenção de decisão fundada em interpretação equivocada da norma constitucional é fator de maior instabilidade do que a rescisão dessa decisão, o que vulneraria o princípio da isonomia; (d) o sentido dado à norma constitucional pelo Supremo concretiza diretamente a Constituição e esta, por sua vez, é pressuposto da autoridade de qualquer ato legislativo, administrativo ou judicial; (e) a manutenção de soluções divergentes causa uma fragilização da força normativa da Constituição.
Não é admissível – prossegue o Ministro Gilmar Mendes – que o Supremo aceite diminuir a eficácia de suas próprias decisões. Assim – afirma ele – “se somente por meio do controle difuso de constitucionalidade, portanto, anos após as questões terem sido decididas pelos Tribunais ordinários, é que o Supremo Tribunal Federal veio a apreciá-las, é a ação rescisória, com fundamento em violação de literal disposição de lei, instrumento adequado para a superação de decisão divergente” (p. 17). Do contrário, segundo ele, seriam fortalecidas as decisões das instâncias ordinárias em detrimento das decisões do Supremo Tribunal Federal, o que é intolerável.
A posição do Ministro Gilmar Mendes foi acompanhada pelos demais, vencido apenas o Ministro Marco Aurélio. A ementa do caso, a seguir transcrita, repercute até hoje com se fosse a “posição atual” da Corte:
Embargos de Declaração em Recurso Extraordinário. 2. Julgamento remetido ao Plenário pela Segunda Turma. Conhecimento. 3. É possível ao Plenário apreciar embargos de declaração opostos contra acórdão prolatado por órgão fracionário, quando o processo foi remetido pela Turma originalmente competente. Maioria. 4. Ação Rescisória. Matéria constitucional. Inaplicabilidade da Súmula 343/STF. 5. A manutenção de decisões das instâncias ordinárias divergentes da interpretação adotada pelo STF revela-se afrontosa à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional. 6. Cabe ação rescisória por ofensa à literal disposição constitucional, ainda que a decisão rescindenda tenha se baseado em interpretação controvertida ou seja anterior à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal. 7. Embargos de Declaração rejeitados, mantida a conclusão da Segunda Turma para que o Tribunal a quo aprecie a ação rescisória (STF, RE 328812 ED, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 06/03/2008).
Após essa decisão, diversas outras foram no mesmo sentido, confirmando que, no entender da Corte, a máxima efetividade da norma constitucional deveria prevalecer sobre a garantia da coisa julgada (STF, AI 555806 AgR, Relator Min. Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 01/04/2008; RE 382960 AgR, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 30/09/2008; RE 596686 AgR, Relator Min. Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 20/04/2010; RE 564425 AgR, Relator Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 05/06/2012; RE 567765 AgR, Relator Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 16/04/2013; RE 646435 AgR, Relator Min. Celso De Mello, Segunda Turma, julgado em 09/04/2013).
O terceiro momento, então, surge em recurso extraordinário relatado pelo Ministro Marco Aurélio, no ano de 2014, um pouco depois de a Corte promover uma importante virada na sua jurisprudência sobre o creditamento do IPI (RE 353.657).
O Ministro Marco Aurélio, em síntese, reafirmou a sua posição de que a interpretação constitucional não afasta aprioristicamente a incidência da Súmula n.º 343 do STF. Para Sua Excelência: (a) a rescisória se presta apenas para situações excepcionalíssima, já que deve prevalecer a garantia da coisa julgada enquanto cláusula pétrea; (b) é preciso prestigiar a coisa julgada se, “quando formada, o teor da solução do litígio dividia a interpretação dos Tribunais pátrios ou, com maior razão, se contava com óptica do próprio Supremo favorável à tese adotada” (p. 10); (c) tanto o preceito constitucional como o infraconstitucional são iguais no ponto em que comportam a distinção ontológica entre texto e norma jurídica; (d) a rescisória não é instrumento de conformação dos pronunciamentos dos tribunais ao que vier a ser decidido após o trânsito em julgado pelo Supremo Tribunal Federal, isto é, a rescisória não é ferramenta de uniformização de jurisprudência. Assim, quando a solução do caso, à época do trânsito em julgado, “dividia a interpretação dos tribunais”, não caberá posterior ação rescisória por violação de norma jurídica. Prestigia-se a autoridade da coisa julgada.
O Ministro Teori Zavascki, em divergência, defendeu que deveria prevalecer a solução do STF mesmo quando superveniente à decisão atacada. Segundo Sua Excelência, dentre outros argumentos, a teoria da “tolerância da interpretação razoável”, para o Supremo, não abrange a ofensa de preceito constitucional, dada a gravidade da violação à Constituição. O Ministro Gilmar Mendes acompanhou a divergência.
Após as considerações trazidas na divergência, o Ministro Marco Aurélio manteve seu voto e reforçou: “se durante praticamente dois anos vigorou essa orientação daquele que é guarda da Lei Maior, é possível dizer-se que os pronunciamentos formalizados pelos demais tribunais, pelos Tribunais Regionais Federais, contrariaram frontalmente a Constituição Federal?” (p. 58). Como se percebe na evolução dos debates, o Relator deixa claro que se há divergência interpretativas nos tribunais – seja qual for o tribunal – na época em que proferida a decisão atacada, é inviável a ação rescisória inclusive quando se alegar violação a normas constitucionais.
Neste julgamento, portanto, prevaleceu o voto do Ministro Marco Aurélio, com importantes fundamentos acrescidos pelo Ministro Celso de Mello em torno da garantia da coisa julgada. Na essência, ficou assentado que não cabe ação rescisória quando há superveniente mudança de jurisprudência. Confira-se a ementa e a tese aprovadas relativas ao Tema 136 da Repercussão Geral:
AÇÃO RESCISÓRIA VERSUS UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. O Direito possui princípios, institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, não cabendo colar a sinonímia às expressões “ação rescisória” e “uniformização da jurisprudência”. AÇÃO RESCISÓRIA – VERBETE Nº 343 DA SÚMULA DO SUPREMO. O Verbete nº 343 da Súmula do Supremo deve de ser observado em situação jurídica na qual, inexistente controle concentrado de constitucionalidade, haja entendimentos diversos sobre o alcance da norma, mormente quando o Supremo tenha sinalizado, num primeiro passo, óptica coincidente com a revelada na decisão rescindenda (RE 590809, Relator Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 22/10/2014).
Tese: Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente.
O breve histórico do julgamento é muito relevante, pois, permite concluir com segurança que a ementa e a tese da repercussão geral não traduzem as razões determinantes da proposição vencedora. Na realidade, o que decidiu o Supremo foi que não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com a jurisprudência dos tribunais, especialmente a do Supremo, à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior mudança de entendimento. A existência de divergência no Supremo é um plus e não uma restrição aos limites da tese, tal como a redação final dá a entender. Na verdade os votos vitoriosos não limitaram, como faz a tese, que a controvérsia fosse no próprio Supremo. Pelo contrário: o Ministro Marco Aurélio expressamente aponta que a divergência “nos tribunais” não justifica a desconstituição por consolidação do entendimento. Essa indevida limitação, que não consta nos votos, aliás, foi aprovada em lista de sessão administrativa e sem fundamentação específica.
Após esse julgamento, inúmeras decisões passaram a seguir a posição firmada, impedindo a rescisória se existisse divergência nos tribunais na época da decisão atacada (AR 1900 AgR, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 24/03/2015; AR 2199, Relator Min. Marco Aurélio, Relator Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015; RE 589513 ED-EDv-AgR, Relator Min. Celso De Mello, Tribunal Pleno, julgado em 07/05/2015; AR 2343 AgR, Relator Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 15/03/2016).
Na mesma época, o Supremo veio a julgar outro assunto relacionado com a autoridade da coisa julgada e a impossibilidade de execução de pronunciamento judicial “fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal”. Nessa ocasião, porém, não se discutiu o papel da ação rescisória, mas sim a constitucionalidade da regra sobre a inexigibilidade da decisão baseada em lei inconstitucional ou baseada em interpretação incompatível com a Constituição (art. 741, parágrafo único, CPC/73 – regra parcialmente reproduzida nos artigos 525, §12 e 535, §5º, do CPC atual).
O Ministro Teori Zavascki destacou que o efeito vinculante das decisões do Supremo do Supremo impõe a conformação superveniente dos atos administrativos ou judiciais inferiores; “não os pretéritos, ainda que formados com suporte em norma posteriormente declarada inconstitucional”. Há que se prestigiar, portanto, a autoridade da coisa julgada e que somente pode ser desafiada por ação rescisória quando esta for cabível (“se for o caso”). A posição que prevaleceu foi justamente em defesa da coisa julgada, no sentido de que somente seria possível a superação da coisa julgada via ação rescisória, se viável. Obviamente, não se discutiram os limites do cabimento da própria rescisória, já que não era objeto do recurso. Mas foi aceito o argumento de inexecutividade da sentença inconstitucional (RE 730462, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 28/05/2015).
Após esse período, a jurisprudência da Suprema Corte voltou à dispersão, com fortes indícios de que iria flexibilizar as verdadeiras razões de decidir formadas no caso do creditamento do IPI (Tema 136).
Com isso, o quarto momento jurisprudencial tem início quando o Ministro Teori Zavascki, em julgamento de caso concreto, julgou improcedente ação rescisória que envolvia justamente o direito a creditamento do IPI. Quando a sua decisão monocrática foi atacada por agravo regimental, o Ministro, ao manter a decisão, explicitou que ela estava de acordo com o entendimento consagrado, bem como que o STF “não operou, propriamente, uma substancial modificação da sua jurisprudência sobre a não aplicação da Súmula 343 em ação rescisória fundada em ofensa à Constituição”, mas somente fixou que a superveniente modificação da sua própria jurisprudência “não autoriza, sob esse fundamento, o ajuizamento de ação rescisória para desfazer acórdão que aplicara a firme jurisprudência até então vigente no próprio STF” (AR 2370 AgR, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 22/10/2015). O julgamento do agravo regimental foi unânime, contudo, as razões do Ministro Teori Zavascki –vencido no julgamento sobre o creditamento do IPI – não traduzem com precisão os limites do que ficara decidido anteriormente. De fato, lá não havia exigência de que a jurisprudência controvertida fosse “no próprio STF” e menos ainda que houvesse “firme jurisprudência” vigente para afastar a vedação da ação rescisória (e flexibilizar a coisa julgada).
Em outro julgamento, o Ministro Teori Zavascki trouxe novamente à baila o assunto da inexequibilidade de sentença baseada em decisão fundada em norma declarada inconstitucional, assunto que já havia sido discutido em outras oportunidades. Cabe lembrar que estava novamente em debate a validade constitucional das regras que permitem a declaração de inexigibilidade da decisão judicial baseada em norma jurídica inconstitucional (art. 741, parágrafo único, CPC/73; artigos 525, §12 e 535, §5º, do CPC atual). Sua Excelência destacou que os dispositivos ampliam o controle contra decisões inconstitucionais, já que “tanto a procedência da ação rescisória, como a procedência dos embargos à execução ou do incidente de impugnação inibem a prática dos atos executivos da sentença atacada e impõem a extinção do processo de execução”.
O Ministro Teori Zavascki ressaltou que as regras sobre a inexigibilidade do título agregam ao sistema processual um instrumento com eficácia rescisória de “certas sentenças eivadas de especiais e qualificados vícios de inconstitucionalidade”. Trata-se, pois, de mais um instrumento de combate à “sentença inconstitucional”, isto é, decisão contrária à Constituição. Ele, então, exemplifica algumas hipóteses de “sentença inconstitucional”: (a) quando aplica norma inconstitucional ou “com um sentido ou a um situação tidos por inconstitucionais”; (b) quando deixa de aplicar norma declarada constitucional; (c) quando aplica norma constitucional considerada não autoaplicável; (d) quando aplica norma constitucional com interpretação equivocada; (e) quando deixa de aplicar norma constitucional autoaplicável. Em suma, conforme Sua Excelência, “em qualquer caso de ofensa à supremacia da Constituição” a sentença é inconstitucional e sujeita a instrumentos de controle. As hipóteses de ineficácia da sentença revelam situações específicas em que esse controle se torna possível após o trânsito em julgado. Não se trata, contudo, de “relativização da coisa julgada” (fenômeno que nega a eficácia de decisão judicial sem que haja previsão expressa na lei).
Após tratar da interpretação constitucional, o Ministro Teori Zavascki conclui que tanto a sentença exequenda que aplica norma inconstitucional como a que deixa de aplicar norma que o STF declarou constitucional se submete à declaração de inexigibilidade (art. 741, parágrafo, CPC/73; art. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14 e art. 535, III, § 5º, do CPC atual). Em ambos os casos, a decisão contrária ao precedente da Corte Suprema, está sujeita tanto à rescisão como à declaração de inexigibilidade pela via da impugnação ou dos embargos.
E sobre a diferença dos instrumentos de controle de constitucionalidade, já com base na nova codificação processual, destaca: “A distinção restritiva, entre precedentes em controle incidental e em controle concentrado, não é compatível com a evidente intenção do legislador, já referida, de valorizar a autoridade dos precedentes emanados do órgão judiciário guardião da Constituição, que não pode ser hierarquizada simplesmente em função do procedimento em que a decisão foi tomada” (p 32). Por esse motivo, a força da autoridade das decisões do Supremo é a mesma no controle concentrado e no controle difuso de constitucionalidade, ganhando relevo a tendência de considerar com eficácia erga omnes inclusive as decisões tomadas em recurso extraordinário (p. 33). Sua Excelência também destacou a importância das alterações promovidas pelo Novo Código de Processo Civil a influenciar a matéria em exame.
A conclusão do Ministro Teori Zavascki foi, novamente, pela constitucionalidade das regras que admitem a inexigibilidade da sentença inconstitucional, desde que: “(a) a sentença exequenda esteja fundada em norma reconhecidamente inconstitucional – seja por aplicar norma inconstitucional, seja por aplicar norma em situação ou com um sentido inconstitucionais; ou (b) a sentença exequenda tenha deixado de aplicar norma reconhecidamente constitucional; e (c) desde que, em qualquer dos casos, o reconhecimento dessa constitucionalidade ou a inconstitucionalidade tenha decorrido de julgamento do STF realizado em data anterior ao trânsito em julgado da sentença exequenda”. Quanto ao último tópico, o Ministro ressaltou, nos debates, que se a decisão do Supremo é posterior ao trânsito em julgado da sentença exequenda, não é cabível a alegação de inexigibilidade, mas é viável a rescisória por agora existir expressa previsão legal (ADI 2418, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2016).
Uma vez mais, contudo, não se discutiram os limites da própria ação rescisória. Não houve debate em torno da Súmula 343 ou sua não incidência em matéria constitucional. Todavia, há um detalhe importante: o STF acabou por reconhecer que cabe, em tese, ação rescisória baseada em interpretação constitucional posterior ao trânsito em julgado de decisão judicial. Esse cabimento “em tese”, inclusive está atualmente amparado no Código de Processo Civil em dispositivo legal que não foi discutido naquele momento (art. 525, § 15, CPC).
Após esse julgamento, as contradições pela falta de um exame claro e objetivo em torno da subsistência da Súmula 343 ficaram mais agudas, com visíveis rupturas à tese firmada no passado em repercussão geral (Tema 136). Podem ser encontradas decisões que genericamente apontam ser inaplicável a Súmula 343 em matéria constitucional; outras no sentido de que não cabe ação rescisória quando o acórdão rescindendo, à época de sua prolação, não estava em confronto com a jurisprudência da Corte; igualmente há casos no sentido de que não cabe ação rescisória quando a matéria era controvertida nos tribunais; mas, há também vários casos a indicar que não cabe ação rescisória quando a matéria era controvertida no STF, justificando a rescisória se a matéria não era controvertida no Supremo no momento do trânsito em julgado.
A 2ª Turma, por exemplo, assentou que “não é aplicável a Súmula 343 do STF, quando o acórdão do juízo de origem reconheceu a controvérsia tratada no acórdão rescindendo como inédita, logo não haveria alteração jurisprudencial ou mesmo divergência jurisprudencial acerca de aplicação da norma” (RE 1048518 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 31/08/2018). Inédita, na realidade, foi a distinção proposta pelo Relator e que jamais foi levantada nos precedentes que deram origem à incidência da Súmula 343 em matéria constitucional. Na mesma 2ª Turma, diversas decisões do Ministro Gilmar Mendes desconsideram o anterior precedente qualificado relativo ao creditamento do IPI.
Mais recentemente, foi reafirmado pelo Plenário, em agravo regimental, que a rescisória “não se presta para desconstituir julgados, se à época da decisão a matéria era flagrantemente controvertida, ainda que a jurisprudência, em momento posterior, venha se firmar a favor da parte autora”. E consta da ementa: “incidência também nos casos em que a controvérsia de entendimentos se baseia na aplicação de norma constitucional” (RE 1194899 AgR, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 07/06/2019). Na mesma linha: “não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais” (AR 2495 AgR, Relator Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 23/08/2019)
Com tantas decisões contraditórias, embora haja precedente qualificado que já deveria ter sepultado a controvérsia (Tema 136 da repercussão geral – caso do creditamento do IPI), é preciso refletir em torno da posição atual do Supremo Tribunal Federal. E o repertório de jurisprudência permite identificar, no mínimo, três correntes.
A primeira corrente, presente em julgados da 2ª Turma, admite ação rescisória em face de decisão contrária à jurisprudência atual do STF, seja qual for a postura dos tribunais ou do próprio STF na época do trânsito em julgado da decisão atacada. Em síntese, não se aplica a Súmula n. 343 quando há violação de norma constitucional pela decisão atacada e deve prevalecer o sentido dado à norma pelo Supremo, ainda que posterior ao trânsito em julgado da decisão. Conforme já visto extensamente, essa primeira corrente nega autoridade ao que foi fixado em regime de repercussão geral pelo próprio Supremo e traduz entendimento superado.
A segunda corrente, vista em julgados do Plenário, não admite ação rescisória em face de decisão contrária à jurisprudência atual do STF, se a matéria era controvertida no próprio STF na época do trânsito em julgado. Essa posição pode ser considerada uma releitura da Súmula 343: não caberá rescisória por ofensa a norma constitucional quando a decisão rescindenda se tiver baseado em norma de interpretação controvertida no Supremo. Aqui surge uma perigosa margem interpretativa para aceitar o cabimento da rescisória em muitas situações que, na época do trânsito em julgado, não caracterizariam “manifesta violação” da norma constitucional. Assim, por exemplo, quando a) não havia uma posição do STF na data do trânsito em julgado ou; b) a despeito da controvérsia nos tribunais, o Supremo vem a firmar sua posição sobre a matéria após o trânsito em julgado da decisão atacada.
A terceira corrente, também do Plenário, não admite ação rescisória em face de decisão contrária à jurisprudência atual do STF, se a matéria era controvertida nos tribunais na época do trânsito em julgado. Essa posição reflete exatamente o que já havia sido fixado em recurso extraordinário com repercussão geral e pode ser considerada uma leitura ampliativa da Súmula n.º 343 do STF: não caberá ação rescisória por ofensa a norma constitucional quando a decisão rescindenda se tiver baseado em norma de interpretação controvertida nos tribunais (seja qual for o tribunal). Como a matéria era controvertida, deve prevalecer a autoridade da coisa julgada.
Essa última corrente seguramente se afigura de todo mais adequada, afinal: (a) ela traduz o que ficou decidido na tese da repercussão geral, o que não poderia simplesmente ser relativizado sem a adequada distinção ou mudança da tese; (b) ela prestigia a segurança jurídica obtida em favor do segurado individualmente em detrimento do que se veio a declarar genericamente inconstitucional.
Uma análise das decisões mais recentes, contudo, permite concluir que é a segunda corrente que está prevalecendo. Ao que tudo indica, a posição se sustenta na harmonia com as regras vigentes sobre a inexigibilidade da sentença inconstitucional e sobre o recurso extraordinário. Além disso, foi reforçada por julgamentos relevantes e atuais.
Quanto à a inexigibilidade da sentença inconstitucional, cabe lembrar que o Código de Processo Civil prevê que a decisão pode ser impugnada na fase de execução e, se o pronunciamento judicial atacado for “fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso” o título judicial deve ser considerado inexigível (art. 525, §12, do CPC). Por outro lado, se a inconstitucionalidade for reconhecida, pelo Supremo, após o trânsito em julgado, é cabível ação rescisória por expressa autorização da lei (art. 525, §15, do CPC). Anote-se que é irrelevante se a decisão foi tomada em controle concentrado ou em controle difuso de constitucionalidade. E para não deixar dúvidas de que essa é uma novidade legislativa no cabimento da rescisória, há regra específica de direito intertemporal indicando que a proposição se aplica apenas às decisões transitadas em julgado após a vigência do Código de Processo Civil (art. 1057, do CPC).
Quanto ao recurso extraordinário, se antes havia debate sobre o seu papel no sistema de controle de constitucionalidade, o Código de Processo Civil reforça o papel central do Supremo para conferir unidade ao ordenamento jurídico. Essa a razão que torna possível a suspensão nacional dos feitos enquanto a matéria é examinada pela Corte (art. 1037, CPC) e a obrigatoriedade na observância das orientações firmadas em recurso extraordinário (art. 927, CPC), inclusive em juízo de retratação (art. 1040, CPC).
Além dessas indicações legais, acaba-se convergindo com a valorização da jurisdição constitucional e da unidade do direito no tratamento de casos idênticos, uma clara exigência de um sistema de precedentes em construção. Por outro lado, o assim chamado “efeito expansivo” do recurso extraordinário acaba por projetar a interpretação constitucional nele fixada (eficácia declaratória da jurisdição constitucional) inclusive para casos anteriores já transitados em julgado e que tenham deixado de observar a diretriz do Supremo. Rompe-se, pontualmente, a garantia da coisa julgada em prol da norma constitucional violada pela decisão que se pretende desconstituir. Porém, quando houver divergência na jurisprudência do próprio STF, prevalecerá a autoridade da coisa julgada.
Em julgamentos recentes, o Supremo caminhou nesse sentido. A questão envolveu os embargos de declaração no recurso extraordinário que julgou carente de previsão legal o instituto da desaposentação. No caso originário, o STF julgara constitucional a norma que não incluiu a aposentadoria dentre os benefícios que poderiam ser concedidos àqueles que já estão aposentados (art. 18, §2º, Lei 8.213/91), o que torna vedada ou sem amparo legal a concessão de aposentadoria para quem já está aposentado. Cabe aqui lembrar que o Superior Tribunal de Justiça admitia essa prática, ocasionando diversas ações procedentes e, inclusive, com trânsito em julgado. Essa, então, seria uma situação que, individualmente, permitiria o ajuizamento de ação rescisória por violação da Constituição contra aqueles que tivessem obtido o direito à desaposentação por decisão transitada em julgado.
No julgamento dos embargos de declaração, então, o Supremo modulou os efeitos de sua decisão “de forma a preservar a desaposentação aos segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento”. Ora, ao reconhecer a necessidade de modulação dos efeitos, de modo a proteger aqueles já beneficiados por decisão transitada em julgado e, por consequência vetar o manejo da ação rescisória, o Supremo acabou por reconhecer que os efeitos naturais do julgamento teriam sido idôneos a justificar a desconstituição de sentenças contrárias já transitadas em julgado. É dizer: não tivesse ocorrido a modulação de efeitos, seria cabível a ação rescisória com base no entendimento recém firmado pelo STF; mas, como houve modulação de efeitos, deve ser preservada a autoridade da coisa julgada em favor daqueles que obtiveram o reconhecimento judicial à desaposentação (RE 827833 ED, Relator Min. Dias Toffoli, Relator p/ Acórdão: Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 06/02/2020).
A posição atual do Supremo, portanto, é de ser a rescisória incabível quando a decisão rescindenda estiver fundada em norma cuja interpretação era controvertida no Supremo. Se havia alguma controvérsia nos demais tribunais, mas ausente pronunciamento do STF à época, a superveniente interpretação constitucional projeta seus efeitos na decisão transitada em julgado, que se torna passível de desconstituição por ação rescisória, quando presentes os seus pressupostos. Cabe lembrar que a hipótese de cabimento aqui abordada envolve a “manifesta violação de norma jurídica” na decisão atacada (art. 966, V, CPC).
Nesse esteira: (a) há violação “manifesta” quando a decisão é contrária à jurisprudência pacífica do Supremo sobre a norma constitucional na época do trânsito em julgado; (b) também há violação “manifesta” quando a decisão é contrária à jurisprudência posterior do Supremo sobre a norma constitucional, exigindo-se, neste último caso, que a matéria não fosse controvertida no Supremo na época do trânsito em julgado da decisão atacada. Em relação à violação de normas infraconstitucionais, não cabe ação rescisória quando a matéria era controvertida na data do trânsito em julgado, justamente porque a violação não é “manifesta”. Em matéria infraconstitucional, segue em vigor o entendimento que deu origem à Súmula n.º 343 do STF.
Por outro lado, a presença de “matéria controvertida no Supremo” na época do trânsito em julgado deve ser apreciada caso a caso, integrando o juízo cognitivo de cada demanda trazida a novo julgamento por ação rescisória.
Apesar de alguma oscilação, esse tem sido também o entendimento atual da Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Exemplificativamente, cito o Desembargador Paulo Afonso, ao explicar que, em matéria constitucional a questão é saber se: “(a) quando da decisão rescindenda, existia posicionamento firme do Supremo Tribunal Federal no mesmo sentido e a rescisória se funda em posterior alteração da jurisprudência da Corte (hipótese na qual a rescisória não é cabível) ou se (b) simplesmente inexistia posição firme do STF sobre a matéria constitucional à época da decisão rescindenda e a Corte vem a se posicionar pela primeira vez - em sentido contrário ao da decisão rescindenda - de maneira a vincular ou ao menos orientar inequivocamente os demais tribunais (caso em que será cabível a ação rescisória).” (AR 0007714-08.2013.4.04.0000, Corte Especial, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 09/05/2018).
Em arremate, essa corrente dominante, segundo penso, deve ser sempre pensada à luz do direito material controvertido. Isto porque, ao menos no que diz respeito a direitos previdenciários, cujo caráter social tem relevância ímpar para os titulares, a segurança jurídica deveria, como regra geral, prevalecer em detrimento da padronização decisória posterior do Supremo. Nesse cenário, incorporado o direito ao patrimônio jurídico do segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, e até mesmo em juízo de proporcionalidade, a providência mais adequada seria justamente, "no interesse social e no da segurança jurídica", que os tribunais superiores modulassem os efeitos de suas decisões, na forma do art. 927, §3º, do CPC.
A posição privilegiada do benefício previdenciário na moldura constitucional já foi reconhecida pelo Supremo em diversas oportunidades. Cabe lembrar, aliás, que ao reconhecer o direito ao melhor benefício, o STF seguiu linha de "preservação do direito adquirido frente a novas circunstâncias", conforme se infere do voto da Ministra Ellen Gracie (STF, RE 630501, Relatora Min. Ellen Gracie, Relator p/ Acórdão Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 21/02/2013). De igual modo, assentou a Corte que o "direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo". A decadência, pois, abrange somente pretensões revisionais (STF, RE 626489, Relator Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2013).
Ora, estando o direito adquirido e a garantia da coisa julgada no mesmo nível de defesa do benefício previdenciário, foge da razoabilidade tolerar mudanças supervenientes quando esse patrimônio já foi incorporado, seja por atos administrativos (direito adquirido) ou por atos judiciais (coisa julgada). Com isso, ainda que a legislação autorize o cabimento da ação rescisória, essa via deve ser reputada excepcional se buscar atingir benefício previdenciário conquistado por decisão de mérito transitada em julgado.
5 – Violação de norma constitucional nas aposentadorias de professores
Assentadas as premissas básicas em torno da ação rescisória fundada em manifesta violação de norma constitucional, cabe perquirir se ela é meio idôneo para desconstituir as decisões transitadas em julgado que reconheceram o direito à aposentadoria de professores sem a incidência do fator previdenciário.
Conforme destacado no início do voto, a Corte Especial deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em incidente de inconstitucionalidade, afastou a aplicação do fator previdenciário no cálculo do salário de benefício da aposentadoria por tempo de contribuição do professor de ensino infantil, fundamental e médio. Na época desse julgamento (08/07/2016), a matéria era controvertida nos tribunais, dando ensejo à natural cadeia recursal. Naquele período, ainda não havia precedente vinculante do STF acerca da constitucionalidade do fator previdenciário para benefícios em geral, mas apenas uma sinalização (ADI 2111 MC, Relator Min. Sydney Sanches, Tribunal Pleno, julgado em 16/03/2000).
Na sequência, o Supremo reconheceu expressamente a distinção entre a constitucionalidade do fator previdenciário para benefícios em geral e a incidência do fator previdenciário para o caso de benefícios de professores. Na oportunidade, com voto do Ministro Edson Fachin, em exame de recurso extraordinário que envolvia justamente acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o STF destacou ter posição pela constitucionalidade do fator previdenciário nos benefícios em geral, mas, a questão do professor deveria ser apreciada de forma específica. Além disso, ainda segundo o Supremo, a questão “demanda análise da legislação infraconstitucional aplicável à espécie, ou seja, das Leis 9.876/99 e 8.213/91”. O assunto, portanto, teria caráter infraconstitucional e deveria ser apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça (RE 1029608 RG, Relator EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 24/08/2017), ou seja, existia uma posição firme do STF quanto à orientação para os tribunais inferiores de que a norma estaria inserida na competência infraconstitucional.
No seguimento, contudo, o Supremo, em “"reafirmação" de jurisprudência”, admitiu e deu provimento a recurso extraordinário com repercussão geral que envolvia a “constitucionalidade do fator previdenciário, previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99” (Tema n.º 1091, STF). Tal como cadastrado, o tema dá margem à interpretação de que haveria mera reafirmação da jurisprudência consagrada sobre fator previdenciário. Realmente a jurisprudência no STF jamais oscilou quanto à constitucionalidade do fator para benefícios em geral. A leitura das razões de decidir, porém, revela que a Corte reviu a posição específica sobre a constitucionalidade do fator previdenciário dos professores.
Houve, portanto, uma virada de jurisprudência: o caráter constitucional da discussão, que antes era negado, passou a ser reconhecido para assentar a constitucionalidade do fator previdenciário inclusive no benefício de professores. Ora, quando há mudança da jurisprudência do Supremo em torno do sentido de determinada proposição normativa, inclusive quanto à natureza da norma, deve prevalecer a segurança jurídica conquistada com a estabilidade da decisão judicial transitada em julgado.
É dizer, não se pode romper a confiança obtida com a autoridade da coisa julgada, fenômeno que permitiu a incorporação do direito ao patrimônio jurídico do titular e o imunizou de mudanças bruscas de entendimento no Supremo. É inviável, portanto, o manejo de ação rescisória para a situação em exame. Devem prevalecer, pois, as considerações trazidas em outra oportunidade pelo Ministro CELSO DE MELLO sobre garantia em tela:
A proteção constitucional dispensada à coisa julgada em sentido material revela-se tão intensa que impede sejam alterados os atributos que lhe são inerentes, a significar, como já salientado, que nenhum ato estatal posterior poderá, validamente, afetar-lhe a integridade
(...)
Esses atributos que caracterizam a coisa julgada em sentido material, notadamente a imutabilidade dos efeitos inerentes ao comando sentencial, recebem, diretamente, da própria Constituição, especial proteção destinada a preservar a inalterabilidade dos pronunciamentos emanados dos Juízes e Tribunais, criando, desse modo, situação de certeza, de estabilidade e de segurança para as relações jurídicas.
(...)
Mostra-se tão intensa a intangibilidade da coisa julgada, considerada a própria disciplina constitucional que a rege, que nem mesmo lei posterior – que haja alterado (ou, até mesmo, revogado) prescrições normativas que tenham sido aplicadas, jurisdicionalmente, na resolução do litígio – tem o poder de afetar ou de desconstituir a autoridade da coisa julgada.
(...)
Todas as considerações que venho de fazer resumem-se a um único ponto, que consiste no reconhecimento de que a segurança jurídica, proporcionada pela autoridade da coisa julgada, representa, no contexto de nosso sistema normativo, o fundamento essencial da ordem constitucional, necessariamente condicionante da resolução da presente controvérsia (STF, RE 590809, Relator Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 22/10/2014).
Poderiam haver aqui dúvidas sobre a mudança jurisprudencial no Supremo, já que num primeiro momento foi “negada repercussão geral” e num segundo momento o STF apenas “reafirmou jurisprudência”. Ocorre que, enquanto a jurisprudência era pacífica em torno da constitucionalidade do fator previdenciário para benefícios em geral, a própria Suprema Corte havia sinalizado, em um primeiro momento, a existência de distinção relevante para os benefícios dos professores, tanto que foi determinado o exame pelo Superior Tribunal de Justiça nos termos do art. 1033 do CPC. A mudança de posição é evidente: inicialmente o Supremo indicou que haveria, no máximo, violação reflexa à Constituição, mas depois reconheceu que a incidência do fator previdenciário em tais benefícios teria assento constitucional e, com isso, haveria violação direta à Constituição nas decisões que negassem a sua incidência.
Aprove-se ou não, ao negar repercussão geral à matéria por considerar reflexa a violação à Constituição, inclusive diante da declaração de inconstitucionalidade promovida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o Supremo Tribunal Federal sinalizou a sua interpretação constitucional em sentido convergente às decisões desta Corte. Tanto foi assim que os recursos extraordinários do INSS foram sistematicamente negados pelo Supremo.
Não se diga, por outro lado, que no caso dos professores o exame anterior da repercussão geral ensejou mero juízo de admissibilidade. Segundo o próprio Supremo, na sistemática atual de julgamento do recurso extraordinário baseado em violação da Constituição (art. 102, III, a, CF/88), antes da análise da transcendência, no sentido da importância ou relevância dos reflexos gerais de natureza econômica, política ou jurídica, é realizada a avaliação quanto ao conteúdo constitucional da controvérsia, isto é, juízo em torno da natureza constitucional ou não da questão colocada, pois, sendo infraconstitucional a discussão, não é cabível o recurso extraordinário. Ocorre que nessa situação específica de violação à Constituição, o juízo de mérito recursal evolve justamente a avaliação sobre a conformidade do ato à Constituição. Há, pois, sobreposição entre admissibilidade e mérito do recurso extraordinário fundado em violação da Constituição.
Nessas condições, seja qual for a denominação que se empregue, houve um clara mudança na jurisprudência do Supremo quanto ao alcance das normas constitucionais em conflito.
6 - Considerações finais
Tendo em vista o debate travado na última sessão, julgo oportuno acrescentar, de um lado, que compartilho do entendimento de que a modulação de efeitos do decidido quanto ao Tema STJ nº 1.011, por ter se dado no âmbito dos repetitivos, não atingiria, em princípio, casos como o presente, em que a questão da incidência do fator previdenciário foi decidida sob enfoque constitucional. De outro lado, ainda que se entenda que a modulação de efeitos se aplique a esta ação, parece-me que esse é um fundamento adicional não para julgá-la parcialmente procedente, e sim para julgá-la improcedente, como o fez o Des. Paulo Afonso Brum Vaz em seu voto divergente.
Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002558438v2 e do código CRC fe47f80e.Informações adicionais da assinatura:
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Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA DE PROFESSOR. FATOR PREVIDENCIÁRIO. SÚMULA 343 DO STF. APLICABILIDADE. TEMA 1.091/STF. MUDANÇA DE ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. TEMA 1.011/STJ. RESSALVA DOS CASOS COM TRÂNSITO EM JULGADO. IMPROCEDÊNCIA.
1. A Corte Especial deste Regional, interpretando o julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 590.809/RS, compreendeu que a superveniente alteração da jurisprudência do STF não autoriza a rescisão de decisão judicial proferida à luz do anterior posicionamento da Corte, hipótese em que aplicável a Súmula 343 do STF. De outra parte, inexistindo posição do Supremo Tribunal sobre a questão constitucional debatida, é admissível a ação rescisória (TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017).
2. O STF, no julgamento do Tema 1.091 da repercussão geral, alterou sua posição em relação à constitucionalidade da questão relativa à aplicação do fator previdenciário às aposentadorias de professor. A mudança de posição foi evidente: inicialmente o Supremo indicara que haveria, no máximo, violação reflexa à Constituição, mas depois acabou passando a reconhecer que a incidência do fator previdenciário em tais benefícios teria assento constitucional e, com isso, haveria violação direta à Constituição nas decisões que negassem a sua incidência. Portanto, a posterior alteração da jurisprudência do STF obsta a rescisão de decisão judicial anterior por contrariedade ao precedente constitucional do RE 1.221.630 (Tema 1.091).
3. O STJ, ao julgar o Tema 1.011 do regime dos recursos especiais repetitivos, preservou da aplicação da tese jurídica os casos com sentença transitada em julgado.
4. Ação rescisória julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido parcialmente o relator, não conhecer da contestação do evento 10 e da impugnação ao valor da causa, retificar, de ofício, o valor dado à causa, para fixá-lo em R$ 76.977,68 (setenta e seis mil novecentos e setenta e sete reais e sessenta e oito centavos) e julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do voto do Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, que lavrará o acórdão. Vencidos, em parte, também, o Desembargador Federal CELSO KIPPER e os Juízes Federais ARTUR CÉSAR DE SOUZA e ÉRIKA GIOVANINI REUPKE, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002608400v4 e do código CRC 73c9af8d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 8/6/2021, às 15:22:30
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 26/08/2020
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 26/08/2020, na sequência 82, disponibilizada no DE de 17/08/2020.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA.
PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 20/04/2021 A 28/04/2021
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/04/2021, às 00:00, a 28/04/2021, às 16:00, na sequência 110, disponibilizada no DE de 09/04/2021.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO QUADROS DA SILVA NO SENTIDO DE NÃO CONHECER DA CONTESTAÇÃO DO EVENTO 10 E DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA, RETIFICAR, DE OFÍCIO, O VALOR DADO À CAUSA, PARA FIXÁ-LO EM R$ 76.977,68 (SETENTA E SEIS MIL NOVECENTOS E SETENTA E SETE REAIS E SESSENTA E OITO CENTAVOS) E JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER; A DIVERGÊNCIA PARCIAL INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ NO SENTIDO DE NÃO CONHECER DA CONTESTAÇÃO DO EVENTO 10 E DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA, RETIFICAR, DE OFÍCIO, O VALOR DADO À CAUSA, PARA FIXÁ-LO EM R$ 76.977,68 (SETENTA E SEIS MIL NOVECENTOS E SETENTA E SETE REAIS E SESSENTA E OITO CENTAVOS) E JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELOS DESEMBARGADORES FEDERAIS MÁRCIO ANTONIO ROCHA, OSNI CARDOSO FILHO E TAIS SCHILLING FERRAZ; E A DIVERGÊNCIA APRESENTADA PELO JUIZ FEDERAL ARTUR CÉSAR DE SOUZA NO SENTIDO DE, EM JUÍZO RESCINDENDO, DESCONSTITUIR O ACÓRDÃO PROFERIDO NOS AUTOS ORIGINÁRIOS E, EM JUÍZO RESCISÓRIO JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO DA PARTE AUTORA DA AÇÃO ORIGINÁRIA, COM RECONHECIMENTO DA APLICABILIDADE DO FATOR PREVIDENCIÁRIO NO CÁLCULO DA RENDA MENSAL DO SEU BENEFÍCIO; PEDIU VISTA O DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA. AGUARDA O DESEMBARGADOR FEDERAL SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ.
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Pedido Vista: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY
Secretário
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Divergência - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.
Acompanha a Divergência - GAB. 62 (Des. Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ) - Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ.
Acompanho a solução do voto divergente
É possível o reconhecimento de que neste caso se aplica a modulação de efeitos, estabelecida pelo STJ no julgamento do tema 1011, o que implica, salvo melhor juízo, em negar-se tanto o juízo rescindente como o rescisório, julgando-se totalmente improcedente a presente ação, como proposto pelo Desembargador Paulo Afonso.
Admitir-se o juízo rescindente sobre a decisão impugnada geraria por efeito a eliminação do mundo jurídico do julgamento desta Corte, em que reconhecido o direito à aposentadoria sem fator previdenciário, justamente o julgado que está sendo mantido como decorrência da modulação de efeitos.
Quanto à circunstância de haver sido estabelecida a modulação de efeitos, pelo STJ no item do voto do relator que tratava de questão em obiter dictum, entendo não ser óbice ao reconhecimento da vinculação desta Corte à decisão modulatória. Essa decisão tem natural caráter expansivo e, no contexto dos recursos repetitivos, sempre se abstrai do caso adotado como paradigma, para reger um sem-número de situações paralelas.
O Superior Tribunal de Justiça declarou a própria competência para examinar, em precedente qualificado, o tema do fator previdenciário na aposentadoria do professor, ainda que para exame dos argumentos infraconstitucionais. E o fez tendo por pressuposto que o próprio STF reconheceu a constitucionalidade do fator previdenciário nas aposentadorias. As decisões não concorrem, resultam na manutenção do critério de cálculo que fora impugnado nos processos, de forma que nada obstaria ao STJ, a modulação ampla de efeitos, como o fez, ao assentar expressamente que a tese representativa da controvérsia firmada no julgamento atingiria "a todos os jurisdicionados que tenham ações em andamento, não alcançando, porém, aquelas transitadas em julgado".
Com essas considerações, acompanho o Desembargador Paulo Afonso, para julgar improcedente a ação rescisória.
Divergência - GAB. 101 (Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO) - Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA.
Com a devida vênia do Eminente Relator, apresento a seguinte divergência.
No caso, o julgamento proferido pela Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região na Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.4.04.0000, sobre a inconstitucionalidade do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/1991, não prevaleceu perante o Supremo Tribunal Federal.
A base de sustentação e de legitimação da decisão rescidenda era a decisão proferida pela Corte Especial deste Tribunal, baseada em matéria constitucional e não infraconstitucional.
Em 19/6/2020, o Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal, no RE 1.221.630/SC, Relator Ministro Presidente Dias Toffoli, admitiu a Repercussão Geral 1091 e reafirmou a constitucionalidade do fator previdenciário, previsto no artigo 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pelo artigo 2º da Lei 9.876/1999. O S.T.F. fixou a seguinte tese de repercussão geral: "É constitucional o fator previdenciário previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99."
A propósito, cita-se a ementa do julgado:
Recurso extraordinário. Direito Previdenciário. Benefício previdenciário. Fator Previdenciário. Constitucionalidade. Existência de repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Recurso extraordinário provido para cassar o acórdão recorrido e determinar de que a Corte de origem profira novo julgamento observando a orientação jurisprudencial emanada do Plenário do STF. Tese de repercussão geral: É constitucional o fator previdenciário previsto no art. 29, caput, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/99.(RE 1221630 RG/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 19/6/2020)
Assim, no meu modo de ver, a análise da questão posta na presente rescisória deve estar delimitada à matéria de natureza 'constitucional' de competência do S.T.F. e não infraconstitucional de competência do S.T.J.
Note-se que o Supremo Tribunal Federal somente analisou a questão tratada na decisão rescindenda, em especial a arguição de inconstitucionalidade analisada no TRF4ª Região, justamente pelo fato de que a matéria ali tratada dizia respeito a norma constitucional.
Portanto, deixando de existir juridicamente a base de sustentação e legitimação da decisão rescindenda, no caso, a declaração de inconstitucionalidade do art. 29, inc. I, da Lei n. 8.213/91, não há como prevalecer o 'decisum' proferido por esta Corte Regional Federal, pois pulverizou-se a fundamentação da própria decisão.
A decisão rescindenda, repita-se, teve por fundamentação questão de natureza 'constitucional', razão pela qual houve manifestação do Supremo Tribunal Federal no Tema n. 1091.
A matéria, portanto, pelo menos no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está delimitada à questão de natureza Constitucional, de competência do S.T.F.
É certo, porém, que o Superior Tribunal de Justiça, no RECURSO ESPECIAL Nº 1.799.305 - PE (2018/0254355-4), ao prestar ESCLARECIMENTOS, IN OBTER DICTUM, À NOTA TÉCNICA DA JUSTIÇA FEDERAL N. 25/2019, assim preceituou:
Em atenção à Nota Técnica 25, em que se identificou dificuldades na aplicação da sistemática deste julgamento por amostragem referente ao fator previdenciário da aposentadoria do professor, considerando que o Supremo Tribunal Federal cancelou a repercussão geral do tema, cumpre destacar que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região fez o controle de constitucionalidade do tema aqui travado, em autos de Arguição de Inconstitucionalidade 5.012.935-13.2015.4.04.000, julgada pela Corte Especial daquele Órgão, em 23/6/2016, de Relatoria do Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, cujo acórdão declarou a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 29 da Lei 8.213/1991, sem redução do texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo artigo 29, com redução de texto, em relação aos professores que atuam na educação infantil e no ensino fundamental e médio. Concluiu-se que não incide o fator previdenciário no cálculo da aposentadoria dos professores.
Com efeito, desse acórdão proferido em controle de constitucionalidade, acarretaram distorções no processo recursal perante as Cortes Superiores, STJ e STF. Explico: os professores que demandaram perante esse Órgão Regional, tiveram seus proventos calculados sem a incidência do fator previdenciário; os recursos especiais oriundos do TRF-4ª Região impugnavam acórdãos de índole exclusivamente constitucional quanto ao tema, assim, passaram a não ser conhecidos no STJ. Essa dinâmica de não conhecimento dos recursos especiais culminou em um caso emblemático, o Recurso Especial 1.668.984/RS, de Relatoria do Ministro Herman Benjamin, no qual a Primeira Seção, por maioria de votos, decidiu, nos termos do artigo 1.033 do CPC/2015, que nas hipóteses em que o STF determina a remessa dos autos ao STJ, seus órgãos jurisdicionais julgarão a matéria relativa à incidência do fator previdenciário no cálculo dos proventos da aposentadoria do professor, sob o enfoque infraconstitucional. Concluiu-se, ainda, no julgamento da Primeira Seção que todos os recursos especiais relativos à matéria, oriundos de acórdãos dos Tribunais Regionais Federais brasileiros, incluído o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, serão julgados sob o prisma infraconstitucional.
Deveras, é a seara infraconstitucional legal o ambiente para a interpretação da incidência do fator previdenciário no cálculo da aposentadoria do professor, o julgamento final do tema compete ao Superior Tribunal de Justiça.
Destarte, a título de esclarecimento, para que não paire dúvidas, a tese representativa da controvérsia firmada neste julgamento atingirá a todos os jurisdicionados que tenham ações em andamento, não alcançado, porém, aquelas transitadas em julgado; bem como aos beneficiários requerentes do INSS, mercê de a Administração Pública também se submeter ao efeito vinculante dos julgamentos em recursos especiais repetitivos.
Dois aspectos devem ser analisados em relação aos esclarecimentos prestados pelo Ministro Mauro Campbell Marques:
a) Os esclarecimentos foram prestados in obter dictum e não como ratio decidendi.
O obiter dictum refere-se àquela parte da decisão considerada dispensável, que o magistrado faz referência por força de retórica e que não importa em vinculação para os casos subsequentes. Referem-se aos argumentos expendidos para completar o raciocínio, mas que não desempenham papel fundamental na formação do julgado. São verdadeiros argumentos acessórios que acompanham o principal – ratio decidendi (razão de decidir). Neste caso, a supressão do excerto considerado obiter dictum não prejudica o comando da decisão, mantendo-a íntegra e inabalada. Obter dictum são conhecidos como argumentos de passagem, de mero reforço, deliberações marginais (a latere) tratadas pelos julgadores, mas que não dizem respeito à questão principal a ser decidida, não compondo o núcleo da controvérsia, podendo serem vistos, ainda, como uma simples impressão (ou mesmo opinião) do julgador acerca de um tema conexo ao que está sendo decidido, prescindível para o deslinde daquela controvérsia.
Nessa linha, afirma Macedo que “a diferença entre a ratio decidendi e obiter dictum está pautada justamente em separar, respectivamente, a parcela obrigatória de um precedente da não obrigatória” (MACEDO, Lucas Buril. Contributo para a definição de ratio decidendi na teoria brasileira dos precedentes judiciais. Precedente/coordenadores, Fredie Didier Jr. Coleção Grandes Temas do Novo CPC, 3, Precedentes, ed. , Salvador: Juspodivm, 2015., p. 215).
Segundo afirma Celso de Albuquerque Silva SILVA, (Do efeito vinculante: sua legitimação e aplicação. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005. p. 303):
O conceito de obiter dicta, dictum está ligado ao conceito de holding, que é a regra ou princípio enunciado pelo juiz em um determinado caso que era necessário para a resolução da questão. Assim, toda e qualquer regra elaborada pela Corte que não era necessária para a solução da questão é considerada dicta, dictum. Considerando que as Cortes podem criar regras de direito, mas com a limitação de que elas devem estar relacionadas com os fatos postos sob adjudicação, esse poder está confinado pelas necessidades das controvérsias que lhe são submetidas para decisão. Os obiter dictum, portanto, são aquelas considerações jurídicas elaboradas pelo Tribunal não relacionadas com o caso, embora as considerem desnecessárias para justificar a decisão proferida. São pronunciamentos que se afastam do princípio justificador daquela decisão. A partir do momento que dele se afastam, o Tribunal passa a falar extrajudicialmente e nenhuma opinião que possa expressar é considerada vinculante.
b) Em segundo lugar, não poderia o S.T.J. modular efeitos de forma ampla e genérica, pois se assim o fizesse correria o risco de estar também modulando os efeitos da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1091, o que caracterizaria usurpação de competência.
Assim, se a intenção do S.T.J. foi modular os efeitos do Tema 1.011, o fez apenas em relação aos processos em que a matéria diga respeito a questão de natureza infraconstitucional.
No caso presente, como o fundamento da decisão rescindenda diz respeito a matéria constitucional, de competência do S.T.F., o precedente vinculante no âmbito de análise da presente rescisória é aquele previsto no Tema 1091 do S.T.F. e não no Tema 1.011 do S.T.J.
Como não houve modulação de efeitos na decisão do S.T.F. no Tema 1091, entendo que os seus efeitos aplicam-se, também, às decisões transitadas em julgado.
Ante o exposto, com base no art. 966, inc. V, do C.P.C., voto por, em juízo rescindendo, desconstituir o acórdão proferido nos autos originários e, em juízo rescisório julgar improcedente o pedido da parte Autora da ação originária, com reconhecimento da aplicabilidade do fator previdenciário no cálculo da renda mensal do seu benefício.
Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado em favor do INSS no percentual de 10% do valor atualizado da causa.
É como voto.
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 26/05/2021
Ação Rescisória (Seção) Nº 5008138-18.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: SIMARA TERESINHA SALDANHA MIGOTTO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 26/05/2021, na sequência 120, disponibilizada no DE de 17/05/2021.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA NO SENTIDO DE JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, E O VOTO DA JUÍZA FEDERAL ÉRIKA GIOVANINI REUPKE ACOMPANHANDO O RELATOR, A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO PARCIALMENTE O RELATOR, NÃO CONHECER DA CONTESTAÇÃO DO EVENTO 10 E DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA, RETIFICAR, DE OFÍCIO, O VALOR DADO À CAUSA, PARA FIXÁ-LO EM R$ 76.977,68 (SETENTA E SEIS MIL NOVECENTOS E SETENTA E SETE REAIS E SESSENTA E OITO CENTAVOS) E JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, NOS TERMOS DO VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO. VENCIDOS, EM PARTE, TAMBÉM, O DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER E OS JUÍZES FEDERAIS ARTUR CÉSAR DE SOUZA E ÉRIKA GIOVANINI REUPKE.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
VOTANTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal ÉRIKA GIOVANINI REUPKE
PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 16/06/2021 04:01:05.